10/10/2013 – 16h54
por Alana Gandra
Rio de Janeiro – O diretor do Instituto de Energia e Ambiente da
Universidade de São Paulo (IEE-USP), Ildo Sauer, ex-diretor da
Petrobras, espera que o Poder Judiciário ainda possa se manifestar para
inviabilizar a licitação do Campo de Libra, primeira na área do
pré-sal, programada para o próximo dia 21, no Rio de Janeiro. Para
Sauer, esse é um ato “contra o interesse nacional”.
“Sou totalmente contrário”, disse o diretor do IEE-USP à Agência
Brasil. “Quem disse que vai ser bom para o país é porque ou deve estar
equivocado ou não sabe fazer contas”. Sauer sublinhou que nenhum país do
mundo que conseguiu identificar uma nova província petrolífera, ainda
mais da importância de Libra, coloca em produção e efetua leilões sem
primeiro pesquisar a fundo qual é o tamanho da reserva.
“Se é para mudar o país, você tem que saber quanto petróleo tem.
Nenhum fazendeiro vende uma fazenda sem saber quantos bois tem”,
argumentou para sinalizar a necessidade que haja um controle
estratégico sobre o ritmo de produção.
Sauer afiançou que o edital de Libra é um equívoco estratégico e contraria o interesse público.
Ele salientou que todos os países exportadores controlam o ritmo de
produção a partir de interesses de Estado “e não de contratos
microeconomicamente outorgados”.
Para ele, o melhor regime para países que têm grandes recursos de
petróleo é contratar uma empresa 100% estatal, como ocorre, por
exemplo, com a Petróleos da Venezuela (PDVSA).
O diretor da IEE-USP não tem dúvidas que existem outras formas, que
não o leilão, que permitem o controle do Estado nacional sobre o ritmo
de produção.
Ele sugeriu a contratação direta da Petrobras e avaliou que isso
geraria mais benefícios para o Tesouro Nacional do que a partilha
convencional no leilão.
No caso da contratação da estatal, o contrato de partilha se
assemelharia mais a um contrato de prestação de serviços, negociado
diretamente com a Petrobras que, por sua vez, é controlada pelo
governo.
Sauer considerou “assustadora” a opção do governo federal pelo leilão
de Libra e atribuiu a pressa em licitar a primeira área do pré-sal ao
acordo firmado pelo governo brasileiro com os Estados Unidos, em março
de 2011, durante a visita do presidente Barack Obama ao Brasil. O
acordo visava a acelerar a produção dos recursos do pré-sal, “que é o
que está sendo feito com Libra”, para benefício mútuo dos dois países.
“Aos Estados Unidos interessa produzir mais petróleo o quanto antes e
reduzir o preço. Para um país que pretende ser exportador, como é o
caso do Brasil, interessa controlar o ritmo de produção e manter o
preço elevado”, insistiu.
Por isso, Sauer reiterou que é “assustadora a euforia ingênua” que
vê em diversas áreas em relação à licitação de Libra, “principalmente na
Presidência da República e na Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural
e Biocombustíveis [ANP], como se fossem agentes subalternos do
interesse americano”.
A espionagem praticada por órgãos dos Estados Unidos em documentos estratégicos do Brasil está vinculada a isso, acredita.
Ildo Sauer sustentou que, atualmente, no mundo, todas as grandes
reservas de petróleo estão nas mãos de empresas 100% estatais ou de
Estados nacionais. “Somente uma fração está na mão das grandes
multinacionais do passado, como a Exxon, a Shell, a EPP, a British
Petroleum”.
O petróleo está no centro de um embate estratégico e geopolítico,
disse. De um lado, se encontram os Estados Unidos e a China, buscando
acelerar a produção de petróleo de todos os tipos, inclusive o não
convencional.
Os Estados Unidos já ocupam a terceira posição no ranking dos maiores
produtores globais, prestes a ultrapassar a Rússia e aproximando-se da
Arábia Saudita.
De outro lado, está a Organização dos Países Produtores de Petróleo
(Opep) que, em 2004/2005, conseguiu elevar os preços do petróleo,
sustentando-os a partir daí em torno de US$ 100 o barril.
Sauer informou que o custo de produzir direto, ou seja, a relação
capital e trabalho, está em US$ 1 na Arábia Saudita e em cerca de US$
15, no Brasil.
Com o acréscimo de transferências obrigatórias, entre as quais impostos e royalties, o preço do produto chega a US$ 40 o barril.
“E tudo que o governo americano, em conjunto com a China e outros,
está fazendo é buscar quebrar a coordenação da Opep que, junto com a
Rússia, vem mantendo o preço elevado. Eles querem que o preço do
petróleo volte a cair para algo como US$ 40 a US$ 50, próximo dos custos
de produção”.
Essa estratégia, disse Sauer, objetiva fazer com que os benefícios do
uso e produção do petróleo vão para quem o consome e não para quem o
produz.
O diretor do IEE-USP disse que é preciso primeiro saber para que o Brasil quer o dinheiro do pré-sal.
Se é para saúde pública, educação, entre outras áreas, para impedir a
repetição de ciclos que se esgotaram, como o do ouro, do café e da
borracha, e não deixaram mudanças concretas de qualidade de vida para a
população.
Sauer assegurou que nenhum país do mundo, que está vinculado ao
debate geopolítico e estratégico, renuncia ao controle sobre o ritmo de
produção. Isso, apontou, é o que ocorrerá no contrato de partilha, que
vai vigorar nos leilões do pré-sal.
Segundo Sauer, esse regime “outorga um contrato que vai sendo
resolvido de acordo com o ritmo de produção. Os investimentos serão
feitos e o objetivo é o quanto antes converter petróleo em moeda”. Na
opinião do ex-diretor da Petrobras, o leilão de Libra é “a maior
privatização da história brasileira”.
A diretora-geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e
Biocombustíveis (ANP), Magda Chambriard, disse que o leilão do Campo de
Libra, “será um sucesso”, não só pelo tamanho das reservas, estimadas
entre 8 bilhões e 12 bilhões de barris de petróleo, mas também pela
absorção de investimentos pela indústria local.
Magda garantiu que a mudança do regime de concessão para o sistema de
partilha não trará prejuízo para o país. A dirigente salientou que o
regime de partilha já faz parte do portfólio de todas as grandes
petroleiras globais.
Edição: Fábio Massalli
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