segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

América Latina, integração sabotada.

http://outraspalavras.net/mundo/america-latina/america-latina-integracao-sabotada/

A escória em ascensão, por Aldir Blanc

mafaldablanc
O desabafo do genial compositor Aldir Blanc, publicado em O Globo:

O Tríduo, cada vez mais estúpido, foi redimido pela força de Maria Bethânia. No geral, um desfile cheio de bobeiras, mas Bethânia enobrece tudo. Houve corrupção, jurados patifes, “musas” desvairadas, mulheres jacas e maracujás de gaveta explodindo botóx e idiotices. Pareciam noites de Walpurgis, nas quais bruxas de bundas encaroçadas (mulheres frutas-de-conde?), pretensas fêmeas esculpidas lembrando halterofilistas ucranianos, avacalhavam a tradição. Faz tempo não vejo tanta mulher feia. A síntese dessa miséria é a Peladona da Peruche, uma baranga socialite que rasgou a fantasia e foi atirada à margem do caminho. Ela também é considerada “musa das manifestações”, o que explica o vexame. No dia seguinte, indo pra vovó, sob o “efeito de remédios”, o sol derreteu a vampira. A verdade: uma sub-BBB, com nível intelectual abaixo de zero. Tivemos também a vaca louca racista que invadiu o Fla-Flu. Quer ter o rótulo Rosconaro no sobrenome. Em redes sociais queria que “os crioulos voltassem para a África”. Esse é o tipo de escória que está em ascensão, como aquele membro de família corrupta que atacou Chico Buarque, e depois, bêbado, lambia Ronaldo, o Fenômeno. Fico me perguntando como é possível alguém querer magoar, ferir, Taís Araújo. Quando vejo na TV essa mulher de sonho, só penso em ficar de mãos dadas, pedir colinho. Aquelas falsas musas não representam a extraordinária luta da mulher brasileira, tão bem destacada recentemente no libelo de Isabel Diegues.
Mudando de assunto, pobres refugiados sírios! Vi um barco de borracha no alto de uma onda gigante com os futuros afogados. Quando não morrem no mar, levam chutes e socos, ficam presos no arame farpado, são explodidos por jatos das democracias liberais, ou voltam a nos assombrar como os esqueletos dos campos de concentração. O Horror retornou. Com a queda de popularidade dos que pretensamente os apoiavam — mamães viraram madrastas —, os refugiados já não podem nem mais ir à Merkell de barquinho.
Falei em Fla-Flu, mas o jogo é Fla-Fla, só um time joga, dá pontapés. O resto apanha. Não acontece nada com os crapulosos tucanos. Podem roubar durante décadas nos trens de São Paulo, comprar votos, se meter em negociatas de um bilhão de dólares com refinarias argentinas e até roubar na merenda escolar. Também podem, sendo políticos drogados de alto bordo, espancar mulheres, pois não serão queimados como outros. Vai dar pizza com Samarco e a privada Vale. São frutos tucanos. Eles podem até mesmo pretextar uso político quando são comprometidos em pensões e compras de apês na Europa para filhos — ou não —, fora dos casamentos exemplares, cujas mães foram perseguidas. O sub-relator da CPÍnfima do BNDES, o tucano Alex Baldy Cheio de M quer prender o Lula. Se ele for criminoso, tudo certo, mas, em nome da decência, prendam o Azeredo, a quadrilha no Paraná, os espancadores de esposas que são candidatos à Presidência da Ré-pública.
Não tá tranquilo nem confiável, Bin Laden. Tá Samarco e ChicunCunha.

“A luta de classes nunca tirou férias neste país”, afirma o professor da UFRJ José Paulo Netto

http://www.brasildefato.com.br/node/33400

domingo, 28 de fevereiro de 2016

Xadrez da cassação

Transcrito do Blog do Magno.


André Singer - Folha de S.Paulo

A espetacular prisão de João Santana, em timing cada vez mais calculado, joga, não por acaso, lenha grossa na fogueira de novas eleições para presidente e vice este ano. Apanha Dilma em curso de perigoso isolamento, ao mesmo tempo em que a alternativa do impeachment continua queimada pelos erros de Michel Temer e pela imagem de Eduardo Cunha. Nesse contexto, a "operação derruba chapa" procura pressionar o frágil colegiado do TSE a cassar os vitoriosos em 2014.
A estratégia dos enxadristas da Lava Jato combina duas linhas de força. De um lado, plantam devagar cerco que imobiliza o ex-presidente Lula. De outro, avançam rápido na direção de comprometer a presidente da República. Lembro que o anterior fato espetaculoso, também preparado com esmero, foi a prisão "em flagrante" do líder do governo no Senado, Delcídio do Amaral. Ressalte-se: do governo.
Os erros que Dilma comete contribuem para a eficácia da estratégia. Na medida que o ex-presidente fica na berlinda, aumenta a tentação da atual mandatária salvar-se por conta própria. Há indícios de que o Planalto cedeu à ilusão de que se cumprir o programa liberal completo receberá salvo conduto para cumprir o resto do mandato, mesmo que Lula e o PT se estrepem.
Trata-se de miopia. Quanto maiores forem as concessões, maiores serão as exigências, sem qualquer apoio sólido em troca. Basta ver o que foi o programa do PMDB, que pretende liderar a reforma liberalizante, anteontem na TV. O partido se colocou de maneira aberta a favor da solução argentina, com Temer procurando aparecer como o Macri brasileiro. Dilma que se estoure.
A detenção de Santana, como era de se esperar, reativou a pressão pró-impeachment dos peemedebistas, que daria lugar a um governo Temer. Ocorre que, além do percalço menor da desastrada carta sentimental do vice em novembro passado, o navio do PMDB também está torpedeado pela Lava Jato. A presença destacada de Cunha no horário político desmonta toda a credibilidade do peemedebismo.
Ao separar-se de Lula, Dilma serra o galho no qual está precariamente sentada. A ameaça de conter os aumentos do salário mínimo e de reduzir a participação da Petrobras no pré-sal alienam os últimos redutos de apoio à presidente reeleita. Consultado, o antigo mandatário não a deixaria bater de frente com os movimentos sociais.
Não será surpresa, se a presidente adotar a defesa de que, se houve problemas nas contas da campanha, elas seriam de responsabilidade do PT, sem que ela nada soubesse. Completaria, assim, o isolamento em que se meteu, sem perceber que o lance seguinte consistiria no xeque-mate.

Documentário - A lista de Furnas.

https://youtu.be/13AS0HJDmWE

Dilma, a Petrobrás e o 'Jogo da Direita'

Gilberto Bercovici, na Carta Maior

 
 
No último dia 24 de fevereiro de 2016, os brasileiros assistiram estupefatos a inexplicável omissão e, logo depois, a atuação decisiva da Presidente Dilma Rousseff na aprovação do Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 131/2015, de autoria do Senador José Serra (PSDB-SP), promovendo a retirada da Petrobrás como operadora única do pré-sal.

Não tardaram a aparecer as mais variadas e esfarrapadas justificativas, desde a eterna tecla do “governo de coalizão” à realpolitik de botequim de que a Presidente necessitaria agradar o Presidente do Senado, Renan Calheiros, para barrar o processo de impeachment. Em todas as enfáticas defesas da atitude presidencial, um argumento sempre presente: aqueles que ousarem criticar a Presidente Dilma Rousseff estarão, na realidade, “fazendo o jogo da direita”. Quem não entende as circunstâncias do exercício do poder presidencial, no assim chamado “presidencialismo de coalizão”, promove o “quanto pior, melhor” e irá beneficiar apenas os setores interessados no impeachment ou derrubada da Presidente Dilma.

O argumento do “jogo da direita”, repetido ad nauseam, nada mais é que a atualização do terrorismo eleitoral das duas últimas eleições presidenciais, em 2010 e 2014: ou a candidata presidencial apoiada pelo PT ou o caos da volta dos tucanos e neoliberais. Esses argumentos se esgotaram, assim como se esgotou nossa paciência com um governo fraco, medíocre, pusilânime e que faz, este sim, o “jogo da direita” com maestria e crueldade.

Ao contrário do que foi amplamente prometido durante as campanhas eleitorais de 2010 e 2014, a Presidente Dilma Rousseff não promoveu um governo que representasse os anseios da maioria de nossa população. No momento imediatamente posterior à proclamação dos resultados eleitorais, a matriz da política econômica foi radicalmente alterada, com a adoção do programa econômico dos adversários derrotados no pleito presidencial. Quem faz o “jogo da direita”?

Ao invés de inclusão, crescimento e ampliação de direitos, o governo federal promoveu deliberadamente um ajuste fiscal de viés marcadamente neoliberal que destruiu a economia do país, gerando retração econômica, a maior recessão dos últimos tempos, de cerca de 10% e com mais de 1 milhão de desempregados, e o ataque indiscriminado aos direitos sociais, trabalhistas e previdenciários. Quem faz o “jogo da direita”?

A Presidente Dilma Rousseff parece acreditar que a culpa da crise e dos desajustes da economia é dos pobres deste país, omitindo-se ou promovendo diretamente uma sucessão de medidas de restrição de direitos sociais básicos, como as restrições ao seguro-desemprego, a proposta de limitar os gastos do governo inclusive com a suspensão do reajuste do salário mínimo, a reforma da Previdência voltada contra os mais humildes e dependentes dos auxílios, nunca contra as aposentadorias excessivas de setores privilegiados do funcionalismo público, notadamente no Poder Judiciário e no Ministério Público. Quem faz o “jogo da direita”?

A Presidente Dilma Rousseff hoje governa não para os que a elegeram, mas para os bancos e os rentistas da dívida pública. A taxa de juros foi elevada a níveis que inviabilizam a atividade econômica produtiva. O país está de joelhos, preso em uma espiral de juros sobre juros que não termina nunca e que enriquece cada vez mais os poucos privilegiados de sempre. Aproximadamente 500 bilhões de reais do orçamento da União estão destinados ao pagamento dos juros da dívida pública. Os banqueiros se refastelam sobre a miséria do povo. Quem faz o “jogo da direita”?

A Presidente Dilma Rousseff foi omissa e seu silêncio foi eloquente quando a principal empresa do país, responsável por 10% dos investimentos e cerca de 18% do PIB, a Petrobrás, se tornou vítima, além da corrupção, de um articulado e gigantesco ataque especulativo, judicial e midiático. O Governo Federal não moveu um músculo em defesa da Petrobrás, seja para recomprar suas ações, cuja queda foi provocada deliberadamente no mercado de capitais, seja para mostrar ao povo brasileiro que a Petrobrás é uma empresa saudável, capaz de cumprir seus compromissos e essencial ao desenvolvimento do país. A resposta à maciça campanha de desmoralização e destruição da Petrobrás é o silêncio. Quem faz o “jogo da direita”?

A Presidente Dilma Rousseff e o seu governo não promovem a efetiva defesa da Petrobrás junto à justiça norte-americana. A lei anticorrupção dos Estados Unidos não se estende a governos estrangeiros. A Petrobrás é um órgão do governo, uma empresa estatal, uma sociedade de economia mista integrante da Administração Pública Indireta federal, vítima de um esquema de corrupção. Em relação aos processos nos Estados Unidos, cujo resultado pode ser a condenação indevida da Petrobrás em bilhões de dólares, a atitude do Governo Federal foi novamente a omissão e a desídia, como se esta questão não fosse de seu interesse. Quem faz o “jogo da direita”?

A Presidente Dilma Rousseff nomeou duas diretorias distintas para a Petrobrás, ambas com o mesmo objetivo: o desmonte parcial da empresa, sua “privatização branca”. A venda de ativos da estatal não é uma novidade de Ademir Bendine, já era promovida por Graça Foster. A atual diretoria da Petrobrás, nomeada pela Presidente Dilma Rousseff, portanto, com o seu aval e beneplácito, apenas aprofundou o processo, ao determinar em seu Plano de Gestão e Negócios (2015/2019) os cortes de cerca de 76 bilhões de dólares em investimentos e a venda de cerca de 57 bilhões de dólares em ativos, como participações na BR Distribuidora, no setor de gás e na petroquímica. Quem faz o “jogo da direita”?

A garantia da Petrobrás como operadora única do pré-sal faz com que o ritmo de investimento e de produção de todos os projetos do pré-sal, bem como a decisão sobre eventuais associações e com quem se associar, permaneçam nas mãos da União. Isso para não mencionar as funções de controle sobre o impacto ambiental e apuração correta da vazão e da quantidade de petróleo extraída, todas exercidas pela Petrobrás. Ao abrir mão dessa política, apoiando a aprovação do Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 131/2015, de José Serra, quem faz o “jogo da direita”?

Os apoiadores do Projeto do Senador Serra e os defensores acríticos do Governo Federal cantam loas ao grande avanço que a Presidente Dilma Rousseff teria conseguido em suas inexplicáveis negociações. Ao invés de se retirar formalmente a Petrobrás da condição de operadora única do pré-sal, ela teria uma espécie de “direito de preferência”, ou seja, escolheria primeiro se teria interesse na exploração daquela área do pré-sal, não sendo obrigada a atuar em todo o pré-sal. Essa proposta “light” do Projeto Serra nada mais é do que trocar seis por meia dúzia. A entrega do pré-sal para as petroleiras internacionais continua intacta, apenas disfarçada pela “esperteza” e pusilanimidade de integrantes de um governo que se comprometeu publicamente, em duas eleições seguidas, a manter o controle nacional sobre o pré-sal. Quem faz o “jogo da direita”?

Sem a Petrobrás como operadora única do pré-sal também se torna inviável estimular a indústria nacional, por meio das políticas de conteúdo nacional. Políticas estas que geram empregos aqui no Brasil e estimulam o desenvolvimento de nossa capacidade industrial. A política de incentivo à inovação tecnológica, que gerou toda a vanguarda da Petrobrás na exploração de petróleo em águas profundas fica também prejudicada se a estatal deixar de ser a operadora única do pré-sal. Ao ameaçar toda a cadeia produtiva do petróleo e parcela da nossa indústria nacional, que geram milhões de empregos no Brasil, quem faz o “jogo da direita”?

A Petrobrás descobriu as jazidas do pré-sal a partir de suas próprias pesquisas e com a utilização de sua própria tecnologia de exploração em águas profundas, sem nenhuma colaboração ou auxílio externo. E as jazidas do pré-sal apresentam risco exploratório próximo de zero, ou seja, praticamente não há possibilidade de se furar um poço e não encontrar petróleo. Nenhuma empresa petrolífera do mundo, estatal ou não, abriria mão dessas reservas. Não há sentido algum em determinar que a Petrobrás perca o controle sobre as jazidas que ela mesma descobriu e desenvolveu tecnologia própria para explorá-las, em nome do Estado brasileiro. Que país do mundo seria capaz de abrir mão do controle sobre esses recursos? Que governo permitiria a perda do controle nacional sobre as reservas petrolíferas e admitiria ter sua exploração ditada a partir dos interesses privados das grandes petroleiras internacionais? Infelizmente, foi isso o que a Presidente Dilma Rousseff promoveu no último dia 24 de fevereiro de 2016. Quem faz o “jogo da direita”?

Sejam quais forem os motivos da capitulação do Governo Federal na discussão do PLS nº 131/2015, nenhum deles justifica a traição a milhões de cidadãos que confiaram na candidata Dilma Rousseff quando esta prometeu por duas vezes, em 2010 e em 2014, que não abriria mão do controle estatal sobre o pré-sal, atendendo aos interesses estratégicos brasileiros. Ao trair seus eleitores e sua base de apoio na sociedade em troca de uma improvável e cada vez mais cara “governabilidade”, quem faz “o jogo da direita”?

Mais do que o “jogo da direita”, a Presidente Dilma Rousseff optou pelo caminho da entrega do patrimônio público nacional, do desmonte do Estado, do desperdício de nossas riquezas estratégicas. Neste caminho ela certamente pode contar com os entreguistas, aduladores e venais de sempre.

Justamente por não fazermos ou compactuarmos com o “jogo da direita”, este não é, nunca foi e não será jamais o nosso caminho. Nós trilhamos um caminho absolutamente distinto. Trilhamos hoje, como ontem, o caminho da soberania nacional e da contínua e árdua defesa dos interesses do povo brasileiro. A soberania nacional não se negocia com ninguém, não é e não pode ser jamais admitida como moeda de troca pela sobrevivência precária de um governo sem rumo.


*Professor Titular de Direito Econômico e Economia Política da Faculdade de Direito da USP



O leão manso do 1% brasileiro

Róber Iturriet Avila, na Carta Maior.

postado em: 23/02/2016
Somente a partir do final de 2014 a Receita Federal do Brasil passou a disponibilizar mais dados brutos das declarações de imposto de renda pessoa física. À medida que essas informações vêm à tona, é possível estabelecer algumas conclusões. Uma delas é que a Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio (PNAD) não é precisa no que tange à renda dos estratos superiores da sociedade brasileira. Outra conclusão é que a concentração de renda é superior ao que as surveys transmitem.

Marc Morgan Milá é um dos autores que trouxe mais luz sobre os dados das declarações de imposto de renda ao concluir seu trabalho na Paris School of Economics, ao final de 2015. O Trabalho de Milá (2015) estabelece estimativas do topo da renda diferentes daquelas presentas na PNAD.  No Brasil, no ano de 2013, a preços de fevereiro de 2016, os cortes dos estratos superiores eram os seguintes:

10 % mais ricos: renda mensal superior a R$ 4.191,88
5% mais ricos: renda mensal superior a R$ 7.536,61
1% mais ricos: renda mensal superior a R$ 23.128,71
0,1% mais ricos: renda mensal superior a R$ 89.971,47
0,05% mais ricos: renda mensal superior a R$ 428.849,47
0,01% mais ricos: renda mensal superior a R$ 690.829,25

Cabe destacar que a renda média do grupo que figura o topo é bastante superior ao corte limiar. Dentre os 0,1% mais ricos, a renda média mensal é de R$ 161.146,38 (valores atualizados). Já dentre os 0,01% mais ricos, a renda média mensal é de R$ 2.213.187,12 mensais (atualizados), ou seja, 964,5 vezes superior à média brasileira.

Em 2013, o 1% mais rico apropriou-se de 26,6% da renda nacional, já o 0,01% mais rico absorveu 4,8% do total. Trata-se do maior nível de desigualdade já registrado a partir dos dados tributários, os quais são mais confiáveis do que os de surveys, ainda que ponderando a provável elisão (ver Gráfico 1).  A concentração existente no Brasil só encontra paralelo com os 0,01% mais ricos dos Estados Unidos.

Cumpre ressaltar que esses dados são apenas de renda, uma variável fluxo, e não de riqueza, uma variável estoque. A riqueza é sempre mais concentrada, em qualquer país. Os 51,4 mil brasileiros mais ricos possuíam, em 2013, uma média patrimonial de R$ 24,8 milhões (a preços de 2016).

Ao longo do século XX, os países corrigiram as sabidas disparidades geradas pelo sistema capitalista através da tributação e de políticas públicas. Na esteira dessas transformações, o Brasil passou a cobrar imposto de renda a partir de 1923. Entretanto, a tributação sobre renda e propriedade no Brasil são sensivelmente baixas em um comparativo internacional. Nos países mais desenvolvidos, a principal fonte de receita tributária é o imposto sobre a renda.  Mesmo o México, o Chile e a Argentina possuem um sistema tributário mais justo em termos sociais do que o brasileiro. Os dois primeiros por cobrarem mais impostos sobre a renda e o último por cobrar mais impostos sobre o patrimônio.

Nas décadas de 1980 e 1990, as alíquotas máximas de imposto de renda no Brasil foram reduzidas de maneira expressiva, conforme explicita o gráfico 2. Atualmente a taxa máxima é de 27,5%, porém chegou a ser de 65% no Governo João Goulart.

Uma das principais distorções do sistema tributário brasileiro é a isenção de imposto de renda dos lucros e dividendos, vigente desde 1995.  A maior parte da renda do 1% mais rico advém de lucros e dividendos. Em 2013, as receitas isentas dos 71,4 mil (aproximadamente 0,05%) brasileiros mais ricos foram de R$ 233,7 bilhões, a preços de 2016. Convém detalhar tais isenções. Esse tema será aprofundado em outra oportunidade.


Gráfico 1 – Participação da renda do 1% mais rico de países selecionados, 1913-2013
C:\Users\rober\Desktop\Sem título.png
Fonte: Milá (2015)
Nota: Existem duas curvas referentes ao Brasil. Uma capta a renda total e outra apenas a renda tributável.


Gráfico 2 – Alíquotas máxima e mínima de imposto de renda no Brasil 1923-2013


C:\Users\rober\Desktop\graf 2.png
Fonte: Milá (2015)


Referências


MILÁ, Marc Morgan.  Income concentration in a context of late development: an investigation of top incomes in Brazil using tax records, 1933-2013.  2015.165f. Dissertação (Mestrado) %u215 Paris School of Economics, Paris, 2015.




Nassif: É evidente que o objetivo de Moro é derrubar o governo

É irreal o grau de ingenuidade de setores do PT e do governo, aliviados com as informações que constam nos documentos que embasaram a Operação Acarajé, de que não há nenhuma evidência de que o marqueteiro João Santana tenha recebido dinheiro ilegal para as campanhas de Lula e Dilma.

Por Luis Nassif*, no Jornal GGN


Segundo Nassif, o juíz federal Sérgio Moro tem como objetivo derrubar o governo Dilma Segundo Nassif, o juíz federal Sérgio Moro tem como objetivo derrubar o governo Dilma
Então, o juiz Sérgio Moro teria autorizado a prisão de Santana por suspeita de financiamento oculto para as campanhas presidenciais na República Dominicana?

É evidente que o objetivo de Sérgio Moro é derrubar o governo. É evidente que Moro está alinhado à oposição e à estratégia de Gilmar Mendes no TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Pessoas minimamente antenadas teriam percebido desde o início a estratégia de Moro – porque é óbvia, pouco sutil. É impressionante, no entanto, a facilidade com que iludiu seus principais alvos, a presidenta Dilma Rousseff e seu conselheiro-mor, o ministro da Justiça José Eduardo Cardozo.

Há duas lógicas na Lava Jato: uma, a lógica político-midiática, de criar o clima para o golpe final; e a lógica jurídica.

Juízes só julgam sobre o que está nos autos. Pode-se fazer a campanha política mais radical, mais evidente, desde que não conste dos autos. Constando dos autos, assim que os processos saírem do Paraná os tribunais superiores poderão reconhecer a parcialidade do juiz e a intenção política da Lava Jato.

A estratégia da Lava Jato foi simples. De posse das informações levantadas, com o poder de editar como bem entendesse, já que aliada à mídia, a Lava Jato direcionou todas as investigações para o lado de Lula e alimentou a mais pertinaz campanha de desconstrução da imagem de uma pessoa pública desde a campanha contra Getúlio Vargas em 1954.

A prisão da nata da malandragem teve como único objetivo recolher informações de ordem política. Depois, todos foram liberados, assim como Alberto Yousseff na Operação Banestado.

A campanha midiática teve por objetivo estimular o clamor popular e demolir as resistências do Judiciário contra os abusos da operação. Ao mesmo tempo em que os delegados vazavam toda sorte de factoides, e os procuradores todo tipo de discurso político, os autos permaneceram impolutos: não há nada contra Lula, Lula não está sendo investigado, Lula não é suspeito.

No reino colorido de Brasília, o conselheiro José Eduardo Cardozo acalmava a Rainha Dilma e lhe dizia:

– Viu? Não há o que temer. A operação é republicana.

Ontem (22), na véspera de se consumar o estupro, começou a cair a ficha das virgens do Planalto de que havia algo de estranho no comportamento de Sérgio Moro.

Provavelmente, é o mais ingênuo governo da história do país. Nem Wenceslau Braz conseguiu superá-lo.


*Jornalista econômico e editor do Jornal GGN.
Título original: Moro e a exploração da ingenuidade imperial

Colocar emprego e renda no centro da política econômica







*José Álvaro de Lima Cardoso
       A situação econômica mundial está complicada, por uma série de razões. Uma das principais, apontada por alguns analistas importantes, é a concentração da renda ao nível mundial. A distância entre ricos e pobres vem aumentando e o 1% mais rico detêm mais riqueza que os 99% restantes. Como apontou recente estudo do Comitê de Oxford de Combate à Fome (Oxfam, na sigla em inglês), o sistema econômico está estruturado para favorecer quem já dispõe de altos rendimentos, como demonstram os “paraísos fiscais”, que detêm no momento US$ 7,6 trilhões, correspondentes ao PIB do Reino Unido e da Alemanha, reunidos. 
        No centro da crise está também a queda drástica do preço do petróleo, como se sabe. Os países que exportam petróleo têm reduzido os gastos e os que importam o produto - e, portanto, ganham com o menor preço - não necessariamente gastam os recursos poupados, por não saberem se o ganho se manterá no longo prazo. Também por essa razão, é um total absurdo a aprovação, no dia 24 de fevereiro, no Senado, do Substitutivo ao PLS 131 que retira a obrigatoriedade da Petrobrás ser a operadora única do Pré-Sal, bem como a garantia de participação mínima de 30% nos campos licitados, como prevê a Lei 12.351/2010, que instituiu o regime de Partilha. O projeto vai claramente contra os interesses do Brasil e de seu povo e interessa diretamente às petrolíferas estrangeiras. A Petrobrás tem reservas garantidas de 14,5 bilhões de barris. Por isso é muito estranha a pressa em fazer novos leilões, especialmente quando há petróleo sobrando no mundo. 
        Com a recessão, o recuo do PIB per capita no Brasil, em 2015 e 2016, pode alcançar 11%. A crise econômica, ao tornar o cobertor da riqueza mais curto, ameaça retirar rapidamente os avanços no campo da distribuição de renda, que o Brasil vinha galgando a duríssimas penas na última década. O mais grave é que o debate público sobre as grandes questões nacionais está dominado pela mediocridade e pelos interesses da minoria. Não se consegue qualificar o nível da discussão. A situação econômica é bastante difícil como se sabe, mas está longe de ser caótica. No entanto, a crise é super dimensionada por interesses econômicos, numa espécie de “terrorismo econômico” permanente (os exemplos são inúmeros, mas o tema sairia do foco deste artigo).
        Neste contexto, é preocupante o conteúdo do documento divulgado em 19 fevereiro pelo Ministério da Fazenda, intitulado Reforma Fiscal de Longo Prazo. Segundo o documento, a proposta do governo é continuar neste ano com a política de austeridade fiscal praticada em 2015, que fracassou rotundamente. O documento do Ministério da Fazenda, em determinada altura diz que o esforço de 2015 “não foi suficiente para gerar superávits primários nos últimos anos devido à redução do nível de atividade econômica e à elevada rigidez do gasto público”. Em outra passagem o documento explicita a intenção de fazer a Reforma da Previdência: “para controlar o gasto obrigatório é necessário reformar a Previdência, controlar o gasto público com pessoal e adotar um limite global para o gasto primário da União”.
        A julgar pelo teor do documento, e de outras indicações, mudou o Ministro da Fazenda, mas o diagnóstico permanece o mesmo. De fato, todos os cortes de despesas do ano passado não foram suficientes para gerar superávit primário, mas, como se sabe, o problema central no campo fiscal são os gastos com a dívida pública. Estes chegaram a R$ 500 bilhões no ano passado, quase 18 vezes os gastos com o Bolsa Família (que tira 55 milhões de brasileiros da fome). O erro capital do governo em 2015 foi promover um ajuste fiscal, aprofundando ainda mais a recessão, que já estava em curso. Há nos governos hoje uma espécie de obsessão pela austeridade, mas penalizando os gastos sociais, salários e aposentadorias, sem atacar o essencial, que são os gastos com a dívida pública. O resultado deste tipo de política, como se observa no mundo, é o agravamento da crise.
       O momento exige ações exatamente na direção oposta: aumentar os gastos dos governos no social e na produção, investir em tecnologia, educação e infraestrutura. Seria fundamental também tornar a estrutura tributária mais justa, cobrando mais impostos de quem pode pagar mais, uma urgência no Brasil. No Brasil, quem paga imposto são os pobres e assalariados, os ricos entram com um volume ridículo, desproporcional à sua renda e patrimônio. A gravidade da situação atual exige medidas ágeis e impactantes, que retirem o governo da letargia, e que assegurem as conquistas da última década, como a melhoria dos salários e da distribuição de renda. E tudo isso com muito sentido de urgência.
           Nos últimos anos nada foi mais importante no Brasil do que a redução do desemprego, a elevação da renda e as políticas sociais. Para o grosso da população não existem medidas mais importantes do que essas. Superávit primário baseado em cortes de gastos públicos interessam apenas à minoria de rentistas e parasitas. Em todo o mundo, o que se verifica é que o desemprego é a verdadeira causa da instabilidade social. Por isso o governo brasileiro tem que colocar a geração de emprego e renda como o centro da política econômica.

*Economista e supervisor técnico do Dieese em Santa Catarina.