22/4/2014 11:03
Por Marilza de Melo Foucher - de Paris transcrito do Vale pensar
Por Marilza de Melo Foucher - de Paris transcrito do Vale pensar
“A direita no Brasil defende desabridamente os princípios do darwinismo
social, acolitada por intelectuais de segunda classe”. A afirmação é do
economista Luiz Gonzaga Belluzzo,
um intelectual de formação pluridisciplinar formado em Direito pela
Universidade de São Paulo em 1965. Em recente entrevista exclusiva ao Correio do Brasil, Belluzzo,
que estudou Ciências Sociais na Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, faz uma análise quanto
aos horizontes econômicos brasileiros. Belluzzo cursou a pós-graduação
em Desenvolvimento Econômico, promovido pela CEPAL/ILPES e graduou-se em
1969. Doutorou-se em 1975 e tornou-se professor – titular na
Universidade Estadual de Campinas em 1986.
No campo das políticas públicas, Belluzzo foi assessor econômico do
PMDB, entre 1974 e 1992, e secretário de Política Econômica do
Ministério da Fazenda (1985-1987), durante o governo de José Sarney. De
1988 a 1990, foi secretário de Ciência e Tecnologia do Estado de São
Paulo, durante a gestão de Orestes Quércia. Foi chefe da Secretaria
Especial de Assuntos Econômicos do Ministério da Fazenda (governo
Sarney).
Luiz Belluzzo é considerado um dos melhores economistas heterodoxos do Brasil,
devido às suas interpretações, sugestões e críticas à sociedade
brasileira, sob a ótica de Karl Marx e John Maynard Keynes. Em 2001, foi
incluído no Biographical Dictionary of Dissenting Economists entre os
100 maiores economistas heterodoxos do século XX.. Recebeu o Prêmio
Intelectual do Ano – Prêmio Juca Pato, de 2005.
– Por que as agências de anotações decidiram baixar a nota de crédito do Brasil?
– Essa decisão foi anunciada em meados do ano passado quando as
manifestações populares estavam no ápice. Isso foi interpretado pelos
senhores do mercado e pela mídia como um sinal de desaprovação da
política econômica dos governos do PT, sobretudo contra o “excessivo
intervencionismo” do governo Dilma e até mesmo contra o
“assistencialismo” das políticas sociais. O anúncio pelo Federal Reserve
de redução do Quantitative Easing ateou gasolina ao fogo e formou-se um
tsunami de pessimismo em torno da “vulnerabilidade” do Brasil.
Mais recentemente, a nova presidente do Fed, Janet Yellen colocou o
Brasil entre os cinco países mais vulneráveis, opinião fundamentada em
um relatório vergonhoso de sua assessoria, eivado de deficiências
técnicas. As críticas ao relatório foram disparadas por economistas
independentes, como Paul Krugman que declarou enfaticamente que o Brasil
não está entre os mais vulneráveis> Disse mais: a despeito do
desempenho sofrível da indústria machucada pelo câmbio valorizado e da
inflação acima da meta (variando nas imediações de 5,6% ao ano), os
indicadores dívida bruta /PIB, dívida líquida, dívida externa de curto
prazo/PIB são considerados satisfatórios.
Quanto às manifestações, a esmagadora maioria dos manifestantes
reclamava a melhoria dos serviços públicos, saúde, educação, transporte
urbano. Ou seja, clamavam por mais investimento dos governos manietados
pelos ditames dos mercados financeiro que gritam “fogo !” diante de
qualquer ameaça a seus poderes e ameaçam os países com a chicote das
agência de risco
–
A grande imprensa no Brasil e a oposição parecem se jubilar com a perda
de credibilidade do Brasil, Em geral os capitalistas praticam o
patriotismo econômico em época de crise…no Brasil eles apostam no
fracasso da economia e na degringolada geral. Inclusive destilam na
imprensa internacional que a contabilidade nacional foi manipulada a
fins político?
– Escreví na revista Carta Capital que
a eleição presidencial vem baixando o nível do debate, com polarização
de opiniões, exageros de pontos-de-vista e abandono dos argumentos, não
raro substituídos por ataques “ad hominem”. A campanha eleitoral já em
curso, como outras, emite sinais de pródigas manifestações de
maniqueísmo. O expediente de satanizar o adversário revela, esta é minha
opinião, indigência mental e despreparo para a convivência democrática.
Intelectuais, incluídos os jornalistas, não escapam destes desígnios:
as sagradas funções da crítica e da dúvida sistemática são atropeladas
pela paixão política.
Leio sistematicamente as colunas dos jornais brasileiros. Leio sempre
com o espírito disposto a considerar os argumentos, mesmo aqueles que
não batem com meus juízos e julgamentos.
Pois, embrenhado no cipoal de opiniões, deparei-me com um luminar da
sabedoria nativa que, do alto de sua coluna, alertava a nação para os
perigos da exploração do “coitadismo”. Imagino que vislumbrasse nas
políticas de redução da pobreza uma afronta aos méritos dos cidadãos
úteis e eficientes.
Lembrei-me de uma palestra memorável do escritor norte-americano David
Foster Wallace. Diante dos estudantes do Kenyon College, Foster Wallace
começou sua fala com um apólogo:
– Dois peixinhos estão nadando juntos e cruzam com um peixe mais velho, nadando em sentido contrário.
Ele os cumprimenta e diz:
– Bom dia, meninos. Como está a água?
Os dois peixinhos nadam mais um pouco, até que um deles olha para o outro e pergunta:
– Água? Que diabo é isso?
Wallace prossegue:
– O ponto central da história dos peixes é que a realidade mais óbvia,
ubíqua e vital costuma ser a mais difícil de ser reconhecida… Os
pensamentos e sentimentos dos outros precisam achar um caminho para
serem captados, enquanto o que vocês sentem e pensam é imediato,
urgente, real. Não pensem que estou me preparando para fazer um sermão
sobre compaixão, desprendimento ou outras “virtudes”. Essa não é uma
questão de virtude – trata-se de optar por tentar alterar minha
configuração padrão original, impressa nos meus circuitos. Significa
optar por me libertar desse egocentrismo profundo e literal que me faz
ver e interpretar absolutamente tudo pelas lentes do meu ser.
O povo brasileiro tem manifestado seu desacordo com os bacanas que, como
os peixinhos, mergulhados em seu egocentrismo, não conseguem reconhecer
o ambiente social em que vivem. Por isso, os bem sucedidos tratam os
beneficiários das políticas sociais como pedintes, não enquanto sujeitos
de direito.
– Como o senhor analisa este tipo de comportamento?
– Nas últimas décadas, certos liberais brasileiros julgam defender o
mercado desfechando invectivas contra as políticas públicas que, em sua
visão, contradizem os critérios “meritocráticos”. A direita no Brasil
defende desabridamente os princípios do darwinismo social, acolitada por
intelectuais de segunda classe.
Marilza de Melo Foucher é economista, jornalista e correspondente do Correio do Brasil em Paris.
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