sexta-feira, 30 de março de 2018

Fascismo com a complacência nacional

por Aldo Fornazieri


O assassinato da vereadora Marielle Franco e os ataques à caravana de Lula  pelo Sul do país não deixam dúvidas de que o Brasil vive um contexto político no qual há a presença de grupos fascistas organizados, violentos e que adotam táticas terroristas para se imporem. Não resta dúvida também que os eixos articuladores desses grupos terroristas são os apoiadores da candidatura de Bolsonaro, da candidatura de Flávio Rocha, de grupos de ruralistas, de movimentos como o MBL e o Vem pra Rua e que contam com apoio institucional em setores do Judiciário e em setores dos partidos políticos governistas e de parlamentares e até de senadores, como é o caso de Ana Amélia Lemos.

O mais grave de tudo isto é que estes grupos fascistas, violentos e terroristas contam com a complacência da grande imprensa, de partidos ditos de centro como o PSDB, da OAB, do governo Temer, das presidências da Câmara e do Senado, da presidência do STF e de alguns candidatos à presidência da República. Afinal de contas, não se ouviu nenhuma dessas vozes condenar a violência contra a caravana.

Cabe perguntar: onde estão os editoriais dos grandes jornais contra a violência que atingiu a caravana de Lula? Jornais que sempre foram ávidos a cobrar posições das esquerdas contra atos esporádicos de violência de militantes... Será mero acaso que os grandes jornais deram generosos espaços, no fim de semana, a generais golpistas, a exemplo do general Antônio Hamilton Martins Mourão?

Por que a OAB, a presidência da República, a presidência do STF, as presidências das Casas Legislativas, o Ministério da Justiça, o Ministério da Segurança Pública e o Ministério Público Federal não se pronunciaram até agora? Por que o "democrata" Fernando Henrique Cardoso silencia ante esses ataques fascistas? Por que os pré-candidatos Alckmin e Rodrigo Maia não emitem nenhuma palavra sobre essa violência política? Onde estão todos? Estão com medo? São coniventes? Ou são cúmplices? É preciso advertir esses emudecidas personagens acerca de que esse silêncio conivente de hoje poderá proporcionar que amanhã também se tornem vítimas dessa violência fascista.

O PT e os democratas precisam pressionar essas autoridades e esses representantes políticos para que se pronunciem sobre esta violência fascista. Ou eles se manifestam e adotam atitudes ou a história os cobrará amanhã acerca do seu covarde silêncio. Esses grupos e dirigentes políticos, na verdade, abrigaram o fascismo nascente no processo do golpe que derrubou a presidente Dilma. Desmoralizados, porque muitos deles se revelaram moralistas sem moral, envolvidos em graves casos de corrupção, se acovardaram e, agora, por falta de coragem, por covardia ou por cumplicidade se calam ante a escalada de violência fascista que poderá mergulhar o Brasil numa guerra civil.

Guerra civil sim, porque esses grupos fascistas e terroristas estão caminhando rapidamente para o paramilitarismo. Os defensores da democracia não podem assistir passivamente a escalada de violência desses grupos. Antes de tudo, precisam organizar a sua autodefesa porque, como foi visto em São Miguel do Oeste (SC), as polícias tendem a ser coniventes com esses grupos terroristas.

Em segundo lugar,  é preciso cobrar do governador de Santa Catarina um esclarecimento acerca da passividade da polícia em face da violência desses grupos. Em terceiro lugar, é preciso levar a senadora Ana Amélia Lemos à Comissão de Ética do Senado por apoiar e estimular a violência política. Em quarto lugar, é preciso promover uma ampla campanha de esclarecimento da opinião pública acerca desses grupos violentos e criminosos. Em quinto lugar, como já sinalizou a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, é necessário fazer uma ampla denúncia internacional acerca da existência desses grupos fascistas e acerca da conivência das autoridades para com os mesmos.  

Por outro lado, já passou da hora de Lula, Ciro Gomes, Guilherme Boulos e Manuela D'Ávila se reunirem para divulgar um manifesto conjunto em defesa da democracia, da liberdade e da justiça e de condenação da violência política e social que graça pelo país. Se não é possível construir uma candidatura de unidade do campo progressista, os candidatos precisam mostrar uma unidade de propósito neste momento grave do país: a luta para defender a democracia que não temos.

Ação fascista: mentiras, violência e covardia

Esses grupos fascistas brasileiros, que proliferaram nos últimos anos, não fogem à tipologia clássica de ação dos movimentos totalitários já mapeada e descrita por vários estudiosos, notadamente por Hannah Arendt. Grupos e movimentos totalitários, quando ainda não estão no poder, se ocupam, fundamentalmente, da propaganda dirigida a pessoas externas aos mesmos visando convencê-las. A característica principal dessa propaganda é a mentira. O contemporâneo fake news foi largamente utilizado pelos nazistas e, em escala menor, pelos fascistas de Mussolini. Não há nenhuma novidade nisto. As mentiras monstruosas que esses movimentos propagam visam entreter o público para convencê-lo e para aliviar as pressões
críticas sobre si mesmos.

Aqui no Brasil, recentemente, viu-se como o MBL e outros grupos agiam no processo do golpe. Mentiam sobre a corrupção do governo Dilma enquanto se aliavam e apareciam em público com os maiores corruptos do país: Eduardo Cunha, Aécio Neves e outros. Aliás, Aécio e o PSDB patrocinaram esses grupos. Eles mesmos são integrados por corruptos e, geralmente, por indivíduos enredados em teias criminosas. E mentem de forma impiedosa e criminosa sobre Marielle quando esta não pode mais defender-se.

Se, externamente, esses grupos se dedicam a propaganda, internamente seu objeto é a doutrinação. Notem o que diz Arendt: "Se a propaganda é integrante da 'guerra psicológica', o terror é-lhes ainda mais inerente". Foi usado em larga escala pelos nazistas, que definiam o terror como "propaganda de força". Arendt adverte que ele aumentou progressivamente antes da tomada do poder por Hitler "porque nem a polícia e nem os tribunais processavam seriamente os criminosos da chamada Direita". Qualquer semelhança com o que temos hoje no Brasil não é mera coincidência.

Crimes contra indivíduos, ameaças e ações violentas contra adversários caracterizam a propaganda e o terror desses grupos. Tem-se aí o assassinato de Marielle e de outros líderes sociais e comunitários e a violência contra a caravana de Lula. Temos a violência verbal nas redes sociais que também é uma forma de propaganda. Não é possível subestimar esses atos, pois englobam elevado perigo num mundo anômico e num país com as instituições destruídas. Todos esses atos, essa violência, esse terrorismo,  têm o mesmo pano de fundo: o crescimento do fascismo no Brasil.

Se a primeira característica desses grupos é a mentira, se a segunda é a violência, a terceira é a covardia. Geralmente praticam a violência contra vítimas indefesas. Veja-se a suprema covardia no assassinato da Marielle. A covardia da tocaia na execução de líderes sem-terra, líderes indígenas e militantes ambientalistas. Os agroboys covardes que atacaram a caravana de Lula agrediram mulheres, inclusive uma mulher que está em tratamento de câncer e que estava com seu filho de dez anos. São esses covardes que a igualmente covarde senadora Ana Amélia Lemos exalta. É preciso detê-los. Detê-los com a militância nas ruas, a exemplo dos atos de protesto contra a execução de Marielle, a exemplo dos professores paulistanos e exemplo de tantos enfrentamentos pelo Brasil. Detê-los com as candidaturas de Ciro, de Boulos e de Manuela. E é preciso detê-los com a candidatura de Lula até o fim.

Aldo Fornazieri - Professor de Sociologia e Política (FESPSP).

quinta-feira, 29 de março de 2018

O novo codinome da privatização

Por Gilberto Bercovici e Felipe Coutinho, no site Carta Maior: Transcrito do blog do Miro

Pesquisa recente apontou que 70% dos brasileiros são contra a privatização da Petrobrás, enquanto 78% são contra o capital estrangeiro na companhia. (Folha de S.Paulo, 2018) Talvez por isso a atual direção da Petrobras evite usar a palavra “privatização”. Sob o eufemismo “parcerias e desinvestimentos”, o plano estratégico tem a meta de privatizar US$ 34,7 bilhões de ativos da estatal entre 2015 e 2018. (Petrobras, PNG 2017-2021, 2016) (Petrobras, PNG 2018-2022, 2018).

As privatizações têm sofrido questionamentos na Justiça e no Tribunal de Contas da União (TCU). Em março de 2017, a Petrobras divulgou que “adaptou o seu programa de desinvestimentos à sistemática aprovada pelo TCU”. A adaptação teve resultado sobre as vendas em andamento e não surtiu efeito sobre os projetos cujos contratos de compra e venda já haviam sido assinados.

A posição do TCU é contraditória, apesar de apontar os desvios dos processos de privatização em curso permitiu que aqueles em fase avançada fossem concluídos sem nenhum reparo. Do mesmo modo, o TCU e os vários órgãos de controle se omitem em relação à política de substituição do monopólio estatal da Petrobras por monopólios privados, o que é absolutamente vedado pela Constituição, em seus artigos 170 e 173, §4º. E, na medida em que a Petrobras vem sendo fatiada, os agentes econômicos privados tendem a buscar o lucro máximo por negócio, majorando os custos ao consumidor, o que restringe ainda mais o já pífio crescimento do mercado interno.

Dos projetos que puderam ser concluídos, destacamos a venda de 90% da participação acionária na Nova Transportadora do Sudeste (NTS), da Petroquímica Suape e Citepe e da Liquigás, esta última recentemente impedida pelo CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica).
Dos projetos de privatização encerrados e que foram destinados a reavaliação para compor a nova carteira, destacamos a cessão dos direitos de campos terrestres, de concessões em águas rasas nos Estados de Sergipe e Ceará, nos campos de Baúna e Tartaruga Verde e a alienação de participação acionária da BR Distribuidora que recentemente foi concluída por meio de oferta pública de ações.

O comunicado da Petrobras sobre a adequação a sistemática exigida pelo TCU registra, em nota, que “não inclui parcerias estratégicas”. (Petrobras, Adaptamos nosso Programa de Desinvestimentos à Sistemática aprovada pelo TCU, 2017).

“Parcerias estratégicas”

Diante das restrições para aceleração das privatizações decorrentes da sistemática exigida pelo TCU a alta direção da Petrobras passou a formar estratégicas parcerias.

Por meio da parceria com a francesa Total vendeu 22,5% (do total de 65% que possui) da concessão de Iara e outra de 35% (dos 45% que possui) no campo de Lapa. Em fato relevante a Petrobras informa que o acordo envolve US$ 2,2 bilhões. Em entrevista coletiva Pedro Parente explica “Conversamos com a área técnica do TCU e trata-se de parceria estratégica e não desinvestimento”. (Valor, 2016)

Então ficamos assim, desinvestimento não é privatização e parceria estratégica não é desinvestimento? É evidente que o resultado da parceria é a privatização sem respeitar as regras estabelecidas com o TCU.

Para o Chairman e CEO da Total, Patrick Pouyanné, “com a concretização da Aliança Estratégica com a Petrobras, que acontece após a recente decisão de investimento para o desenvolvimento em larga escala do campo gigante de Libra, operado pela Petrobras e no qual a Total é parceira, a Total consolida sua presença no Brasil, em uma das bacias mais prolíferas do mundo, tendo como diferencial a sua expertise em águas profundas. Estamos particularmente satisfeitos por sermos a primeira major a operar um campo em produção no pré-sal brasileiro. ” Pouyanné declarou também: “pretendemos continuar fortalecendo a nossa Aliança Estratégica com a Petrobras através do compromisso de intensificar a nossa cooperação técnica em operações, pesquisa e tecnologia, e desenvolver novas sinergias entre as duas empresas”. (Petrobras, Petrobras e Total concluem a cessão de direitos das concessões de Lapa e Iara, como parte de sua Aliança Estratégica, 2018)

Em setembro de 2017, a Petrobras e a chinesa CNPC firmaram Memorando de Entendimento para iniciar tratativas referentes a uma parceria estratégica. (Petrobras, Petrobras e CNPC formam Aliança Estratégica abrangente, 2017)

Em outubro de 2017, a Petrobras assinou uma carta de intenções com a inglesa BP para identificar e avaliar conjuntamente oportunidades de negócio, envolvendo ativos ou empreendimentos no Brasil e no exterior. O documento prevê cooperação nas áreas de exploração & produção, refino, transporte e comercialização de gás, GNL, trading de petróleo, lubrificantes, combustível de aviação, geração e distribuição de energia, renováveis, tecnologia e iniciativas de baixa emissão de carbono, visando o desenvolvimento de uma potencial aliança estratégica entre as companhias. (Petrobras, Petrobras inicia negociação com a BP para aliança estratégica, 2017)

Em dezembro foi a vez da norte americana ExxonMobil, com o qual a Petrobras firmou consórcio para exploração de seis blocos offshore na Bacia de Campos. (Petrobras, Petrobras e ExxonMobil formam Aliança Estratégica, 2017)

Ainda em dezembro de 2017, Petrobras e Statoil assinam contratos relacionados à parceria estratégica. Acordo envolve cessão de 25% da participação da Petrobras no campo de Roncador, pelo valor total de US$ 2,9 bilhões. (Petrobras, Acordo envolve cessão de 25% da participação da Petrobras no campo de Roncador, pelo valor total de US$ 2,9 bilhões, 2017)

Até o momento foram firmados memorandos, acordos e contratos sob a bandeira das “parcerias estratégicas” com cinco multinacionais, a francesa Total, a chinesa CNPC, a inglesa BP, a estadunidense ExxonMobil e a norueguesa Statoil. As parcerias permitem a privatização dos ativos industriais e das concessões de petróleo e gás da Petrobras, sem seguir o regramento acordado com o TCU e descumprindo a legislação brasileira.

Conclusão

Estamos diante de uma política deliberada da atual direção da Petrobras de violar a legislação existente sobre venda de ativos de empresas estatais. Essas “parcerias estratégicas” com alienação de ativos da Petrobras são juridicamente nulas, dada a ausência de licitação pública, como determina o Plano Nacional de Desestatização e o artigo 29 da Lei 13.303/2016, que não inclui venda de ativos de sociedade de economia mista como caso para dispensa de licitação pública.

A legalidade, a isonomia e a impessoalidade são os princípios estruturantes de qualquer licitação pública. Não apenas a Constituição (artigo 37), mas a legislação específica reitera estes princípios, como a Lei nº 8.666/1993, dentre outras. A impessoalidade determina, entre outros deveres, o de que a Administração Pública esteja proibida expressamente de discriminar quem quer que seja sem fundamento legal, ou seja, todos devem ser tratados igualmente perante a Administração. Do mesmo modo, a legislação é explícita ao vedar qualquer tipo de preferência ou distinção sem fundamento no ordenamento jurídico, visando frustrar justamente o caráter competitivo do procedimento licitatório. Afinal, o fundamento da ideia de licitação é o da competição, sem privilégios entre os concorrentes. No sistema constitucional brasileiro, a licitação é a regra e a dispensa de licitação é a exceção.

O pressuposto da licitação é justamente a competição, como possibilidade de acesso de todos e quaisquer agentes econômicos capacitados. E isto vem sendo reiteradamente violado com a atuação da Petrobras nas “parcerias estratégicas”, nas quais a direção da estatal simplesmente escolhe diretamente com quem vai estabelecer a parceria, portanto dirige a venda de seus ativos para um comprador já previamente determinado.

Sob a Constituição de 1988, as empresas estatais, como a sociedade de economia mista Petrobras, estão subordinadas às finalidades do Estado. A legitimação constitucional, no caso brasileiro, desta iniciativa econômica pública, da qual as sociedades de economia mista constituem exemplos, se dá pelo cumprimento dos requisitos constitucionais e legais fixados para a sua atuação. Os objetivos das empresas estatais estão fixados por lei, não podendo furtar-se a estes objetivos. Devem cumpri-los, sob pena de desvio de finalidade. Para isto foram criadas e são mantidas pelo Poder Público.
A sociedade de economia mista é um instrumento de atuação do Estado, devendo estar acima, portanto, dos interesses privados. A Lei das S.A. (Lei nº 6.404/1976), se aplica às sociedades de economia mista, desde que seja preservado o interesse público que justifica sua criação e atuação (artigo 235). O seu artigo 238 também determina que a finalidade da sociedade de economia mista é atender ao interesse público, que motivou sua criação. A sociedade de economia mista está vinculada aos fins da lei que autoriza a sua instituição, que determina o seu objeto social e destina uma parcela do patrimônio público para aquele fim. Não pode, portanto, a sociedade de economia mista, por sua própria vontade, utilizar o patrimônio público para atender finalidade diversa da prevista em lei, conforme expressa o artigo 237 da Lei das S.A.

O objetivo essencial das sociedades de economia mista não é a obtenção de lucro, mas a implementação de políticas públicas. A esfera de atuação das sociedades de economia mista é a dos objetivos da política econômica, de estruturação de finalidades maiores, cuja instituição e funcionamento ultrapassam a racionalidade de um único ator individual (como a própria sociedade ou seus acionistas). A empresa estatal em geral, e a sociedade de economia mista em particular, não tem apenas finalidades microeconômicas, ou seja, estritamente “empresariais”, mas tem essencialmente objetivos macroeconômicos a atingir, como instrumento da atuação econômica do Estado.

Portanto, fica evidente que as sociedades de economia mista, como a Petrobras, estão constitucional e legalmente vinculadas aos fins definidos nas suas leis instituidoras, não havendo possibilidade jurídica de utilizarem o seu patrimônio, por sua própria vontade ou do governante de plantão, para atender a outras finalidades, comprometendo, inclusive, a sua própria continuidade e atuação como ente da Administração Pública Indireta do Estado. As chamadas “parcerias estratégicas” não passam de uma forma de burlar as condicionantes constitucionais e legais de atuação da Petrobras, privilegiando determinados agentes econômicos privados, geralmente estrangeiros, escolhidos a dedo, sem nenhuma forma de concorrência pública, em clara violação às determinações impostas pelos órgãos de controle da Administração, como o TCU.

A partir de 1º de janeiro de 2019, o novo presidente eleito precisa revogar todas as medidas privatistas e antinacionais que estão sendo tomadas por Michel Temer e a atual direção da Petrobras. As multinacionais estrangeiras que se beneficiam desta alienação devem ser tratadas como receptadoras de bens vendidos de forma ilegal e o patrimônio estatal devidamente recuperado para o bem de todos os brasileiros.


* Gilberto Bercovici é Professor titular de Direito Econômico e Economia Política da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Felipe Coutinho é Engenheiro Químico e Presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (AEPET)

No encerramento da caravana pelo Sul, ontem na Curitiba republicana, Lula colhe o que plantou!

relato do advogado Samuel Gomes, o Samuel da Ferrovia: retirado do blog Conversa Afiada.


No encerramento da caravana pelo Sul, ontem na Curitiba republicana, Lula colhe o que plantou!
 Eu estava lá.

Cheguei com a caravana. De Chapecó/SC a Curitiba - com atos e reuniões fantásticas em São Miguel do Oeste, Francisco Beltrão, Quedas do Iguaçu e Laranjeiras do Sul - enfrentamos ventos e tempestades, bloqueios de estrada, miguelitos e tiros contra o nosso comboio.

Em Marmeleiro/PR, fiz valer a minha carteira da OAB: recorri à Justiça e pude ver um juiz de Direito, o jovem Márcio de Lima, cumprir o seu papel e honrar a Constituição, determinando o imediato desbloqueio da rodovia para que a caravava pudesse seguir.

E a caravana seguiu. Podíamos escutar ao longe os cachorros fascistas ladrando entre ranger de dentes.

Mas o que ficou mesmo na lembrança foi o carinho dos agricultores familiares e dos acampados e assentados da reforma agrária.

Para mim, e para tantos outros, foi a caravana da ferrovia e a caravana da coragem. Afinal, o que a vida pede da gente é coragem. Agir com coragem é agir com o coração.

No encerramento da caravana na Praça da Universidade em Curitiba falei ao povo em nome do PMDB do Paraná, o PMDB do Roberto Requião e pude ouvir com alegria o eco das minhas palavras na boca de milhares de pessoas: Lula Presidente! Volta Requião! Volta Requião!

Foi lindo e foi verdadeiro. Era a da Justiça, a voz do povo brasileiro!
Samuel da Ferrovia

Os cúmplices paulistas do atentado a Lula

Por Gilberto Maringoni, na revista Fórum: do blog do Miro.

O fato mais grave do dia não é o atentado a tiros à comitiva do presidente Lula, no Paraná.

O fato mais grave do dia é o aval que Geraldo Alckmin e João Doria deram à tentativa de homicídio do líder petista e seus companheiros.

Da disputa de narrativas sobre a morte – e a vida – de Marielle Franco, passamos, neste caso, à uma desfaçatez ainda maior. Agora a extrema-direita não está tentando fazer valer alguma calúnia de que Lula seria amigo de Marcinho VP ou se andava com bandidos.

Agora a escória joga mais baixo ainda: o PT colhe o que plantou. E o que o PT plantou? Não há argumento. Há a sinalização aos atiradores que podem ir em frente que o aval está dado. Se matarem Lula como fizeram com Marielle, não tem problema. A justificativa é o “que ele plantou”.

Não estamos mais nos argumentos de Pedro Aleixo, vice de Costa e Silva (1967-69), durante a reunião que definiu o AI-5, em 13 de dezembro de 1968.

Aleixo era contra o ato que representava o fechamento do regime, rumo a uma ditadura sem máscaras.

O ministro da justiça Gama e Silva – pai espiritual de Sergio Moro e de Cármen Lúcia – perguntou se Aleixo não confiava nas “mãos honradas do presidente Costa e Silva, que será o único juiz da aplicação do ato?”

A resposta do vice tornou-se clássica:

“Nas mãos honradas do presidente eu confio! Desconfio é do guarda da esquina!”

Doria e Alckmin superaram aquela situação. Estão dizendo ao guarda da esquina para – literalmente – mandar bala, que eles seguram a onda.

São cúmplices de um crime.

Imperialismo, soberania energética e o golpe de Estado.


                                                                                              *José Álvaro de Lima Cardoso. 
    Não há sociedade moderna, desenvolvida econômica e socialmente, sem suprimento regular, e em quantidade suficiente, de eletricidade e combustíveis. O Brasil nesse aspecto é privilegiado, porque produz praticamente toda a energia que consome e é, também, o segundo maior produtor de alimentos do mundo. Além disso, pelo menos metade da energia produzida no país é renovável e não poluente. Isso em decorrência, dentre outros aspectos, do peso das hidrelétricas na produção de eletricidade no país. O engenheiro e físico José Walter Bautista Vidal, uma das maiores autoridades do país no debate sobre energia, idealizador do Proálcool (falecido em 2013), dizia que uma enorme vantagem estratégica do Brasil é ser o grande continente tropical do planeta.  
   Segundo o professor, o país é “proprietário” do reator à fusão nuclear, o Astro-rei, responsável pela geração do petróleo, xisto, turfa, gás natural, elementos fundamentais para o desenvolvimento econômico-social de qualquer nação. O grande trunfo do Brasil, segundo Vidal, seria utilizar de forma imediata essa riqueza disponibilizada em profusão pelo sol, bastando realizar os investimentos necessários para a sua exploração. Segundo ele o Brasil é a civilização dos hidratos de carbono, que seriam os dividendos do reator à fusão nuclear, que a humanidade nunca irá conseguir reproduzir e que o Brasil dispõe com grande fartura.
     Para o professor os brasileiros foram agraciados com um “reator” à fusão nuclear particular, e com total condição de captar e armazenar essa energia, em função da abundância de água e da grande extensão territorial do país. Bautista Vidal costumava apontar a inevitável vinculação entre apropriação e uso das fontes de energia e sua relação com a política, em todos os seus aspectos, principalmente o militar. Se referia com frequência a um fato decisivo na geopolítica mundial: as nações hegemônicas no mundo são pobres em produção de energia, por se localizarem em regiões temperadas e frias do planeta, o que as levará, à inevitável decadência econômica. Exceto se tomarem o potencial de energia dos trópicos.
      Esse debate não poderia ser mais atual. O Brasil acabou sofreu recentemente um golpe de Estado, comandado pelos EUA, no qual um dos principais motivadores foi a cobiça por fontes de energia como um todo, mas especialmente as jazidas do pré-sal. O golpe foi perpetrado para, dentre outras coisas, interromper a viabilização, a partir de várias frentes, da soberania energética brasileira, para a qual são importantes todas as fontes de energia, e que é pré-requisito para o desenvolvimento econômico-social. O interesse do imperialismo são as ricas matérias primas existentes (água, minerais, biodiversidade da Amazônia) como um todo, mas as reservas do pré-sal estão no centro das motivações golpistas. A Lava Jato, Cavalo de Tróia do golpe, tratou de rapidamente prender o Vice-almirante e Engenheiro Othon Luiz Pinheiro da Silva, ainda em 2015, principal responsável pelas maiores conquistas históricas na área de tecnológica nuclear no Brasil. 
     Esse militar é considerado o principal mentor do programa nuclear brasileiro e o principal responsável pela conquista da independência na tecnologia do ciclo de combustível, o que colocou o Brasil em posição de destaque na matéria, no mundo. Por isso, durante vários anos, foi monitorado pela CIA. O militar, que recebeu todas as honrarias possíveis das Forças Armadas Brasileiras (tem oito das mais importantes medalhas militares), para os especialistas no setor, é considerado um patriota e um herói brasileiro. Para o judiciário entreguista da Lava Jato, é um corrupto. O vice-almirante recebeu a sentença mais rigorosa entre todos os réus da Lava Jato (até o momento cerca de 150): 43 anos de cadeia, o que, para um senhor de quase 80 anos de idade, na prática, significa prisão perpétua. O militar, que havia sido solto em 2017 por ter idade avançada e estar lutando contra um câncer, está ameaçado neste momento de voltar para a cadeia.
   O Programa Nuclear da Marinha, principal projeto nessa área no Brasil, foi criado em 1979 no Governo Geisel, com a ostensiva oposição do governo dos EUA. Em pouco tempo de existência do projeto, o país conseguiu dominar o ciclo completo de enriquecimento de urânio, com desenvolvimento nacional de centrífugas. OS EUA fizeram de tudo para impedir o programa, colocando inclusive o Brasil numa lista de países que não poderiam importar materiais visando o programa nuclear. Após uma longa interrupção do Programa, principalmente no período FHC, o programa foi reativado no governo Lula.
     Com a anúncio da maior descoberta de petróleo nos últimos 30 anos, em 2006, o pré-sal, o governo brasileiro fez um acordo com a França para desenvolver um projeto de fabricação de um submarino à propulsão nuclear, visando proteger a chamada Amazônia Azul (território marítimo brasileiro, com área corresponde a aproximadamente 3,6 milhões de quilômetros quadrados, equivalente à superfície da floresta Amazônica) que, somente na camada do pré-sal, pode conter até 300 bilhões de barris de petróleo. É dessa área que o país extrai 90% de sua produção de petróleo, daí a importância do Projeto. A empresa responsável para construção do estaleiro e de uma base naval para os submarinos foi a Odebrecht, a mais impactada pela destruição das empresas nacionais, levada à cabo pela Lava Jato. O presidente da empresa, Marcelo Odebrecht está preso há três anos e foi condenado a 19 anos de prisão. Este fato, por si só, já revela quem é a principal força do golpe no Brasil. Quem, além do império americano, teria força para encarcerar, de forma ilegal, o presidente daquela que era a maior empreiteira da América Latina e uma das mais importantes multinacionais brasileiras?
     A busca de soberania energética pelo Brasil, que significou por exemplo, a aprovação da Lei de Partilha em 2010 (com oposição dissimulada de José Serra e outros entreguistas), não foi, é claro, a única razão do golpe. O Brasil tomou uma série de outras iniciativas nos últimos anos, que desagradaram ao império: aproximação soberana dos vizinhos sul americanos, fortalecimento do Mercosul, ingresso nos BRICS, criação da Unasul (União de Nações Sul-americanas) e da CELAC (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos). Além disso, realizou enormes obras de infraestrutura, como a represa de Belo Monte e vinha renovando os equipamentos das Forças Armadas, como nem os governos militares haviam feito. Ou seja, estava em curso, ainda que com uma série de limitações, um projeto nacional, na direção do Brasil como uma potência na Região.
     Talvez, de todos os equívocos cometidos pelos governos anteriores ao golpe, um dos mais graves tenha sido a subestimação da agressividade do império. Desde 2014, vários analistas, apontam o envolvimento da Lava Jato com as estruturas de espionagem do Império Americano. Os procedimentos ilegais utilizados na Operação, prisões arbitrárias, vazamento seletivo de delações de criminosos, desrespeito aos princípios mais elementares da democracia (como a presunção de inocência), e a mobilização da opinião pública contra pessoas delatadas, são técnicas largamente utilizadas pela CIA em golpes e sabotagens mundo afora.  É fato conhecido que desde o fim da 2ª Guerra Mundial, Washington já tentou derrubar mais de 50 governos (a maior parte dos quais plenamente democráticos), bombardeou populações civis de mais de 30 nações e tentou assassinar mais de 50 líderes estrangeiros. Como mostra a história do Brasil no século XX, estava evidente que um projeto próprio e soberano para fazer do Brasil uma grande potência, mesmo que moderado, entraria em rota de colisão com os Estados Unidos. Deram um golpe, baseados em técnicas de comunicação e semiótica, sem precisar disparar um único tiro.
                                                                                                                       *Economista. 28.03.2018

Livro Golpe de Estado e Imposição da Política de Guerra no Brasil


domingo, 25 de março de 2018

Raquel Dodge, a mensageira do arbítrio

Por Luis Nassif, no Jornal CCG. Do blog do Miro

Finalmente, a Procuradora Geral da República Raquel Dodge explicita a que veio: aprofundar o arbítrio.

Nem se fale do absurdo de endossar a condução coercitiva. O papel da PGR é seguir as decisões do Supremo Tribunal Federal (STF). Há uma turma que defende a condução, outra que a condena. Logo, não há jurisprudência formada. Qual a razão para Dodge endossar a versão mais radical, em um momento em que o arbítrio campeia sem freios pela Polícia Federal, por procuradores e juízes de primeira instância?

Essa decisão em favor do arbítrio foi apenas o primeiro sinal.

Antes disso, Dodge havia substituído a subprocuradora Ela Wieko como uma das representantes do Ministério Público Federal junto ao Supremo. Ela, figura referencial do MPF, foi substituída pelo subprocurador Juliano Villaverde.

Coube a ele, com delegação de Dodge, defender a maior aberração jurídica dos últimos tempos: o mandato de condução coletiva. Por ele, qualquer policial pode invadir casas, ante a mera suspeita de que algum crime esteja sendo cometido. Trata-se de uma violência inconcebível, especialmente para as residências de menor renda. Não se trata de medida para o Jardim Paulista, mas para favelas e periferia.

Responsável pela colaboração internacional no âmbito da PGR, figura relevante de investigações históricas do MPF, como o caso Banestado, o procurador Vladimir Aras escreveu em seu Twitter:

“Uma lição que ecoa há 255 anos no mundo e que está no art. 5º da Constituição: a casa é o asilo inviolável do indivíduo. Por mais humilde que seja, que seja uma cabana, um casebre ou uma choupana em que entrem o frio e a chuva, nem o Rei da Inglaterra pode ali entrar sem direito”.
Tempos sombrios, de masmorras silenciosas, trazendo o que de pior existe no mais recôndito da alma das pessoas.

Dodge tornou-se mais um vulto exterminador, em um país que clama por pacificação.

Marina Silva e a série da Netflix

Por Kiko Nogueira, no blog Diário do Centro do Mundo. Do blog do Miro

Marina Silva precisa explicar a promoção que está fazendo da série “O Mecanismo”, da Netflix, dirigida por José Padilha e inspirada em livro do filho de Miriam Leitão, Vladimir Netto, sobre a Lava Jato.

Nas redes, Marina está usando uma foto de Marielle Franco com o círculo vermelho usado na comunicação visual da campanha do seriado.

Isso serve de ilustração para um blablablá demagógico.

“Todos sabemos: o dinheiro que remunera o crime é o mesmo que financia o arbítrio policial, as milícias e grupos de extermínio. E todos estão ligados aos propinodutos da corrupção. #MariellePresente“, escreveu.

Esse palavreado vazio e idiota dá link para um release mal disfarçado da produção que saiu no Valor assinado por Marina.

“O cineasta José Padilha definiu bem em um artigo – que agora é lançado como seriado: há um mecanismo de exploração da sociedade, do qual o sistema político corrompido é um aspecto cada vez visível. Um sistema de esquemas”, afirma.

“As causas de Marielle são lutas contra o mecanismo, pois todos sabemos: o dinheiro que remunera o crime é o mesmo que financia o arbítrio policial, as milícias e grupos de extermínio. E todos estão ligados aos propinodutos da corrupção.”

Além de Marielle, Marina cita Chico Mendes e a irmã Dorothy.

O texto é de 23 de março, dia do lançamento no site de streaming. Há duas alternativas:
Marina escreveu sem ver; 2) A Netflix ou Padilha lhe deram acesso, ela encarou uma maratona e sentou o dedo.

A pergunta que ela precisa responder é quanto custou o show.

Ou fez tudo de graça?

Para quem vive de discursos moralistas, apontando o dedo para o alheio, Marina tem a obrigação de explicar seu conforto para usar o cadáver fresco de Marielle para fazer merchandising.

Se ela não vê nenhum problema nisso, seus eleitores têm um problema mais grave.

O risco da História, e das ilusões


                                                                              *José Álvaro de Lima Cardoso.
    Desde que se intensificaram as articulações para o golpe no Brasil, lá por 2014, veio à tona um dos traços assustadores da nossa sociedade, que é o total desconhecimento, de parte da população em geral, de aspectos elementares da história do Brasil. Mesmo quando trata-se de acontecimentos políticos relativamente recentes. E não apenas entre a juventude, mas nas demais faixas etárias. É possível que este seja este um dos problemas mais graves e uma das tarefas mais urgentes que teremos que enfrentar no Brasil nas próximas décadas. Povo sem conhecimento de sua própria história é povo sem destino relevante, e presa fácil de ambições imperialistas. Como estamos vendo agora, quando sofremos um ataque contra a soberania popular, sem os golpistas precisarem disparar um tiro.    
     O conhecimento da história é essencial para o povo de qualquer país, pois ajuda a evitar que se cometa os mesmos erros do passado. Passados apenas 33 anos do fim da ditadura militar, é desolador presenciar grupos pregando que seria melhor voltar ao período militar do que viver nessa “bagunça”, onde todos os políticos seriam corruptos, ladrões, etc. Impressiona constatar que setores da classe média e alta simpatizem com ideias semelhantes às que prepararam o caldeirão social do fascismo no mundo, e no Brasil. Uma parte da classe média é abertamente antirrepublicana e antidemocrática, e prega sem a menor vergonha, o rancor, o ódio e a ferocidade. Com a desculpa que lutam contra a corrupção, na verdade esse pessoal tem uma postura completamente fascista, contra os pobres e os marginalizados da sociedade brasileira.
    Uma diferença essencial deste momento, em relação aos anos que precederam o golpe de 1964, é que naquela ocasião havia propostas de reformas profundas para o país. Por volta de 1962 tinha se encerrado um ciclo de crescimento, que foi da II Guerra Mundial até o início dos anos 60, caracterizado por um vigoroso incremento do PIB e que ensejou ao Brasil ingressar no caminho da industrialização moderna. Este período teve as seguintes  características: a) ampliação do mercado interno; b) políticas protecionistas em relação à indústria nacional e apoio à substituição de importações; c) fortes investimentos estatais na infraestrutura de energia, transportes e na produção de insumos básicos; d) estímulos à entrada maciça de capital estrangeiro no setor de bens manufaturados produzidos para o mercado interno; e) facilidades fiscais, cambiais e creditícias concedidas ao capital privado como incentivo à produção industrial; e f) crescimento da oferta de alimentos e insumos agrícolas.
    Quando esgotou o referido ciclo de crescimento, dentre outras medidas, no final de 1962 o economista Celso Furtado, então ministro extraordinário para Assuntos de Desenvolvimento Econômico, apresentou ao país o Plano Trienal. O Plano, dentre outros assuntos fundamentais, tocava em dois itens sabidamente críticos da agenda nacional: reforma agrária e medidas de controle do capital estrangeiro no país. A ideia de reforma agrária visava combater o latifúndio, expandir um mercado interno para a indústria, ao mesmo tempo que estendia a sindicalização dos trabalhadores rurais. As medidas de controle do capital estrangeiro – como, por exemplo, a limitação da remessa de lucros - favoreceriam as indústrias nacionais e o desenvolvimento autônomo do país.
     A agenda do Plano Trienal é atualíssima, e deveria estar na ordem do dia do debate nacional, pois os principais problemas abordados naquele documento, continuam sem solução. Por exemplo, vivemos um aguçamento da desnacionalização da economia nos últimos anos, a reforma agrária ainda precisa ser realizada, e a renda é ainda mais concentrada que no começo dos anos de 1960. Por detrás do golpe de Estado de 2016 está uma questão de fundo essencial, que é uma agenda de resistência histórica que vem no Brasil desde muitos anos. Essa agenda foi derrotada várias vezes na história do país: há algumas décadas, em 1954 (quando renasceu com o suicídio de Vargas, adiando o golpe); em 1961, quando quiseram impedir Jango de assumir; e duramente derrotada com o golpe de 1964. Essa agenda é, basicamente, a luta por um projeto nacional de desenvolvimento, com distribuição de renda e com soberania em relação às potências imperialistas.
     Como agora, no golpe de 1964 havia uma direita que lutava para fazer o país se render incondicionalmente à dominação do capital financeiro internacional. E a crise mundial do sistema capitalista tem levado o império a perpetrar golpes em todo o mundo, somente na América do Sul, recentemente, golpes foram operados em três países. Recentemente, o secretário de Estado dos EUA, Rex Tillerson, sugeriu a possibilidade de um golpe militar na Venezuela. Segundo ele “na história da Venezuela, e dos países sul-americanos, às vezes os militares são o agente da mudança quando as coisas estão ruins e a liderança não serve ao povo”. Essa foi a manifestação de um secretário de Estado do país que lidera o golpe no Brasil, e que vem perpetrando golpes mundo afora, com a ajuda de militares ou não. Com um detalhe: os EUA sabem que a tentativa de golpe na Venezuela enfrentaria uma firme resistência, que inclusive vem sendo preparada pelo governo.
     Aqui irão continuar tentando dar uma fachada de legalidade ao golpe, ação que ilude um número cada vez menor de incautos. Porém, se houver necessidade, dependendo da reação da população e dos rumos das eleições gerais, podem dar um golpe militar, como já ocorreu tantas outras vezes na história do Brasil. A essa altura do jogo, a partir das peças que já estão postas no tabuleiro, as ilusões que ainda existem quanto à determinação dos que deram o golpe, assim como do risco de golpe militar, mostram porque tomamos o golpe de Estado mais asqueroso da história, com o mínimo de reação.

                                                                                                                 *Economista (25.03.18).