quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Contas externas e capital estrangeiro no Brasil




    *José Álvaro de Lima Cardoso
     Nos dez meses primeiros meses de 2013 a balança comercial brasileira acumula um déficit de US$ 1,8 bilhão. No ano passado, no mesmo período, tinha sido feito um superávit de US$ 17,350 bilhões. Isto revela que houve um rápido processo de deterioração da balança comercial.  O déficit no acumulado do ano é o pior do Brasil para os 10 primeiros meses do ano desde 1998, ano em que foi registrado déficit de US$ 5 bilhões.  O déficit nas transações correntes (ou déficit em conta corrente), aumentou 77%, chegando a US$ 60,416 bilhões.  Em 12 meses, esse déficit já chegou a US$ 80 bilhões, equivalente a 3,6% do PIB.
     A ideia de que o déficit em transações correntes não é problema porque o país está recebendo investimentos diretos estrangeiros (US$ 43,7 bilhões entre janeiro e setembro) não resiste à uma análise mais profunda. Em boa parte, o problema é justamente a internacionalização da economia, através da vendas de empresas nacionais. Déficits externos são extremamente perigosos, especialmente no atual contexto de crise mundial prolongada e de desfecho imprevisível. Todas as graves crises que o país enfrentou nas últimas décadas têm em comum os déficits das contas externas.
     De janeiro de 2011 a setembro de 2013 entraram no país, em termos líquidos (ou seja, descontadas já as saídas), US$ 175,714 bilhões em IED. No entanto, a taxa de investimento caiu, porque esse dinheiro veio para adquirir empresas já construídas (investimentos já realizados, portanto) pelos brasileiros – e transformá-las em filiais, que enviam lucros e importam componentes ou de bens já acabados. Um outro problema é que, cada vez mais, o próprio IED assume um caráter especulativo. Fundos especulativos vem adquirindo empresas brasileiras por todo o país. Aliás, este é um fenômeno mundial. Que compromisso estes fundos de investimentos vão ter com a produção, com empregos ou com interesses do Brasil? O negócios deles é o lucro líquido, se a empresa parar de dar lucro eles fatiam e vendem.
     Os investimentos estrangeiros estão aqui para extrair lucros e enviá-los na maior quantidade possível para fora. Não apenas de forma oficial, mas através de outras formas ilegais, como o superfaturamento de importações. As multinacionais, inclusive, por serem importadoras por definição, acabam agravando o déficit comercial. Algumas destas empresas praticamente produzem exclusivamente com insumos e componentes importados, ajudando a destruir os elos internos das cadeias de produção. Segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior entre as 35 maiores empresas importadoras no primeiro semestre deste ano apenas quatro são empresas privadas nacionais. As demais são todas filiais de multinacionais.
    O curioso é que a ideia é atrair IED para trazer investimentos no Brasil, mas um dos atrativos de investimentos estrangeiros usados pelo governo são os empréstimos do BNDES (caso da BMW em Santa Catarina e tantas outros). O investimento estrangeiro direto tem significado, na prática, o aprofundamento da desnacionalização da economia brasileira, ou seja, os capitais estrangeiros são destinados, em sua maioria, para a compra de empresas nacionais. Cobrir déficit externo com investimento estrangeiro aumenta a dependência do Brasil das estratégias dos grandes capitais internacionais.
     Em face da escassez de alternativas de investimentos no mundo, as multinacionais investem em uma economia grandemente promissora, com forte potencial de crescimento e com amplo apoio político e financeiro do Estado Brasileiro (isenções fiscais, dinheiro do BNDES, desonerações, etc.).  O ranking das maiores empresas que atuam no Brasil, mostra que um grande e crescente número delas é de capital estrangeiro, puro ou consorciado com capitais de origem nacional. Na região Sudeste, por exemplo, a mais dinâmica e industrializada do país, das 50 maiores empresas, 22 (44%) são estrangeiras ou têm capital estrangeiro na sua composição. Tais empresas, e este é um detalhe importante, estão geralmente posicionadas nos setores da economia que apresentam maiores taxas de retorno para os investimentos (comércio varejista, telecomunicações, veículos, farmacêutica e cosméticos e outros). As empresas estrangeiras que adquirem empresas brasileiras normalmente são megacorporações transnacionais, com estratégias globais e centros de pesquisa localizados em geral nos países onde ficam as suas sedes.
*Economista e supervisor técnico do DIEESE em Santa Catarina.

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