andré singer

É cientista político e professor
da USP, onde se formou em ciências sociais e jornalismo. Foi porta-voz e secretário
de Imprensa da Presidência no governo Lula.
Escreve aos sábados.
Escreve aos sábados.
No auge da
popularidade do lulismo, a qual possibilitou a eleição de Dilma Rousseff em
2010, publiquei ensaio na revista "Piauí" em que sugeria a ideia de
que um sonho rooseveltiano havia tomado conta do Brasil. Em resumo, tratava-se
da possibilidade de integrar, em curto espaço de tempo, as grandes maiorias a
padrões civilizados de vida material, com aumento substantivo da igualdade.
Passados quase cinco anos daquele momento otimista, sou obrigado a reconhecer
que o desejo não se cumpriu.
Uma pequena, porém
reveladora, notícia da semana passada pode ser tomada como índice disso.
"O trabalho doméstico vinha caindo com a maior formação dos jovens
brasileiros. No último ano, porém, temos percebido aumento nesse grupamento,
talvez por falta de oportunidade", declarou o coordenador de Trabalho e
Rendimento do IBGE, Cimar Azevedo (site da revista "Exame"). Nos três
primeiro meses de 2015, cerca de 90 mil pessoas engrossaram o exército dos que
se dedicam a tal atividade. Em outras palavras, o nítido declínio na oferta de
mão de obra doméstica, ocasionado pela abertura de possibilidades de empregos
melhores, e mesmo pela opção de fazer faculdade, começa a ser revertido.
O processo de mudança
lenta que o lulismo abriu entre 2004 e 2010 não se acelerou o suficiente de
maneira a tornar residual a modalidade de serviço que é considerada um castigo
pelas camadas populares. É verdade que, em 2010, o Brasil era, segundo a
Organização Internacional do Trabalho, o país com maior número de empregados
domésticos do mundo, na casa dos 7 milhões. Ou seja, para absorver tal
contingente em outras atividades teria sido necessário que o primeiro mandato
de Dilma aumentasse de maneira expressiva a geração de vagas nos setores mais
modernos e de maior remuneração.
Para sorte da minha
interpretação à época, aceitei a sugestão do jornalista Mario Sergio Conti de
encerrar o texto esperançoso com a ideia de que o ritmo da redução da pobreza e
da desigualdade, deflagrada pelo lulismo, seria determinada pela luta de
classes. Dito e feito. Com apoio passivo da classe trabalhadora organizada,
Dilma tentou efetivar o anseio rooseveltiano por meio de uma política
desenvolvimentista em 2011/12. Mas foi derrotada pela reunificação da burguesia
em torno do rentismo, que é avesso de qualquer coisa que cheire a igualdade.
O lulismo não se
revelou, até aqui, capaz de ultrapassar a exploração de brechas existentes na
armação neoliberal. Em condições mundiais favoráveis, usou, com inegável
habilidade, os espaços de não confronto para melhorar a vida dos pobres, o que
confirma a minha tese principal. Porém o salto a um país realmente de classe
média parece que ficará para outra quadra, com outra correlação de forças.
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