quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Uma corrida por terras de emergentes



A corrida por terras agrícolas levou investidores estrangeiros a adquirir
pelo menos 83 milhões de hectares em países em desenvolvimento entre 2000
e 2010, segundo o Deutsche Bank. O total equivale a 1,7% da área
agricultável global e é muito superior aos 50 milhões de hectares
utilizados para o plantio de grãos no Brasil na safra 2012/13.

O Brasil é um dos alvos da cobiça estrangeira, liderada por China, Arábia
Saudita, Kuait, Qatar, Bahrein e investidores dos EUA. As compras de
terras brasileiras somaram 2,6 milhões de hectares no período. Para o
banco, o objetivo dos investidores é garantir acesso a alimentos e água.

A corrida por terras agrícolas levou investidores estrangeiros a adquirir
pelo menos 83 milhões de hectares em países em desenvolvimento de 2000 a
2010, de acordo com análise do Deutsche Bank baseada em dados do Land
Matrix, uma base pública de dados sobre negócios do gênero.

A reportagem é de Assis Moreira e publicada pelo jornal Valor, 16-11-2012.

Mas, ao mesmo tempo, investidores do Brasil engrossam os aportes. Estão
entre os que adquiriram terras na África, com destaque para o Sudão,
visando ao plantio de soja, algodão e outras commodities agrícolas, mas a
preferência continua ser apostar as fichas em países vizinhos, como
Paraguai e Bolívia.



Os investimentos globais são guiados por tendências de longo prazo, como o
crescente consumo de alimentos e biocombustíveis num cenário de
disponibilidade limitada de terras aráveis, água e energia. De acordo com
o banco alemão, o objetivo desses investidores é justamente assegurar
acesso a alimentos e água, além de obter retorno financeiro como um ativo
alternativo. Boa parte da produção nessas terras é para exportação.

Dois terços dos países-alvo das transações terão um aumento no consumo de
água estimado em mais de 12% como resultado dessas grandes aquisições de
terras.

Diante da falta de transparência nesse tipo de investimento, o banco
considera "confiável" pelo menos metade das transações relatadas - o que
significa a compra por estrangeiros de 32,7 milhões de hectares, o
equivalente aos territórios de Alemanha, Bélgica e Holanda juntos, ou 0,7%
das terras agrícolas do planeta.

O estudo mostra que, se entre os investidores privados destacam-se os
americanos, entre os estatais são os do Golfo Pérsico que despontam. Mais
recentemente é que se fortaleceram os aportes no exterior de investidores
de países como China (boa parte estatais), Brasil, África do Sul, China e
Índia, entre outros emergentes da Ásia. O amplo envolvimento de emergentes
é também considerado sintomático das novas tendências nas relações
Sul-Sul.

Para o Deutsche Bank, investimentos privados na agricultura em outros
países fazem sentido, já que até 2050 serão necessários aportes de US$ 83
bilhões ao ano, em média, para incrementar a produção, 50% maior que
montante atual.

Na África, as aquisições por estrangeiros entre 2000 e 2010 representaram
4,8% das terras agrícolas do continente, ou uma área equivalente à do
Quênia. Na América Latina, os estrangeiros compraram, segundo o estudo,
1,2% das terras agrícolas, enquanto na Ásia o percentual ficou em 1,1%.

A maioria dos alvos dessas transações são países exportadores líquidos de
alimentos, com frágil governança no setor de terras e outros problemas,
como a corrupção.

O banco aponta "riscos significativos" associados a investimentos em
terras agrícolas. O principal desafio é o respeito aos direitos econômicos
e sociais das populações locais, além da preservação da sustentabilidade
ambiental.

Mas, para o Deutsche, há evidências de que modelos de cooperação entre
investidores e pequenos agricultores também podem funcionar - um exemplo é
a garantia da compra da produção. Conforme a instituição, parcerias como
essas podem beneficiar a produtividade e reduzir a pobreza sem
necessariamente envolver transferência de terra.

Para os "financistas", diz o banco, investimentos em terras agrícolas são
atraentes por várias motivos. A começar pela boa perspectiva de lucros no
longo prazo, diante do previsto aumento da demanda por alimentos, que deve
elevar os preços. O retorno varia dependendo da região e do tipo da terra,
e pode chegar a 20% na África e a até 30% no Brasil.

Em consequência da escassez de terras - e apesar dos limites às aquisições
por estrangeiros em países como o Brasil -, os preços estão em ascensão.
Negócios como sequestro de carbono e outros serviços ambientais
(diversidade, disponibilidade e qualidade de água, etc.) podem elevar
ainda mais os valores.

Contexto

A compra de terras em países em desenvolvimento na África e na América
Latina tem como principal razão a tentativa de grandes mercados
consumidores garantirem matéria-prima agrícola para o seu consumo
doméstico. Mas os preços de terras nesses continentes é o que possibilita
as grandes aquisições.

Nos Estados Unidos, onde não há restrições para aquisições de
estrangeiros, os preços por hectare arável oscilam entre US$ 10 mil e US$
20 mil, dependendo da região agrícola.

O mesmo acontece na Europa. A esse patamar de preços, os retornos do
investimento em terras para agricultura diminuem muito, levando o foco dos
investidores inevitavelmente para países mais baratos, explicou Jonathan
Lassers, presidente do Ariel Investment Management, do Uruguai, em um
recente seminário sobre o assunto realizado em Cingapura.

De acordo com Lassers, o arrendamento de terras de qualidade na Ucrânia,
por exemplo, chega a sair por US$ 100 por hectare. Na Polônia e na
Romênia, US$ 200.

No Brasil, existem restrições à compra de terras por estrangeiros - a
Advocacia Geral da União determina que eles devem ter participação
inferior a 50% em propriedades rurais. O limite tira liquidez do mercado,
mas os preços estão em alta. Segundo José Vicente Ferraz, diretor técnico
da Informe Economics-FNP, o hectare chega a R$ 16,3 mil em Santa Catarina,
R$ 3 mil na Bahia e R$ 4 mil em Mato Grosso.




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