segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

Os aloprados no comando do Titanic Brasil

Por Luis Nassif, no Jornal GGN:

A economia mundial está sob influência dos seguintes fatores negativos, um desmanche em toda organização que vigorou no pós-guerra.

Peça 1 – desaceleração das economias

União Europeia

Nos últimos meses houve uma redução abrupta da oferta de crédito, com reflexos nas diversas economias. E uma obsessão por ajustes fiscais que derrubou as condições sociais estimulando partidos radicais em praticamente todos os países.

Alemanha – no final do ano passado mostrou os primeiros sinais de recessão, com queda brusca na produção industrial. A dívida alemã está sendo negociada com rendimentos negativos, sinal de que se aproxima uma deflação da economia. No segundo semestre de 2018 houve uma queda de 3,2% na produção industrial da Alemanha. Em dezembro, as encomendas caíram 7% em relação ao mesmo mês do ano anterior. A recessão começou com a indústria automobilística e já se espalhou para construção, produtos químicos e farmacêuticos.

Itália – A Comissão Europeia reviu o crescimento em 2019 para 0,2%. Além disso, o país corre o risco de uma nova crise da dívida, tendo que refinanciar 400 bilhões de euros em dívidas em 2019.

Inglaterra – presa às indefinições do Brexit, sem liderança e sem estratégia clara sobre as regras de saída. Em 2016 montou-se uma campanha a favor do Brexit sem nenhuma informação mais concreta sobre as implicações da decisão na vida das pessoas. Sequer analisaram-se as implicações na política interna, como a manutenção do Acordo de Sexta Feita Santa de 1998, que celebrou a paz na Irlanda do Norte, após três décadas de guerras sangrentas. Além disso, os números da economia mostram o menor crescimento desde 2012.

EUA – o FED (Banco Central dos EUA) interrompeu momentaneamente a alta nas taxas básicas de juros. Mas ficou a dúvida no ar sobre os próximos passos.

Peça 2 – alto endividamento

Anos de juros perto de zero provocaram um megaprocesso de endividamento corporativo e de países. A tomada de empréstimos se baseia na relação entre a taxa de crescimento da economia e o volume de crédito tomado. Quando cai o crescimento, aumenta o peso dos juros. O mercado de taxas traz indicações preocupantes de deflação na zona do euro. O que significa redução do numerador.

Mais que isso. O excesso de crédito inflou os ativos internacionais. A manutenção das cotações depende, sempre, da expectativa de crescimento dos investimentos e da manutenção da liquidez internacional.

Com menos crédito, haverá menos expectativa de rentabilidade dos ativos – que já estão caros. Essa parada poderá deflagrar o chamado “overshooting” para baixo. Isto é, deflagração de ordens maciças de venda.

- Além da queda da atividade econômica global, há um conjunto de crises latentes:

- Guerra comercial entre EUA e China.

- Confisco do ouro da Venezuela em bancos europeus, trazendo um fator adicional de insegurança jurídica.

- Crise política se alastrando na França, inclusive com embates verbais com a Itália

- A indefinição em relação aos juros norte-americanos.

- A indefinição em relação ao Brexit.

Peça 3 – o fator Bolsonaro

É nesse universo turbulento que o governo Bolsonaro começa a apresentar suas fichas. Tem-se um maremoto pela frente e no leme do país um governo mais preocupado em desmontar o barco movido por dois fundamentalismos: o religiosos e o econômico.

Depois de um primeiro mês atabalhoado, começam a sair as primeiras medidas, uma sucessão infindável de propostas fundamentalistas, descoladas da realidade, e, especialmente a equipe da cota dos Bolsonaro, com um despreparo abismante.

Se a educação e as relações exteriores estão sob controle de fundamentalistas religiosos, a política econômica foi entregue a fundamentalistas econômicos. O Ministro da Economia Paulo Guedes não é uma pessoa racional, que se debruça sobre a realidade para encontrar soluções. É um ideólogo sem noção, que julga que destruindo a ordem econômica em vigor, irá brotar do caos uma nova ordem conduzida pela mão invisível do mercado.

Desde o governo Temer, vem sendo desmontadas peças centrais da economia, com reflexos terríveis nas próximas décadas.

O desmonte do BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social) começou com a mudança da taxa referencial de juros, procurando aproximar suas taxas de longo prazo das taxas de mercado através do expediente mais nocivo possível: elevando as taxas mais baixas do banco, em vez de trabalhar para reduzir as taxas do mercado.

O desmonte da legislação trabalhista criou duas bombas relógio.

A primeira, os impactos gradativos sobre a receita fiscal. O que a tolice guedesiana chama de “herança getulista”, nada mais é do que um engenhosos mecanismo implementado por Roberto Campos, que transformou o desconto em folha em peça central da arrecadação fiscal, do financiamento da Previdência e do financiamento da infraestrutura, através do FGTS.

Com o desestímulo progressivo à formalização, haverá impactos de monta na receita fiscal e praticamente a inviabilização da previdência pública.

Sua proposta de reforma da Previdência – de impor a capitalização individual para os novos contribuintes – não tem pé nem cabeça. Existe um sistema em vigor, a chamada repartição simples, no qual a contribuição dos ativos banca a aposentadoria dos inativos. Se já há dificuldade em manter o sistema atual, como pretende incluir um novo sistema? Se os novos contribuintes deixarem de contribuir para a repartição simples, haverá um crescimento exponencial do déficit atuarial. Se acumular duas contribuições, o custo se tornará inviável para o empregado.

Portanto, há dois mega-rombos a caminho, caso passe a reforma: a redução da formalização do emprego; a interrupção do fluxo de contribuições ao sistema de repartição.

Tome-se a ausência completa de políticas contra cíclicas, para melhorar o nível de atividade, mais o desmonte das políticas sociais, o aumento da informalidade, um plano de segurança pública meramente bacharelesco, e a guerra religiosa que se prenuncia, para se ter um quadro complicado pela frente.

A guerra hoje não é entre centro-esquerda e centro-direita. É entre a irracionalidade mais delirante a os setores racionais do país, é entre a liberdade religiosa e o fundamentalismo mais canhestro, entre os direitos sociais e individuais e as milícias. Ou os setores formais e racionais se unem contra essa avalanche fundamentalista ou a reconstrução se tornará impossível.

Site desmascara Juan Guaidó: um falso democrata que não surgiu do nada

Do Portal Vermelho


O site uruguaio Se Puede fez a “lição de casa” e foi investigar quem é Juan Guaidó, o golpista que tenta usurpar o poder na Venezuela das mãos do presidente legítimo, Nicolás Maduro. O resultado do trabalho é uma devassa sobre a vida pregressa – e altamente condenável – do oposicionista venezuelano. Conforme o artigo, “Guaidó não surgiu do nada, e tampouco é um democrata preocupado pela vida dos venezuelanos”. Leia abaixo, na íntegra, o artigo.

Guaidó não surgiu do nada, e tampouco é um democrata preocupado pela vida dos venezuelanosGuaidó não surgiu do nada, e tampouco é um democrata preocupado pela vida dos venezuelanos
Quem é Juan Guaidó?
Por Se Puede. Tradução: Carta Maior

Estamos há um mês nos fazendo essa pergunta: quem é Juan Guaidó? Quem é esse fenômeno que apareceu com tanta força na política internacional, reconhecido por vários governos como presidente (!!!) da Venezuela, mesmo sem ser eleito, e que rapidamente também foi aceito pelos representantes da direita uruguaia. Guaidó se dá ao luxo inclusive de criticar o nosso presidente Tabaré Vázquez simplesmente porque o nosso país, junto com o México, avançou pelo único caminho possível para nós que amamos a democracia, a liberdade, a paz e especialmente o diálogo. E claro, Guaidó não está de acordo com essas posturas.

Investigando a respeito do seu passado, nos encontramos com uma matéria escrita por Pablo Pozzi para a publicação Quién es quién, a qual transcrevemos aos nossos leitores. É somente mais uma contribuição, para conhecer melhor a biografia do sujeito. Algum leitor pode considerar que não está de acordo com o relato e que Guaidó é realmente um democrata. Considere-a, então, somente mais uma fonte para ajudar a compreender os acontecimentos na Venezuela, país que tem se transformado no centro do mundo.

Abrindo o The New York Times (bom, clicando em seu sítio web), pode-se ver Juan Guaidó descrito como alguém “com um estilo refrescante e uma visão de quem quer melhorar” a Venezuela. Ao mesmo tempo, o Bloomberg News insiste em que Guaidó tenta “restaurar a democracia”, enquanto o The Wall Street Journal o declara como “o novo líder democrático”. É encantador para quem não tinha a menor noção de quem era. Por sorte, esses baluartes do jornalismo objetivo e da defesa da democracia me esclareceram.

Até que chegou à redação uma mensagem de um amigo, o sindicalista canadense Sid Shniad, que incluía uma longa investigação dos jornalistas Dan Cohen e Max Blumenthal sobre o personagem. Ambos devem ser muito mal intencionados (e também Sid, que sempre foi um desses vermelhinhos ranzinzas), porque se dedicaram simplesmente a fazer algo que os outros jornalistas não fizeram: revisar na web, entrevistar especialistas, ler diversos informes de ONGs sobre a Venezuela, etc. E então, para surpresa nossa, percebemos que o jovem democrata não veio do nada. Tampouco é a cara da democracia na Venezuela (e em nenhum outro lugar). Mas, quem é Juan Guaidó? O que nos dizem Cohen e Blumenthal?

Primero, o mais simples: Guaidó é membro do partido Vontade Popular, fundado por Leopoldo López e protagonista das chamadas “guarimbas”, enfrentamentos que custaram a vida de centenas de venezuelanos entre 2014 e 2017 (o que ninguém diz é que 70% dos mortos foram chavistas). O partido Vontade Popular pertence ao setor mais pró-estadunidense, neoliberal e intransigente da oposição antichavista, que rechaça qualquer tipo de negociação que não se baseie na derrota total dos aderentes de Chávez e um desmantelamento de todos os programas reformistas das últimas duas décadas. López, ademais de ser neoliberal e de ultradireita, recebeu quase 50 milhões de dólares em “ajuda democrática” por parte das organizações USAid (ligada ao governo norte-americano) e National Endowment for Democracy (NED: ligada à CIA), isso segundo o instituto espanhol FRIDE. Guaidó foi eleito deputado com 26% dos votos em 2016, pelo pequeno estado de La Guaira, graças a uma fragmentação de outras candidaturas opositoras ao chavismo; ou seja, também nesse sentido não é o que espera de um representante do povo. E se tornou presidente da Assembleia Nacional em circunstâncias ainda hoje pouco claras (na verdade, a presidência legalmente deveria ser de um tal Juan Andrés Mejía).

Por si só, os dados anteriores já mostram Juan Guaidó como uma pessoa mais ou menos desconfiável. Mas Cohen e Blumenthal buscaram mais um pouquinho, e descobriram que Guaidó era um dirigente estudantil da Universidade Andrés Bello. Aparentemente foi um dos cinco estudantes venezuelanos enviados pela NED a Belgrado em 2005 (nesse então, tinha apenas 21 anos), para ser capacitado pelo CANVAS, um grupo de treinamento sobre como organizar “protestos não violentos”, cujos alunos foram responsáveis por várias “revoluções coloridas”, como a dos neonazistas na Ucrânia. Em 2007, Guaidó recebeu seu diploma universitário e viajou a Washington, para estudar com Luis Enrique Berrizbeitia, um ex-diretor executivo do FMI. Cohen e Blumenthal não discutem nem especulam sobre como esse garoto de La Guaira conseguiu se conectar tão facilmente com um dos principais economistas neoliberais da América Latina. Isso sim, pouco depois de começar seus “estudos”, Guaidó já era parte do grupo fundador da Geração 2007, uma organização de estudantes treinados pelo CANVAS e financiado por Washington, cujo objetivo era derrotar a reforma constitucional chavista daquele ano. Segundo os emails do embaixador norte-americano na Venezuela em 2007, “o objetivo da Geração 2007 era forçar o governo venezuelano a reagir com repressão”, tudo para criar um “evento internacional”. Guaidó foi um dos personagens identificados como dirigentes desses protestos.

Em novembro de 2010, Guaidó e outros dirigentes do Vontade Popular participaram de um seminário secreto de cinco dias no hotel Fiesta Mexicana, na Cidade de México. O evento foi organizado pela Otpor, uma instituição dedicada às “mudanças de regime” e financiada por Washington. Por sua vez, o dinheiro do seminário veio da petroleira mexicana Petroquímica del Golfo e do banco JP Morgan. Durante o evento, segundo os emails de um dos participantes, foi planejada uma estratégia de desestabilização do governo da Venezuela, incluindo o assassinato de Hugo Chávez, e depois o de Nicolás Maduro. As “guarimbas” de 2014 foram parte dessa campanha, e é possível ver em diversos vídeos os dirigentes estudantis com camisetas do partido Vontade Popular. Entre eles estava Guaidó.

O governo venezuelano prendeu vários dirigentes do Vontade Popular, acusados de terrorismo e posse ilegal de armas de guerra. Entre eles estavam Freddy Guevara, Lester Toledo, Carlos Graffe, David Smolansky, Yon Goicoechea e Leopoldo López. Vários deles foram liberados posteriormente, para que esperassem pelo julgamento, e nesse então quase todos saíram ao exílio, ficando somente Leopoldo López, que se encontra hoje em prisão domiciliar. Convenhamos que, para ser acusada de ser uma ditadura selvagem, as penas que a Venezuela dá a esses opositores que promovem desestabilizações sociais e políticas têm sido incrivelmente leves. Mais ainda: Smolansky escapou do país sem muitos problemas, disfarçado de padre, e foi primeiro ao Brasil e logo aos Estados Unidos. Uma vez em Washington, tuitou que teve uma “amável reunião” com Elliot Abrams, o famoso arquiteto da estratégia de alimentar quadrilhas paramilitares na América Central durante os Anos 80, e que hoje é um “enviado especial” de Trump na Venezuela. Para pobres estudantes democráticos, estes garotos têm um acesso notável a muitos dos personagens mais obscuros da política norte-americana.

A saída de tantos dirigentes do país favoreceu Guaidó, que passou de ser um fundador secundário a se erguer como porta-estandarte do Vontade Popular. Em dezembro de 2018, Guaidó viajou em segredo a Washington, para planificar as mobilizações contra Maduro, que ocorreram em janeiro de 2019. Ali recebeu o compromisso de apoio dos senadores trumpistas Marco Rubio e Rick Scott, e do deputado Mario Díaz Ballart. Depois, se reuniu com o secretário de estado Mike Pompeo. No dia 5 de janeiro, antes de regressar à Venezuela, ele foi nomeado presidente da Assembleia Nacional, e 18 dias depois se autoproclamou “presidente encarregado” do país (um título que constitucionalmente não existe). Rapidamente, Washington se mobilizou para reconhecê-lo, e ao mesmo tempo começou sua pressão aos aliados e títeres para que fizessem o mesmo.

Guaidó não surgiu do nada, e tampouco é um democrata preocupado pela vida dos venezuelanos. Isso está muito claro no informe de Cohen e Blumenthal. Evidentemente, nem o The New York Times, nem o The Wall Street Journal repercutiram a investigação desses dois jornalistas. Para que? Se o Departamento de Estado sempre diz a verdade e o que é preciso saber.