sábado, 9 de novembro de 2013

Eike simbolizou não a nova economia, mas a velha mídia

Paulo Nogueira

Não tenho simpatia ou admiração por alguém que, como Eike Batista em seus dias dourados, diz que seu sonho é ser o homem mais rico do mundo.
É muita pobreza de espírito. Mesmo em concurso de misses você vai encontrar respostas mais interessantes sobre sonhos e aspirações.
Mas, posto isto, o que estão fazendo com Eike na queda me lembra o que fizeram com Gatsby, o grande personagem de Fitzgerald. É um massacre abjeto, desprezível e cínico em que a maior vítima é a verdade.
Em seu Twitter, o ex-colunista da Veja Diogo Mainardi postou um vídeo em que Dilma aparece elogiando Eike. Postou também, modestamente, um artigo em que um blogueiro da Veja saúda sua capacidade profética.
Mainardi teria visto antes que os outros, segundo o blogueiro, que Eike era uma “farsa”. Em seu currículo de profecias, Mainardi carrega uma – que correu as redações como piada por muito tempo – em que ele dizia o seguinte, em janeiro de 2005. “Dentro de um ano, Serra vai subir a rampa do Planalto”.
Pausa para rir.
Vejamos agora o que a Veja dizia de Eike quando ele subia, em 2008.
“O empresário Eike Batista acaba de se tornar o símbolo do novo empreendedor brasileiro. A oferta pública de ações (IPO, na sigla em inglês) da OGX, sua companhia petrolífera, captou 4 bilhões de dólares nesta sexta-feira, quando foi realizada. É a maior operação desse tipo já feita no país. [...]
O sucesso de Eike Batista rendeu-lhe a reportagem de capa de VEJA desta semana.
[...]
Eike virou assim a cara do capitalismo que começa a se instalar no país, no qual o empreendedorismo se sustenta no mercado de capitais e não nas benesses estatais.
[...]
Tudo isso forma o cenário definido por um experiente analista do mercado de capitais como “alinhamento dos astros”. Graças a esse alinhamento e a uma eficiente capacidade de contratar as pessoas certas, Eike manteve o rumo nos momentos ruins e disparou nos bons. Isso não explica completamente o sucesso alcançado pela OGX. Para compreender o que se passou na Bovespa na sexta-feira, é preciso levar em conta um fator subjetivo, que vem sendo chamado de “Efeito Eike”.”
Bem, uma nova pausa para rir.
A Veja, como toda a mídia, comprou Eike. Chegou a compará-lo, numa das capas mais pavorosas dos 45 anos da revista, com Deng Xiao Ping.
Mas, caído ele, a mídia finge que não adulou Eike, convenientemente colocado agora, na desgraça, como uma invenção de Dilma.
Não que Dilma não tenha culpa de muitas coisas, como atestam os índios. Mas vinculá-la ao colapso de Eike é uma falácia.
Capa histórica
Capa histórica
Tenho minha própria visão.
Um empresário tão preocupado com coisas frívolas não poderia dar certo. Nas palavras da Veja:
“Mora numa casa de 3.500 metros quadrados, construída em um terreno de 60.000 metros quadrados, sem vizinhos que o separem do Cristo Redentor. Além do Mercedes de 1,2 milhão de euros que fica estacionado em uma das salas da mansão, tem catorze automóveis na garagem, três lanchas, três aviões e um helicóptero. Brinda a cada novo contrato com champanhe junto a uma fonte em seu jardim, de onde se descortina uma das mais lindas vistas da Lagoa Rodrigo de Freitas. Faz negócios e corre riscos à luz do dia.
Mais Eike tornaria o ambiente de negócios no Brasil melhor? Sem dúvida. “Isso é muito bom para um país que precisa ser mais assumidamente capitalista, globalizado e moderno”, afirma o ex-presidente do Banco Central Gustavo Franco. “Ele foge do estereótipo do empresário chapa-branca, atrasado, que não gosta de capitalismo.””
Se algum leitor da revista acreditou no que leu e comprou ações de Eike, por causa de sua fabulosa “capacidade de contratar as pessoas certas” e outras virtudes, pode talvez reclamar no Procon ou coisa parecida.
Eike era um símbolo, é certo, mas não da nova economia, mas da velha mídia.
Lembremos as “benesses estatais” das quais fala, acusadoramente, o texto da Veja. Agora relembre coisas como a reserva de mercado da mídia e o chamado “papel imune”, sobre o qual numa camaradagem extrema não incide imposto, e os cofres sempre franqueados do BNDES e do Banco do Brasil para as grandes corporações jornalísticas.
Pronto. Agora uma pausa para todos nós rirmos.
Sobre o Autor
O jornalista Paulo Nogueira, baseado em Londres, é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

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