quarta-feira, 19 de março de 2014
Alternativas brasileiras
Por Samuel Pinheiro Guimarães no sitio da Fundação Rosa Luxemburgo
A alternativa política
1. As alternativas brasileiras constituem um complexo de desafios políticos, econômicos, sociais e internacionais que não podem ser bem compreendidos nem enfrentados se não se reconhecer a sua interelação.
2. O principal desafio do desenvolvimento brasileiro é de natureza política.
3. A sociedade e o Estado brasileiros são o que são devido à enorme concentração de poder político (fenômeno em que se deve incluir o controle, por poucas famílias, dos meios de comunicação de massa) em um número muito reduzido de indivíduos que tem o poder, pela sua força econômica e política, de organizar a sociedade e o Estado, em seu benefício.
4. Em um sistema social de democracia liberal conjugada a um regime capitalista, na esfera econômica o poder dos indivíduos para decidir o que se deve produzir e consumir depende do seu poder econômico, isto é, de sua riqueza, de sua renda.
5. No mercado, a cada unidade monetária corresponde um “voto”. Assim, o poder de decisão econômica de um milionário, hoje em dia chamado, eufemisticamente, de investidor, de banqueiro, ou de empresário, é incomensuravelmente maior do que o poder econômico de um indivíduo de classe média e ainda muito maior do que o de um trabalhador.
6. Todavia, neste sistema, na esfera da democracia liberal, cada cidadão, independente de sua riqueza, tem um voto. Porém, é o conjunto desses votos que vai escolher os cidadãos que vão elaborar as leis e executá-las, inclusive as leis que definem os parâmetros da atividade econômica, as medidas de sua execução e os programas do Governo de aplicação dos tributos. Assim ocorre com as leis sobre a propriedade da terra, tributos, bancos e sistema financeiro, os programas sociais e de apoio (crédito, isenções, subsídios ) às empresas etc etc.
7. Assim, para as classes hegemônicas, de que participam os detentores da riqueza nacional, uma questão essencial é a de como transformar seu poder econômico em poder político.
8. Os debates sobre o voto obrigatório ou voluntário; o financiamento público ou privado das campanhas políticas; o “caixa dois”; o voto distrital, proporcional ou em lista; estão todos relacionados a esta questão central, pois a questão jurídico-política da legislação eleitoral é fundamental para a definição do poder.
9. A concentração de poder político e econômico no Brasil decorre, historicamente, da escravidão, do sistema do latifúndio que tem sua origem nas sesmarias, na Lei de Terras de 1850, e na concessão de terras devolutas, e na discriminação contra os pobres, os afrodescendentes e as mulheres e que se perpetuou e se perpetua através de mecanismos jurídicos e políticos, tais como, a título de exemplo, o perdão periódico das dívidas dos grandes proprietários rurais, a tributação regressiva, a leniência com a evasão de tributos, o parcelamento periódico de dívidas tributárias, os empréstimos agrícolas e industriais a juros altamente subsidiados, a violência policial, o voto (aberto) de “cabresto” até 1932, a influência do poder econômico nas eleições, a leniência com o oligopólio da media etc.
10. Até 1932, as mulheres não tinham o direito de voto; até 1985, os analfabetos, que eram cerca de 40% da população, não podiam votar; de 1964 a 1985, quando vivemos o regime civil-militar autoritário, todos os brasileiros não podiam votar para Presidente e Governadores e para muitas prefeituras, sendo que milhares de políticos, sindicalistas, intelectuais, estudantes e militares de orientação política de esquerda tiveram seus direitos políticos cassados e muitos foram torturados e mortos.
11. Hoje, somente 10% do Congresso Nacional é composto por mulheres, sendo elas 51% da população; os representantes de trabalhadores urbanos e rurais não chegam a 20% enquanto que os afrodescendentes, na melhor das interpretações, não chegam a 10% do total dos parlamentares.
12. Enquanto isto ocorre a “bancada” ruralista tem mais de 200 integrantes, sendo numerosas as “bancadas” da saúde (representantes de donos de hospitais, empresas de saúde etc), da educação (representantes dos donos de colégios e universidades privadas e religiosas) e das comunicações (representantes dos proprietários de rádios, televisões, jornais etc).
13. O sistema político brasileiro está longe de ser democrático na medida em que a população somente participa da administração do seu Estado através de eleições periódicas, influenciadas pelos diversos setores do poder econômico que financiam as campanhas de candidatos, que serão seus “representantes”, tanto para o Poder Legislativo quanto para o Poder Executivo. Após as eleições, os eleitores pouco ou nada podem participar do processo de elaboração de leis ou do processo de formulação e execução das políticas públicas. A organização das conferências nacionais, sobre os mais diversos temas, a partir do Governo do Presidente Lula, foi um passo importante para ampliar a participação popular na política, assim como foi um passo importante mas de difícil execução a possibilidade de promover leis de iniciativa popular. Nada comparável, todavia, ao poder dos grupos de pressão em sua ação permanente junto ao Executivo, ao Legislativo e ao Judiciário.
14. O sistema político brasileiro, que tantos progressos fez nos últimos quase trinta anos em direção a uma democracia efetiva, inclusive devido aos esforços de inclusão dos excluídos, pode ser, ainda, todavia, classificado como plutocrático que, na definição de Aristóteles, significa o governo dos ricos.
15. A grande alternativa do desenvolvimento político brasileiro é ou se resignar a este sistema político e econômico, que concentra renda, riqueza e poder, e nele fazer, a duras penas, ajustes superficiais; ou tentar transformar este sistema plutocrático em um sistema verdadeiramente democrático, em uma moldura jurídica atual de democracia formal, em que os instrumentos de mudança se encontram, em grande parte, no Legislativo nas mãos de “representantes” daqueles que concentram o poder econômico e não tem o menor interesse em perder o seu poder sobre os mecanismos normativos que disciplinam as atividades econômicas e, portanto, a distribuição da riqueza.
16. A solução para esta alternativa político/econômica é articular uma campanha para aprovação de uma emenda constitucional que determine a convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte ampla e exclusiva, isto é, composta por indivíduos eleitos exclusivamente para elaborar uma Constituição, através de eleições com financiamento público e igualdade de tempo na televisão e nos meios de radiodifusão para todos os candidatos, que trate de forma efetiva de temas tais como a democratização dos meios de comunicação, a revogação de mandatos pelo povo, o plebiscito e o referendo.
A alternativa econômica
17. A atual crise da economia internacional e a emergência simultânea da China como a nova fronteira de capitalismo e, principal centro manufatureiro internacional, com extraordinária demanda por minérios e por alimentos e extraordinária capacidade de exportação de produtos industriais, se encontram na base da atual alternativa de políticas para o desenvolvimento econômico brasileiro.
18. A crise econômica nos países altamente industrializados faz com que estes procurem escapar dela através de medidas que afetam profundamente o Brasil:
a. a redução das taxas de juros, a níveis às vezes até negativos, para estimular os investimentos tornou mais atrativos aqueles mercados financeiros onde as taxas de juros são elevadas, como é o caso do Brasil;
b. a política de emissão de moeda para socorrer entidades financeiras em dificuldades, inclusive para resgatar títulos “derivativos” em sua posse e “limpar” o mercado, provoca um movimento permanente de desvalorização do dólar e do euro nos mercados cambiais, inclusive em relação ao Real;
c. os programas governamentais dos países desenvolvidos de estímulo às exportações, em especial de produtos industriais, e as medidas de restrição às importações, como instrumentos de reativação da atividade econômica, afetam a balança comercial brasileira.
19. A extraordinária demanda chinesa por minérios e produtos agrícolas provocou uma alta significativa de preços internacionais dessas commodities e, portanto, receitas extraordinárias de divisas para os países capazes de exportar esses produtos, como é o caso do Brasil.
20. Ao ingresso de divisas decorrentes do aumento do valor das exportações de produtos primários, somou-se o ingresso de dólares causado, em primeiro lugar, pela política de alívio quantitativo (quantitative easing) do Governo americano que emite 75 bilhões de dólares por mês para comprar títulos públicos e derivativos que estão na posse dos bancos privados; em segundo lugar, pela emissão de euros pelo Banco Central Europeu; e, em terceiro lugar, pelo ingresso de divisas devido às oportunidades de investimentos mais lucrativos.
21. A esses fatores se deve somar a política do Banco Central, que faz com que o Brasil tenha uma das mais altas taxas de juros do mundo, o que atrai capitais especulativos e voláteis de todas as partes.
22. Esta situação faz com que o Real tenda, permanentemente, a se valorizar e, assim, a tornar mais baratas as importações, em especial de produtos industriais, mais baratas as despesas dos turistas brasileiros no exterior, e mais baratas as remessas de lucros e todo tipo de pagamentos ao exterior.
23. De outro lado, o Real valorizado torna mais difíceis as exportações brasileiras que ficam menos lucrativas em Reais e faz com que o Brasil seja um destino turístico menos atraente.
24. A esta situação cambial se soma o efeito dos baixíssimos preços, reais ou artificiais, das importações de produtos industriais de consumo e de bens de capital provenientes da China e também o efeito dos esforços de promoção de suas exportações e de redução de importações dos países altamente industrializados, isto é, dos Estados Unidos e da Europa Ocidental, como forma de reduzir os efeitos domésticos de suas crises econômicas.
25. Este conjunto de situações contribui para a desindustrialização, a desnacionalização e a “reprimarização” da economia brasileira, pois:
a. torna mais lucrativos os investimentos, tanto nacionais como estrangeiros, no agronegócio, na mineração, no setor financeiro e no setor de serviços, inclusive de saúde e educação, que não sofrem a concorrência estrangeira, e menos atraentes os investimentos no setor industrial;
b. torna crescente a participação das importações de produtos industriais no total do consumo doméstico brasileiro;
c. torna crescente a participação de partes e peças importadas nas cadeias produtivas brasileiras;
d. torna mais fácil a aquisição de empresas brasileiras, fragilizadas, por empresas estrangeiras;
e. torna a pauta brasileira de exportações cada vez mais constituída por produtos primários e, portanto, faz com que a volatilidade das receitas de exportação se torne maior.
26. A primeira alternativa para o desenvolvimento econômico é a seguinte:
1. executar uma política econômica:
a. que aceite, implicitamente, as recomendações do Consenso de Washington, tais como
• equilíbrio orçamentário
• abertura indiscriminada, sem controle e disciplina, ao capital estrangeiro
• privatização
• ausência de controle dos fluxos de capital
• prioridade para o pagamento do serviço da dívida pública
• prioridade absoluta ao controle da inflação, sem consideração para com os níveis de emprego e de crescimento.
b. que aceite taxas de crescimento baixas, ainda que isto signifique um aumento da distância econômica entre o Brasil e os países desenvolvidos de dimensões semelhantes, o que acarreta o aumento do subdesenvolvimento;
c. que priorize o pagamento do serviço da dívida pública em relação aos investimentos, o que significa uma transferência de recursos públicos originados dos impostos cobrados da maioria da população para os detentores desses títulos que são os segmentos mais ricos da população, o que aumenta a concentração de riqueza;
d. que não privilegie nem proteja o desenvolvimento e a integração da estrutura industrial brasileira;
e. que não estabeleça condições para os investimentos estrangeiros que se destinam ao Brasil em busca de lucros extraordinários decorrentes dos baixos salários e de situações de oligopólio;
f. que confia em que o Brasil pode se tornar permanentemente um grande exportador competitivo de commodities e com as divisas obtidas, importar todos os bens de consumo e de produção que forem demandados pela sociedade;
g. que priorize acima de tudo o controle da inflação e não receie tornar o Brasil mais uma vítima da “doença holandesa”;
ou
2. adotar uma política de crescimento econômico acelerado capaz de utilizar de forma mais plena e eficiente os recursos de trabalho, de capital e de recursos naturais da sociedade brasileira e, assim, reduzir a distância entre o Brasil e os países altamente desenvolvidos através das seguintes medidas:
a. aproveitar a atual situação, que pode se revelar temporária, de elevados preços para os produtos primários e de forte demanda da China para estabelecer impostos de exportação e, com a receita desses impostos, criar fundos específicos para financiar investimentos que visem à transformação industrial desses produtos primários, agregando valor, e desenvolvam a infraestrutura das regiões onde são produzidos;
b. privilegiar as importações de bens de capital e desestimular as importações de bens de consumo suntuário;
c. disciplinar o capital estrangeiro de modo que venha ele a ampliar a capacidade instalada no Brasil e contribuir para a diversificação das exportações e para o desenvolvimento tecnológico;
d. taxar de forma diferenciada de acordo com o prazo de sua permanência no Brasil os fluxos de capital especulativo;
e. aumentar, em coordenação com os sócios do Mercosul, os impostos de importação até o limite das tarifas consolidadas no GATT-94 e estabelecer impostos específicos nos casos de preços de importação notavelmente inferiores aos preços praticados no mercado internacional;
f. garantir a realização dos investimentos, de natureza estratégica, pelo Estado nas áreas de energia e de transporte quando não houver interesse das empresas privadas;
g. estabelecer metas de emprego e de crescimento a serem obedecidas em conjunto com as metas de inflação.
A alternativa social
27. A partir de 2003, os êxitos dos programas brasileiros de combate à fome, à miséria e a desigualdade de gênero e de origem étnica, que resultaram em maior inclusão social, são notáveis e são reconhecidos tanto pelos organismos internacionais como pelos países dos mais diferentes continentes.
28. Todavia, ainda resta muito a fazer como indica o fato de que 13,7 milhões de famílias, cerca de 55 milhões de brasileiros, um quarto da população do país, são beneficiários do Programa Bolsa Família, isto é, integram famílias cuja renda per capita mensal é inferior a 70 reais, isto é, um total de 280 reais para uma família média de quatro membros.
29. A gravidade deste fato pode ser medida quando se considera que o valor do salário mínimo por trabalhador no Brasil é de 724 reais e que, portanto, uma família em que dois adultos ganhem, cada um, um salário mínimo, tem um rendimento mensal de 1.448 reais.
30. A alternativa de política social no Brasil é:
a. ou procurar atender, no curto prazo, às demandas de educação, de saúde e de transportes de toda a população, isto é, dos ricos, da classe média, dos pobres e dos excluídos;
b. ou procurar atender de forma qualificada, consistente no curto, médio e longo prazo, e com absoluta prioridade, às demandas da enorme população pobre e excluída.
31. Assim, na educação é mais importante criar condições para uma educação de qualidade para os brasileiros excluídos ainda que nem todos possam ser atendidos imediatamente do que tentar incluir no sistema educacional todas as pessoas para receberem uma educação de baixíssima qualidade, como comprovam as estatísticas sobre analfabetismo funcional, os resultados de quaisquer exames gerais em qualquer nível de ensino, a remuneração baixíssima dos professores e o número de professores “leigos”.
32. As iniciativas estratégicas fundamentais na área da educação são:
a. criar uma carreira nacional de professor de ensino primário e médio com níveis salariais capazes de atrair jovens qualificados;
b. criar escolas de formação de professores, com ênfase nas disciplinas de matemática e português, como condição de acesso à carreira nacional de professor;
c. ampliar significativamente o número de escolas de tempo integral de ensino verdadeiro, e não apenas de recreação esportiva ou cultural, de acesso democrático a todos os setores da população, por sorteio dos candidatos, até incluir no horário integral todas as crianças e os jovens.
33. Assim, na saúde é mais importante:
a. estender o sistema de saneamento básico e de água potável, a começar pelas regiões mais pobres das periferias urbanas do que instalar equipamentos médicos de alta complexidade e custo elevadíssimo, tais como tomógrafos, para atender as demandas da classe média;
b. dar toda prioridade a campanhas de medicina preventiva em relação aos programas de medicina curativa. O fato de no Brasil haver cinquenta mil vítimas fatais de acidentes de automóvel por ano, e, portanto, cerca de duzentas mil vítimas não fatais; de serem cinquenta mil as vítimas de homicídio e de a obesidade, inclusive infantil, estar se tornando uma epidemia, com todos os seus efeitos sobre a ocupação dos hospitais e as despesas do sistema único de saúde, demonstram, a título de exemplo, a necessidade e a prioridade que se deve atribuir a essas campanhas preventivas;
c. dar prioridade à coleta e ao processamento industrial do lixo urbano, cujo acúmulo é fonte de todo tipo de doenças e contribui para a baixa auto estima da população mais pobre.
34. A situação extremamente precária dos transportes públicos, em especial de ônibus e trens nas grandes cidades, afeta a saúde, inclusive psíquica, e a capacidade de trabalho e lazer da população que deles se utiliza e que são, de fato, os trabalhadores mais pobres. Assim, nos transportes é mais importante investir no transporte de massa, em especial nos sistemas de trens dos subúrbios e periferias das grandes cidades, do que na construção de metrôs que atendem as populações dos bairros de classe média, e de viadutos e grandes avenidas, que beneficiam os proprietários de automóveis.
A alternativa internacional
35. Os desafios internacionais do desenvolvimento brasileiro são de natureza política, militar e econômica e nesses três casos são inter-relacionados e podem ser examinados em conjunto.
36. A primeira alternativa constitui em incorporar o Brasil, de forma ainda mais profunda, ao sistema político, militar e econômico ocidental, liderado pelos Estados Unidos e manter o Brasil como um Estado periférico, subdesenvolvido e com reduzido grau de autonomia, inclusive para promover o seu próprio desenvolvimento econômico.
37. Na área política, esta primeira alternativa significa:
a. despriorizar a campanha para obter um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas e reduzir sua estratégia de aproximação, em todos os setores, com os países do Sul e “amortizar” sua reivindicação junto às Grandes Potências e a seus Estados “associados”;
b. reduzir a ênfase no objetivo de formação de um bloco regional na América do Sul, a partir do Mercosul e da Unasul;
c. negociar acordos de “livre comercio”, na realidade acordos de consolidação de normas restritivas ao desenvolvimento e altamente assimétricos, com países desenvolvidos.
38. Na área militar, esta primeira alternativa significa:
a. não priorizar o desenvolvimento tecnológico nas áreas nuclear, espacial e de tecnologia da informação;
b. aceitar os acordos de desarmamento promovidos pelos Estados Unidos, pelas Grandes Potências e seus Estados “associados”;
c. não priorizar o desenvolvimento da indústria bélica nacional;
d. priorizar a importação de material de defesa em prejuízo da produção e da pesquisa nacional, como foi o caso da aquisição de veículos aéreos não tripulados (vant), pela Policia Federal.
39. Na área econômica, esta primeira alternativa significa:
a. despriorizar os esforços de diversificação das exportações para a África, Oriente Próximo e Ásia;
b. não dar ênfase aos esforços de integração da América do Sul, e em especial do Mercosul;
c. não aproveitar a demanda extraordinária por produtos primários de parte da China para promover o processamento industrial, no Brasil, desses produtos primários, com eventual cooperação com a China, e se conformar com “apelos” para que as empresas diversifiquem suas exportações;
d. não disciplinar as atividades das empresas estrangeiras instaladas no Brasil de modo a fazer com que elas contribuam efetivamente para a modernização do parque industrial, para a diversificação e o aumento das exportações e para o desenvolvimento tecnológico da economia brasileira;
40. A segunda alternativa constitui a estratégia de transformar a inserção do Brasil no sistema internacional, político, militar e econômico de modo a fazer com que o nosso país venha a participar do sistema político internacional em uma posição que permita defender e promover seus interesses, (e da América do Sul) atuais e futuros; venha a ter uma capacidade de defesa capaz de dissuadir qualquer eventual agressor e assim resguardar sua soberania; venha a permitir que a economia brasileira reduza a distância que a separa das economias altamente desenvolvidas.
41. Na área política, esta segunda alternativa significa:
a. priorizar a campanha para obter um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas e para tal fortalecer sua estratégia de aproximação, em todos os setores, com todos os países do Sul, independente de sua organização política e social, e reivindicar, com firmeza, junto às Grandes Potências, e em especial junto àquelas que são membros permanentes do Conselho, e junto a seus Estados “associados”, esta sua legítima aspiração;
b. ampliar os esforços de formação de um bloco regional na América do Sul, com fundamento nos princípios de não intervenção, de autodeterminação, de cooperação e de responsabilidade brasileira no processo de redução de assimetrias, especialmente através da ampliação significativa do Fundo de Convergência Estrutural do Mercosul (FOCEM).
42. Na área militar, esta segunda alternativa requer:
a. priorizar o desenvolvimento tecnológico e os investimentos nas áreas nuclear, espacial e de tecnologia da informação, o que significa garantir recursos orçamentários, não contingenciáveis e previsíveis para períodos de pelo menos cinco anos.
b. não subscrever acordos de desarmamento promovidos pelos Estados Unidos, pelas Grandes Potências e os seus Estados “associados”, em especial aqueles acordos de natureza assimétrica, os quais aquelas Potências muitas vezes não subscrevem ou não cumprem de fato, ou dos quais não participam ;
c. priorizar o desenvolvimento da indústria de defesa nacional, através de programas de desenvolvimento e de aquisição de equipamentos, com recursos previstos em orçamento plurianual, não contingenciáveis;
d. priorizar a aquisição de material de defesa de produção nacional, e evitar a importação de equipamentos, mais baratos no curto prazo porém mais “caros” no longo prazo, na medida em que prejudicam o desenvolvimento tecnológico autônomo.
43. Na área econômica, esta segunda alternativa significa:
a. priorizar a política de integração econômica da América Latina, e em especial da América do Sul, visando a redução das assimetrias e o desenvolvimento industrial de todos os países da região;
b. priorizar os esforços de diversificação das exportações para a África, Oriente Próximo e a Ásia, através da alocação de recursos significativos, semelhantes aos que são dedicados, por exemplo, pela Índia;
c. aproveitar a demanda extraordinária chinesa por produtos primários e negociar com a China programas de promoção do processamento industrial, no Brasil, desses produtos primários, criando fundos específicos para cada setor com os recursos decorrentes de impostos de exportação, a serem aplicados no desenvolvimento industrial e na infraestrutura do setor, a serem geridos com a participação dos empresários do setor;
d. disciplinar as atividades das empresas estrangeiras instaladas no Brasil, cuja presença hoje é extraordinária, de modo a fazer com que elas contribuam efetivamente para a ampliação da capacidade instalada, para a modernização tecnológica e, assim, para a maior competitividade da produção industrial brasileira, para a diversificação e o aumento das exportações, utilizando para alcançar tais objetivos o poder de compra e de concessão de crédito do Estado.
* * *
44. Muitos e árduos são os desafios do desenvolvimento brasileiro mas, se não forem enfrentados, maior será o custo para a sociedade e mais remota a possibilidade de realizar o sonho de um país mais justo, mais próspero, mais igual, mais democrático e soberano.
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