Enviado por Miguel do Rosário transcrito do site Vale Pensar
"A
mídia amanheceu quinta-feira anunciando, difundindo e cobrindo
manifestações no Brasil inteiro. É a chamada "quinta-feira negra da
Copa", durante a qual movimentos sociais, alguns sérios outros nem
tanto, tentaram chamar a atenção para os problemas nacionais.
A
história, como se sabe, tem o hábito da ironia. Coube a ela produzir uma
interessante coincidência. Na véspera dessas manifestações, a revista
[norte-americana] "Forbes" divulgou a lista das 15 famílias mais ricas
do país.
No topo delas, encontra-se a família Marinho,
proprietária do maior conglomerado de mídia da América Latina e talvez o
maior do mundo ainda sob controle estritamente familiar.
A
concentração das nossas riquezas agora tem nome e sobrenome. Não é mais
uma tese acadêmica. Essas quinze famílias amealham hoje um patrimônio
total de R$ 271,26 bilhões.
Os Marinho se destacam no ranking, com 23% do total, contra 16% para o segundo colocado e 12% para o terceiro.
Os
Marinho antes não figuravam em primeiro lugar porque a "Forbes" não
tinha o hábito de juntar as fortunas de familiares numa só conta. Até
que eles perceberam que o Brasil tem a característica de que suas
principais empresas permanecem familiares.
O controle familiar
acrescenta uma nota mórbida ao que representa a "Globo" no país. É a
concentração absoluta de poder. Eles são hegemônicos na mídia, na
economia… e no gerenciamento de uma fortuna de proporções nababescas.
Não
é mais possível, hoje, para ativistas e movimentos sociais que lutam
para transformar o Brasil, omitir-se em relação à concentração
estapafúrdia de dinheiro em mãos de tão poucas famílias.
O Brasil precisa de uma lei que imponha um imposto pesado sobre as grandes fortunas do país. Assim como há nos EUA e na Europa.
A
fortuna dos Marinho, além disso, evidencia que os interesses econômicos
e políticos da grande mídia brasileira jamais serão os do povo.
A
hegemonia midiática da "Globo" é possivelmente o maior fator de
desequilíbrio e desigualdade políticas presente em nossa democracia.
Qualquer grupo político que tenha a preferência da "Globo" terá uma
vantagem dupla: financeira e midiática.
É justamente isso que
estamos assistindo. A "Globo", mais uma vez, se posiciona de maneira
clara. Seus braços midiáticos estão trabalhando, diuturnamente, para
derrotar o projeto popular iniciado por Lula em 2003. Não lhes interessa
que nunca tenham ganho tanto dinheiro. Eles já têm o poder midiático,
já têm o poder financeiro. Só lhes falta o poder político direto. Eles
querem alguém de absoluta confiança ocupando o Planalto. Alguém deles,
com quem possam trocar confidências, com quem possam almoçar e contar
piadas.
Diante da fortuna dos Marinho, vemos o quanto é ridículo a
tentativa de vender à opinião pública a existência de uma “elite
sindical”. Aliás, diante da fortuna dos Marinho, vemos a importância
essencial de sindicatos e centrais para a existência de uma bancada
mínima parlamentar que represente os trabalhadores. Como um brasileiro
poderia alcançar a representação política no país assumindo posições
políticas independentes da "Globo"?
É por isso que eles odeiam Lula.
Agora, também entendemos o “pacto” tácito entre Lula e "Globo". Foi um pacto entre adversários.
Pacto
que permitiu Lula governar e distribuir renda e à "Globo" continuar
amealhando dinheiro. PT e "Globo" cresceram nos últimos anos, como dois
exércitos que acumulam forças enquanto esperam a próxima grande batalha
entre si.
As eleições deste ano serão essa grande batalha. E não será a última.
A
fortuna dos Marinho ajuda a botar lenha no debate sobre a
democratização da mídia. Mais que nunca, está claro que essa é
necessária para a consolidação da nossa democracia, a qual,
evidentemente, está em risco se há uma família que controla, sozinha, a
mídia, o dinheiro e a política de um país.
Agora, sabemos quanto
rendeu o “mensalão”. Enquanto a "Globo" satanizava a classe política,
seus donos ganhavam uma quantidade de dinheiro que fazem qualquer "caixa
2" partidário parecer um grão de areia [e ainda mais não pagando os impostos devidos, apropriação de dinheiro público].
[imagem obtida no blog "Tijolaço"]
Agora, sabemos que o
poder corruptor da "Globo" é algo além da imaginação. Agora entendemos
porque Joaquim Barbosa, presidente do STF, pôs seu filho para trabalhar
na emissora e passou a frequentar convescotes de Luciano Huck. Agora,
entendemos porque Ayres Britto, ex-presidente do STF, assinou prefácio
do livro de Merval Pereira e assumiu a presidência do "Instituto
Innovare", da "Globo".
Agora, entendemos a campanha da "Globo" para glorificar Joaquim Barbosa e detonar Lewandowski.
A "Globo" cuida, como sempre, de seu bolso.
A "Globo" explorou os preconceitos do povo (no qual incluo a classe média) para vender a ideia de que o julgamento do mensalão, pela primeira vez na história do Brasil, “prendeu poderosos”.
Ora, ao vermos a fortuna dos Marinho e olharmos para José Genoíno, como
evitar uma sombria e nervosa gargalhada interior? Que espécie de
"poderosos" são esses cuja fortuna de uma vida inteira não daria sequer
para comprar a graxa dos sapatos usados pela família Marinho?
A
concentração de mídia, dinheiro e poder é um problema muito maior que a
corrupção, porque implica na destruição dos fundamentos de uma
democracia, segundo o qual o poder deve emanar do povo, da maioria da
população. A democracia implica, naturalmente, também em regras que
protejam o direito das minorias e filtrem as paixões mórbidas do povo.
Explorar
os preconceitos populares, como fez a nossa mídia durante a cobertura
do mensalão, foi um tremendo mal ao processo democrático.
As
pessoas que pensam a política no Brasil não têm mais o direito de
omitir-se em relação ao risco democrático inerente ao descomunal poder
midiático e financeiro da "Globo". Lideranças de movimentos sociais, de
partidos, de sindicatos, intelectuais progressistas, terão de ser muito
mais atentos.
O PT e o governo federal, por sua vez, terão de
refletir profundamente sobre esse caso. Uma redistribuição profunda das
verbas publicitárias se faz premente, porque não é possível continuar
alimentando um monstro que não apresenta um risco somente para o PT, mas
para a própria democracia.
Não querem dar nada à imprensa
alternativa, tudo bem. Mas não dêem para a "Globo". Criem uma portaria
qualquer que obrigue concessões públicas a veicularem gratuitamente os
anúncios de cunho institucional.
Pensem na democracia, pelo amor de Deus!
A única solução é a internet. Estive relendo uma matéria publicada ano passado no "Viomundo",
com uma entrevista com Helena Chagas, e voltei a ficar estarrecido com o
desprezo dela por uma política de desconcentração e pluralidade das
verbas federais voltadas para a publicidade.
Claro, a culpa não é
dela. Trata-se de uma visão do PT e da própria Dilma. Mas agora temos
dados reais. A política de concentração de verbas, incentivada pelo
conceito de "mídia técnica", ajudou a criar esse monstro. Uma fortuna
tão desproporcional em relação ao tamanho da economia brasileira, em
mãos de uma família que controla o principal conglomerado de mídia no
país, significa risco altíssimo à democracia, porque o poder corruptor
do dinheiro se soma ao poder manipulador da informação.
A mídia, em qualquer país, responde pela representação do nosso imaginário. Agora, entendo porque jamais se fizeram (ou se fez tão poucos) filmes ou livros sobre a mídia.
Lima
Barreto se deu mal quando lançou "Memórias do Escrivão Isaías Caminha",
no qual denunciava um jornal fictício chamado… "O Globo"! O escritor se
baseou em sua experiência no "Correio da Manhã". "O Globo" ainda não
havia sido fundado quando escreveu o livro, mas a coincidência dos nomes
tem um quê de visionária.
Depois daquele livro, Barreto entrou
na lista negra da mídia carioca e nunca mais trabalhou em jornal nenhum.
Ficou sem renda da noite para o dia, apesar de ser um dos maiores
escritores vivos da época. Cem anos depois, o drama se repete, mas em
proporções infinitamente maiores. E o que está em risco não é mais a
segurança financeira de um pobre escritor carioca, mas sim a de um país
inteiro, à mercê dos caprichos de uma família multibilionária e seus
fantoches na política e no Judiciário.
FONTE: escrito
pelo jornalista Miguel do Rosário em seu blog "O Cafezinho"
(http://www.ocafezinho.com/2014/05/15/a-fortuna-dos-marinho-e-a-grande-batalha-que-se-avizinha/).[Título
e trechos entre colchetes adicionados por este blog
'democracia&política'].
Nenhum comentário:
Postar um comentário