domingo, 6 de julho de 2014
O ESCÂNDALO É A FALTA DE INDIGNAÇÃO
Por Paulo Moreira Leite, diretor da Sucursal da revista ISTOÉ em Brasília. Transcrito do Blog Democracia & Política
"Depois do carnaval diante da mordida de Suarez, observadores silenciam diante da agressão criminosa contra Neymar.
O aspecto mais chocante da contusão que deixará Neymar fora da Copa é a falta de indignação.
A joelhada de Zuñiga aos 41 minutos do segundo tempo foi um ato desleal e deliberado. Atacando sua vítima por trás, Zuñiga empurrou a cabeça de Neymar com a mão direita, para que o tronco ficasse encurvado e a espinha dorsal, mais exposta.
Se Neymar tivesse sido atingido algumas vértebras acima, o dano seria muito grave e é bom nem pensar nas consequências para o futuro do jogador. Mesmo assim, uma vértebra foi fraturada – o que dá uma ideia da violência que atingiu Neymar.
Zuñiga não foi expulso. Nem recebeu cartão amarelo.
A agressão, brutal, foi tratada como uma agressão "normal de jogo", embora tivesse produzido uma lesão muito mais grave do que a mordida do uruguaio Luis Suárez no ombro do italiano Chiellini.
Olha só: embora tenha sido um ato de uma pessoa psicologicamente perturbada, o que é sempre um atenuante num caso como este, a mordida de Suárez lhe valeu a suspensão por nove partidas da FIFA. Até Chiellini achou um exagero.
A reação diante da violência contra Neymar, o maior jogador brasileiro, a estrela número 2 da Copa depois do argentino Messi, foi a passividade. Essa é a mensagem.
É curioso imaginar por que não se fez um escândalo, nem no momento da agressão nem depois. Ficou tudo na normalidade.
O juiz Carlos Velazco Carballo será punido? E Zuñiga? Nada. A maior crítica que li nos jornais, hoje, foi um comentário dizendo que sua entrada foi “maldosa.” Fraco, hein?
Será que a Comissão de Arbritragem da FIFA irá se manifestar contra Carballo? Quem está pedindo? Quem exige?
Dá para entender o recado enviado aos árbritos das próximas partidas do Brasil, certo?
Essa reação "compreensiva" – digamos assim -- encobre um movimento que não ousa se mostrar por inteiro. Estou falando da torcida contra a Copa.
Derrotados fora de campo, quando se comprovou que a Copa era um sucesso nacional e internacional, e que a maioria dos meios de comunicação havia embarcado numa Escola Base em nível federal, testemunhada por 200 milhões de brasileiros, essa turma foi obrigada a guardar as energias negativas para o que acontece nos gramados.
Não vamos negar: a possibilidade, real, de o Brasil sair campeão deixa essa turma em pânico.
Seu movimento mental é semelhante ao discurso de Carlos Lacerda contra Juscelino Kubisctheck nas eleições de 1955, quando ele dizia: JK não pode candidatar-se; se sair candidato, não pode vencer; se vencer, não será empossado. Na Copa de 2014, o raciocínio é o mesmo. Não poderia haver Copa. Como ela aconteceu, deve ser ruim. E se não foi ruim, o Brasil não pode vencer.
Por isso ficaram muito indignados com o penalti (duvidoso, no mínimo) em cima de Fred no "jogo do VTNC" contra a Croácia. Mostraram-se generosos quando a Holanda foi beneficiada num lance parecido. Acharam normal. O silêncio diante da omissão absurda de Carballo é parte dessa postura.
Nas rodadas finais do Mundial, a turma do “Não vai ter Copa” aposta suas últimas esperanças numa derrota da Seleção.
Exibe sorrisos amarelos a cada vitória dos meninos. Sexta-feira, quando ficou garantido que, na pior das hipóteses, a Seleção Brasileira terá direito a disputar uma medalha de bronze, o que ninguém espera, mas está longe de ser aquele fiasco anunciado, a ausência de Neymar tornou-se a esperança silenciosa desse pessoal que, nos últimos dias, tentava inutilmente jogar nas costas da “Copa” e do “PAC” a tragédia numa obra de infraestrutura de Belo Horizonte, licitada e administrada pela prefeitura de um aliado da oposição.
A joelhada de Zuñiga foi um ato canalha. Mas o jogo fora do campo é muito pior e desleal, vamos combinar."
FONTE: escrito por Paulo Moreira Leite, diretor da Sucursal da revista ISTOÉ em Brasília, autor de "A Outra História do Mensalão". Foi correspondente em Paris e Washington e ocupou postos de direção na VEJA e na Época. Também escreveu "A Mulher que Era o General da Casa" (http://www.istoe.com.br/colunas-e-blogs/colunista/48_PAULO+MOREIRA+LEITE).
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