Por Luis Nassif
“Recém lançado, o livro “O Príncipe da Privataria” – do jornalista Palmério Dória –
traz um capítulo polêmico, sobre inquérito da Polícia Federal que teria
levantado atividades irregulares do então cônsul do Líbano, em
operações de conversão de dívida externa. As suspeitas envolvem o então
senador Fernando Henrique Cardoso.
Mas, em 2002, o inquérito já tinha sido alvo de uma reportagem de Amaury Ribeiro Jr na revista “IstoÉ”.
O inquérito levantava as atividades de um tal “Socimer International Bank”, localizado em um paraíso fiscal nas Bahamas, que quebrou no final dos anos 90.Quatro
anos após sua liquidação, investigação do Ministério Público Federal e
da Polícia Federal constatou que havia um registro dele na Junta
Comercial de São Paulo, exclusivamente para comercializar produtos de
exportação. Foi-se mais a fundo e constatou-se que, durante dez anos,
atuou como banco clandestino, ajudando na lavagem de dinheiro de
investidores brasileiros.
Por essa época, o MPF conseguiu – num feito inédito –
quebrar o sigilo das contas do Banestado, do Paraná, revelando uma
verdadeira usina de lavagem de dinheiro. Os dados foram passados para a
“CPI do Banestado”, que acabou enterrada em um acordo espúrio entre o
PSDB e o PT – na figura do relator deputado José Mentor (PT-SP).
O que importa, para nossa história, é o início desse episódio, que remonta ao governo Sarney.
Historicamente,
em períodos de crise externa, adquirir títulos da dívida externa com
deságio e revendê-los pelo seu valor de face constituiu-se na mais
rentável operação do século, responsável por grandes fortunas
construídas ao longo da história.
Com a moratória de Sarney, o
então Ministro da Fazenda Luiz Carlos Bresser-Pereira decidiu
implementar um plano que disciplinasse as conversões e impedisse as
jogadas costumeiras com dívida externa. Consistia na “securitização” da
dívida. Ou seja, quem tinha créditos contra o país trocaria por novos
títulos, a prazos elásticos, taxas de juros razoáveis e valendo apenas
uma fração da dívida original.
Bresser-Pereira caiu logo após propor a “securitização”, e foi substituído por Maílson da Nóbrega.
Mailson
engavetou o plano de Bresser e lançou outro, permitindo a conversão
total da dívida em cruzados, com o compromisso de investir no país.
Com
o BC afrouxando a fiscalização, foram aplicados golpes de toda sorte.
Convertia-se dívida, aplicava-se em empresas fantasmas, com os cruzados
adquiriam-se dólares no mercado paralelo e remetiam-se para fora, por
esquemas de doleiros. Esse golpe teve influência direta na hiperinflação
brasileira do final do governo Sarney.
Havia um prazo para a
conversão, mas montou-se inicialmente uma operação para os mais amigos.
Bancos estrangeiros ficaram de fora. Nos anos seguintes, a influência
política de economistas e políticos ligados ao BC garantiu a abertura de
exceções, uma das quais foi para o empresário Alberto Achcar,
envolvendo o “Banco Paribas”, da França.
O livro sugere que FHC teria atuado para ajudar Achcar a conseguiu a conversão fora do prazo.
Anos
depois, o Secretário do Tesouro norte-americano, Nicholas Brady,
apresentou o “Plano Brady”, de securitização da dívida. O Brasil aderiu.
Mas o golpe já havia sido dado.
No programa “Roda Viva” de 5 de fevereiro de 1990, questionei Mailson sobre essa operação. Aqui, a pergunta e sua resposta:
Luis
Nassif: Ministro, o senhor acha que é correto pegar uma dívida estável e
sem inflação, que é a divida externa, e jogá-la para uma outra dívida,
que é explosiva, que pode provocar inflação?
Maílson da Nóbrega: Não,
não é correto. A dívida externa brasileira é menos de um terço do PIB
[Produto Interno Bruto]. Em termos relativos, a dívida interna
brasileira provavelmente é a mais baixa da América Latina. No Uruguai, a
dívida externa é de 90% do PIB, no Chile era mais de 100% e agora
reduziu um pouco, na Argentina é 80%, no México é 70%. Então, a dívida
não é realmente o problema do Brasil. Agora, a redução da dívida pela
conversão é um mecanismo adequado para reduzir o estoque da dívida desde
que você crie internamente um espaço na política fiscal para evitar um
endividamento maior. Qual é o país que obteve o maior sucesso com o
programa de conversão? O Chile, porque fez uma política fiscal de
contenção e a expansão provocada pela conversão não causou problema.
Tivemos problemas porque não houve abertura de espaço na política
fiscal. Quando nós lançamos o programa de conversão, a idéia era reduzir
o déficit e ir abrindo espaço para uma redução da dívida negociada no
mercado secundário com investidores, com empresas do Brasil. Enfim, você
obteria um resultado positivo da redução da dívida, sem criar problemas
de expansão monetária no mercado.”
FONTE: escrito pelo jornalista Luis Nassif e publicado no “jornal da GGN”
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