domingo, 29 de junho de 2014

Defender a Argentina dos abutres

http://www.ihu.unisinos.br/noticias/532666-defender-a-argentina-dos-abutres

Quem vai indenizar as vítimas da mídia?

Por Paulo Nogueira, no blog  Diário do Centro do Mundo


Janio de Freitas, que pertence à esquálida cota de pensamento independente da Folha, nota em seu artigo deste domingo um contraste.

Uma pesquisa mundial do Gallup coloca os brasileiros como um povo essencialmente feliz e otimista. Na imprensa, e em pesquisas dos grandes institutos nacionais, o retrato é o oposto. Somos derrotados, miseráveis, atormentados.

Janio brinca no final dizendo se sentir cansado demais para explicar, ou tentar explicar, tamanha disparidade.

Não é fácil para ele se alongar nas razões, sobretudo porque a Folha é uma das centrais mais ativas de disseminação da visão de um Brasil horroroso.

A motivação básica por trás do país de sofredores cultivada pela imprensa é a esperança de que o leitor atribua tanta desgraça – coisas reais ou simplesmente imaginárias - ao governo.

Ponto.

É a imprensa num de seus papeis mais notáveis nos últimos anos: o terrorismo.

A Copa do Mundo foi um prato soberbo para este terrorismo. A imprensa decretou, antes da Copa, que o Brasil - ou melhor: o governo - daria um vexame internacional de proporções históricas.

Em vez do apocalipse anunciado, o que se viu imediatamente após o início da competição foi uma celebração multinacional, multicolorida, multirracial.

Turistas de todas as partes se encantaram com o Brasil e os brasileiros, e a imprensa internacional disse que esta era uma das melhores Copas da história, se não a melhor.

Note o seguinte: a responsabilidade por um eventual fracasso seria atribuída pela mídia ao governo. O sucesso real, pelo que se lê agora, tem vários pais, entre os quais não figura o governo.

O melhor artigo sobre o caso veio de uma colunista da Folha que se proclamou arrependida por ter ouvido o “mimimi” da imprensa.

Ela disse ter perdido a oportunidade de passar um mês desfrutando as delícias que só uma Copa é capaz de oferecer: viagens para ver jogos, confraternizações com gente de culturas diferentes e por aí vai.

É uma oportunidade única na vida - quando haverá outra Copa no Brasil - que ela perdeu por acreditar na imprensa.

Quem vai indenizá-la? O Jornal Nacional? A Veja? O Estadão? E a tantos outros brasileiros como ela vítimas do mesmo terrorismo?

Para coroar o espetáculo, o Jornal Nacional atribuiu a histeria pré-Copa à imprensa internacional.

Pausa para rir.

Mais honesto, infinitamente mais honesto, foi o colunista JR Guzzo, da Veja - o maior mestre que tive no jornalismo, a quem tenho uma gratidão eterna e por quem guardo uma admiração inamovível a despeito de nossas visões de mundo diferentes.

“É bobagem tentar esconder ou inventar desculpas: muito melhor dizer logo de cara que a imprensa de alcance nacional pecou, e pecou feio, ao prever durante meses seguidos que a Copa de 2014 ia ser um desastre sem limites”, escreveu Guzzo em seu artigo na Veja desta semana.

“Deu justamente o contrário”, continua Guzzo. “Os 600.000 visitantes estrangeiros acharam o Brasil o máximo e 24 horas depois de encerrado o primeiro jogo ninguém mais se lembrava dos horrores anunciados durante os últimos meses.”

Bem, não exatamente ninguém: o Jornal Nacional se lembrou. Não para fazer uma reflexão como a de Guzzo - mas para colocar a culpa nos gringos.

Recorro, ainda uma vez, e admitindo minha obsessão, a Wellington: quem acredita nisso acredita em tudo.

O JN parece achar que seus espectadores são completos idiotas.

Outro legado da Copa

Laurindo Lalo Leal Filho no site Carta Maior


Além de estádios, aeroportos e alguns novos serviços de transporte, a Copa do Mundo no Brasil deixa um outro grande legado: a certeza de que precisamos ampliar a liberdade de expressão no país.

Restrita a alguns jornalões diários, a revistas semanais monocórdicas (com exceção da Carta Capital) e a um conjunto oligopolizado de emissoras de rádio e TV, a informação homogênea, já denunciada há muito tempo pela mídia alternativa, tornou-se cristalina nesta Copa.

A revista semanal de maior tiragem chegou a anunciar que devido ao ritmo das obras dos estádios o Brasil só teria condições de realizar a Copa em 2038. Mas não foi só ela que vendeu essa mentira ao brasileiros. Foi a mais descarada, sem dúvida, não contando no entanto com o privilégio da exclusividade.

Basta consultar os jornais ou conseguir acesso aos telejornais dos últimos anos para constatar que todos rezaram pela mesma cartilha. O objetivo era desacreditar da capacidade do governo brasileiro em oferecer as condições necessárias para a realização de um evento desse porte.

A expressão “imagina na Copa” foi uma das mais ouvidas em aeroportos, rodoviárias, avenidas e estradas congestionadas e até em filas de bares e restaurantes, nos últimos tempos.  Refletia a expectativa negativa criada pela mídia em torno do evento.

O clima ruim propagado dessa forma se alastrou mundo afora. Equipes estrangeiras de jornalistas baseadas no Brasil são raras. Na maioria dos casos a cobertura do pais é realizada por apenas um correspondente que se pauta, invariavelmente, pela mídia nativa.

Deu no que deu. Até uma Brazuca (bola oficial desta Copa) incandescente  se aproximando como um meteoro mortal sobre o Rio de Janeiro ilustrou a capa de uma revista alemã. O Brasil era um perigo para quem por aqui se aventurasse neste 2014. Governos de alguns países alertaram seus cidadãos para esses riscos.

Tentava-se destruir em pouco tempo todo o esforço empreendido pelo governo brasileiro, a partir de 2002, para fazer do pais um ator respeitado, não apenas pelas transformações que operava internamente, mas também por sua seriedade e capacidade de ação política no cenário internacional.

Basta lembrar o protagonismo de Brasília, ao lado do governo turco, ao alinhavar com o Irã um acordo nuclear estimulado e depois boicotado pelos Estados Unidos.

Há uma cena impagável no filme “Habemus Papam”, do diretor italiano Nanni Moretti, quando após a morte do Papa o seu sucessor (representado pelo excelente Michel Piccoli) reluta em assumir o posto. Um dos cardeais, desesperado com a demora, alerta que daquele jeito logo o presidente do Brasil estaria por lá para ajudar a encontrar uma solução.

Ao que tudo indica, no entanto, lá como cá, a população não foi na onda da mídia. Estádios, ruas e praças estão lotadas, nunca houve tantos turistas circulando pelo Brasil ao mesmo tempo como nestes dias. Talvez pudessem ter vindo mais, não fossem os fantasmas plantados pela mídia.

Até a critica de que o ex-presidente Lula exagerou ao propor à FIFA um número maior de cidades-sede para a Copa foi por água abaixo. Todas estão dando conta do recado. Só é lamentável que cidades como Belém ou Florianópolis tenham ficado de fora. Em vez de 12 poderiam ter sido 14 ou quem sabe 16.

Diante de tudo isso os meios de comunicação farão auto-crítica ou serão responsabilizados pelas perdas causadas ao país? Claro que não. Basta ver que a torcida contra não desapareceu. Pequenos incidentes, comuns a qualquer grande evento, seguem tendo destaque. Para não falar da mesma revista, antes mencionada, que soltou a manchete: “Só alegria até agora”. O “até agora” é  revelador da intenção.

Ao transitar das questões estritamente políticas para as político-esportivas a mídia tradicional deu uma contribuição importante para a revelação a um público mais amplo do seu papel disseminador de um pensamento único, antagônico aos interesses da ampla maioria da população brasileira.

Tiragens de jornais e revistas em queda, audiências de telejornais despencando são as respostas do público, cada vez mais consciente de que, por esses meios, não escapa do pensamento único.

Como através do mercado não há solução para o problema, ao contrário, ele só joga a favor da concentração da propriedade dos meios, resta a saída única da presença do Estado, regulando a comunicação para ampliar a liberdade de expressão.

A consciência dessa necessidade por camadas cada vez mais amplas da população é, sem dúvida, um dos maiores legados da Copa das Copas.




A Internacional do Capital Financeiro


Tarso Genro (*) no site do Carta Maior

  

A revista Forbes publicou em maio deste ano que 5% do PIB brasileiro está nas mãos de quinze ilustres famílias, que detém um patrimônio de 269 bilhões de reais. Thomas Piketty, autor do "O Capital no Século 21" - mencionado por Paul Krugman como provavelmente o mais importante livro de economia desta década - é autor de uma frase de uma obviedade alarmante nos dias que correm, mas que passa ter valor especial porque é formulada, não por um inimigo do capitalismo, mas por um insatisfeito com os seus rumos atuais: "os poucos que estão no topo  - diz Thomas - tendem a apropriar-se de uma grande parcela da riqueza nacional, à custa da classe média baixa" e que "isso já aconteceu no passado e pode voltar a acontecer no futuro".

O remédio apontado pelo autor, um imposto global progressivo, vai precisamente contra a tendência autorizada pelas grandes agências financeiras, públicas e privadas, de importância no mundo, como se vê nas medidas em andamento nos países da União Europeia, que pretendem recuperar suas combalidas economias. Estudo recente, publicado pelo "El País" (22 jun. 2014), mostra 10% de queda nos gastos de alimentação da população espanhola no ano de 2013, o que atinge diretamente o consumo básico dos assalariados, aposentados e desempregados, que vivem da parca ajuda estatal.

No âmbito da crise, os índices de pobreza, já alarmantes, aumentaram gravemente  nos Estados Unidos, pois hoje já afetam 46 milhões de norte-americanos, maior cifra dos últimos 50 anos, que deve ser combinada com o aumento da renda dos 1% mais ricos, em 9%, nos últimos 35 anos. ("Página 12", 23 jun.14, baseado em estudos do professor Abraham Lowenthal, emérito da Universidade do Sul da Califórnia). Os Estados Unidos, como se sabe, superam a União Europeia em desigualdade, pois nesta a maior concentração de renda está com 10% da população e nos EUA a maior concentração de renda, em termos relativos, está com 1% da população.

Cabe um comparativo latino-americano, para verificarmos como os diferentes países colocados na cena mundial globalizada, reagem perante os dissabores da atual crise do capital. Recentemente os nossos "especialistas" em desastres econômicos - sempre atentos aos interesses especulativos e manipulações políticas no mercado de ações -passaram a mostrar a genialidade da direita mexicana para lidar com o baixo crescimento e a pobreza. Quando se depararam com as estatísticas - a partir de 2003 a economia brasileira cresceu 45,44% e a economia mexicana, no mesmo período, cresceu 30,471% - o México desapareceu das suas colunas proféticas. Mormente porque ficaria chato revelar que a participação dos salários na renda nacional, no Brasil é de 45% e no México é de 29%.  Ou seja, o Brasil cresceu muito mais com menos desigualdade.

Esse rápido repasse na crise do capitalismo, presidido pela agenda neoliberal, serve para ilustrar a guerra de interpretações travada no meio intelectual, pelas redes e pelos órgãos de imprensa tradicional, entre as lideranças das mais diversas posições do espectro político. De um lado, estão os que entendem que a crise ocorre  porque todas as "reformas", necessárias para o reinado completo do capital financeiro sobre a vida pública e sobre os estados (capturados pelas agências que  especulam com a dívida pública, para acumular sem trabalho) aquelas reformas, repito, não foram feitas pelos governos. Por isso, as baixas taxas de crescimento, o aumento da pobreza e do desemprego.

Num outro polo, os que, por diversos meios e com diversas gradações,  sustentam que a decomposição da socialdemocracia, em nome de um "ajuste" conservador e predatório dos direitos sociais  (com a renúncia de uma agenda socialista ou democrático-social verdadeira), significou a vitória dos valores dos que "estão no topo", como diz Piketty. E que a pretensão verdadeira daquela agenda é desapropriar os direitos sociais, que vem sendo conquistados desde o Século 19, para conformar uma sociedade dos mais aptos, dirigida pelos mais fortes e mais ricos, capazes de se servir das grandes transformações tecnológicas, distribuindo migalhas de sobrevivência para a maioria da população, tendo como intermediária uma pequena e rica classe média, apartada nos seus condomínios ou pequenos bairros com segurança privada.

A campanha contra o Governo brasileiro e contra o Estado brasileiro, desencadeada pelos órgãos de imprensa e partidos políticos vinculados à primeira posição, no mundo inteiro,  passava a imagem de um país degradado na sua vida pública, com autoridades incapazes de acolher um evento como a Copa do Mundo, incompetentes para dar segurança às autoridades de fora do país e ineptos para a realização da própria competição. Esta campanha, no entanto,  não foi um mero mau humor da direita mundial. Foi nitidamente uma orquestração política de caráter estratégico  para desmoralizar um BRIC que, com seus avanços e recuos, com as suas vacilações e posições ousadas, já tinha demonstrado que é possível crescer, distribuir renda, cuidar da vida dos mais pobres e excluídos e, ainda,  exercer um papel político no cenário internacional,  com certa margem de autodeterminação e soberania, criticando o neoliberalismo com as "costas quentes". À esquerda ultra-radical isso parece pouco, mas,  examinada a situação internacional e a própria fragilidade interna das bases políticas para desenvolver estas ações de resistência, convenhamos que é um feito extraordinária que nenhum governo, pelo mundo afora, conseguiu realizar com tal amplitude.

O mais grave é que os veículos de comunicação tradicionais do país, não só repassaram este pânico desmoralizante da nação e das suas instituições, como alimentaram com falsas informações os veículos externos. Trabalharam diretamente contra o Brasil, embora já ensaiem uma autocrítica oportunista, Não se tratou de mero equívoco, mas de parceria política, porque, para estes grupos, nunca se coloca como real a disjuntiva "Soberania X Dependência", ou "Estado Social x Estado Mínimo", ou "Cooperação Interdepende x Subordinação Dependente", ou mesmo "Democracia x Autoritarismo". Porque soberania, estado social, cooperação sem submissão, sempre apontam para mais democracia (não menos democracia), para mais participação das pessoas na política e na renda (não menos participação)  e as receitas europeias para resolver as crises são incompatíveis com tais conquistas da modernidade.

O traço material desta aliança e da campanha contra o Brasil é o interesse em ganhar dinheiro com a dívida pública, gerando instabilidade e desconfiança nos governos ou submetendo as nações a governos dóceis e à agenda da redução das funções públicas do Estado. A ideologia da aliança é o liberalismo econômico, ora ornamentado com traços de fascismo e intolerância, ora casado com a austeridade fiscal. Ela tanto pode arrastar as classes médias para os protestos, como atiçar o "lúmpen" para fazer quebradeiras de bens públicos e privados -principalmente bens públicos - assim esvaziando os movimento sociais e políticos de esquerda, que estão insatisfeitos, com justiça, com os limites que já bloqueiam o crescimento econômico e impedem  a melhoria da qualidade do serviços públicos nas áreas da saúde, transporte e segurança, principalmente nas grandes regiões metropolitanas. A repressão, então, por este mecanismo perverso de isolamento dos lutadores sociais, aparece legitimada para a maioria da sociedade, que não se identifica com a violência gratuita à margem da lei, aceitando uma violência do Estado, que julga "necessária", mesmo que muitas vezes também à margem da lei.

Arrisco dizer que, diferentemente das crises clássicas do capitalismo - como na crise de 29 e  na crise "do petróleo" nos anos 70 - a crise atual se diferencia, enquanto crise política conjugada com a crise econômica,  por encontrar o capital com um grau organização mais complexo e sofisticado, sem aparência imediata, mas mais capaz de interferir rapidamente sobre os Estados, sem guerras extensivas e ocupações militares em todos os territórios de domínio. De um lado, há uma verdadeira "Internacional do Capital Financeiro", com seus tentáculos internos na mídia e nos partidos tradicionais  -que já avança sobre os não tradicionais através do financiamento privado das campanhas eleitorais-  e, de outro, há uma visível fragmentação na estrutura material e espiritual das classes populares,  com a correspondente fragmentação dos seus movimentos e partidos.

Os bancos centrais dos países ricos, as agências privadas de risco, as instituições financeiras destinadas a especulação, juntamente com as grandes cadeias de comunicação globais, são organizados diretamente pelo dinheiro e apoiadas na reprodução ficta do dinheiro, com um manto ideológico e político que  carece de coerência programática, mas que se amplia no próprio movimento do dinheiro, como acumulação artificial incessante. Esta vai aparelhando e submetendo instituições, grupos e indivíduos, em todas as esferas da vida pública, assim tornando os próprios partidos liberais e neoliberais supérfluos, como inteligência política, constituindo-os como mera extensão e reprodução daquele movimento do dinheiro, promovendo a irrelevância das suas construções programáticas.

O surgimento de partidos de extrema direita e de caráter fascista em toda a Europa, com base de massas, também é uma agonia da política burguesa democrática em seu sentido clássico e, em termos humanos, imprime nestes  partidos o mesmo conteúdo ideológico de barbárie que move as atuais guerras de conquista territorial pelas fontes de energia fóssil: ambos os processos são inspiradas pelo espírito patriótico, ambos dependem de aplicação de doses maciças de violência para serem vitoriosos, ambos respaldam o poder dos mais fortes e mais decididos a dominar e vencer, ambos não tem a aniquilação da vida do outro como limite moral do seu projeto de poder.

Ao tentar desmoralizar o Brasil, sem qualquer rubor e apostando que a Copa fosse um festival de incompetência e violência generalizada, a direta conservadora e antidemocrática do país - associada material e ideologicamente ao capital financeiro e sua estrutura de poder internacional - mostrou mais uma vez que não conhece o Brasil. Nem o que tem de bom, produtivo e organizado, no Estado brasileiro. Não conhece o seu povo, porque não convive com as suas lutas nem compreende a sua linguagem, como demonstraram quando quiseram impedir o Prouni e o Bolsa-Família, por exemplo. Não conhecem o Estado Brasileiro, porque prestam atenção somente nas suas imperfeições e mazelas históricas, com os olhos de quem quer destruir o que ele tem de público para construir uma nação soberana, pautada pela Justiça e pela Liberdade.


(*) Governador do Estado do Rio Grande do Sul




Mídia, política e poder do voto

Por Luis Nassif, no Jornal GGN: transcrito do Blog do Miro


Historicamente políticos e jornais sempre disputaram quem era mais autorizado a falar pela opinião pública. É essa competição que explica os conflitos reiterados entre ambos.

Ambos têm interesses próprios – legítimos ou ilegítimos – e lutam com garras e dentes para preservá-los. Ambos dependem de financiadores privados; ambos disputam recursos públicos.

Mas existem diferenças.

Os grupos de mídia buscam o público escolarizado, bancarizado e consumidor, que garante os patrocínios comerciais – porque consumidores – e a influência política – porque abarcando setores influentes da sociedade.

Já para os políticos, cada cidadão é um voto. Portanto, seu público é universal, distribuído por todos os cantos do país.

*****

Tem mais.

A governança de grupos de mídia é autocrática, anacrônica, pré-mercado de capitais.

As grandes sociedades anônimas, embora sob comando de grupos de controle, são obrigadas a prestar contas de seus atos a acionistas minoritários, a autoridades reguladoras do mercado de capitais, do direito econômico. Independentemente do tamanho, os grupos de mídia são fundamentalmente familiares. O processo de decisão é solitário, monárquico.

No Congresso, a governança é negociada. São deputados de todas as partes do país, precisando prestar contas aos seus eleitores (em alguns casos, aos seus financiadores), mas tendo de convencer seus pares. Mesmo os lobistas têm que legitimar publicamente seus argumentos.

*****

No parlamento prevalece a democracia (cada voto um voto) e a ampla discussão; nos grupos de mídia, as decisões individuais e o cuidado de não chocar os leitores – o que os torna agentes do status quo.

Esta semana, o presidente da Câmara Federal, deputado Henrique Alves, ocupou rede nacional para uma prestação de contas. Mereceu notas pequenas nos jornais.

No balanço do ano, Alves divulgou as seguintes votações que representaram avanços civilizatórios importantes:

1. Criação do Plano Nacional de Educação, obrigando o governo federal a destinar 10% do orçamento para a área.

2. Votação do Marco Civil da Internet, assegurando a neutralidade da rede, dificultando a formação de novos monopólios, como existe hoje em dia na radiodifusão.

3. Prorrogação por quinze anos dos incentivos para a indústria de informática.

4. Aprovação das cotas raciais nos concursos para o serviço público.

5. Instituição do piso de R$ 1.014,00 para agentes comunitários de saúde e endemias.

6. Aprovação da Lei Menino Bernardo, para coibir violência doméstica contra crianças.

7. Votação de emenda constitucional que obriga a União, estados e Distrito Federal a garantir a presença de defensores públicos em todas as comarcas.

8. Aprovação do Código de Processo Civil.

Velha mídia perde a pose


Do site da CTB: transcrito do blog do Miro


O papel desempenhado pela velha mídia desde que o Brasil foi escolhido para sediar a Copa do Mundo em 2007 beira o ridículo de tão contrário à realização do megaevento no país, colocando em dúvida a capacidade dos brasileiros em organizar eventos de grande porte e jogando sempre no time do quanto pior melhor, parecendo torcer para dar tudo errado, inclusive para a seleção brasileira perder. Mas o tempo colocou tudo no seu devido lugar.

Não é a primeira vez que os fatos derrotam manipulação efetuada pela mídia tradicional. Em 1984 na campanha Diretas Já, a Globo só passou a noticiar a mobilização popular contra a ditadura quando ficou impossível ignorar o fato e os dias da ditadura estavam contados. No ano passado, a mídia começou a atacar as manifestações de junho, depois tentaram a cooptação e mudaram de posição apoiando, depois retornaram à criminalização.

Em relação à Copa, os ataques passaram a ser sistemáticos. Da construção dos estádios à reforma aos aeroportos, tudo era negativo. A reacionária revista Veja, da família Civita, chegou a estampar na capa de 25 de maio de 2013 que os estádios ficariam prontos somente em 2038. Já na edição de quarta-feira (25) estampou: “Só alegria até agora”. Chamada que traiu o desejo claro dos editores em que aconteça alguma desgraça em prejuízo do Brasil.

Diariamente os jornalões e os telejornais apontavam os problemas, os atrasos nas construções e a falta de estrutura e de preparo do país para organizar um evento desse porte. Até uma semana antes da abertura da Copa no dia 12, só noticiavam desgraças e pouco falavam inclusive da seleção.

“A imprensa brasileira já vinha fazendo lentamente o caminho de volta para a realidade ao reconhecer que a Copa do Mundo no Brasil é, até aqui, um grande sucesso e uma ampla coleção de recordes. Até a revista Veja, que há alguns anos abandonou o jornalismo, já ensaiou o processo de transição do pessimismo para a celebração, caso os fatos continuem a desafiar suas próprias previsões”, acentua Luciano Martins Costa no Observatório da Imprensa.

Luciano refere-se ao “mea culpa” feito nesta quinta-feira (26) pelo Jornal Nacional, da Globo, última a assumir o sucesso da Copa no Brasil. Mais uma vez na história a mídia comercial se viu obrigada a se render, inclusive aos apelos comerciais do evento, mas principalmente porque estava ficando muito estranho os posicionamentos midiáticos sobre o país. Como justificar a torcida contra a seleção brasileira?

“A Globo não diz quem alimentou o pessimismo e o noticiário negativo sobre o Brasil nos dias que antecederam o início da Copa do Mundo. De repente, ninguém sabe, ninguém viu quem estimulou o espírito de porco e quem animou o complexo de inferioridade a se manifestar”, questiona o jornalista Luciano.

“Com a chegada da Copa, cerca de 19 mil profissionais de mídia de diversos países do mundo desembarcaram no Brasil. Por si só, esse número já mostra o fracasso da imprensa tradicional brasileira”, revela Helena Sthephanowitz. Segundo ela, “quase ninguém quis comprar suas reportagens e matérias por falta de confiança na narrativa. Todos quiseram ver com seus próprios olhos, fazendo suas próprias reportagens, tanto esportivas como sobre outros acontecimentos”.

O que a mídia comercial não previu era que 3,6 bilhões de pessoas estariam ligados na Copa do Mundo de 2014. Sendo cerca de 600 mil turistas estrangeiros somente no Brasil. A velha mídia perde a pose, mas não a cara-de-pau.

QUEM JÁ PERDEU A COPA

Transcrito do blog Democracia & Política



Por Paulo Moreira Leite, diretor da Sucursal da revista "ISTOÉ" em Brasília

QUEM JÁ PERDEU A COPA


"Fantasmas do antiCopa eram tão grotescos que a maioria dos brasileiros encara encontro com a realidade com alegria

O Brasil não ficou melhor nem pior com o Mundial.

Mas, acima de tudo, a Copa de 2014 está sendo, para os brasileiros, uma experiência cultural confortadora. Não vamos ser completamente ingênuos. A partir da versão de que era preciso aguardar desastres inevitáveis e inúmeras provas de incompetência durante o Mundial, o "Imagine na Copa" e o AntiCopa só tentavam nos convencer de que um grande fracasso se aproximava. Deu errado.

A crítica foi tão exagerada, tão desmedida, que a realidade mostrou-se muito melhor do que se queria imaginar. O choque foi muito grande. Equivale a acordar de um pesadelo.

Num tempo de realidades globalizadas, o Mundial permitiu aos brasileiros conhecer o novo lugar do país entre as nações do mundo. E eles estão gostando daquilo que podem enxergar.

Por muito tempo, fomos ensinados a só gostar daquilo que se via lá fora. Nem futebol tinha importância porque “só” era popular no Brasil e outros países parecidos, pobres, pretos, periféricos...

Hoje, o país sedia um campeonato que mobiliza uma plateia que formará uma audiência somada de 20 bilhões de pessoas no mundo inteiro, ao longo de todas as partidas. Até os norte-americanos querem feriado para assistir a Copa.

É isso: o Mundial mostra aos brasileiros que eles têm motivos para gostar de seu país. Talvez ajude a diminuir, um pouquinho, quem sabe, nosso complexo de vira-lata.

Era isso, claro, que se temia e se queria impedir.

Quando a Copa chega às oitavas-de-final, e 75% das partidas foram disputadas, com recorde de gols marcados em mais de meio século, a única dúvida sobre o Mundial envolve aquela angústia maravilhosa que vai nos acompanhar até o apito final, em 13 de julho, no Maracanã: qual seleção será campeã?

É bom que seja assim.

Estamos falando de futebol, não de política. Quem não soube distinguir as proximidades e distâncias desses universos, perdeu a Copa na partida inaugural, aquela do VTNC, e foi eliminado sem nenhum ponto ganho.

Os brasileiros aproveitam cada instante para festejar e celebrar o Mundial e as alegrias que proporciona. Cantam, bebem, se esborracham. Dispensando intermediários de imensa desfaçatez e inacreditável ganância, namoram à vontade e beijam com gosto. Adoram feriados. Aplaudem a beleza dos estádios, mais confortáveis e seguros do que jamais visto no país. Aproveitam aeroportos, onde atrasos e cancelamentos de voos estão num padrão aceitável para a ocasião.

Pode-se encontrar até taxistas que falam bem da Copa, o que vai contra o código de ética de uma categoria habituada a reclamar de tudo.

Concordo com quem reclama do preço dos ingressos, que são altíssimos para um país de renda como o nosso. A queixa é certíssima. Sempre será possível pedir preços mais em conta, mas é razoável lembrar que não se pode querer um espetáculo milionário, com fortunas para suas estrelas, de tamanho global, com preço de quermesse junina. Um ingresso para um jogo da Copa nunca vai custar barato.

O futebol tornou-se uma parcela dos investimentos de marketing de grandes empresas globais, que moldam o capitalismo no mundo inteiro.

Mesmo assim, e isso tem um divertido aspecto surrealista, não custa lembrar quem foram os campeões do “antiCopa”, os influentes, aqueles que contam, que colocaram a coisa no debate: grandes campeões da iniciativa privada, porta-vozes das causas mais reacionárias. Não custa lembrar que, em 14 de janeiro, você podia ler o seguinte apelo nas páginas de dois dos mais tradicionais jornais do país:

A maior Copa de todos os tempos na frase de Dilma, é a Copa mais cara da história. A festa macabra da Fifa, bancada com dinheiro público, simboliza a inigualável soberba do lulismo. Que as pessoas voltem às ruas desde a hora do apito inicial e, no entorno das arenas bilionárias, até a cerimônia de encerramento, exponham ao mundo a desfaçatez dessa aliança profana entre os donos do negócio do futebol e os gerentes dos "negócios do Brasil". Que a polícia trate com urbanidade os manifestantes - e com a dureza da lei os vândalos mascarados.

Não há nada de errado em criticar investimentos da Copa. Ninguém é obrigado a achar que um país deve sediar um campeonato mundial de futebol. Na época devida, 2007, eu também me perguntei: por quê? Para quê?

Depois da crise de 2008, a Copa revelou-se uma ideia mais útil do que parecia. Ajudou a economia a crescer – 0,5% do PIB anual – e a criar empregos. O debate mudou: se é verdade que hoje o país cresce menos do que se gostaria, a média de crescimento seria ainda pior sem a Copa.

No debate político de fundo, que se prolongará até as urnas de 2014, investir na Copa foi uma forma de evitar a recessão e rejeitar a austeridade que derrubou a maioria dos países da Europa. Simplificando: Neymar, Messi & os outros ajudaram as ideias de John Maynard Keynes -- economista que ensinou o capitalismo a criar empregos e crescimento com apoio do Estado -- a entrar em campo.

Será por isso que o AntiCopa ganhou tanta força? Difícil negar, ainda que se tratava, vamos combinar, de uma ideia que já nasceu condenada a morte.

Baseava-se no desprezo por um sentimento profundo do povo, que é o gosto pelo futebol, que ajudou os brasileiros a construir sua nacionalidade, em particular depois da Copa de 1958, onde se cantava que “com o brasileiro não há quem possa.” (E nós sabemos como a turma antiCopa, que desembarcou aqui de caravelas, considera o nacionalismo verde-amarelo um atraso, um “populismo”). A única forma de assegurar alguma vitalidade ao ambiente antiCopa era produzir informações parciais e manipuladas, o que implicava em esconder dados reais sobre os estádios, sobre investimentos em educação, aeroportos e até sobre a isenção fiscal combinada com a FIFA.

Não vamos falar do tratamento generoso que todas as manifestações –anarquistas, stalinistas, tucanas, liberais e fascistas – receberam nos últimos meses. Até vídeos em inglês, com legendas em português!, foram recebidos com simpatia e calor.

E me diga quantas vezes você pode ler manifestações a favor da Copa. Estou falando, e este é um exemplo, do jornal do "Sindicato dos Metalúrgicos de Santo André e Mauá" onde se diz o seguinte: “Não seremos contaminados pelo pessimismo dessa elite que apodrece a olhos vistos, porque nossa alegria de ser brasileiro é imbatível.” O texto lembra que "não desanimávamos quando éramos submetidos a uma inflação de mais de mil por cento por ano, quando o Brasil era governado pelos militares para concluir que nossa vida é só alegria. E trabalho, muito trabalho.”  Na semana passada, o mesmo boletim do sindicato dizia na manchete: “Mostramos nossa alegria e capacidade de trabalho para o resto do mundo.” Detalhe: o sindicato é ligado a Força Sindical, aquela central que promete apoio à oposição.

Na "Folha" de sábado, 28 de junho, Ruy Castro fala do tempo em que “Não ia ter Copa”. Chama manifestantes que tentavam impedir a Copa de “desajustados mentais” e reconhece:

Nós, da mídia, fomos essenciais para esse pessimismo, denunciando a Fifa como Estado invasor, o fracasso na preparação da infraestrutura exigida para receber os visitantes e a diferença entre o custo estimado dos estádios e o custo real -- embora não me lembre de nenhuma reportagem dizendo para onde foi o dinheiro. O ‘ Imagina na Copa!', que começou como uma brincadeira, tornou-se a sentença para a nossa inabalável vocação para o subdesenvolvimento.”

Pois é, meus amigos."

FONTE: escrito por Paulo Moreira Leite, diretor da Sucursal da revista "ISTOÉ" em Brasília. É autor de "A Outra História do Mensalão". Foi correspondente em Paris e Washington e ocupou postos de direção na VEJA e na Época. Também escreveu "A Mulher que Era o General da Casa"  (http://www.istoe.com.br/colunas-e-blogs/colunista/48_PAULO+MOREIRA+LEITE).

sábado, 28 de junho de 2014

O QUE DEU CERTO E O QUE DEU ERRADO EM CADA CIDADE DA COPA

Transcrito do Blog Democracia & Política



Balanço da primeira fase!

O que deu certo e errado em cada sede da Copa

Do "LANCE!NET"

De Manaus ao Rio Grande do Sul, "L!Net" mostra análise sobre cada cidade neste Mundial

A primeira fase acabou e todas as sedes já receberam jogos importantes. E uma pergunta fica no ar: será que todas foram aprovadas em todos os quesitos do chamado "padrão Fifa"? 

Segurança, mobilidade urbana, qualidade da comida e funcionamento dos estádios, esses são os quesitos adotados pelo "LANCE!Net" para identificar problemas e fazer elogios [e críticas] à cada sede. De Manaus ao Rio Grande do Sul, "L!Net" mostra análise sobre cada cidade neste Mundial.

Nossos enviados especiais às sedes da Copa do Mundo fizeram um balanço sobre cada sede e você confere abaixo:

Rio de Janeiro - Igor Siqueira

Segurança: O problema de segurança foi mais chamativo no Maracanã do que nas ruas do Rio, que estão, principalmente na Zona Sul, muito mais patrulhadas. As seguidas invasões de argentinos e chilenos - a segunda, com direito a depredação do Centro de Imprensa do Maracanã - foram as principais dores de cabeça do COL e das autoridades de segurança pública.

Mobilidade urbana: O metrô teve alguns problemas, principalmente quando coincidiu o horário de saída dos trabalhadores do Centro da cidade com a vinda de torcedores ao Maracanã. Por isso, a medida para diminuir o impacto foi decretar feriado em dias de jogos no Rio.

Comida no estádio: Não chegou a faltar, mas teve boteco fazendo melhor. Pelo menos, não teve nada estragado.

Funcionamento do estádio: O Maracanã não teve problemas de escoamento de torcedores, quedas de luz ou algo do gênero. Como estava muito bem testado desde 2013, deu poucos problemas à organização no sentido estrutural.

Conclusão de obras pela cidade: O Rio é um canteiro de obras, ainda mais porque será a sede olímpica em 2016. Sobre o aeroporto, o anunciado caos aéreo parece que vai esperar outro megaevento para aparecer.

Análise da cidade

"O Rio de Janeiro já tem uma atratividade natural para os turistas e, com a Copa do Mundo, o crescimento foi elevado à décima potência. O Rio ferveu. Brasileiros, argentinos, chilenos e representantes de outros países espalharam a festa pelos principais pontos da cidade".

São Paulo - Bruno Andrade

Segurança: A Polícia Militar tem trabalhado com 1.800 policiais nos dias de jogos. A segurança do entorno da Arena Corinthians tem sido positiva. Apesar de o estádio ser aberto, o efetivo policial tem trabalhado duro para evitar invasões e tumultos.

Mobilidade urbana: Metrô e trem têm funcionado bem e recebido elogios dos torcedores. A CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) fechou diversas ruas próximas ao estádio. Isso para evitar a entrada de carros e, principalmente, priorizar o transporte público.

Comida no estádio: A Arena Corinthians sofreu na abertura (Brasil x Croácia). O sistema de venda das lanchonetes caiu e várias filas foram formadas, o que irritou os torcedores. O problema foi resolvido nos jogos seguintes.

Funcionamento do estádio: Não houve reclamações na organização de entrada e saída de torcedores. A internet tem funcionado bem até agora. A limpeza do estádio é feita logo ao término das partidas. O grande problema é o gramado, que tem sido alvo de críticas de vários jogadores e treinadores.

Conclusão de obras pela cidade: As obras nos aeroportos (Cumbica e Congonhas) foram finalizadas e, até agora, nenhum problema foi registrado. Boa parte das obras no entorno do estádio também foi finalizada (pontes e novas entradas). As poucas obras que seguem não têm atrapalhado.

Belo Horizonte - Rodrigo Vessoni

Segurança: Não houve maiores problemas no entorno do Mineirão e nem dentro dele. Uma briga entre argentinos e brasileiros na Savassi e um protesto de poucas pessoas no dia da abertura foram os únicos problemas de segurança a destacar.

Mobilidade urbana: Torcedores que foram de carro (táxi ou próprio) sofreram um pouco com o trânsito, mas não tiveram grandes transtornos para chegar ao Mineirão. Todos chegaram sem gastar muito tempo até aonde era permitido, ou seja, até ao início do perímetro Fifa.

Comida no estádio: Houve falta de comida e filas enormes no primeiro jogo. Na sequência, resolveram a escassez de alimento, mas as filas nos períodos de pico (antes do jogo e no intervalo) permaneceram. Mas sem grandes tumultos.

Funcionamento do estádio: Mineirão já tinha sido bastante testado, inclusive, com uma final de Copa Libertadores. Não houve grandes transtornos, não.

Conclusão de obras pela cidade: Não houve conclusão de algumas obras, que seguem em andamento.

Análise da cidade

"De uma maneira geral, Belo Horizonte foi uma ótima sede de Copa do Mundo. Houve problemas, mas nada que fosse um obstáculo intransponível aos mineiros e aos turistas, que vieram em milhares até a capital mineira".

Curitiba - Rodrigo Cerqueira

Segurança: Curitiba colocou um efetivo de segurança forte nas ruas. As forças de segurança pública estavam presentes nos principais locais da cidade, e contavam com a ajuda do Exército. Em várias operações, como a chegada de alguma delegação e dias de jogos, até o uso de helicópteros estava previsto.

Mobilidade urbana: Curitiba tem um sistema de transporte considerado modelo, o BRT articulado. A cidade é dividida em eixos, e coberta em grande parte por esses veículos. Com o perímetro da "Arena da Baixada" fechado em cerca de dois quilômetros, uma das opções era mesmo utilizar esse serviço e andar um pedaço até ao estádio.

Comida no estádio: Em alguns jogos, longas filas. Mas durante o intervalo dos jogos, quando a procura era maior, os torcedores conseguiam comprar alimentos e bebidas.

Funcionamento do estádio: Ainda com obras para serem realizadas, principalmente na parte de acabamento, a Arena da Baixada chegou a ser um dos três estádios que melhor foram avaliados pelo público na primeira rodada. Porém, poeira, escadas e corredores ainda inacabados, setor de imprensa impovisado - já que o prédio que seria destinado para os jornalistas não ficou pronto, foram alguns dos problemas.

Conclusão de obras pela cidade: A principal delas foi a ampliação da Avenida das Torres, importante via que liga o aeroporto Afonso Pena ao Centro da cidade. Ficou pronta aos 45 minutos do segundo tempo, mas facilitou muito a chegada e a saída da cidade.

Análise da cidade

"Curitiba talvez tenha sido a sede mais fria, em todos os sentidos. Os turistas passavam poucos dias na cidade, porque, como os próprios curitibanos falam, lá é local de turismo de negócios, e cidades com mais atrativos naturais, como Rio de Janeiro e Salvador, por exemplo, teriam muito mais destaque".

Porto Alegre - Valdomiro Neto

Segurança: Porto Alegre talvez tenha passado pelo maior dos testes de fogo de todas as sedes com o jogo Argentina x Nigéria. Projeta-se que a cidade tenha recebido cerca de 90 mil pessoas (números da Brigada Militar do Estado). Diante disso, a sede saiu-se bem. Houve alguns incidentes pontuais, com tentativas de furto e roubo de ingressos e só. Dentro do estádio, os "stewards", funcionários de segurança da Fifa, tiveram muito trabalho com torcedores argelinos (jogo Argélia x Coreia do Sul) e alguns conflitos entre brasileiros e argentinos (jogo argentina x Nigéria).

Mobilidade urbana: Esse item foi melhorando com o transcorrer dos jogos. O Caminho do Gol, trajeto criado pela prefeitura para o Beira-Rio, ajudou bastante os torcedores que saiam do centro para o estádio. Porém, o trânsito ficou caótico nas duas horas anteriores e posteriores às partidas.

Comida no estádio: Em todos os jogos, alguns bares têm registrado falta de alimento durante o segundo tempo. Deixou a desejar.

Funcionamento do estádio: De maneira geral, as informações no estádio são claras e os voluntários trabalham de forma eficiente. Alguns mostraram graus elevado de estresse diante da grande demanda, até mesmo irritação. Porém, isso foi exceção.

Conclusão de obras pela cidade: Quando França x Honduras começou - primeiro jogo na cidade - ainda havia uma série de obras no entorno do estádio, com tratores e operários trabalhando intensamente. No jogo Argentina x Nigéria, o quarto no Beira-Rio, foi a primeira vez em que se viu as barreiras que delimitam o estacionamento de uma das laterais erguidas.

Análise da cidade

"Os porto-alegrenses entraram no clima da Copa. Além de bandeiras do Brasil pela cidade, em especial no centro, nos dias de jogos os estrangeiros eram tratados com bastante gentileza e receptividade. Alguns deles viravam atração turística, em especial holandeses e sul-coreanos que, com torcidas animadas, tiveram engajamento dos torcedores nas ruas".

Salvador - Leo Burlá

Segurança: A segurança na Fonte Nova não registrou grandes ocorrências. A grande parte dos casos teve a ver com a detenção de cambistas. No Pelourinho, ponto importante de convergência de torcedores, houve alguns casos de furto, que representaram 80% das queixas prestadas por torcedores.

Mobilidade urbana: Um dos pontos mais dramáticos de Salvador é o trânsito caótico da cidade. Em dias de jogo, no entanto, o problema é minimizado pelo bloqueio de algumas ruas e avenidas. O recém-inaugurado trecho do metrô auxiliou na chegada de torcedores, que também foi facilitada graças à localização central da Fonte Nova.

Comida no estádio: Houve as tradicionais filas nas lanchonetes, mas problemas com abastecimento foram sendo resolvidos jogo a jogo. O restaurante do Centro de Imprensa não suportou a demanda das duas primeiras partidas.

Funcionamento do estádio: A Fonte Nova passou pelo teste, já que não houve nenhuma ocorrência relevante no quesito segurança e o estádio recebeu três jogos envolvendo grandes seleções na fase inicial. O técnico Carlos Queiroz, do Irã, reclamou da qualidade do gramado.

Conclusão de obras pela cidade: Algumas obras na parte externa do aeroporto não foram concluídas, o que dá um aspecto ruim ao terminal. A operação, contudo, correu sem maiores problemas. A ampliação e reforma da área de embarque foi uma intervenção importante.

Análise da cidade

"Naturalmente festiva, a cidade de Salvador abraçou totalmente a Copa. A 'Fan Fest' da Barra recebe sempre um bom público, e estrangeiros são vistos aos montes nos principais pontos da capital. Um deficiência grande é a a qualidade dos serviços. Seja em hotéis, restaurantes ou até mesmo em táxis, o serviço prestado fica muito aquém do desejável. Sem dúvida, esse é um dos pontos mais falhos e que deve ser melhorado visando maior atração de turistas no futuro".

Fortaleza - Caio Carrieri

Segurança: Os poderes públicos lotaram as principais vias de Fortaleza com policiais. É comum haver até três PMs nas esquinas movimentadas da cidade, por onde circulam número grande de turistas. Por enquanto, houve apenas uma ocorrência de grande gravidade.

Mobilidade urbana: O "Veículo Leve Sobre Trilhos" era para ser o principal legado da Copa do Mundo. E passou longe disso. Com previsão de entrega para junho de 2013, está com as obras interrompidas e com apenas 50% do trabalho concluído. No entorno do estádio do Castelão, as obras de acesso foram concluídas às pressas e inauguradas inacabadas antes do primeiro jogo na capital cearense, Uruguai 1x3 Costa Rica, em 14 de junho.

Comida no estádio: Os torcedores no Castelão voltaram a enfrentar um problema que tem sido comum em vários estádios da Copa do Mundo: falta de comida nas lanchonetes. O dia mais problemático foi 19 de junho, data do empate sem gols entre Brasil e México. A cerca de três horas do início da partida, já abriram sem sanduíches. Outras tiveram seus estoques esgotados rapidamente.

Funcionamento do estádio: A imprensa enfrentou pequenos problemas no Castelão. No jogo entre Uruguai e Costa Rica, repórteres receberam ingressos de lugares inexistentes na tribuna de imprensa. Por ser um jogo de menor apelo do que o do Brasil, por exemplo, havia bancadas livres para as quais alguns jornalistas foram remanejados.

Conclusão de obras pela cidade: O Aeroporto Internacional Pinto Martins, em Fortaleza (CE) tenta esconder de quem passa pelo saguão principal a obra inacabada e paralisada de ampliação do seu terminal. Uma estrutura de concreto e ferro com aspecto de abandono está atrás de tapumes de madeira, posicionados em frente a um vidro que seria para dar visão do lado de fora. A área maquiada fica bem próxima aos guichês de check-in das principais companhias aéreas que operam no local.

Análise da cidade

"Assim como já tinha acontecido na Copa das Confederações, boa parte da cidade entrou no clima do Mundial e se relacionou super bem na maioria dos contatos com os estrangeiros e turistas de outros estados brasileiros. Em datas que não sejam as das partidas, quando o arredor do Castelão respira o jogo desde cedo, a Avenida Beira-Mar é onde há grande confraternização".

Manaus - Carlos Alberto Vieira

Segurança: Cinco mil policiais foram destacados e um forte esquema implantado no entorno do estádio e nas zonas de maior aglomeração, como 'Fan Fest', região do Teatro Amazonas e nas grandes ruas que contam com telões e estão enfeitadas (cerca de 100 mil pessoas ao todo). Como a cidade está muito animada com a festa e os "contra o Mundial" são muito poucos, a segurança teve trabalho apenas em direcionar os torcedores e evitar que os beberrões criassem caso.

Mobilidade urbana: Aqui a coisa não não funcionou. Com a rua do estádio (uma das principais vias da cidade) fechada seis horas antes do início dos jogos, a cidade parou. Vale usar como exemplo que seria algo como se a Marginal Tietê ou a Avenida Brasil fossem fechadas em São Paulo ou no Rio. Era um inferno chegar à Arena.

Comida no estádio: Nos dois primeiros jogos, falha total. Acabou antes do jogo começar na partida inaugural. No intervalo, no segundo jogo, se ajeitou.

Funcionamento do estádio: Quase perfeito. Banheiros limpos e limpeza em todas as instalações, voluntários muito prestativos, 'stewards' impecáveis, entrada e saída de público muito rápidas e eficazes, estádio limpo 2 horas após os jogos. Observei uma cadeira quebrada no terceiro jogo e dois dias depois, na véspera da quarta partida no estádio, ela estava consertada.

Conclusão de obras pela cidade: Muitas obras programadas nem começaram. Daquelas que foram iniciadas, somente o estacionamento do Aeroporto não foi entregue. Pelo tamanho do estacionamento, ficou uma primeira impressão bem feia para quem desembarcava no aeroporto e seguia para a cidade. Todos na cidade falam que ocorreu uma maquiagem nas áreas principais e próximas dos eventos e muitos pontos da periferia foram esquecidos. Mas, por onde passei, não vi nada comprometedor.

Análise da cidade

"Embora tenha ocorrido uma decepção por causa do pouco tempo que as seleções ficaram na cidade e uma certa irritação com as críticas ao calor, há um orgulho muito grande da população com o resultado final. Os muito elogios pela organização e a grande hospitalidade da cidade foram marcantes e são evidentes nas declarações dos torcedores e da imprensa internacional".

Recife - Vinicius Perazzini

Segurança: No primeiro jogo, entre Japão e Costa do Marfim, houve um fato grave. Duas horas antes da partida, vândalos deixaram dois pneus nos trilhos do metrô e colocaram fogo. Por sorte, nenhuma composição estava passando no momento. A explicação foi que a área do incidente é rural e não pode ser murada por ser passagem de animais silvestres.

Mobilidade urbana: Há BRT expresso e metrô para o estádio, que fica a 20 quilômetros da zona hoteleira de Recife. O sistema de transporte tem funcionado bem.

Comida no estádio: Faltou comida nas arquibancadas em Japão x Costa do Marfim e Croácia x México. A Fifa chegou a ser notificada. A alimentação dos trabalhadores também deixou a desejar. 320 kg de comida foram considerados como estragados e retidos pela defesa sanitária no dia do jogo Itália x Costa rica.

Funcionamento do estádio: Houve problemas na operação das máquinas de Raio-X no primeiro jogo, entre Japão x Costa do Marfim. Ocorreu atraso no credenciamento de 13 operadores. O resultado foram filas enormes para entrar. Logo no segundo jogo, o problema desapareceu.

Conclusão de obras pela cidade: A Via Mangue, estrada importante que passa por dentro da cidade, foi inaugurada às vésperas do primeiro jogo em Recife. O BRT expresso também foi aberto há uma semana do jogo inicial. E ainda há muitas estações que não estão prontas (e por consequência, fechadas).

Análise da cidade

"O clima da competição demorou um pouco a pegar. Só mesmo quando a bola rolou para Brasil x Croácia, no dia 12 de junho, é que as pessoas saíram de verde e amarelo pelas ruas. Muitos moradores de Recife ficaram na bronca por receber a seleção. Porém, agora a corrente é total pelo hexacampeonato".

Cuiabá - Textos enviados pelo jornal "Folha do Estado"

Segurança: “A Copa foi muito tranquila.” Esta é a avaliação do secretário-adjunto da Comissão Estadual de Segurança de Grandes Eventos de Mato Grosso, coronel Alexandre Rodrigues. Por outro lado, há grande preocupação quanto aos crimes praticados contra os turistas, como roubos e furtos. Em Cuiabá, foram realizados quatro jogos da Copa do Mundo até quarta-feira, e não houve nenhuma situação considerada “violenta” pela comissão.

Mobilidade urbana:
De 56 obras prometidas para Copa, o Governo entregou 19 obras (inacabadas, tráfego sem iluminação, revitalização, pintura etc), o VLT não ficou pronto e o governador Silval Barbosa, admitiu dívida de R$ 8 bilhões. Os turistas precisaram ir de ônibus, ou táxis. A frota urbana foi realocada para atender e priorizar o trechos entre aeroporto-Centro-Arena Pantanal.

Comida no estádio: Com toda a movimentação de mato-grossenses, brasileiros e estrangeiros que Cuiabá tem vivido desde o dia 12 de junho, quando começou a Copa do Mundo no Brasil, alguns bares da Praça Popular passaram a cobrar taxas de entrada dos clientes que vão até R$ 80,00, sendo que, antes do período excepcional, não cobravam nada.

Funcionamento do estádio: À exceção do último jogo, a entrada e saída dos torcedores na Arena Pantanal aconteceu de forma rápida e tranquila. No Primeiro jogo, torcedores soltaram fogos de artifícios na direção do campo de futebol, na vitória do Chile. Mas a revista foi reforçada no segundo jogo e nada mais foi encontrado.

Conclusão das obras: Os trabalhos nas obras de mobilidade urbana em Cuiabá que não foram entregues para a Copa do Mundo de 2014 continuam na capital. Para agosto, estão previstas a finalização de sete delas entre Cuiabá e Várzea Grande, conforme o último relatório do Tribunal de Contas do Estado. Os Centros Oficiais de Treinamento (COT), tanto o da Barra do Pari, em Várzea Grande, quanto o da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), na capital, que deveriam ter ficado prontos para o Mundial, visando o treinamento de seleções na capital, devem ser concluídos até o dia 31 de agosto.

Natal - Enviado por Itamar Ciríaco, da "Tribuna do Norte"

Segurança: Segundo balanço da Polícia Militar, houve redução de 60% do número de ocorrências. A cidade não teve manifestações relevantes (a última delas reuniu cerca de 50 pessoas). O clima foi de tranquilidade e muita festa entre turistas e as pessoas da cidade.

Mobilidade urbana: Graças às férias escolares, aos feriados e pontos facultativos no serviço público, Natal, que é uma cidade que possui muitos funcionários da área governamental, teve fluxo de tráfego normal. Algumas reclamações dos motoristas surgiram no momento de deslocamento das delegações, mas nenhum problema grave foi registrado.

Comida no estádio: Em Natal, fez falta a integração, ao cardápio, de uma comida típica local. Nos bares da Arena das Dunas, foi mais fácil ingerir bebidas (alcoólica ou não) do que consumir alimentos (filas).

Funcionamento do estádio: A Arena das Dunas funcionou de acordo com o planejado. Surgiram reclamações com relação as filas para os alimentos e, no jogo Japão x Grécia, seis torcedores não encontraram as cadeiras que haviam comprado. A FIFA justificou que teria deslocado os lugares para acomodar equipamentos da transmissão de TV. Esses torcedores foram reacomodados mas reclamaram da localização dos novos assentos. No entorno do estádio, na área de estacionamento, em alguns setores havia falta de local adequado para estacionar os veículos.

Conclusão de obras pela cidade: Cerca de 90% das obras de mobilidade foram entregues antes da Copa. Um viaduto estaiado, quatro túneis e uma passarela foram entregues na semana anterior ao início do Mundial, além do novo Aeroporto Internacional (Aluizio Alves). Uma obra de drenagem na área da Arena, um túnel e o terminal de passageiros do Porto de Natal não foram concluídos.

Análise da cidade

"O secretário de Obras Públicas e Infraestrutura, Tomaz Pereira Neto, reforçou os prazos para as obras em andamento, lembrando que a continuidade dos serviços depende do fim das chuvas. Segundo ele, serão entregues no próximo dia 10 as passarelas sobre a avenida Prudente de Morais e a rua Lima e Silva, o túnel da avenida Capitão Mor Gouveia, e o viaduto da BR-101; as obras de drenagem na Mor Gouveia serão entregues dia 30 de julho".

Brasília - Michel Castellar

Segurança: O plano operacional de segurança em Brasília funcionou perfeitamente. Nos quatro dias de jogos, foram destacados 3.488 policiais e nenhum grave incidente foi registrado. Os [poucos] protestos pacíficos também contribuíram para a situação de normalidade. Somente na abertura da Copa ocorrramu duas prisões de manifestantes que desacataram os policiais.

Mobilidade urbana: Outro ponto positivo de Brasília. As largas avenidas contribuem para o escoamento dos veículos. Além disso, a disponibilização de 40 ônibus para o transporte gratuito dos torcedores evitou que as ruas do entorno do Mané Garrincha vivessem um caos no trânsito.

Comida no estádio: Nos dois primeiros jogos, faltaram comida e bebida em algumas lanchonetes. Mas nada grave. O abastecimento foi regularizado posteriormente.

Funcionamento do estádio: A experiência de ter organizado mais de 40 eventos antes do início da Copa foi fundamental para o sucesso operacional do Mané Garrincha. O estádio só apresentou problemas no primeiro jogo ao computar longas filas por até 15 minutos após o início do confronto entre Equador e Suíça. O motivo foi algumas máquinas de raio-x que apresentaram problemas.

Conclusão de obras pela cidade: A cidade concluiu em parte todas as obras e as que ficaram por concluir não influenciaram na Copa. Faltam a construção de dois túneis que ligarão o Centro de Convenções Ulisses Guimarães ao Mané Garrincha, implantação das placas de energia solar no estádio, além da urbanização de seu entorno.

Análise da cidade

"Os brasilienses receberam de braços abertos e com festa todos os estrangeiros que passaram pela capital federal. Até mesmo a invasão colombiana ocorrida antes do confronto do país contra Costa do Marfim foi encarada com humor e festa. O aeroporto também não teve problemas. Não foram registradas filas ou longas esperas. O setor hoteleiro também festejou. A ocupação dos hotéis, em média, foi de 95% Na partida do Brasil chegou a 100%."

FONTE: do site "LANCE!NET", transcrito no portal da FAB  (http://www.fab.mil.br/notimp#n76537).

Análise: A Copa das Copas é da América do Sul

Pedro Silva Barros (*) no site Carta Maior


A copa do mundo voltou à América do Sul depois de 36 anos. Mais da metade de nós, sul-americanos, nunca havíamos visto um mundial em casa. Parte de nós não imaginava que participaríamos tanto do maior evento do principal esporte do planeta.

Chilenos, colombianos e argentinos se fizeram maioria nas arquibancadas de onde jogaram. Uruguaios e equatorianos contaram com o apoio indubitável dos brasileiros que encheram os estádios. Um fenômeno tão inédito como ignorado pelas análises feitas na onda dos protestos de junho do ano passado.

Os meios de comunicação jogaram sistematicamente contra a copa. Um exemplo entre muitos é o número 82 da revista venezuelana Clímax, que está nas bancas de Caracas com a capa “Brasil 2014: la gran estafa” e a chamada interna “Una fiesta para pocos. Brasil ha dado muestras de no estar preparado para fungir de buen anfitrión”.

A reportagem reproduz argumentos da revista brasileira Veja: os estádios foram caríssimos, a infraestrutura não vai funcionar, o mundial será uma vergonha para o Brasil e só foi feito para que se roubasse o erário público.

[Ver abaixo um dos arautos nacionais do #NãoVaiTerCopa e do fracasso da Copa no Brasil]

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A torcida sul-americana compareceu porque confiou em suas equipes e também porque estava segura de que nós os brasileiros organizaríamos uma grande copa. Desconsideraram a avalanche de críticas de que o torneio seria um fiasco. Para isso, além da paixão pelo futebol, contribuiu o fato de conhecermos muito bem a nossa imprensa, que é muito parecida em toda a região. Sabíamos que todo aquele quadro alarmista era falso.

No caso da mídia nativa, o quadro é de emulação. Está se superando em relação à cobertura das manifestações de junho do ano passado quando de crítica passou a apoiadora. Desta vez os grandes meios de comunicação nacional não só mudaram repentinamente de opinião como, em um ato de aparente desespero e explícito despudor, começaram a atribuir aos seus congêneres internacionais a responsabilidade pela uruca pré-copa. Não é de se estranhar que cada vez mais reproduzam argumentos do tipo: “Agora o mundo está vendo o equívoco de haver apostado contra o Brasil”. Lembrando Freud, a negativa histérica e veemente dos próprios atos, acompanhado do mecanismo de transferência da responsabilidade a terceiros é a patética assunção da culpa; o famoso batom na cueca! Até o Ronaldo se viu obrigado a mudar o discurso e retirar as críticas à organização do mundial.

Na copa, o Brasil exerceu o papel de liderança que nossos vizinhos esperam. Acertamos quando pensamos grande. Estamos fazendo uma copa para toda a América Latina. Tudo caminha para que seja reafirmada a escrita de que só os sul-americanos ganham as copas do lado de cá do Atlântico. Mas dessa vez a copa também está fazendo com que os sul-americanos nos conheçamos mais, muito mais. Esse convívio é a condição que nunca houve para a ampliação da integração da América do Sul.


A América do Sul em 1978 e em 2014

Nos últimos 50 anos a América do Sul organizou uma única copa, na Argentina em 1978. Ela me foi apresentada como um dos poucos consensos no futebol brasileiro: roubada, tudo armado, a Argentina comprou o Peru e ao Brasil coube o título de campeão moral, que nunca valeu nada. Refletia um momento de muita obscuridade no Cone Sul. Ditaduras na Argentina, Brasil, Chile, Uruguai, Paraguai, Bolívia... O regime militar argentino, assim como os outros, se legitimava também pelo discurso da ameaça externa. A pouca cooperação regional que existia se concentrava na repressão, em perseguir e matar a esquerda onde quer que ela estivesse.

O brasileiro, durante e depois daquela competição de 1978, não se sentiu mais sul-americano. O mesmo valeu para os próprios argentinos, para os peruanos e para os demais vizinhos que não participaram do torneio.

Se consolidou a versão que a Argentina era nossa rival, para além do futebol. Cresci ouvindo que os argentinos eram nossos maiores inimigos; a todos os nossos vizinhos o Brasil era apresentado como a grande ameaça.

No meio tempo, a copa de 1986 seria na Colômbia. A instabilidade interna e as exigências da FIFA fizeram o país desistir de organizar o torneio. Chegaram a oferecer a copa ao Brasil, que na época não a aceitou e ela foi acontecer no México. Até 2003, Argentina e Colômbia se apresentavam como possíveis candidatas, na definição; em 2006, toda a América do Sul já estava unida em torno candidatura do Brasil.

Hoje o momento é outro, completamente diferente dos anos setenta ou mesmo dos noventa. O Brasil e a América do Sul de 2014 estão construindo democracias cuja riqueza é, com muitas contradições, diminuir as desigualdades, garantir a diversidade e incluir massas que até há muito pouco tempo eram consideradas eternas excluídas. A cooperação regional agora tem objetivos muito mais nobres, o Mercosul cresce, a Unasul se consolida e recentemente foi criada a CELAC (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos). Todas essas novidades incomodam muito os que têm jogado contra a copa do Brasil.

A espetacular presença dos 100 mil argentinos em Porto Alegre, das dezenas de milhares de colombianos em Belo Horizonte, Brasília e Cuiabá, de chilenos também em Cuiabá, Rio e em São Paulo, dos equatorianos em Curitiba e dos uruguaios em Natal, além da grande quantidade de bandeiras da Venezuela em todos os estádios, particularmente em Manaus, criaram uma atmosfera inédita para a reconhecimento mútuo da região. Parte considerável visitou o Brasil pela primeira vez. A maioria quer voltar.

A copa está consolidando, coroando, o processo de afirmação da região que começou a ganhar corpo na virada século com a falência do Consenso de Washington e que foi impulsionada com a ascensão de governos populares em muitos dos nossos países. A América Latina e o Caribe são a única região do mundo em que as desigualdades diminuíram na última década.

Pela primeira vez na história a América do Sul tem desempenho melhor do que o europeu numa primeira fase de mundial. Nosso aproveitamento foi de 83% (5 classificados de um total de 6 participantes) contra 46% do velho continente (6 classificados de um total de 13 participantes). Em termos absolutos, se consideramos as seleções latino-americanas em seu conjunto (somando México e Costa Rica), classificamos 7 seleções (7 classificados em 9 participações, ou 78% de aproveitamento) contra as 6 europeias.

Não tenho dúvidas que o Paraguai, mesmo com a sua retranca, apresentaria um futebol melhor do que o da Grécia. Ou que a Venezuela, que nas eliminatórias ganhou da Argentina com Messi em Puerto La Cruz e da Colômbia com Falcao em Puerto Ordaz, seria uma estreante melhor do que a Bósnia. Aliás, o futebol está superando o beisebol, herança das petroleiras americanas do início do século, como principal esporte na Venezuela. A organização da copa América em 2007 com a construção de sete novos estádios foi decisiva para o movimento que levou as venezuelanas ao quarto lugar no mundial sub-17 feminino neste ano.

Em 2014, também pela primeira vez, a América do Sul jogou com 6 equipes. Não tivemos nenhuma decepção. Equador, o pior sul-americano, foi o melhor entre os eliminados na primeira fase. Saiu da copa ao empatar com um dos três melhores europeus jogando com um a menos por mais de quarenta minutos.

A copa é parte da consolidação da autoestima sul-americana. Nada mais simbólico do que o jogo entre Chile e Espanha no Maracanã. O Chile nunca havia derrotado sua antiga metrópole. Sete derrotas e um empate. Ganharam de 2 a 0. Os sul-americanos não temos jogado com a arrogância dos espanhóis contra a Holanda, tampouco com a ingenuidade da Costa do Marfim contra a Grécia. Temos feito no nosso jogo, e estamos ganhando.

Jogos em todo o país, até na Amazônia

A escolha de realizar partidas em cidades sem tradição futebolísticas foi uma das decisões mais criticadas e, ao mesmo tempo, mais acertadas da organização dessa copa. Fez que a copa fosse de todos os brasileiros, com jogos nas cinco regiões, garantiu que fosse uma copa sul-americana, por estar mais próximas dos vizinhos, e criou possibilidades para fortalecer nosso futebol e a integração regional.

Ao envolver todo o país estamos fazendo um mundial com a grandeza do Brasil. A decisão corajosa de sediar jogos em Manaus e em Cuiabá, além de quatro capitais nordestinas foi uma atitude consoante com nosso objetivo constitucional de diminuir as desigualdades regionais e compatível com várias outras ações de governo dos últimos anos, como a criação de dezenas de universidades, particularmente nas regiões mais pobres do país.

Os minimalistas defendiam um mundial enxuto, com jogos onde sempre há. São Paulo, Rio, Porto Alegre e Belo Horizonte. Talvez em Curitiba, Salvador e Recife também. Diziam que a falta de tradição futebolística e de dinâmica econômica em Fortaleza, Manaus, Natal e Cuiabá deixariam esses estádios vazios.

Desconsideraram que o Brasil está mudando e é muito maior do que o Centro-Sul.
Assisti a um único jogo do mundial. Havia comprado os ingressos antes mesmo do sorteio dos grupos. Optei pala primeira rodada em Manaus, a sede mais próxima da Venezuela. O sorteio apresentou um duelo entre dois ex-campeões, Itália e Inglaterra. Peguei o carro e fui com minha família a partir de Caracas. Muitos quilómetros de estrada. Fiquei aliviado ao ver a simplicidade do trâmite para passar com o carro na fronteira após o ingresso da Venezuela ao Mercosul. No hotel em Boa Vista, havia mais de trinta motoqueiros venezuelanos que faziam o mesmo trajeto. Na estrada, centena deles. Alguns ônibus também iam ao mesmo destino: a Arena da Amazônia.

O estádio mais questionado do mundial custou 500 ou 600 milhões de reais. Tudo funcionou: foi rápido para entrar, a visão do jogo da arquibancada era muito boa, a cerveja gelada, os banheiros limpos. Lotou nos quatro jogos da primeira fase, com um público total de 160 mil pessoas. Se o estádio fosse construído só para a copa, cada ingresso teria que custar quase R$ 4 mil para cobrir todo o custo. Não sei quanto os ingleses, italianos, portugueses, suíços, camaroneses, hondurenhos, norte-americanos e croatas que foram assistir os jogos de seus países gastaram nos dias que ficaram em Manaus, mas não deve ter sido menos do que esse valor.

A maioria do público, porém, era de brasileiros. Muitos de outras regiões do país, vários nunca conheceriam Manaus se não fosse a copa. Ninguém negaria a importância para o país de mais brasileiros conhecerem a Amazônia.

A exposição de Manaus ao mundo foi a maior da história; seu benefício para nós, difícil de calcular. Só nos EUA 25 milhões assistiram ao vivo a partida contra Portugal, mais do que a média das cinco partidas da final da NBA e dos seis jogos da final do beisebol do ano passado. Quanto custaria expor por duas horas para 25 milhões de estadunidenses a ideia subentendida de que a Amazônia tem dono e não são eles? E aos milhões de europeus que assistiram Itália contra Inglaterra?

No dia seguinte, o calor da cidade, que é o mesmo desde que ela foi criada, era o principal assunto nos sites de nossos jornais que não se cansaram de criticar os gastos com o estádio de Manaus. Nenhuma menção aos benefícios do evento para o país. Quando levei meus filhos ao Teatro Amazonas pensei sobre quantos, ao verem aquela construção, não faziam a pergunta simplista que os jornais não se cansaram de estimular sobre os estádios: não seria melhor ter construído um hospital ou uma escola? Minha resposta seria a mesma sobre a Arena da Amazônia.

Fracasso das previsões, sucesso de público e crítica

Os números satisfatórios e o entusiasmo com o mundial após o final da primeira fase são inquestionáveis. O fracasso das previsões também.

O banco Goldman Sachs, que por vias tortas acertou em cheio ao tecer o termo BRIC, parece ir no mesmo caminho agora. Se equivocaram em boa parte dos fundamentos em 2001, mas a agrupação BRIC, depois BRICS, tornou-se realidade anos depois. Em 2014, previu que os europeus dominariam a primeira fase, mas apontaram uma final sul-americana entre Brasil e Argentina. Apostaram que 11 dos 13 europeus passariam de fase, metade ficou pelo caminho. Erraram os oito cruzamentos das oitavas de final! Tirando Alemanha e Brasil, que foram à segunda fase em todas as copas desde que ela passou a ser realizada com grupos e oitavas em 1986, o banco acertou apenas 7 dos outros 14 times. Péssimo rendimento, considerando que 16 dos 32 classificariam.

Pode parecer temerário que as finanças do mundo sejam operadas por esses modelos. Esperamos que, outra vez, acertem no que ficará para a história. Que o Brasil campeão contra os hermanos seja tão real como a Cúpula que se reunirá em Fortaleza na semana depois da copa.

A revista americana ESPN FC indicava que a Argélia era o segundo com menos chances de classificar entre todos os países. Para o Goldman Sachs, a Costa Rica seria o time com menos chance de ser campeão e não haveria nenhum africano nas oitavas. É o que dá utilizar modelos em que os resultados do passado definiriam o presente. Diferente de Espanha, Inglaterra e Itália, Argélia, Costa Rica e Nigéria estão vivos e enfrentarão três dos poucos europeus que restaram.

Há alguns anos, poucos apontavam o sucesso de público que estamos tendo. As médias de pessoas presentes e de ocupação nos estádios são espetaculares. Superam todos os campeonatos nacionais do mundo. No campeonato brasileiro o público médio é de 15 mil (ocupação de 44%) e no italiano de 22 mil (51%). A copa das copas supera a ocupação e o público médio dos melhores campeonatos nacionais nesses quesitos, o alemão (45 mil, 93%) e o inglês (34 mil, 97%). A fabulosa taxa de ocupação de 98% garantirá um público médio final bastante superior aos 50 mil. A média de público só ficará atrás da copa dos EUA, que utilizou estádios de futebol americano. O púbico total deve igualar o recorde de 3,5 milhões.

Os alemães realizaram uma grande copa e com ela reestruturaram e melhoraram seu campeonato nacional. Nós podemos fazer o mesmo respeitando nossas especificidades e utilizando um dos nossos maiores ativos, as dimensões continentais e um mercado interno que cresceu extraordinariamente na última década. O problema não são os estádios caros, mas a gestão que vamos fazer deles. Por que não os times do Brasileirão mandarem cinco partidas por campeonato em estádios neutros, como os novos de Brasília, Manaus, Cuiabá, Fortaleza ou Natal, ou antigos que devem se modernizar em Belém ou Campo Grande.
A revista Veja um mês antes do início da copa era taxativa em seu site: “A seleção pode até ganhar, mas o Brasil já perdeu”. Hoje poderíamos dizer sem dúvidas: A seleção pode até perder, mas o Brasil já ganhou!


(*) Pedro Silva Barros é palmeirense, brasileiro, sul-americano. As opiniões expressas neste artigo são estritamente pessoais, não representando necessariamente a de nenhuma das instituições às quais o autor é vinculado.

sexta-feira, 27 de junho de 2014

Racismo e imigração na Copa do Brasil


Por David Goldblatt, no site da Adital: transcrito do blog do Miro


A constituição étnica dos 32 times da Copa do Mundo reflete as camadas sedimentares da migração global nos últimos 500 anos. A destruição das comunidades indígenas americanas levada a cabo pela colonização europeia nos dá três seleções de constituição quase completamente europeia: Chile, Argentina e México. A Austrália é a versão disso na Oceania.

Na maior parte das vezes, a conquista continental foi seguida pela importação massiva de trabalho escravo africano, o que explica a mistura afro-europeia de Brasil, Equador, Honduras, Costa Rica, Colômbia, Uruguai e EUA, muito embora na América os latinos constituam uma categoria à parte. Por todo o continente, o futebol é uma zona de mobilidade social para a juventude pobre e migrante. No caso do Equador, afroequatorianos constituem apenas 6% da população, mas são quase a totalidade do time.

A mesma lógica opera na Europa ocidental, onde os times vêm sendo formados por duas ondas mais recentes de movimentos migratórios. Durante as migrações que acompanham a descolonização e o longo boom do pós-guerra, a Inglaterra ganhou uma comunidade afrocaribenha, a Alemanha, os "trabalhadores convidados” (gastarbeiters) turcos, a França começou a absorver africanos francófonos, a Bélgica, os congoleses e a Holanda, os surinameses.

Em todos esses países, a mudança no visual das seleções nacionais tem servido tanto como emblema otimista para o sucesso da integração e como bode expiatório das acusações de falta de autenticidade: quem canta ou deixa de cantar o hino antes dos jogos tem se tornado critério de cidadania para muitos comentaristas da extrema direita.

Nas duas últimas décadas, novos fluxos de refugiados e imigrantes para a Europa têm deixado sua marca no futebol: a primeira estrela internacional incontestável do futebol italiano, Mario Balotelli; um lado suíço que tem quase dois terços de ascendência imigrante; jogadores com raízes afrogermânicas e afroespanholas. Em contraste, seleções de países mais a leste – Bósnia, Croácia, Rússia e Grécia – embora tenham suas próprias complexidades étnicas internas – são brancas.

Os times mais etnicamente homogêneos são Japão e Coreia do Sul, ambos com populações imigrantes pequenas. Nas arquibancadas, contudo, há bastante evidência de suas próprias comunidades emigradas – os nipo-brasileiros que partiram rumo às plantações de café de São Paulo no final do século 19 e os americanos de origem coreana. Essas comunidades da diáspora, que mantêm ligação afetiva e prática com seus países de origem, são melhor representadas pelo Irã e pela Argélia. O técnico Carlos Queiroz fez um chamado aos iranianos nascidos na Suécia, Holanda e Alemanha. Dezesseis membros da seleção argelina nasceram na França, mas optaram por jogar pelo país norte-africano.

Independentemente do que possam representar, jogadores profissionais são, eles mesmos, imigrantes batalhadores. São parte de um mercado de trabalho altamente qualificado e de altos salários, que também pode ser visto nos serviços financeiros e profissionais. Os quatro times da África ocidental – Camarões, Nigéria, Gana e Costa do Marfim – têm apenas seis jogadores em times locais, dentre os quais, quatro goleiros.

Cidadania é negociável. Croácia e Espanha adquiriram os brasileiros Eduardo e Diego Costa, respectivamente. Apenas os ingleses e os russos, sem histórico de sucesso na migração futebolística, jogam principalmente em casa, nas ricas ligas domésticas.

Se os campos da Copa do Mundo 2014 são um quadro vivo da diversidade e da complexidade étnica do mundo, o mesmo não pode ser dito tão claramente sobre as torcidas ou as comissões técnicas. O holandês Patrick Kluivert é um dos poucos rostos negros entre as comissões europeias. Nenhum time latino-americano tem um técnico de origem africana ou indígena. Gana e Nigéria optaram por técnicos locais, mas Camarões e Costa do Marfim têm europeus no comando.

A FIFA tem investigado pequenos incidentes envolvendo cantos racistas pelas torcidas argentina e mexicana e a presença de cartazes de extrema-direita, até mesmo fascistas, entre as torcidas croatas e russas. Mais significativamente, contudo, nenhum grupo nas arquibancadas compartilha a diversidade étnica de seus respectivos times. É difícil conduzir uma pesquisa demográfica a partir da cobertura televisiva altamente seletiva dos jogos no Brasil, mas a torcida anfitriã parecia incrivelmente branca e a gigantesca presença colombiana também. Suspeito que o mesmo possa ser dito dos europeus.

Obviamente, a mesma lógica que intersecta etnia e divisão de classe e que explica a super-representação de grupos minoritários no futebol profissional explica também sua relativa ausência no caríssimo turismo futebolístico e no olimpo gerencial do esporte.

Quando a poeira baixar sobre a Copa do Mundo, a FIFA – muito preocupada com o comportamento das torcidas em relação ao racismo – poderia voltar sua atenção aos mundos privados do racismo e viés institucionais e ao dilema mais amplo de tentar encenar um festival de universalismo a que apenas os ricos podem ir.

* David Goldblatté é autor do livroThe ball is round: a global history of football ("A bola é redonda: uma história global do futebol”). Tradução de Renata Gomes, professora universitária e participante da UniNômade Garoa.

Lucros gigantes dos bancos e o custo do crédito no Brasil




*José Álvaro de Lima Cardoso

     Recentemente o DIEESE divulgou análise do desempenho dos seis maiores bancos em atividade no Brasil em 2013. Os números impressionam. O total de ativos dos seis maiores bancos em atividade no país (Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Bradesco, Itaú Unibanco, Santander e HSBC) alcançou R$ 4,8 trilhões, equivalente ao PIB (Produto Interno Bruto, soma de todas as riquezas produzidas no país) do Brasil no ano passado. O patrimônio líquido das seis instituições mencionadas expandiu 8,5% em 12 meses, chegando a R$ 315 bilhões.
     No que se refere à oferta de crédito, os destaques foram a Caixa Econômica e o Banco do Brasil, que juntos, responderam, por 48,1% do total das operações de crédito realizadas nos seis maiores bancos no ano passado. Nos bancos privados nacionais (Bradesco e Itaú), houve um razoável crescimento do crédito, 12,3%, e nos privados estrangeiros (Santander e HSBC), a carteira de crédito também cresceu, mas bem menos (8,9%).
     Em termos de lucro líquido o destaque no ano ficou por conta do Itaú, R$ 15,8 bilhões, alta de 12,8% em relação ao ano anterior (num ano em que o PIB cresceu 2,3%). Este foi o maior lucro obtido por um banco na história do sistema financeiro nacional. O Banco do Brasil, obteve lucro quase tão elevado quanto o Itaú (R$ 15,7 bilhões), tendo apresentado o maior crescimento do lucro líquido, alta de 29,1% em relação ao ano anterior.
     A rentabilidade média sobre o patrimônio líquido nos seis bancos ficou em 18% e as receitas de prestação de serviços e cobrança de tarifas, continuaram crescendo em 2013, tendo atingido R$ 96,4 bilhões. Estas receitas, apesar de serem consideradas secundárias pelas instituições financeiras, superaram as despesas com pessoal (entre os seis maiores bancos), em 28%. Em alguns bancos privados esse tipo de receita supera largamente a despesa com pessoal. É o caso do Santander, onde a receita de prestação de serviços supera o gasto com pessoal em 47,4%, ou seja, este tipo de receita cobre o pagamento de pessoal e ainda sobram 47%.
     Apesar dos ótimos indicadores de lucratividade, nos últimos anos os bancos, especialmente os privados, têm reduzido o quadro de trabalhadores. Nas seis instituições analisadas no estudo do DIEESE, o número de postos de trabalho apresentou queda em 12 meses, passando de 477.345, em dezembro de 2012, para 470.034, em dezembro de 2013, com redução de 7.311 postos de trabalho. A redução no nível de emprego só não foi maior porque houve expressiva contratação na Caixa Econômica, com 5.272 novos empregados. Os demais bancos da amostra demitiram: Santander foi o que fechou o maior número de postos de trabalho (- 4.371); seguido pelo Bradesco (-2.896); Itaú Unibanco (-2.734); Banco do Brasil (-1.966) e HSBC (-616). Juntos, estas cinco instituições eliminaram 12.583 postos de trabalho em 2013.
     É difícil aceitar que os bancos demitam, levando em conta que ganham muito dinheiro com as taxas de juros estratosféricas praticadas no Brasil. A taxa Selic, que remunera os detentores de títulos públicos, como é o caso dos bancos, é uma das taxas de juros mais elevadas do mundo. Ademais, as taxas cobradas pelos bancos ao tomador final no Brasil equivalem, em regra, a cerca de dez vezes os juros praticados internacionalmente. Segundo estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), de 2009, a taxa real de juros para pessoa física (descontada a inflação) cobrada pelo HSBC no Brasil é de 63,42%, quando, ao mesmo tempo, equivale a 6,60% no mesmo banco para a mesma linha de crédito no Reino Uni­do, país de origem do banco. Para o Santander, as cifras correspondentes são 55,74% para o Brasil e 10,81% para a Espanha. No Citibank essa taxa é 60,84% no Brasil e 7,28% nos EUA. Nos juros cobrados para a pessoa jurídica, fundamental para a produção e para o custo de produção, o HSBC, por exemplo, cobra 40,36% no Brasil, e 7,86% no Reino Unido. Os grandes bancos brasileiros, mesmos os estatais, cobram também taxas absurdas. Segundo o citado estudo do Ipea, para empréstimos à pessoa física o custo do crédito no Brasil, em relação ao custo internacional, chega a ser quase 10 vezes mais elevado. Para empréstimos à pessoa jurídica, em decorrência da existência dos bancos públicos a diferença de custo é menor, mas, assim mesmo, é mais de 4 vezes maior para o brasileiro, segundo o Ipea.
     A taxa de juros média para as pessoas físicas no Brasil supera 100% ao ano, enquanto a inflação, está abaixo de 6%. No caso do juro médio cobrado sobre o cartão de crédito a taxa anual é de 232% no Brasil, enquanto nos EUA gira em torno dos 16,00% e de 18% no Reino Unido. Com esse custo do crédito claro que haverá uma pressão sobre o custo final dos produtos e serviços. Apesar disso, curiosamente, muitos economistas e formadores de opinião econômica defendem o aumento de juros como antídoto para o aumento da inflação (mesmo quando esta decorre de problemas climáticos, que reduzem a oferta de alguns hortifrutigranjeiros, como ocorreu recentemente).                       *Economista e supervisor técnico do DIEESE em Santa Catarina.