*José Álvaro Cardoso
*Adhemar Mineiro
No dia 21 de outubro, a Agência
Nacional de Petróleo vai leiloar o maior campo de reservas de petróleo
brasileiro, encontrado a 180 km do litoral, na Bacia de Santos, a sete mil
metros de profundidade. São comprovadamente de 12 a 14 bilhões de barris de
petróleo, equivalente, por exemplo, a todas as reservas conhecidas de que o
México dispõe. A área a ser licitada tem cerca de 1,5 mil quilômetros quadrados
e as empresas que ganharem a licitação deverão explorar o campo durante quatro
anos, período que poderá ser estendido,
conforme prevê o contrato de partilha de produção.
Pelo sistema de partilha
vigente no país, a Petrobras será a operadora única do pré-sal, e terá direito
a 30% do Campo de Libra. Para termos uma ideia do significado do
pré-sal para o país, antes dele a reserva brasileira de petróleo era de 14,2
bilhões de barris, o que garantia 15 anos de autossuficiência. Com o pré-sal a
Petrobrás já localizou mais de 60 bilhões de barris de óleo de reservas.
Somadas às reservas anteriores ao pré-sal, ultrapassamos 74 bilhões de barris,
60 anos de autossuficiência, se não houver uma utilização acelerada das
reservas, para exportação, por exemplo.
Que pretende o governo brasileiro, ao
leiloar um campo já descoberto, que, sabidamente, armazena bilhões de barris de
óleo? O que explica essa atitude do governo brasileiro ao possivelmente entregar
uma reserva confirmada às empresas transnacionais de forma tão fácil? Conforme
tem sido afirmado pelos especialistas no assunto (com posição independente dos
interesses das multinacionais do petróleo), o pré-sal representa a maior
oportunidade de o país se tornar uma potência energética, fator fundamental
para tornar-se uma grande potência econômica. O pré-sal é a principal reserva de petróleo descoberta no planeta no
século 21. As possibilidades trazidas pela descoberta são, dentre outras, a
oportunidade de alavancagem da indústria brasileira (equipamentos, máquinas, naval,
logística, tecnologia e serviços) diretamente ligada ao petróleo e também externa
ao ciclo do petróleo. Significa uma rara chance de o país revigorar
tecnologicamente o processo industrial e enfrentar o grande risco de perda da
indústria, através do atual processo de desindustrialização (o que, infelizmente,
para muitos não é levado em consideração).
O governo defende que esses
investimentos estrangeiros são necessários para a economia voltar a crescer, o
que é parcialmente verdadeiro (pode ser um truísmo, mas o fato é que precisamos
de investimentos, mas obviamente, com financiamento, esses podem ser levados
adiante pela própria Petrobras). Ocorre que as empresas estrangeiras que
ganharem os leilões irão usar tecnologias de suas matrizes e trazer os
equipamentos de fora. Por exemplo, se as empresas da China
hegemonizarem o leilão de Libra, certamente irão privilegiar a importação de
equipamentos para retirada e transporte do petróleo da China, o que retiraria
parte do impacto positivo sobre a indústria brasileira. Além disso, a China tem
uma indústria naval muito mais competitiva que a brasileira e certamente
fabricaria lá os navios necessários para o transporte do petróleo extraído de
Libra. Além das empresas ganharem o direito de remeter lucros – e pressionar o
balanço de pagamentos brasileiro – além de exportar um recurso natural
esgotável.
Uma outra razão apontada
pelos analistas para a realização do leilão, é a meta de superávit primário
definida pelo governo para este ano, que seria engordada pelo bônus que será
arrecadado com o leilão de Libra, algo em torno de R$ 15 bilhões. A questão é
que não faz sentido o governo manter uma política de superávit primário apenas
em nome da “estabilidade” e visando tranquilizar os investidores, especialmente
considerando o fato de que não somos devedores do FMI. Ademais, em termos
relativos, estamos falando em um valor irrisório, se compararmos com os mais de
R$ 3,45 trilhões em petróleo, que podem ser explorados de Libra nos próximos 35
anos. E com um detalhe fundamental: trata-se de bem finito com forte tendência
a aumentar de preço nos próximos anos, além de necessário ao desenvolvimento
nacional.
É difícil entender que essa
seja uma razão para a realização do leilão. Mesmo porque, todo ano um grupo
reduzido de detentores de títulos da dívida pública recebe mais R$ 200 bilhões
(quase 5% do PIB) por conta dos juros da dívida pública. Porque não aplicar uma
parte desse recurso em investimentos maciços para a exploração do pré-sal? Além do mais, boa parte dos recursos públicos
emprestados pelo BNDES vai para grandes empresas multinacionais que pagam juros
subsidiados pelo sacrifício do povo brasileiro e retirados do próprio lucro do
negócio.
Porque não preservar um dos
patrimônios mais estratégicos que o Brasil dispõe entregando toda a reserva do
pré-sal para exploração exclusiva da Petrobras, coisa que a vigente Lei de
Partilha permite? A empresa (ou empresas) que ganhar o leilão certamente irá
fazer os investimentos com dinheiro captado no mercado, como todas fazem. A
Petrobras é uma das maiores empresas do mundo e, dispõe de crédito para
conseguir empréstimos em qualquer lugar do exterior.
Além dessas discussões, vale
lembrar que a Petrobras esta pressionada também pela proximidade dos leilões de
áreas possíveis para a exploração de gás de xisto, tendo por isso que dividir
suas apostas. A pergunta seria para que o Brasil, que tem enormes reservas de
petróleo no pré-sal, e gás não apenas da produção doméstica, mas também dos
acordos com a Bolívia, deve se meter nessa história do gás de xisto (“shale
gas”), que tem fortes impactos ambientais e econômicos na sua exploração. Vale
lembrar que as áreas a serem leiloadas para a produção de gás de xisto envolvem
área contíguas ao chamado Aquífero Guarani, ou no próprio aquífero, o que pode
contaminar as águas (nos EUA, casos variados têm evidenciado essa possibilidade
concreta) e afetar fortemente as possibilidades da produção agrícola em área de
grande produção do agronegócio e da agricultura familiar, envolvendo o Oeste de
Santa Catarina, Oeste do Paraná, Mato Grosso do Sul, Oeste Paulista e outras.
O leilão
do campo de Libra tem ainda mais um agravante. Como foi amplamente divulgado na
mídia internacional, a Petrobrás foi espionada pela Agência de Segurança
Nacional dos Estados Unidos (NSA, sigla em inglês), órgão do governo, e até
pelo governo canadense. É grande o risco de que informações estratégicas da
Petrobrás tenham sido obtidas ilegalmente, tratando, por exemplo, de dados das
análises geológicas dos poços do pré-sal. Isso obviamente beneficiou as
concorrentes da Petrobrás no mercado internacional, o que compromete ainda mais
o leilão.
*Economistas
e técnicos do DIEESE.
Isso não parece realidade, as vezes fico tentando achar uma explicação lógica para o Leilão, mas até agora não encontrei... subjetividades, talvez, coisas que não se pode explicitar... mas aí mora o perigo, pois quando o fato dá margem para interpretações subjetivas, hipóteses... Dá-se a impressão de estar a deriva e neste caso o que conta é o imediato, não adianta mais cartas náuticas, o que importa é salvar a tripulação do naufrágio, parece algo assim... o que está acontecendo com a nossa"bandeira"? bandeira de tantas batalhas, vidas ceifadas, mas vitoriosas... a Petrobras chegou ao topo do mundo e está pronta para coroar o seu feito, seria uma lástima descartar essa oportunidade que veio na hora mais certa, quando o mundo luta para resolver seus caixas, o Brasil tem em suas mãos a maior riqueza, maior do que o ouro e todos os seus recursos naturais exploráveis até aqui. Enfim, não joguemos essa oportunidade fora seria um desatino!
ResponderExcluirCaro Pedro Teixeira,
ExcluirObrigado pelo teu pertinente comentário. É que este é uma tema muito complexo, com muitas dimensões envolvidas. Portanto, a questão tem aspectos econômico, políticos e sociais, todos interagindo com o fenômeno. O entendimento da questão, de fato, exige muita reflexão coletiva.
Abraço. Zé Álvaro .