quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

Os ricos do Brasil e o minério estratégico que o país despreza

por Sergio da Motta e Albuquerque
 
A lista anual de multimilionários da revista Forbes é uma referência mundial de abastança. Ou riqueza, melhor dizendo. A relação dos brasileiros, publicada pela revista no final do ano passado mostra alguns casos interessantes, do 5º ao 9º lugar. Neles estão alguns magnatas locais ligados às comunicações e ao cinema. Notem que a lista pula do 6º para o 9º lugar. Abílio Diniz [7º lugar] e Jorge Moll Filho [8º] ficaram de fora da relação publicada no “Povo online”, mas constam na lista da Forbes americana. Os dois não trabalham, ou estão ligados a nenhum tipo de negócio envolvendo a propriedade de meios de comunicação, ou a entretenimento e mídia. Ressalva feita, passemos à relação dos multimilionários do Brasil (Povo online, 31/12/2016):
Encabeçando este pedaço da lista, Eduardo Saverin, o “brasileiro” que ajudou a fundar o Facebook, mas nunca recebeu a aprovação de Zuckerberg. Logo baixo dele estão os herdeiros Marinho (Roberto, Fernando e José Roberto). Quem aparece depois? Os irmãos Moreira Salles - dois deles parte importante da nobreza do cinema nacional. Walter Salles passou de 21º em 2014 a 9º em 2016. Não creio que cinema do Brasil dê tanto tanto dinheiro. E não dá.
Há três anos, o “Valor Econômico” (13/3) informou que os herdeiros acabaram como uma das famílias mais ricas do Brasil graças à um investimento que seu pai fez em 1965 na exploração em um mineral desconhecido chamado “nióbio”. Que tem a virtude de tornar o aço ainda mais forte e maleável, entre muitas outras. Nesse ano, Walther Moreira Salles, o pai, depois de atender a convite para exploração comercial do metal junto com o Almirante norte -americano Arthur Radford, (então presidente do conselho da mineradora ianque Molycorp), tomou o controle de partes da empresa e passou a produzir a maior parte do minério consumido no mundo. A Molycorp faliu um 2016 e ainda tenta sobreviver com dificuldade depois que a canadense “Neo Performance Materials” passou a controlá-la.
Foi diferente com a exploração do nióbio no Brasil. Com os anos de 1970, a empresa de Salles cresceu. O mineral é essencial nas indústrias de aviação, aço, informática, armamento convencional e nuclear e indústria naval. Além disso, o subproduto de sua extração gera as “terras raras”, magnéticas e necessárias na produção de lâmpadas LED e chips de computador e outros componentes resistentes ao calor. Seu pó pode ser usado para fabricar capacitores e componentes eletrônicos que trabalham em temperaturas muito altas. O nobre metal também é resistente à corrosão. Com a guerra do Vietnã, seu preço disparou com as demandas do conflito, adicionada às duas “corridas” da Guerra Fria: a armamentista e espacial. Os Salles criaram o monopólio do Nióbio, e agora a fortuna da família não vem apenas de bancos e fusões, mas em grande parte da exploração do metal pela Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM) , a companhia controlada pela família Moreira Salles.
Em 2013, o Valor Econômico (13/3) informou que a companhia de nióbio dos Salles era mais valiosa que a parte deles de 7,1 biliões de dólares no Itaú-Unibanco. Os irmãos, através do grupo E. Johnston (partilhado entre eles) controlam 33,5% “do Itaú Banco Participações, o que os faz controlar 51% das ações de voto do Itaú”, aditou o periódico. O irmãos Moreira Salles são uma das famílias mais ricas do Brasil. Graças ao patriarca da família, que sempre se valeu de suas relações com o estado Brasileiro em seus negócios, antes e depois do golpe de 1964.
Cinema no Brasil não não paga bem. Nem boas histórias comoventes, como a do filme “Central do Brasil”. Mas o Nióbio é considerado um mineral estratégico para os Estados Unidos. O Brasil detêm quase 90% das reservas do metal no mundo, informou o Wikileaks em 2010 através do “ Business Insider”(12/10). Em 2016, a revista “Brasileiros”(5/9) publicou uma matéria mais completa sobre o desperdício que acontece no Brasil. Que, na realidade, segundo a publicação, concentra “aproximadamente 98%” das reservas mundiais, informou Wanderley Pleite Sobrinho, o autor da matéria. Poderíamos estar na liderança de componentes eletrônicos de alta resistência térmica (como fontes de energia de PC's ou componentes para celulares, por exemplo), se produzíssemos no Brasil os componentes mais elementares da indústria eletrônica, como resistores, capacitores e transístores com este metal.
A revista apontou outras contradições importantes. A EMBRAER “poderia participar da cadeia produtiva” do mineral e ampliá-la, acrescentou o geólogo e ex-secretário de Mineração, Geodiversidade e Recursos Hídricos do Estado do Amazonas Daniel Nava - hoje no Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas. Afinal, não se pode fabricar uma boa turbina de avião, ou as saídas de exaustão dos motores a jato sem o mineral. Elas são feitas com o nióbio, assim como as dos misseis. O alumínio de aviação, leve e ultra-forte, também leva o mineral em sua composição. O geólogo explicou à revista que o PT perdeu uma grande oportunidade com a mineração do metal nobre e suas aplicações na indústria de alta-tecnologia.
Não é tão fácil assim pensarmos o mercado mundial de terras raras e exploração do nióbio. A China é o maior consumidor mundial do minério e a maior produtora de terras raras. Desde 1986 existe naquele país o “Programa 863”, criado com a supervisão do próprio Den Xiaoping para acabar com a dependência do pais nas industrias de alta tecnologia. O esforço chinês que condenou a Molycorp à falência funciona, para os chineses, como um jogo de soma-zero com o resto do mundo: o que eles ganham é igual ao que os outros países juntos perdem. Em 2011, a CBMM dos Salles vendeu 15% de participação empresa para um consórcio japonês-coreano. Os chineses ficaram com os outros 15%.
O Brasil, com sua imensas reservas, não é ameaça à China. Continuamos submetidos pelos desígnios de Pequim e pela ambição dos nossos empresários. Que não possuem visão estratégica associada ao desenvolvimento da tecnologia nacional e à elevação do pais a condição de produtor de bens de alto valor agregado. O Marco Regulatório da Mineração ainda não chegou. E não vai chegar agora, no governo Temer e seu arrocho prometido de 20 anos. Não vai haver investimento público para a expansão da nossa indústria de base tecnológica. Continuaremos a importar minérios que deveríamos exportar, explicou Daniel Nava à revista “Brasileiros”. Nada de indústrias de tecnologia por aqui. Se educação e saúde estão com os orçamentos minguados, que esperança resta para projetos de desenvolvimento tecnológico no Brasil?

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