O clima de Caracas: o
que dizem chavistas e anti-chavistas
a três dias das
eleições presidenciais.
Por Tatiana Merlino
Enviada Especial
CARACAS - “Leva algum tipo de
arma ou explosivo na mala?”. Essa é uma das perguntas
que constam do formulário de imigração na Venezuela.
“Não, claro que não. Quem usa essas coisas é o [Hugo]
Chávez e os chavistas no Palácio Miraflores”, diz a
senhora sentada ao meu lado no avião, no voo de São
Paulo a Caracas, na quarta-feira, dia 4, enquanto
preenche o papel.
“A senhora não gosta
do presidente?”, pergunto. “Uff, não, não”, responde,
irritada, fazendo caretas. “Depois de tanta corrupção,
depois de 14 anos no poder, cansamos dele. Ele que vá
cuidar da saúde, não é? Queremos mudança.”
Nieves Herrera Moreno
tem 93 anos e retorna ao seu país depois de uma
temporada de quatro meses com a filha que mora em
Curitiba (PR). Em novembro, conta, irá a Chicago, nos
Estados Unidos, onde passará seis meses com outro
filho. “Meus filhos são todos muito bem colocados na
vida. O que mora aqui na Venezuela é engenheiro
elétrico, tem um bom emprego.” Na despedida, ela me
diz, baixinho: “Tome muito cuidado aqui. Eles
[chavistas] não são de brincadeira, não”.
Propagandas
No trajeto de 20
quilômetros que separam o aeroporto Maiquetía Simón
Bolívar do centro de Caracas, um desavisado que
chegasse ao país sem saber que em três dias haveria
eleições presidenciais no país não passaria incólume
às propagandas de Hugo Chávez e do principal candidato
da oposição, Henrique Capriles. “Tu también eres
Chávez”, diz um imenso outdoor pendurado num prédio na
entrada da capital. Os de Capriles tem os dizeres:
“Vota por tu progreso, hay un camino”.
Nos muros que separam
a estrada dos morros há inúmeras pinturas e
referências a Simón Bolívar, libertador do país e
figura resgatada pela “Revolução Bolivariana”de
Chávez. Os moradores das casas populares desses morros
são, em sua maioria, eleitores do atual presidente. De
acordo com pesquisa do Instituto Venezuelano de
Análises de Dados (IVAD), na classe D o mandatário tem
53,1% de intenção de votos, enquanto Capriles tem
29,6%. Na classe C, Chávez tem 48,8%, enquanto o
opositor tem 33,9%. Nas classes A-B, a briga é maior:
47% a 41,7%, em favor de Chávez.
Menos pobreza
O motorista que me
leva do aeroporto à cidade acredita que quem vota em
Chávez é “iludido”ou “fanático”. Os inteligentes,
garante, “votam em Capriles”. Na opinião dele, as
políticas sociais de Chávez que diminuíram a pobreza
no país não são eficazes. “Todo mundo quer melhorar de
vida, mas, para isso, temos de trabalhar duro. Não
está certo ganhar as coisas assim. Chávez faz isso
para comprar votos”,acredita. Segundo a Cepal
(Comissão Econômica para a América Latina e Caribe),
entre 2002 e 2010 a pobreza na Venezuela caiu mais de
20 pontos, passando de 48,6% para 27,8% da população.
No mesmo período, a pobreza extrema foi reduzida de
22,2% para 11,5%.
Um dos temas mais
explorados pela campanha de Capriles é o aumento da
violência urbana. Em 2009, 19.133 pessoas foram
assassinadas na Venezuela, ou seja, uma taxa de 75
homicídios por cem mil habitantes. “Todo mundo que
conheço já sofreu um assalto e tem um conhecido que já
foi sequestrado”, garante o motorista.
"Viramos gente"
Se o motorista e a
senhora do avião defendem Capriles, é com o mesmo
entusiasmo que a camareira de um hotel no bairro de
Altamira, classe média de Caracas, apoia Chávez. Ao
ser questionada sobre as eleições, ela olha para os
lados do corredor de um dos andares do hotel e, quando
checa que não há ninguém, diz: “Chávez, claro. A
gente, que nunca ninguém olhava, passou a ser gente
depois que ele chegou ao poder”. Segundo ela, as misiones
de Chávez ajudaram muito os venezuelanos. Por
estar trabalhando, a moça de 39 anos não poderá ir à
marcha de encerramento da campanha “de nosso
Comandante” nesta tarde. “Mas você vai ver, haverá
muitos como eu lá.”. Ela conta que há outras pessoas
que trabalham no hotel que também votam em Chávez, mas
que são discretas, já que a área é de predominância
antichavista.
Capriles, que é
apoiado pelos principais empresários venezuelanos,
banqueiros e meios de comunicação privados, encerrou
sua campanha no último domingo, no centro de Caracas,
onde, de acordo com seu comando de campanha, havia um
milhão de pessoas. Hoje, quinta-feira, 5, Chávez
encerra a sua campanha com uma grande marcha em
Caracas, que ocupará as principais avenidas da cidade.
De acordo com o Censo
Nacional de População de 2011, a Venezuela tem cerca
de 29,7 milhões de habitantes, dos quais 19 milhões
estão aptos a votar no próximo domingo, 7 de outubro.
Embora o voto não seja obrigatório, de acordo com
institutos de pesquisa, cerca de 85% dos venezuelanos
comparecerão às urnas.
Tatiana Merlino é
jornalista.
*Exclusivo para o
site da revista Caros Amigos.
Boletim 01 –
04.10.2012
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