“Leilão é erro estratégico”, afirma descobridor do pré-sal
O
diretor de Exploração e Produção da Petro brás no governo Lula e responsável
pela descoberta do pré-sal, Guilherme Estrella, afirmou, durante seminário
organizado pela Academia Brasileira de Ciências (ACB), Rio de Janeiro, que a
realização do leilão do Campo de Libra, previsto para ocorrer em outubro "é
um erro estratégico". "Libra são 10 bilhões de barris de petróleo já
descobertos, é muito óleo. A nossa posição de reserva com o pré-sal é muito
confortável pelos próximos 20 anos. Por
que vai abrir Libra para a participação de empresas estrangeiras e
interesses estrangeiros?", indagou Estrella.
"As empresas estrangeiras são
empresas que representam os interesses de seus países. Nós conhecemos a
história do petróleo. Isso não está certo", insistiu o ex-diretor da
Petrobrás. "Abrir uma licitação para 10 bilhões de barris já descobertos não
está certo. A lei permite a contratação pelo governo de sua empresa para
produzir esse petróleo", lembrou. O artigo 12º da nova lei do petróleo (lei
nº 12.351/2010), que rege o pré-sal, determina que a União, quando for o
caso de "preservar o interesse nacional" (sic) e atender aos "objetivos
da política energética" (sic) deve contratar a Petrobrás diretamente "para
a exploração e produção de petróleo, de gás natural e de outros
hidrocarbonetos fluidos sob o regime de partilha de produção". Em suma,
em área "estratégica", definida pela mesma lei como "região de interesse
para o desenvolvimento nacional, (...) caracterizada pelo baixo risco
exploratório e elevado potencial de produção de petróleo, de gás natural e
de outros hidrocarbonetos fluidos", a Petrobrás deverá ser contratada
diretamente. Se Libra - maior reserva de petróleo do mundo - não é
estratégica, o que será uma área estratégica?
"Se tinha que fazer uma nova
licitação, até politicamente, faz de outra área nas proximidades, aliás
temos nas proximidades de Libra, Franco, que é da cessão onerosa e vai ser
produzido pela Petrobrás", prosseguiu Estrella. "Para mim, essa decisão foi
um erro estratégico. Nós estamos trazendo interesses não brasileiros para
produzir 10 bilhões de barris", completou Guilherme Estrella.
"Quando a gente fala em
energia, estamos falando de um tema muito sensível sob o ponto de vista da
geopolítica mundial. Especialmente petróleo e gás natural, nós temos um foco
numa série de questões que tocam a soberania das nações, ao conhecimento e o
desenvolvimento do conhecimento científico e tecnológico", frisou. "Além de
serem absolutamente fundamentais na vida das pessoas. Consumo de energia é
parâmetro de qualidade de vida, mas, ao mesmo tempo é fundamental na
sustentação de hegemonias geopolíticas mundiais. Isso é o que acontece no
nosso dia a dia", destacou o debatedor.
"Nós, cidadãos do século XXI,
assistimos estarrecidos há uns dez anos a invasão de países soberanos para
apropriação de reservas petrolíferas. Monarquias absolutamente medievais,
autoritárias, opressoras são mantidas para sustentar como fonte de energia,
fonte de petróleo e gás natural as potências hegemônicas mundiais",
denunciou Estrella.
Aos argumentos apresentados
pelo ex-diretor da Petrobrás contra o leilão de Libra vieram se somar às
recentes denúncias veiculadas recentemente pela TV, de que a Petrobrás foi
espionada pela NSA (Agência de Segurança Nacional dos EUA). Segundo os dados
divulgados pelo ex-analista da agência, Edward Snowden - atualmente exilado
na Rússia - a estatal brasileira foi bisbilhotada pela agência de espionagem
norte-americana. Na opinião generalizada de especialistas, e até da
presidente Dilma Rousseff, essa espionagem visava obter vantagens para as
empresas dos EUA na disputa pelo controle do pré-sal. Este fato gerou um
amplo movimento dentro do país, envolvendo centrais sindicais,
personalidades, parlamentares e diversos movimentos sociais, exigindo o
cancelamento do leilão.
O seminário - que fez parte do
simpósio "Recursos Minerais no Brasil: Problemas e Desafios" - foi conduzido
pelo acadêmico Umberto Cordani. Além de Guilherme Estrella, o simpósio teve
ainda uma conferência ministrada pelo acadêmico Luiz Pinguelli Rosa, diretor
do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa em Engenharia
(Coppe/UFRJ). No papel de debatedores estavam Aquilino Senra (INB), Colombo
Tassinari (ABC/USP), Edison Milani (Petrobrás), Gilmar Bueno (Petrobrás),
John Forman (J. Forman Consultoria), José Goldemberg (ABC/USP), José Israel
Vargas (ABC/UFMG), Maurício Tolmasquim (EPE), Paulo Heilbron (CNEN) e
Roberto Villas-Bôas (Cetem). O seminário de Estrella aconteceu no dia 14 de
agosto passado e abriu as discussões na ACB sobre recursos energéticos de
origem mineral.
SÉRGIO CRUZ
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