Por José Inácio Werneck, de Bristol (EUA)
"Acho
que todos nós brasileiros deveríamos encarar com humildade uma história
como a da Síria, cuja capital, Damasco, é uma das mais antigas cidades
do mundo continuamente habitadas e a caminho da qual Saulo de Tarso,
diz-se, encontrou Jesus.
Atravessando os séculos, como parte da Mesopotâmia e da Assíria, dominada pelos romanos (é interessante recordar que diversos imperadores romanos eram sírios de nascença),
pelos cristãos, depois pelos muçulmanos, integrante do Império Otomano,
a Síria foi uma das regiões do mundo que potências ocidentais dividiram
arbitrariamente de acordo com seus próprios interesses, traçando
fronteiras que não levavam em consideração nem etnias, nem religiões,
nem tribos, nem seitas, nem costumes, nem lealdades.
O filme
"Lawrence of Arabia", em que Peter O’Toole teve o papel principal,
mostra bem este episódio, em que o inglês T. E. Lawrence (foto)
convenceu os árabes de que eles ganhariam a independência apenas para
saber depois que seus superiores tinham feito um acordo secreto com a
França em que a região seria dividida entre os dois países.
Foi o
acordo "Sykes-Picot", em que a França ficou com a Síria, entre outras
regiões, e o Reino Unido ficou com o Iraque, entre outras.
A Síria tornou-se um Mandato Francês e só ganhou sua independência em 1946, depois da Segunda Guerra Mundial.
Isso
explica em parte porque o parlamento do Reino Unido, tão interessado em
se aliar aos Estados Unidos no Iraque, não aprovou agora um ataque à
Síria, enquanto a França, que se negou a se envolver no Iraque, acode
pressurosamente quando se trata de uma intervenção na Síria, que
considera sua "zona de influência".
O conflito de 1914 a 1918
viu, também, a criação do Mandato Britânico na Palestina, com a
garantia, em documento escrito, de Lord Balfour ao Barão de Rothschild,
poderoso banqueiro judeu de cujo financiamento a continuação da guerra
necessitava, de que a região seria eventualmente entregue aos judeus,
como acabou acontecendo.
Por que o Império Otomano conseguiu
durante tantos séculos dominar a região, enquanto as potências
ocidentais, das quais os Estados Unidos são o natural sucessor, são
obrigadas a enfrentar permanente instabilidade?
A reposta está na
descentralização do Império Otomano, com as diversas regiões e
diferentes seitas e etnias, entre as quais se incluíam cristãos
(assírios, coptas, católicos, protestantes, ortodoxos), judeus, curdos,
árabes, persas, turcos, armênios, gregos, ciganos, circacianos,
cipriotas, tártaros, iazidis, sunis, alawitas, xiitas e zoroastras, gozando de grande autonomia em suas áreas.
Mas
o Império Otomano (leia-se Turquia) cometeu o erro fatal de se aliar à
Alemanha e ao Império Austro-Húngaro, derrotados na I Guerra Mundial, e
foi por isso parcelado entre os vencedores.
T. E. Lawrence, com seu conhecimento da região, disse que a catástrofe seria inevitável, exatamente como acontece agora.
Barack
Obama encontra-se diante da decisão mais difícil de sua administração.
Por causa de interesses belicistas dos Estados Unidos, corre o risco de
enredar, cada vez mais, o país num labirinto que as nações europeias
criaram por não ouvirem a voz de homens conhecedores da história da
região, como foi T. E. Lawrence.
Pior: está praticando um ato ilegal, que ignora o Conselho de Segurança das Nações Unidas"
FONTE:
escrito por José Inácio Werneck, de Bristol, EUA. O autor é jornalista e
escritor com passagem em órgãos de comunicação no Brasil, Inglaterra e
Estados Unidos. Publicou "Com Esperança no Coração: Os imigrantes
brasileiros nos Estados Unidos", estudo sociológico, e "Sabor de Mar",
novela. É intérprete judicial do Estado de Connecticut. Trabalha na ESPN
e na Gazeta Esportiva. Artigo publicado no site "Direto da Redação" (http://www.diretodaredacao.com/noticia/lourenco-tinha-razao).
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