30/03/2013 | Brasil,Comunicação,Destaques,Leituras
Por Luiz Carlos Azenha.
Meu advogado, Cesar Kloury, me proíbe de
discutir especificidades sobre a sentença da Justiça carioca que me
condenou a pagar 30 mil reais
ao diretor de Central Globo de Jornalismo, Ali Kamel, supostamente por
mover contra ele uma “campanha difamatória” em 28 posts do Viomundo,
todos ligados a críticas políticas que fiz a Kamel em circunstâncias
diretamente relacionadas à campanha presidencial de 2006, quando eu era
repórter da Globo.
Lembro: eu não era um qualquer, na
Globo, então. Era recém-chegado de ser correspondente da emissora em
Nova York. Fui o repórter destacado para cobrir o candidato tucano
Geraldo Alckmin durante a campanha de 2006. Ouvi, na redação de São
Paulo, diretamente do então editor de economia do Jornal Nacional, Marco
Aurélio Mello, que tinha sido determinado desde o Rio que as
reportagens de economia deveriam ser “esquecidas”– tirar o pé, foi a
frase — porque supostamente poderiam beneficiar a reeleição de Lula.
Vi colegas, como Mariana Kotscho e
Cecília Negrão, reclamando que a cobertura da emissora nas eleições
presidenciais não era imparcial.
Um importante repórter da emissora
ligava para o então ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, dizendo
que a Globo pretendia entregar a eleição para o tucano Geraldo Alckmin.
Ouvi o telefonema. Mais tarde, instado pelo próprio ministro, confirmei o
que era também minha impressão.
Pessoalmente, tive uma reportagem
potencialmente danosa para o então candidato a governador de São Paulo,
José Serra, censurada. A reportagem dava conta de que Serra, enquanto
ministro, tinha autorizado a maior parte das doações irregulares de
ambulâncias a prefeituras.
Quando uma produtora localizou no
interior de Minas Gerais o ex-assessor do ministro da Saúde Serra,
Platão Fischer-Puller, que poderia esclarecer aspectos obscuros sobre a
gestão do ministro no governo FHC, ela foi desencorajada a perseguí-lo,
enquanto todos os recursos da emissora foram destinados a denunciar o
contador do PT Delúbio Soares e o ex-ministro da Saúde Humberto Costa,
este posteriormente absolvido de todas as acusações.
Tive reportagem sobre Carlinhos Cachoeira — muito mais tarde revelado como fonte da revista Veja para escândalos do governo Lula — ‘deslocada’ de telejornal mais nobre da emissora para o Bom Dia Brasil, como pode atestar o então editor Marco Aurélio Mello.
Num episódio específico, fui perseguido
na redação por um feitor munido de um rádio de comunicação com o qual
falava diretamente com o Rio de Janeiro: tratava-se de obter minha
assinatura para um abaixo-assinado em apoio a Ali Kamel sobre a
cobertura das eleições de 2006.
Considero que isso caracteriza assédio
moral, já que o beneficiado pelo abaixo-assinado era chefe e poderia
promover ou prejudicar subordinados de acordo com a adesão.
Argumentei, então, que o comentarista de
política da Globo, Arnaldo Jabor, havia dito em plena campanha
eleitoral que Lula era comparável ao ditador da Coréia do Norte, Kim
Il-Sung, e que não acreditava ser essa postura compatível com a suposta
imparcialidade da emissora. Resposta do editor, que hoje ocupa
importante cargo na hierarquia da Globo: Jabor era o “palhaço” da casa,
não deveria ser levado a sério.
No dia do primeiro turno das eleições,
alertado por colega, ouvi uma gravação entre o delegado da Polícia
Federal Edmilson Bruno e um grupo de jornalistas, na qual eles
combinavam como deveria ser feito o vazamento das fotos do dinheiro que teria sido usado pelo PT para comprar um dossiê contra o candidato Serra.
Achei o assunto relevante e reproduzi uma transcrição — confesso, defeituosa pela pressa – no Viomundo.
Fui advertido por telefone pelo atual
chefão da Globo, Carlos Henrique Schroeder, de que não deveria ter
revelado em meu blog pessoal, hospedado na Globo.com, informações
levantadas durante meu trabalho como repórter da emissora.
Contestei: a gravação, em minha opinião,
era jornalisticamente relevante para o entendimento de todo o contexto
do vazamento, que se deu exatamente na véspera do primeiro turno.
Enojado com o que havia testemunhado ao
longo de 2006, inclusive com a represália exercida contra colegas —
dentre os quais Rodrigo Vianna, Marco Aurélio Mello e Carlos Dornelles —
e interessado especialmente em conhecer o mundo da blogosfera — pedi
antecipadamente a rescisão de meu contrato com a emissora, na qual
ganhava salário de alto executivo, com mais de um ano de antecedência,
assumindo o compromisso de não trabalhar para outra emissora antes do
vencimento do contrato pelo qual já não recebia salário.
Ou seja, fiz isso apesar dos grandes danos para minha carreira profissional e meu sustento pessoal.
Apesar das mentiras, ilações e tentativas de assassinato de caráter, perpretradas pelo jornal O Globo* e colunistas associados de Veja, friso: sempre vivi de meu salário. Este site sempre foi mantido graças a meu próprio salário de jornalista-trabalhador.
O objetivo do Viomundo sempre
foi o de defender o interesse público e os movimentos sociais,
sub-representados na mídia corporativa. Declaramos oficialmente: não
recebemos patrocínio de governos ou empresas públicas ou estatais, ao
contrário da Folha, de O Globo ou do Estadão. Nem do governo federal, nem de governos estaduais ou municipais.
Porém, para tudo existe um limite. A
ação que me foi movida pela TV Globo (nominalmente por Ali Kamel) me
custou R$ 30 mil reais em honorários advocatícios.
Fora o que eventualmente terei de gastar
para derrotá-la. Agora, pensem comigo: qual é o limite das Organizações
Globo para gastar com advogados?
O objetivo da emissora, ainda que por
vias tortas, é claro: intimidar e calar aqueles que são capazes de
desvendar o que se passa nos bastidores dela, justamente por terem
fontes e conhecimento das engrenagens globais.
Sou arrimo de família: sustento mãe,
irmão, ajudo irmã, filhas e mantenho este site graças a dinheiro de meu
próprio bolso e da valiosa colaboração gratuita de milhares de leitores.
Cheguei ao extremo de meu limite
financeiro, o que obviamente não é o caso das Organizações Globo, que
concentram pelo menos 50% de todas as verbas publicitárias do Brasil,
com o equivalente poder político, midiático e lobístico.
Durante a ditadura militar, implantada com o apoio das Organizações Globo, da Folha e do Estadão —
entre outros que teriam se beneficiado do regime de força — houve uma
forte tentativa de sufocar os meios alternativos de informação, dentre
os quais destaco os jornais Movimento e Pasquim.
Hoje, através da judicialização de
debate político, de um confronto que leva para a Justiça uma disputa
entre desiguais, estamos fadados ao sufoco lento e gradual.
E, por mais que isso me doa
profundamente no coração e na alma, devo admitir que perdemos. Não no
campo político, mas no financeiro. Perdi. Ali Kamel e a Globo venceram.
Calaram, pelo bolso, o Viomundo.
Estou certo de que meus queridíssimos leitores e apoiadores encontrarão alternativas à altura. O certo é que as Organizações Globo,
uma das maiores empresas de jornalismo do mundo, nominalmente
representadas aqui por Ali Kamel, mais uma vez impuseram seu monopólio
informativo ao Brasil.
Eu os vejo por aí.
PS do Viomundo: Vem aí
um livro escrito por mim com Rodrigo Vianna, Marco Aurelio Mello e
outras testemunhas — identificadas ou não — narrando os bastidores da
cobertura da eleição presidencial de 2006 na Globo, além de retratar
tudo o que vocês testemunharam pessoalmente em 2010 e 2012.
PS do Viomundo 2: *Descreverei detalhadamente, em breve, como O Globo e associados tentaram praticar comigo o tradicional assassinato de caráter da mídia corporativa brasileira.
Fonte: Viomundo
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