domingo, 22 de junho de 2014

Um texto de ficção, por Cláudio Schuster


O jornalista quase não acredita em seus olhos. Ao seu lado, no voo entre Brasília e São Paulo, acento 13B, nada menos do que a presidente Dilma. Sozinha, sem seguranças. É a sorte grande. O furo do ano.
- Boa tarde, presidente Dil...
- Presidenta.
É ela, é ela, nem precisa checar, vibra o experiente repórter.
- Como vai a economia?
- Uma merda. Por isso estou aqui na classe econômica. Tivemos até que cortar os gastos com o avião presidencial.
"Economia está uma merda", admite Dilma. A manchete que vai resgatar o poder da mídia, vai mudar o Brasil e me colocar na história, prevê, em êxtase quase sexual.
- A senhora pensa em mudar a equipe econômica?
- Sim, sim. O Mantega é um bosta. Estou pensando na Míriam Leitão. O que você acha?
- O avião balança, numa turbulência quase instintiva. Mas a excitação do jornalista é tão grande que ele nem percebe.
- E a Copa? As vaias, os gastos...
- Com a crise na Europa não foi muito caro comprar as seleções mais fortes. A Espanha já foi. Estamos vendo agora como comprar o elogio dos VIPs. Talvez tenhamos que cortar o Bolsa Família. Mas o investimento vale a pena, pelo legado que eles vão deixar ao país.
- President...a, uma curiosidade: o número 13 da fileira até dá pra entender, mas por que não escolheu a janelinha?
- Ela olha para o lado, volta-se para o intrépido interlocutor, quase incrédula, e responde num sussurro:
- Você não viu? Porque na janelinha está o Felipão!
O jornalista não acredita em seus olhos. Novas manchetes giram enlouquecidas em sua cabeça, como nos filmes antigos. E quase sem conseguir respirar, faz a última pergunta a Dilma:
- A senhora não se importa em trocar de lugar só um instantinho?

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