Escrito por Guilherme C. Delgado
Terça, 15 de Março de 2016
Examinar o estado geral de um paciente enfermo, de certa gravidade,
e comunicar os seus resultados à pessoa doente e a seus familiares,
são momentos distintos de um diagnóstico médico, que muitas vezes
não coincidem no tempo, por razões ou conveniências sociais
conhecidas.
Outro enfoque e outro método científico se aplicam ao diagnóstico de
um sistema econômico em crise; mas há de comum nos dois casos o peso
da comunicação social, tanto na recuperação quanto na própria
determinação do grau da enfermidade.
O exame preliminar dos sinais de funcionamento da economia
brasileira neste primeiro bimestre do ano, principalmente no mês de
fevereiro, nos dá conta, ainda de forma muito tênue, de pequenas
melhorias na situação econômica: a inflação desacelerou, o déficit
externo diminuiu sensivelmente, houve certa recuperação dos preços
externos do ferro e do petróleo bruto e a atividade econômica, a
julgar pelo consumo de energia elétrica aumentou levemente (2,0% no
último mês).
Mas esses sinais preliminares da conjuntura, de certa forma refletem
uma porção do sistema econômico, ao redor de 30%, que seria
influenciado pelo movimento do chamado sistema de preços dos
mercados reais, tanto para cima quanto para baixo. No caso
brasileiro em particular, dada nossa recente especialização no
comércio externo, são as “mercadorias mundiais (‘commodities’), de
origem primária os tais mercados reais relevantes.
Por outro lado, algo como 70% da saúde do sistema econômico
dependem do jogo da economia política em curso (jogo da renda e da
riqueza em disputa na crise). E neste jogo os papeis da política e
da comunicação social são determinantes à apropriação do excedente
econômico prospectivo. Daí que o movimento dos mercados reais fica
subordinado a uma outra entidade ideológico/teológica – o mercado
ídolo.
Observe o leitor, que se examinada a aparência – os sinais estritos
de funcionamento da economia, com tênues indicações de recuperação;
tal sinalização não se confirma no jogo da economia política. O
movimento hegemônico no campo político e midiático é diametralmente
oposto: reativar o processo do ‘impeachment’ da Presidente Dilma e
promover verdadeiro ‘cerco e aniquilamento’ ao ex-Presidente Lula,
com vista a inabilita-lo a uma disputa presidencial em 2018.
Esse movimento conjuntural de exacerbação da crise política não
apenas conspira contra a recuperação econômica, como também se
aproxima perigosamente da ruptura da ordem democrática
constitucional de 1988. Esta é a salvaguarda dos direitos políticos
e sociais, que em última instância se chocam com os interesses
hegemônicos em disputa no jogo indefinido da economia política.
Mas é preciso cortar o nó da recessão e do desemprego, que caminha
em 2016 para repetir os péssimos resultados de 2015, com agravante
de que agora se opera explicitamente para fazer “uma ponte para o
passado” em matéria de estado direito. Este dilema que já está
posto, provavelmente por um erro de operação tática da “República da
‘Lava-a-jato’” no dia 04 de março (prisão imotivada do ex Presidente
Lula), não se resolverá de forma trivial. Ou a história da outra
república similar, a da ‘República do Galeão’, de 1954, se repetiria
como farsa?
Guilherme Costa Delgado é doutor em economia pela UNICAMP e
consultor da Comissão Brasileira de Justiça e Paz.
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