Desafio do Brasil:
crescer com desenvolvimento social e distribuição de renda
*José Álvaro de
Lima Cardoso
O aumento da inflação em janeiro, maior
taxa mensal nos últimos anos, deixou alguns setores da opinião pública e de
produção de dados econômicos, bastante agitados e defendendo insistentemente, a
elevação dos juros básicos da economia, preferencialmente já na próxima reunião
do Copom. Setores que vivem da especulação financeira se apressaram em espalhar
a ideia de que o governo estaria se preparando para combater a inflação através
do aumento dos juros. A questão é que, elevação de juros como receita para o tipo
de problema colocado não resiste à análise, por primária que seja.
A
pressão inflacionária atual, ao que tudo indica, está relacionada à queda na produção de alguns produtos agrícolas de
alto consumo, causada por sérios problemas na agricultura, como a seca no
Nordeste (a maior das últimas décadas) e aos sérios desastres climáticos no Sul
do País. Sintoma disso é que, dos 10 grupos que compõem o Índice
de Custo de Vida (ICV-DIEESE), que acumulou 6,89% nos últimos 12 meses até
janeiro, dois apresentaram variações bem superiores à inflação: Despesas
Pessoais (21,65%) e Alimentação (11,37%). Os índices calculados pelo IBGE revelam
o mesmo fenômeno: ao longo de
2012, o grupo Alimentação e Bebidas, o de maior peso no Índice de preços ao
Consumidor Amplo (IPCA-IBGE), teve um aumento de 9,86%, contra 7,18% em 2011.
Numa
conjuntura de elevação dos preços de alguns itens, e com a continuidade da
geração de empregos e do crescimento da massa salarial (6,7% em 2012), que
permite que os trabalhadores, especialmente os localizados na base da pirâmide
salarial, possam continuar consumindo, é normal que haja uma pressão nos preços.
É relevante observar que, mesmo com a redução dos juros a patamares
historicamente baixos em 2012, a inflação permaneceu em nível inferior ao ano
anterior.
Apesar da grande preocupação que o governo
vem demonstrando com o problema inflacionário (correta e necessária) dificilmente
o combate à elevação dos preços será centrado num só vetor, especialmente no
aumento dos juros. Podem ser usadas, por exemplo, a ampliação das renúncias
fiscais decorrentes de desonerações da folha de salários e o governo já
anunciou a desoneração de impostos dos produtos que compõem a cesta básica. Ademais,
os preços dos alimentos já deram uma aliviada em fevereiro, como mostram os dados da cesta básica calculada
pelo DIEESE. Outros fatores importantes é que, em fevereiro, teremos o impacto "cheio" da
redução dos preços nas contas de luz em todo o Brasil e a previsão é de safra agrícola
recorde neste ano, o que também alivia as pressões inflacionárias. O
importante, no debate sobre o aumento da inflação é separar as causas efetivas
do fenômeno, do jogo de cena de alguns, que agem como se o país tivesse perdido
o controle dos preços, com o inconfessável objetivo de pressionar pela elevação
dos juros para melhorar os seus ganhos.
Além de continuar vigilante
com o controle da inflação, o Brasil tem o desafio de retomar o crescimento
neste ano. Para tanto é fundamental que os investimentos públicos decolem,
puxando o setor privado e o crescimento do PIB. O baixo crescimento verificado
no ano passado teve como uma causa principal o sofrível desempenho do setor
industrial. O hiato entre a indústria (queda de -2,7% em 2012) e o comércio
(que cresceu 8,4%), que é muito significativo, tem dado a dinâmica recente da
economia brasileira. Numa economia que vem gerando empregos e a massa salarial vem
expandindo, parcelas crescentes da população passam a adquirir bens duráveis e
a acessar serviços que antes não podiam consumir. Não por acaso, nos últimos 12
meses, enquanto o ICV-DIEESE acumulou 6,88%, o item Despesas Pessoais chegou a
21,65%. O problema é que parcela crescente desse aumento do consumo tem sido
suprida com importações, como revela o déficit recorde da indústria de
transformação em 2012, de US$ 51,6 bilhões. Ou seja, uma parte da demanda por
produtos industriais tem vazado para o exterior, o que desestimula
investimentos.
Uma variável fundamental
neste ano, como sempre, será o câmbio, que continua valorizado. A boa política
cambial, como se sabe, não admite movimentos bruscos. Se a moeda se valoriza, há
uma maior dificuldade para as exportações industriais e um maior estímulo para
as importações, como vêm ocorrendo há vários anos no Brasil. Tem que ir desvalorizando
com cuidado, sempre observando o comportamento dos preços. É fundamental desvalorizar
o câmbio pelas simples razão de que o Brasil tem a difícil tarefa de conciliar
crescimento robusto com desenvolvimento social. Nessa equação, uma indústria
forte e competitiva parece ser uma componente fundamental.
*Economista e supervisor técnico do DIEESE em Santa
Catarina.
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