domingo, 26 de janeiro de 2014

Cracolância e os dilemas de Haddad

Por Igor Felippe, no blog Escrevinhador: retirado do blog do Miro

Eleito prefeito de São Paulo, Fernando Haddad estendeu a mão para o governador Geraldo Alckmin. A perspectiva do petista era distensionar as relações com os tucanos, construindo uma clima de “convivência pacífica” em torno de políticas públicas para a cidade.

O sentido geral da postura do prefeito era que, dentro do sistema republicano, não teria sentido duas esferas da federação permanecerem em conflito. De fato, não tem sentido, mas… Um dos objetivos concretos de Haddad era ter Alckmin como um parceiro na implementação do Bilhete Único Mensal, uma das promessas da campanha vitoriosa de 2012.

O primeiro capítulo dessa história aconteceu em junho. Diante das mobilizações crescentes de rua pela revogação do aumento das passagens do transporte público, Haddad não soube lidar. O PT apoiou as lutas do Movimento Passe Livre durante a gestão de Gilberto Kassab. Frente aos protestos dos jovens, o prefeito titubeou.

Não tirou os olhos das “planilhas”, enquanto os protestos cresciam. Mesmo quando não havia dúvidas de que seria necessário baixar as tarifas, Haddad insistiu. Naquele momento, ele parecia estar amarrado a Alckmin. Não queria desrespeitar o acordo que fizera com o governador para a integração ônibus-metrô-trem do Bilhete Único Mensal.

Com isso, ele perdeu uma oportunidade dupla: atender a reivindicação da juventude em luta e dar um xeque mate em Alckmin. Se Haddad tivesse baixado a tarifa do ônibus, a tendência era que o movimento se voltasse contra o governador pela revogação do aumento do metrô e trem.

O desfecho foi o pior possível para o prefeito: Alckmin anunciou a redução das passagens em toda a rede de transporte, ao lado de um Haddad que demonstrava que sofrera uma derrota.

Essa história vive mais um capítulo em torno da Cracolândia.

A Polícia Civil realizou uma operação de guerra na cracolândia, na tarde desta quinta-feira, que terminou em violência contra usuários de crack. Esse tipo de ação tem um sentido inverso da Operação Braços Abertos, lançada pela prefeitura no começo deste ano.

A intervenção de um braço do governo do estado atropelou o programa da prefeitura, que pretende dar dignidade aos dependentes, viabilizando hospedagem, alimentação e emprego para criar condições para que o tratamento clínico dê certo.

Os dependentes de drogas formam um segmento social vulnerável que tem como viga mestra de sustentação o próprio vício. É difícil que saiam da dependência sem ter outras formas de se sustentar. Ou seja, moradia, alimentação e emprego ampliam as condições para o tratamento para sair do vício alcance melhores resultados.

A ação da Polícia Civil prejudica e coloca em risco a Operação Braços Abertos, que foi lançada depois de um trabalho de seis meses na Cracolândia.

O que Haddad fará depois de sofrer um atropelo de um departamento do governo do estado? O prefeito anunciou que “rompeu um diálogo muito produtivo e profícuo que o município tinha com o governo”.

No entanto, o governo do estado não recuou. A Secretaria da Segurança Pública classificou a ação do Denarc (Departamento de Narcóticos) na Cracolândia como “legítima”.

Alckmin não controla a ação de cada um dos policiais que atuam nas ruas, mas indicou o secretário de Segurança, sendo responsável político por seus pronunciamentos e medidas.

Haddad tem duas opções: cobrar um posicionamento firme do governador contra a intervenção do Denarc ou lamentar pelas dificuldades de governar, vendo sua autoridade derreter e sua margem de ação ficar cada vez menor.

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