quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Mito econômico Brasileiro: nunca antes na história do Plano Real a inflação esteve tão perto de sair de controle

O mito econômico da vez no Brasil é o de que nunca antes na história do Plano Real a inflação esteve tão perto de sair do controle (ou que a hiperinflação voltou, obrigando até as pessoas a fazem “compras de mês”. A premissa implícita da narrativa é a de que antes dos governos trabalhistas havia “estabilidade” macroeconômica mantida com muito sacrifício, disciplina e responsabilidade.

Mas fatos não corroboram o mito, que se baseia na confusão entre “fim da hiperinflação” com “estabilidade”.

O grande logro do governo FHC foi a derrota definitiva da hiperinflação (além de ter dado credibilidade à moeda nacional). Essa foi a grande marca do 1º mandato do presidente tucano e lhe valeu a reeleição. O período 1980-1994 foi caracterizado por taxas de inflação anuais, quase sempre na casa dos três dígitos. O último ano do presidente Sarney, 1989, a inflação chegou a 1.972%. Em 1993, já com o presidente Itamar, o IPCA bateu recorde: 2.477%. No ano seguinte, quando o Plano Real foi lançado no 2º semestre, a taxa caiu drasticamente, para 916%.

A receita para lograr tamanho feito, ao contrário do que se pensa, foi amarga, à base de juros altos (taxas de juros básicos sempre acima de 19%), privatizações, liberalização comercial, desemprego, arroxo salarial, e liberalização dos fluxos de capital. Esses custos, no entanto, foram relegados a notas de rodapé da história, diante do sucesso do plano contra a hiperinflação.

Porém, o modelo deu sinais de esgotamento e deixou evidente a sua grande vulnerabilidade a partir de 1998, no último ano do 1º mandato, a partir das sucessivas crises financeiras internacionais que finalmente atingiram o país naquele ano. Dali em diante, a economia do país inaugurou um longo período de INSTABILIDADE que só terminou em 2004.

Dessa história complexa, a narrativa que ficou foi a de que o governo tucano trouxe “estabilidade”, e que a inflação teria sido controlada durante esse período. Não foi.

A partir de 1999, e meio a uma grave crise econômica, já no segundo mandato de FHC, quando a hiperinflação já tinha sido derrotada, foi instituída a política de metas de inflação – que permanece até hoje. A mudança foi turbulenta: o IPCA apresentou elevação considerável e grande volatilidade: a meta foi estourada por três anos seguidos (2001, 2002 e 2003), com tendência de aceleração ano a ano.
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A inflação, portanto, nunca esteve de fato “sob controle” durante o governo FHC.

Os críticos falam que o modelo (o tal “tripé” meta de inflação/câmbio flutuante/superávits primários) foi abandonado ou que tem sido “deturpado” sistematicamente durante o governo Lula e especialmente durante o governo Dilma.

É possível ver no gráfico abaixo que a inflação, no segundo mandato de FHC, foi muito mais elevada que nos períodos seguintes (é importante lembrar que em 1997 e 1998 a inflação já estava abaixo de 6%, então não cola aqui a desculpa da “herança” dos tempos de hiperinflação). De fato, a inflação só ficou sob controle a partir de 2004, tendendo a se estabilizar no curto prazo em torno de 5,5%, acima da meta, mas abaixo do limite. Antes disso (entre 1999 e 2003), porém, a tendência era de inflação crescente.
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Em média, a taxa anual de inflação entre 1999 a 2002 foi de 8,78%. Mas, para os analistas econômicos,  o perigo da volta da inflação veio mesmo durante os mandatos “irresponsáveis” posteriores: no primeiro mandato de Lula (2003-2006), quando a média anual do IPCA foi de 6,43%; depois em seu segundo mandato (2007-2010), quando a inflação anual foi de 5,15%. Ou seja, em oito anos de Lula, a inflação em média foi de 5,79% ao ano.

Agora o alvo da vez é Dilma, que, até agora, em seus três primeiros anos de mandato, entregou uma taxa de inflação anual média de 6% (até novembro). Se cada ponto percentual a mais pode significar um aumento da chance de a hiperinflação voltar, o período em que a hiperinflação esteve mais perto de voltar foi entre 1999 e 2002 e não agora.

Muito terrorismo barulho é feito quando a meta do ano “estoura” durante algum período do ano, no acumulado de 12 meses (como aconteceu em março em junho do ano passado), embora por 10 anos seguidos (desde 2004) o índice tivesse ficado sempre dentro do limite da meta.
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Durante os quatro anos do segundo mandato “responsável” de FHC, a meta foi cumprida apenas uma vez, em 2000. O índice ficou dentro do limite por em 1999. E ESTOUROU por dois anos seguidos (2001 e 2002). Como herança para seu sucessor, FHC deixou uma inflação em dois dígitos (12,53%) em seu último ano.

Sob Lula, a meta de inflação só estourou em seu primeiro ano de mandato (2003). A meta foi cumprida por três vezes (2006, 2007 e 2009) e ficou dentro do limite nos quatro anos restantes (2004, 2005, 2008 e 2010).

Durante a gestão Dilma, a meta para o IPCA ficou dentro do limite da meta em cada um de seus três anos de mandato(2011-2013). Em em nenhum ano meta foi cumprida, mas também em nenhum ano ela estourou o limite. Em resumo: se o “tripé” da política econômico alguma vez foi  ameaçado, ao longo da história do regime de metas, entre 2001 e 2003.

Mas existe uma vítima maior que  Lula, Dilma ou o PT. O ministro da Fazenda, Guido Mantega. Considerado como incompetente pelos críticos, nativos e estrangeiros, o ministro é um injustiçado (pese seus erros e algumas trapalhadas). Não se fala de seu papel na recuperação de 2010, mas sobretudo há uma tendência de ignorar (ou deturpar) os fatos no que tange a seu “legado” no campo da inflação.

Em comparação com seus antecessores, Mantega não faz feio. De fato, foi quando esteve à frente do ministério da Fazenda que o país mais cumpriu as metas de inflação (3 vezes). Sob Mantega, a meta jamais foi estourada, e o IPCA anual médio foi o menor entre dos três ministros da “era do tripé” (5,23%, contra 7,53% de Palocci e 8,78% de Malan).
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Se fosse um campeonato (como às vezes é tratado pelo jornalismo econômico), o ministro seria “o campeão” das metas de inflação. Claro que não é o ministro da economia que faz todo o trabalho: tem o presidente do Banco Central, o próprio presidente da República, toda uma equipe econômica. Mas quem está na berlinda, para o bem ou para o mal, é o ministro da Fazenda. É, por assim dizer, o “capitão” da economia. Nada mais justo, então, colocá-lo no alto do pódio desse “campeonato”.

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