domingo, 18 de maio de 2014

A fortuna dos Marinho e a grande batalha que se avizinha

Enviado por Miguel do Rosário         transcrito do site Vale Pensar

"A mídia amanheceu quinta-feira anunciando, difundindo e cobrindo manifestações no Brasil inteiro. É a chamada "quinta-feira negra da Copa", durante a qual movimentos sociais, alguns sérios outros nem tanto, tentaram chamar a atenção para os problemas nacionais.

A história, como se sabe, tem o hábito da ironia. Coube a ela produzir uma interessante coincidência. Na véspera dessas manifestações, a revista [norte-americana] "Forbes" divulgou a lista das 15 famílias mais ricas do país.

No topo delas, encontra-se a família Marinho, proprietária do maior conglomerado de mídia da América Latina e talvez o maior do mundo ainda sob controle estritamente familiar.

A concentração das nossas riquezas agora tem nome e sobrenome. Não é mais uma tese acadêmica. Essas quinze famílias amealham hoje um patrimônio total de R$ 271,26 bilhões.

Os Marinho se destacam no ranking, com 23% do total, contra 16% para o segundo colocado e 12% para o terceiro.



Os Marinho antes não figuravam em primeiro lugar porque a "Forbes" não tinha o hábito de juntar as fortunas de familiares numa só conta. Até que eles perceberam que o Brasil tem a característica de que suas principais empresas permanecem familiares.

O controle familiar acrescenta uma nota mórbida ao que representa a "Globo" no país. É a concentração absoluta de poder. Eles são hegemônicos na mídia, na economia… e no gerenciamento de uma fortuna de proporções nababescas.

Não é mais possível, hoje, para ativistas e movimentos sociais que lutam para transformar o Brasil, omitir-se em relação à concentração estapafúrdia de dinheiro em mãos de tão poucas famílias.

O Brasil precisa de uma lei que imponha um imposto pesado sobre as grandes fortunas do país. Assim como há nos EUA e na Europa.

A fortuna dos Marinho, além disso, evidencia que os interesses econômicos e políticos da grande mídia brasileira jamais serão os do povo.

A hegemonia midiática da "Globo" é possivelmente o maior fator de desequilíbrio e desigualdade políticas presente em nossa democracia. Qualquer grupo político que tenha a preferência da "Globo" terá uma vantagem dupla: financeira e midiática.

É justamente isso que estamos assistindo. A "Globo", mais uma vez, se posiciona de maneira clara. Seus braços midiáticos estão trabalhando, diuturnamente, para derrotar o projeto popular iniciado por Lula em 2003. Não lhes interessa que nunca tenham ganho tanto dinheiro. Eles já têm o poder midiático, já têm o poder financeiro. Só lhes falta o poder político direto. Eles querem alguém de absoluta confiança ocupando o Planalto. Alguém deles, com quem possam trocar confidências, com quem possam almoçar e contar piadas.

Diante da fortuna dos Marinho, vemos o quanto é ridículo a tentativa de vender à opinião pública a existência de uma “elite sindical”. Aliás, diante da fortuna dos Marinho, vemos a importância essencial de sindicatos e centrais para a existência de uma bancada mínima parlamentar que represente os trabalhadores. Como um brasileiro poderia alcançar a representação política no país assumindo posições políticas independentes da "Globo"?

É por isso que eles odeiam Lula.

Agora, também entendemos o “pacto” tácito entre Lula e "Globo". Foi um pacto entre adversários.

Pacto que permitiu Lula governar e distribuir renda e à "Globo" continuar amealhando dinheiro. PT e "Globo" cresceram nos últimos anos, como dois exércitos que acumulam forças enquanto esperam a próxima grande batalha entre si.

As eleições deste ano serão essa grande batalha. E não será a última.

A fortuna dos Marinho ajuda a botar lenha no debate sobre a democratização da mídia. Mais que nunca, está claro que essa é necessária para a consolidação da nossa democracia, a qual, evidentemente, está em risco se há uma família que controla, sozinha, a mídia, o dinheiro e a política de um país.

Agora, sabemos quanto rendeu o “mensalão”. Enquanto a "Globo" satanizava a classe política, seus donos ganhavam uma quantidade de dinheiro que fazem qualquer "caixa 2" partidário parecer um grão de areia [e ainda mais não pagando os impostos devidos, apropriação de dinheiro público].


globo-darf-2
[imagem obtida no blog "Tijolaço"]


Agora, sabemos que o poder corruptor da "Globo" é algo além da imaginação. Agora entendemos porque Joaquim Barbosa, presidente do STF, pôs seu filho para trabalhar na emissora e passou a frequentar convescotes de Luciano Huck. Agora, entendemos porque Ayres Britto, ex-presidente do STF, assinou prefácio do livro de Merval Pereira e assumiu a presidência do "Instituto Innovare", da "Globo".

Agora, entendemos a campanha da "Globo" para glorificar Joaquim Barbosa e detonar Lewandowski.

A "Globo" cuida, como sempre, de seu bolso.

A "Globo" explorou os preconceitos do povo (no qual incluo a classe média) para vender a ideia de que o julgamento do mensalão, pela primeira vez na história do Brasil, “prendeu poderosos”. Ora, ao vermos a fortuna dos Marinho e olharmos para José Genoíno, como evitar uma sombria e nervosa gargalhada interior? Que espécie de "poderosos" são esses cuja fortuna de uma vida inteira não daria sequer para comprar a graxa dos sapatos usados pela família Marinho?

A concentração de mídia, dinheiro e poder é um problema muito maior que a corrupção, porque implica na destruição dos fundamentos de uma democracia, segundo o qual o poder deve emanar do povo, da maioria da população. A democracia implica, naturalmente, também em regras que protejam o direito das minorias e filtrem as paixões mórbidas do povo.

Explorar os preconceitos populares, como fez a nossa mídia durante a cobertura do mensalão, foi um tremendo mal ao processo democrático.

As pessoas que pensam a política no Brasil não têm mais o direito de omitir-se em relação ao risco democrático inerente ao descomunal poder midiático e financeiro da "Globo". Lideranças de movimentos sociais, de partidos, de sindicatos, intelectuais progressistas, terão de ser muito mais atentos.

O PT e o governo federal, por sua vez, terão de refletir profundamente sobre esse caso. Uma redistribuição profunda das verbas publicitárias se faz premente, porque não é possível continuar alimentando um monstro que não apresenta um risco somente para o PT, mas para a própria democracia.

Não querem dar nada à imprensa alternativa, tudo bem. Mas não dêem para a "Globo". Criem uma portaria qualquer que obrigue concessões públicas a veicularem gratuitamente os anúncios de cunho institucional.

Pensem na democracia, pelo amor de Deus!

A única solução é a internet. Estive relendo uma matéria publicada ano passado no "Viomundo", com uma entrevista com Helena Chagas, e voltei a ficar estarrecido com o desprezo dela por uma política de desconcentração e pluralidade das verbas federais voltadas para a publicidade.

Claro, a culpa não é dela. Trata-se de uma visão do PT e da própria Dilma. Mas agora temos dados reais. A política de concentração de verbas, incentivada pelo conceito de "mídia técnica", ajudou a criar esse monstro. Uma fortuna tão desproporcional em relação ao tamanho da economia brasileira, em mãos de uma família que controla o principal conglomerado de mídia no país, significa risco altíssimo à democracia, porque o poder corruptor do dinheiro se soma ao poder manipulador da informação.

A mídia, em qualquer país, responde pela representação do nosso imaginário. Agora, entendo porque jamais se fizeram (ou se fez tão poucos) filmes ou livros sobre a mídia.

Lima Barreto se deu mal quando lançou "Memórias do Escrivão Isaías Caminha", no qual denunciava um jornal fictício chamado… "O Globo"! O escritor se baseou em sua experiência no "Correio da Manhã". "O Globo" ainda não havia sido fundado quando escreveu o livro, mas a coincidência dos nomes tem um quê de visionária.

Depois daquele livro, Barreto entrou na lista negra da mídia carioca e nunca mais trabalhou em jornal nenhum. Ficou sem renda da noite para o dia, apesar de ser um dos maiores escritores vivos da época. Cem anos depois, o drama se repete, mas em proporções infinitamente maiores. E o que está em risco não é mais a segurança financeira de um pobre escritor carioca, mas sim a de um país inteiro, à mercê dos caprichos de uma família multibilionária e seus fantoches na política e no Judiciário.

FONTE: escrito pelo jornalista Miguel do Rosário em seu blog "O Cafezinho"  (http://www.ocafezinho.com/2014/05/15/a-fortuna-dos-marinho-e-a-grande-batalha-que-se-avizinha/).[Título e trechos entre colchetes adicionados por este blog 'democracia&política'].

Nenhum comentário:

Postar um comentário