Sem compromisso com estatísticas e dados, imprensa ocidental publica o que quer sobre Venezuela, desde que contra Chávez
Na semana passada, houve um verdadeiro
festival midiático de ódio contra o presidente venezuelano Hugo Chávez,
com algumas das mais influentes publicações de ambos os lados do
Atlântico realmente execrando o cara. Até mesmo para os padrões de
hostilidade com os quais estamos acostumados, foi impressionante.
É interessante, já que os Estados Unidos
são um dos únicos países do mundo onde as notícias da mídia mais
liberal – NPR [Rádio Pública Nacional] ou até mesmo a New Yorker – são
minimamente diferentes das transmitidas na Fox News ou outros meios de
comunicação de direita (como veremos mais abaixo).
O episódio mais engraçado veio do El
País, que na última quinta-feira (31/01) publicava em sua primeira
página a fotografia de um homem que alegavam ser Chávez, deitado em uma
cama de hospital, aparentando estar em um estado bem complicado, com
tubos em sua boca. Logo se descobriu que a foto era completamente falsa.
Ops! O jornal, que é a publicação mais influente da Espanha (e com
muita repercussão na América Latina também), teve que retirar a edição
das bancas e pedir desculpas publicamente. No entanto, assim como os
venezuelanos reclamaram, não houve desculpas nem para Chávez nem para
com sua família. Não é surpreendente, já que o El País odeia Chávez
profundamente.
O New York Times, por outro lado,
publicou outro exemplo de ódio na seção de editoriais abertos. O
cachorro morde o homem. Nada de novo aqui, eles fizeram isso por quase
14 anos – o mais recente foi há apenas três meses. Este foi marcadamente
pouco original, ao comparar o governo de Chávez com um romance de
realismo mágico latino-americano. Continha pouquíssima informação, mas a
falta de compromisso com os fatos permitiu que os autores alegassem que
o país estava com a “produtividade em queda” e tinha uma “carga enorme
de dívida
externa”. Mas a produtividade não “diminuiu” com Chávez; de fato, o PIB
real per capita, que é basicamente condicionado pelo crescimento,
aumentou 24% desde 2004 (para uma explicação de por que 2004 é um ponto
de partida razoável, leia aqui). Nos 20 anos anteriores a Chávez, o PIB
real per capita na verdade diminuiu. Quanto à “carga enorme de dívida
externa”, a dívida externa pública da Venezuela equivale a cerca de 28%
do PIB, com um juros de aproximadamente 2% do PIB. Se essa cifra é
enorme, bom, vamos apenas dizer que essas pessoas não têm um bom senso
de quantidade.
Os autores provavelmente só estavam
seguindo a regra comum, que é a de que se pode dizer praticamente o que
quiser sobre a Venezuela, desde que seja negativo, e normalmente ninguém
questiona. As estatísticas e os dados quase não são levados em conta
quando a imprensa está apresentando sua imagem feia.
Isso se aplica especialmente para a
reportagem de Jon Lee Anderson publicada na edição da New Yorker de 28
de janeiro, “Slumlord: What has Hugo Chavez wrought in Venezuela?”
(Senhor das favelas: o que Hugo Chávez criou na Venezuela?). Nela, ele
menciona de passagem que “os venezuelanos mais pobres estão ligeiramente
melhor hoje em dia”. Ligeiramente? De 2004 a 2011, a extrema pobreza
foi reduzida em dois terços. A pobreza foi reduzida pela metade. E esses
indicadores somente medem a renda. Não consideram o acesso ao sistema
de saúde que agora milhões possuem, ou a duplicação do número de
matriculados em universidades – com educação gratuita para muitas
pessoas. O acesso às pensões públicas triplicou. A cifra de desemprego
caiu pela metade em relação à existente quando Chávez assumiu.
Eu não deveria ter que ressaltar que a
redução da pobreza venezuelana, o crescimento da renda real (ajustada à
inflação) e outros dados básicos não são questionados por especialistas,
e nem sequer por agências internacionais de estatísticas como o Banco
Mundial ou a ONU. Até mesmo os economistas da oposição usam esses dados
para fazer oposição ao governo. São somente jornalistas como Anderson os
que evitam que números e fatos corroborados interfiram em seu texto.
Anderson dedicou milhares de palavras,
em uma das principais revistas literárias dos Estados Unidos, para fazer
um retrato do lado obscuro da vida na Venezuela: ex-presos, ocupações,
prisões horríveis. “Uma espessa linha preta de excrementos humanos
corria em um muro exterior, e o pátio de dentro era um mar de águas
residuais e lixo de vários pés de profundidade”. Ele usa mais de uma
década de visitas à Venezuela para despejar no leitor suas lembranças
mais repugnantes da sociedade e do governo. O texto está acompanhado de
uma série de fotografias sombrias, em um deprimente branco e preto, de
pessoas com aspecto infeliz em ambientes feios (eu não podia parar de
pensar em todas aquelas pesquisas internacionais que continuam
constatando que os venezuelanos estão entre as pessoas mais felizes da
América Latina e do mundo – será que Anderson nunca conheceu ao menos um
destes venezuelanos?).
Fonte: Ópera Mundi.
Foto: Agência Efe
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