*Daniel dos passos
*José Álvaro de Lima Cardoso
*Adhemar Mineiro
O Brasil foi o país que recebeu o terceiro
maior volume de Investimento Externo Direto (IED) em 2012 entre as economias
emergentes, em um total de US$ 65 bilhões, ficando atrás apenas da China (US$
120 bilhões) e Hong Kong (US$ 72 bilhões). Esse grande volume de IED no Brasil
cobriu o déficit em conta corrente no mesmo ano, que chegou a US$ 54,2 bilhões, equivalente a 2,4% do PIB
(Produto Interno Bruto). Há quem considere os déficits externos naturais,
especialmente em países em desenvolvimento, e que, se estiver sendo coberto com
investimentos estrangeiros diretos, está tudo bem. Mas é difícil aceitar esse tipo de argumento porque déficits em
conta corrente não são “naturais”, mas frutos de políticas e escolhas
concretas. Entre 2003 e 2007 o país apresentou superávit em conta corrente. Os
déficits voltaram em 2008 pelo aumento das importações, pelo pagamento de juros
e das remessas de lucros das empresas internacionais operando no Brasil, que
aumentaram com a crise mundial, pelos gastos de brasileiros no exterior e por
outros pagamentos de serviços (fretes, por exemplo) e foram compensados no
balanço de pagamentos através do crescimento do investimento direto estrangeiro.
O déficit nas contas
externas (conta-corrente ou transações correntes) dos dois primeiros meses do
ano aumentou 105% em relação ao mesmo período do ano anterior, chegando a US$
17,997 bilhões. Entre os componentes das contas externas o fator que mais chama
a atenção é a elevação, no primeiro bimestre, de 221,78% nas remessas de lucros
e dividendos das filiais de transnacionais para as suas matrizes, em relação ao
mesmo período em 2012. Aumentaram também, por parte dessas empresas, os envios
de ganhos especulativos para o exterior, em 103,8% em relação ao primeiro
bimestre de 2012.
Muitos economistas fazem a apologia da
chamada “absorção de poupança externa”, que, na prática, significa capitais em
busca de valorização adquirindo empresas nacionais, como revelam os dados. As vendas de empresas brasileiras bateram um
novo recorde em 2012, com 206 empresas nacionais passando para controle
estrangeiro. Desde 2004, foram 1.296 empresas transferidas para controle de
empresas estrangeiras. Ou seja, estamos financiando déficit com a venda de
empresas nacionais, o que significa mais remessas de lucros
no futuro.
No Brasil nos últimos dez anos as
remessas de lucro para as matrizes de transnacionais (muitas delas estatais)
chegaram a 410 bilhões de dólares[1].
Mas, o pior é que, na indústria, na área de infraestrutura ou de
telecomunicações, quem está financiando o investimento é o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que tem colocado o grosso dos
recursos. Ou seja, dinheiro público financia a maior parte de investimentos em
negócios que, posteriormente, representam o envio de bilhões de dólares para o
exterior. Há inúmeros exemplos, em todo o país, de empreendimentos estrangeiros
financiados com recursos do BNDES.
O que o Brasil ganha com isso? Se o país tem
recursos para financiar empresas transnacionais porque não priorizar empresas
que reinvestirão os seus lucros prioritariamente no Brasil, ou condiciona seus
financiamentos a este objetivo? Desnacionalizar a economia significa perder
competitividade industrial porque as empresas transnacionais que tomam conta de
setores inteiros da economia brasileira, obviamente, não têm maiores
compromissos com os projetos nacionais do país. A abertura e a manutenção de
suas plantas industriais seguem estratégias globais de investimentos e obtenção
de mercados. Se deixar ao sabor das estratégias dessas empresas, a aquisição de
empresas nos países periféricos não significa transferência de tecnologia.
Longe disso, significa continuar dependente de importação de tecnologia, forma
clássica pela qual as transnacionais remetem divisas ao exterior. Além do que,
os setores das empresas que desenvolvem tecnologia são considerados
estratégicos, e por isso ficam normalmente nas próprias matrizes das empresas.
A consequência deste processo é, além disso, piorar a situação das contas externas, já que, 40% do comércio
exterior do país é “intra-firma”, ou seja, entre a matriz de uma transnacional e sua filial no Brasil. Segundo a
Receita Federal o comércio entre filiais de empresas no Brasil é insignificante. Ou seja, as transnacionais estão
determinando, crescentemente, as nossas importações. Ademais, essas empresas também não têm interesse de
exportar produtos industrializados porque, na prática, estariam concorrendo com unidades do próprio grupo
transnacional. Como se sabe, um país com economia inserida de forma dependente no sistema mundial corre o
risco de desindustrialização, dependendo de como as empresas transnacionais que nele atuam definirem a
organização de suas cadeias de produção e seus fornecedores. A distribuição das plantas industriais dos grandes
grupos capitalistas segue as suas lógicas globais, que não levam em conta os interesses de países específicos.
Em qualquer caso, a dependência segue crescendo, e a capacidade de definir estratégias autônomas e alternativas
de desenvolvimento, diminuindo.
*Técnicos do DIEESE.
[1] Ver artigo de Mauro
Santayama, publicado em seu blog em 25/03: “A República e as transnacionais”.
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