11/10/2012 | Estados Unidos,Mundo
Por Noam Chomsky.
Nossos políticos mostram uma
extraordinária vontade de sacrificar as vidas de nossos filhos e netos
por ganhos a curto prazo. No momento em que as eleições para a
Presidência chegam ao momento decisivo, é útil indagar como as campanhas
políticas estão lidando com os temas mais cruciais que enfrentamos. A
resposta é: ou muito mal, ou simplesmente não tratam destes assuntos.
Sendo assim, surgem algumas questões importantes: por que? E o que
podemos fazer em relação a isso?
Existem dois problemas de importância
fundamental, porque o destino da espécie está em jogo: o desastre
ambiental e a guerra nuclear. O primeiro está regularmente nas primeiras
páginas. Em 19 de setembro, por exemplo, Justin Gillis escreveu uma
reportagem para o New York Times sobre como o derretimento do gelo do
Oceano Ártico cessou por esse ano, “mas não sem antes derrubar seu
recorde anterior — desencadeando novas preocupações sobre o ritmo
acelerado nas mudanças da região.” O derretimento está se dando de modo
muito mais rápido do que era previsto por modelos matemáticos
sofisticados e pelos últimos relatórios da ONU sobre o aquecimento
global.
Novos dados indicam que o gelo deve
desaparecer durante o verão até 2020, com consequências severas.
Pesquisas estimam que o gelo desaparecerá completamente por volta do ano
2050. “Mas os governos não responderam à mudança com a urgência
necessária para limitar as emissões de efeito estufa,” escreve Gillis.
“Ao contrário, sua resposta principal tem sido planejar a exploração dos
agora acessíveis minerais do Ártico, incluindo a extração de mais
petróleo” — isso é, acelerando a catástrofe. A reação demonstra,
novamente, uma extraordinária vontade de sacrificar vidas das nossos
filhos e netos pelo curto prazo.
Ou, talvez, uma vontade igualmente
notável de fechar nossos olhos, para que não vejamos o perigo iminente.
Não é só. Um novo estudo do Monitor da Vulnerabilidade Climática
verificou que “as mudanças climáticas provocadas pelo aquecimento
global estão reduzindo a produção econômica mundial em 1,6% ao ano, e
provocarão a duplicação de certos custos estratégicos nas próximas duas
décadas”. O estudo foi amplamente divulgado em outros países, mas os
norte-americanos foram poupados de tais notícias perturbadoras. As
plataformas dos partidos Democrata e Republicano sobre assuntos
climáticos foram analisadas na edição de 14 de setembro da revista
Science.
Num caso raro de ação comum, os dois
partidos propõem que tornemos o problema mais grave. Em 2008, ambas as
plataformas dedicavam alguma atenção às políticas do governo diante da
mudança climática. Agora, o tema quase desapareceu da plataforma
republicana — que, no entanto, pede que o Congresso “aja rapidamente”
para evitar que a Agência de Proteção Ambiental (EPA, em inglês) —
criada pelo ex-presidente republicano Richard Nixon em dias mais sãos —
regule a emissão de gases do efeito-estufa. E devemos abrir o Refúgio
Ártico do Alaska à perfuração, para tirar “vantagem de todos os recursos
que Deus ofereceu aos americanos”. Não podemos desobedecer o Senhor,
afinal de contas. A plataforma também sustenta que “devemos restaurar a
integridade científica de nossas instituições de pesquisa e eliminar
incentivos políticos relacionados à pesquisa desenvolvida com recursos
públicos” — um código para referir-se à ciência do Clima.
Tentando escapar do estigma de ter se
preocupado com mudança climática há alguns anos, Mitt Rommey, o
candidato republicano, declarou que não há consenso científico sobre o
tema. Portanto, deveríamos apoiar mais debate e investigações — mas não
ações, exceto as que tornam o problema mais sério. Os democratas
mencionam, em sua plataforma, que há um problema, e recomendam
trabalharmos “em direção a um acordo para definir limites às emissões,
com outras potências emergentes”.
Porém, o presidente Barack Obama
enfatizou que os EUA devem conquistar cem anos de independência
energética empregando extração por fratura hidráulica (fracking)
e outras tecnologias — sem se perguntar o que este tipo de prática
provocará no planeta, em cem anos. Há, portanto, diferenças entre os
dois partidos: dizem respeito a quão entusiasticamente os ratos devem
marchar até o abismo. Um segundo grande tema, a guerra nuclear, também
está nas primeiras páginas todos os dias, mas de uma forma que
escandalizaria um marciano observando fatos estranhos na Terra.
A ameaça atual está, de novo, no Oriente
Médio, especificamente no Irã — ao menos segundo o Ocidente. No próprio
Oriente Médios, os EUA e Israel são considerados ameaças muito maiores.
Ao contrário do Irã, Israel recusa-se a permitir inspeções ou a assinar
o Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP). Possui centenas de ogivas
nucleares e sistemas avançados de mísseis, além de uma longa história de
violência, agressão e desrespeito ao direito internacional, graças a
apoio norte-americano incessante. Se o Irã está tentando desenvolver
armas nucleares, os serviços de inteligência dos EUA não sabem. Em seu
último relatório, a Agência Internacional de Energia Atômica afirma que
não pode demonstrar “a ausência de material e atividades nucleares
não-declaradas no Irã” — um rodeio em que a instituição condena o país,
como Washington exige, ao mesmo tempo em que reconhece não poder
acrescentar nada às conclusões da inteligência norte-americana.
Portanto, deve-se negar ao Irã o direito
de enriquecer urânio, que é assegurado pelo TNP e endossado pela maior
parte do mundo — inclusive o movimento dos países não-alinhados, que
acabam de se reunir em Teerã. A possibilidade de que o Irã desenvolva
armas nucleares sobressai na campanha eleitoral (o fato de Israel já
tê-las, não…). Duas posições se contrapõem. Os Estados Unidos deveriam
declarar que atacarão, caso o Irã alcance capacidade de desenvolver
armas nucleares, como dezenas de outros países? Ou Washington deveria
manter a “linha vermelha” mais indefinida? A segunda posição e a da Casa
Branca; a primeira é exigida pelos falcões israelenses — e aceita pelo
Congresso norte-americano.
O Senado acaba de votar, por 90 x 1, em
favor do apoio a Israel. Está ausente do debate a alternativa óbvia para
mitigar ou eliminar qualquer ameaça que o Irã possa representar. Basta
estabelecer uma zona livre de armas nucleares no Oriente Médio. A
oportunidade está ao alcance da mão: uma conferência internacional sobre
o tema irá se reunir em alguns meses para trabalhar por este objetivo,
apoiado no mundo todo — inclusive, por uma maioria de israelenses. O
governo de Telaviv, no entanto, anunciou que não participará, até que
haja uma acordo de paz na região, algo inatingível enquanto Israel
persistir em suas atividades ilegais nos territórios ocupados da
Palestina. Washington aferra-se à mesma posição, e insiste que Israel
deve ser excluído de tal acordo regional.
Podemos estar caminhando para uma guerra
devastadora, talvez nuclear. Há caminhos diretos de superar esta
ameaça, mas não serão adotados exceto se houver ativismo social em larga
escala, exigindo que se aproveite a oportunidade. Isso, no entanto, é
muito improvável, enquanto tais temas permanecerem fora da agenda — não
só a do circo eleitoral mas também a da mídia e do debate nacional mais
amplo. As eleições são feitas pela indústria de relaç?os públicas, cujo
principal afazer é a publicidade comercial. É concebida para subverter
os mercados, criando consumidores desinformados que tomam decisões
irracionais — o oposto exato de como se supõe que os mercados
funcionariam. As vítimas, porém, não estão obrigadas a obedecer. A
passividade costuma ser o caminho mais fácil — porém, quase nunca, o
honroso.
Tradução: Gabriela Leite e Antonio Martins
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