Mauro Santayama, em seu blog
(JB) -
Vez ou outra, os jornalistas vêm-se obrigados a tocar, repetidas vezes,
nos mesmos assuntos, não pela razão — como dizia o poeta — de querer
fazer um samba de uma nota só mas porque a realidade do país nos impõe,
infelizmente, os mesmos implacáveis fatos, dia a dia, mês a mês, ano a
ano, quase sem interrupção.
A
situação do presídio de Pedrinhas, no Maranhão, com a morte de dezenas
de detentos, no ano passado, e a decapitação de alguns, com direito a
gravação em vídeo, seguida de macabra divulgação na internet, retrata
resistente e trágica mazela que a sociedade brasileira não consegue
vencer nem enfrentar.
Muda o
nome do presídio, da cidade, do estado, mas a situação, o roteiro —
como acontece com os blockbusters de Hollywood — é quase o mesmo.
E o
pior, para a ONU e a Comissão de Direitos Humanos da OEA, o nome do
país, também é quase sempre o mesmo, só muda o mês, o ano e o filme que
está em cartaz.
Tudo
isso ocorre porque, por trás da situação do Sistema Carcerário
Brasileiro, existe outro “sistema”, paralelo, anônimo, ilegal e
suboficial. Esse “sistema” está envolvido com atividades ilegais, que
vão de cartéis para o fornecimento de comida e outros insumos para os
presos à introdução de drogas, armas e celulares nos presídios. Um
“sistema” que se sente confortável como um peixe dentro de lago
profundo, escuro e estanque com o estado atual das nossas prisões.
Talvez
seja essa a razão para que, nos últimos anos — incluídos os de FHC,
Lula e Dilma— pouca coisa tenha mudado em nossas cadeias, e, de modo
geral, para os milhares de detentos que se encontram atrás das grades,
cerca de 40% deles ilegalmente, já que sem terem tido culpa formada ou
reconhecida pela Justiça.
Está faltando um debate mais amplo para discutir o descalabro e as perspectivas do panorama carcerário no Brasil
Acossados
pelo conservadorismo, tanto o PSDB como o PT, no entanto, evitam
aprofundar-se no assunto, embora o tema devesse constar com destaque em
qualquer programa de governo, e esteja faltando um debate mais amplo, e
mais sério, para discutir o presente descalabro, e as perspectivas
futuras, do panorama carcerário no Brasil.
Em
Minas, o governo Anastasia inaugurou, no início de 2013, a primeira
prisão “privada” do país, erguida e administrada por investidores, por
meio de PPP, com celas para quatro presos em regime fechado, ou seis em
regime semiaberto.
O
complexo, com previsão para cerca de 3 mil presos, é gerido por um
agente público, e por um conselho com participação das áreas de
corregedoria, de direitos humanos e da própria comunidade, além do grupo
responsável pela sua construção.
O
senhor Fernando Henrique Cardoso já se manifestou publicamente — mas o
PSDB não assumiu essa bandeira — a favor da descriminalização, assunto
que está na ordem do dia com a regulação da produção e consumo da
maconha no Uruguai, prestes a se transformar na primeira potência
cannábica do planeta, inclusive com a exportação do produto para outros
países, para a produção de medicamentos.
O que
não pode continuar ocorrendo, nem no Maranhão, nem em qualquer outro
estado, ou em prisões federais, é que se tente imputar aos presos a
culpa pela situação.
Preso é preso, e Estado é Estado, assim como seus policiais, funcionários e agentes carcerários.
Querer
culpar o detento por ter acesso a desafetos, celulares, drogas, armas,
dentro da cadeia, quando se sabe que nada entra na cela sem o interesse
ou a cumplicidade de alguém, é o mesmo que insultar a inteligência da
nação.
Afinal,
quem pode mais, pode menos. Quando os agentes do Estado querem — às
vezes até mesmo à revelia das lideranças legalmente constituídas —
invadem arbitrariamente prisões, espancam e torturam presos, massacram
indiscriminadamente detentos como aconteceu no Carandiru.
Sejamos
francos, a morte dos presos de Pedrinhas só chamou a atenção porque o
presídio foi visitado por uma comissão externa ligada ao Ministério
Público, determinada a verificar a situação da população prisional. E
por causa de ataques, fora de seus muros, que atingiram covardemente a
população local.
Se
não fosse isso, a repercussão dos assassinatos de detentos em Pedrinhas
seria zero. A morte de cinquenta ou sessenta presos por ano em um
presídio qualquer não atrapalha em nada o “sistema”. Pelo contrário,
ela é vista, por muitos, dentro e fora dele, como desejável e normal.
Resta
saber se essas mortes, assim como os ataques a inocentes, como a menina
de três anos, queimada dentro de um ônibus, não estão sendo
incentivadas, direta ou indiretamente, e se existe mais alguém, além
dos detentos, interessado em incendiar o Maranhão.
Isso
já ocorreu em São Paulo, não faz muito tempo, com as chacinas — que
mataram dezenas de pessoas — detonadas no rastro dos ataques do PCC, em
2012.
Sempre
que se tenta mudar a vergonhosa situação prisional do Brasil — que
volta a estarrecer o mundo inteiro, neste momento — se está metendo a
mão em perigoso vespeiro, forjado por anos e anos de impunidade e
omissão.
E as
vespas não conhecem outro caminho, para responder a quem mexe com elas,
do que disseminar ao máximo seus enxames e ferrões, espalhando o medo e o
terror.
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