postado em: 24/11/2013
Este artigo aborda duas questões importantes que afetam o crescimento econômico e as contas internas e externas do País, que são as taxas de juros bancárias inibidoras do consumo e a liquidez da economia, uma das principais causadoras dos déficits gêmeos fiscal e externo.
1 - Juros bancários - O governo deu passo importante ao iniciar o combate às taxas de juros bancárias em abril do ano passado. Foi uma iniciativa inovadora e sem precedentes que teria tudo para dar certo. A estratégia adotada foi de orientar suas instituições oficiais Banco do Brasil (BB) e Caixa Econômica Federal (CEF) a reduzirem suas taxas e expandir o crédito pela ampliação de clientes. Campanha publicitária foi, também, articulada para facilitar ao público o acesso a condições melhores no crediário ao buscar novas alternativas de financiamento.
O início dessa campanha ocorreu no dia 30 de abril do ano passado, quando a presidente usou cadeia nacional de rádio e TV para reafirmar seu compromisso em trazer essas taxas para níveis civilizados e atacou os bancos privados que sempre praticaram as taxas em níveis siderais. O combate à agiotagem bancária ganhou na ocasião corpo e apoio na sociedade. No dia do trabalho no ano passado as centrais sindicais ampliaram sua pauta e colocaram em destaque essa questão.
Os primeiros seis meses da ofensiva governamental foram marcados por forte redução nas taxas da CEF e redução não tão intensa no BB. Os bancos privados reduziram suas taxas, mas bem menos do que fizeram os bancos oficiais. Passado esse período de acomodação, os bancos privados voltaram gradualmente a elevar suas taxas para os níveis anteriores à ofensiva governamental, aproveitando que a pressão do governo tinha amortecido.
Faltou, no entanto, nessa estratégia do governo, não só continuar sua pressão, mas também complementar a redução ocorrida no BB e CEF, com novas medidas para forçar os bancos privados a operar com taxas equivalentes às praticadas pelos bancos oficiais.
Entre essas medidas vale citar duas: a) redução da Selic ao nível da inflação, como ocorre tanto nos países emergentes quanto nos desenvolvidos e; b) reduzir, tabelando as escorchantes tarifas nos serviços bancários.
Essas medidas reduzem duas importantes fontes de lucro dos bancos, induzindo-os a compensar essa redução pela maior oferta de crédito. Isso aumentaria a disputa entre os bancos pela conquista de clientes, com reflexo na redução das taxas de juros. É o mercado agindo para tornar o sistema bancário mais competitivo. Isso pouco ocorre, pois os bancos podem se dar ao luxo de só financiar os ditos bons clientes, pois seus ganhos são engordados pelas aplicações sem risco nos títulos oficiais (ganhos de tesouraria) e pelas tarifas bancárias que por si só cobrem todo o custo fixo bancário.
A não continuidade da ofensiva governamental (não se tocou mais no assunto), agravada pela retomada da elevação da Selic neste ano contribuiu para que o resultado de redução das taxas se apoiasse quase que exclusivamente nos bancos oficiais. A Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Contabilidade e Administração (Anefac), que registra as taxas de juros do sistema bancário e do comércio, registrou o ocorrido. Antes da ofensiva governamental a taxa à pessoa física girava no entorno de 120% ao ano e à pessoa jurídica no entorno de 60% ao ano. A redução ocorrida levou-as respectivamente a 90% e 45% devida basicamente aos bancos oficiais, pois os privados retornaram suas taxas, com exceção do financiamento da aquisição de automóveis, aos níveis que vigoravam antes da ofensiva governamental.
2 - Inundação de liquidez – A crise no cerne do sistema capitalista está sendo combatida com uma explosão de liquidez feita pelos bancos centrais dos países desenvolvidos para salvar seus sistemas financeiros da derrocada. A injeção de moeda ultrapassou a casa dos US$ 10 trilhões! Na zona do euro, elo mais fraco do sistema capitalista, as emissões nos últimos anos elevaram a base monetária de dois trilhões de euros em 2000 para cinco trilhões de euros. Os Estados Unidos elevaram sua base monetária de menos de um trilhão de dólares antes da crise para três trilhões de dólares no final de 2011 e continua injetando US$ 85 bilhões a cada mês, devendo reduzir esse ritmo somente no próximo ano.
Essa inundação de moedas desvalorizou-as em relação às moedas dos países que não usaram a mesma estratégia. Isso distorceu a concorrência internacional entre as empresas, prejudicando aquelas sediadas em países que não alteraram suas bases monetárias. Urge corrigir essa distorção e só vejo como forma eficaz nesse embate o uso da mesma arma, ou seja, a elevação da base monetária.
Nesse sentido, o governo, ao invés de continuar a emitir títulos de dívida para cobrir o déficit fiscal, que oneram juros, deveria emitir moeda até atingir nível condizente com o que operam economias de países emergentes, que têm inflação semelhante à nossa. Trata-se de ampliar substancialmente a liquidez da economia. Como se verá a seguir, felizmente há espaço para isso.
3 - M1 - Uma das principais medidas da liquidez é o M1, que é um agregado monetário que engloba o dinheiro em circulação mais os depósitos em conta corrente nos bancos.
Chama a atenção o M1 do Brasil, que desde 2000 oscila entre 5% a 7% do PIB. É muito baixo em comparação com os demais países. O último dado disponível é de 2010: Brasil 6,8%, Argentina e México 12%, Índia 19%, África do Sul 31% e China 60%. Na zona do euro o M1 estava em 2010 em 50% e no Japão 104%.
A evolução do M1 no Brasil foi a seguinte: em 1970 estava em 15%, caindo a partir de 1973 até atingir 2% em 1993 e passando a subir até 5% em 2000 quando se estabiliza entre 6% e 7% a partir de 2007. Em teoria o M1 se relaciona inversamente com a inflação. Na prática, no entanto, nem sempre isso ocorre. Quando o M1 assumiu seu mais alto nível no entorno de 15%, na primeira metade da década de 70, a inflação girava em torno de 20%, portanto, cerca de quatro vezes o nível atual.
Se o M1 fosse gradualmente elevado pela emissão monetária até o nível de 12%, seriam economizados anualmente em juros R$ 23 bilhões por ano. A dívida do setor público cairia R$ 250 bilhões, levando-a abaixo de 30% do PIB, e o câmbio poderia caminhar rumo a R$ 3,00 por dólar, contribuindo para ampliar a competitividade das empresas e indo na direção do equilíbrio nas contas externas.
4 - Risco de inflação - Essa ampliação da liquidez não foi feita, pois o governo teme que isso vá causar inflação. É sintomático afirmar que a emissão monetária gera inflação. Na teoria monetária é verdade, mas na prática o que ocorre é que a desvalorização cambial num primeiro momento encarece os produtos importados, mas quem exporta procura estabelecer o preço levando em conta os preços praticados no mercado de destino. Com a desvalorização do real o preço do produto importado também pode ser reduzido dada a super oferta internacional com preços sendo derrubados. Assim, no momento seguinte os preços podem se acomodar não gerando inflação. A prova disso é que em 2011 o câmbio em valores de junho deste ano estava em R$ 1,83/US$ e a inflação bateu em 6,5%. Atualmente gira no entorno de R$ 2,20/US$, com desvalorização real (excluída a inflação) de 20% e a previsão da inflação é de 5,8%.
A ampliação do M1 é necessária e fundamental para contribuir para o equilíbrio nas contas internas e externas e devolver às empresas a competitividade que lhes foi tomada. Quem comanda a emissão monetária é o Banco Central, que mantém o arrocho na liquidez como arma para controlar a inflação. Esse arrocho está levando à ampliação desnecessária na dívida federal e ao desequilíbrio nas contas externas ao artificializar o câmbio.
É fundamental para o deslanche saudável da economia e a melhoria dos fundamentos econômicos que atingem as contas internas e externas do país reduzir as taxas de juros do sistema financeiro e dar liquidez à economia.
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