Organizações do movimento social e popular
O Brasil
mudou nos últimos anos. Houve redução do desemprego e melhoria da renda do
trabalhador. Milhões de brasileiros saíram da pobreza extrema e outros tantos
conquistaram a casa própria. Além disso, milhões ingressaram e concluíram o
ensino superior e o ensino técnico. Foram também iniciados e concluídos
importantes projetos de infraestrutura.
Vivemos
um período importante na trajetória desse projeto de mudança. Depois de 12
anos, o país passa por um momento extremamente difícil. O governo parece
encurralado e não demonstra capacidade de ampliar o horizonte político de um
projeto que fez o Brasil avançar. O país precisa reencontrar o caminho do
desenvolvimento e construir uma estratégia política capaz de enfrentar os novos
desafios.
Um
pressuposto fundamental desta estratégia política deve ser o crescimento, com
proteção dos empregos, evitando que o Brasil mergulhe numa recessão que se
avizinha. No entanto, a posição do governo, expressa pelo Ministério da
Fazenda, está concentrada exclusivamente numa política de ajuste fiscal, que
além de insuficiente, pode deteriorar ainda mais o quadro econômico brasileiro.
Ajuste
fiscal recessivo
O governo
diz para a sociedade que a MP 665 ataca uma distorção no gasto das políticas de
proteção ao trabalhador formal e que a MP 664 corrige abusos e fraudes. No
entanto, admite publicamente, especialmente quando se dirige ao mercado
financeiro, que essas medidas fazem parte de um ajuste fiscal.
Dados do
Dieese estimam que, com a proposta original do governo na MP 665, mais de 4,8
milhões de trabalhadores não poderiam acessar o seguro-desemprego (38,5% do
total de demitidos sem justa causa em 2013) e 9,94 milhões de trabalhadores
perderiam o Abono Salarial. Com as alterações nas MPs na Câmara dos Deputados,
que diminuíram o impacto fiscal, o governo anuncia que aumentará o corte no
orçamento dos ministérios e elevará impostos.
O quadro
de desequilíbrio fiscal das contas do governo não é responsabilidade dos mais
pobres, trabalhadores, aposentados e pensionistas. As causas desse
desequilíbrio foram a desoneração fiscal de mais 100 bilhões concedida pelo
governo às grandes empresas, as elevadas taxas de juros Selic, que transferem
recursos para o sistema financeiro, e a queda da arrecadação devido ao baixo
crescimento no ano passado.
Não é
justo, agora, colocar essa conta para ser paga pelos mais pobres que precisam
de políticas públicas, trabalhadores, aposentados e pensionistas. Enquanto o
andar de baixo perde direitos, não está em curso nenhuma medida do governo para
tornar o nosso sistema tributário mais progressivo. Dados do especialista em
finanças Amir Khair apontam que a taxação sobre as grandes fortunas pode render
até R$ 100 bilhões por ano. Onde está a parcela de contribuição dos bancos e
dos mais ricos?
Para
agravar a situação do país, associado ao arrocho fiscal, vem um aperto
monetário, que enfraquece a economia e anula o seu próprio esforço fiscal. O
governo já aumentou em 2% da taxa de juros Selic neste ano, beneficiando apenas
os especuladores do mercado financeiro. A cada aumento de 0,5% da taxa Selic
durante o ano, o gasto público cresce de R$ 7,5 bi a R$ 12 bi. No ano passado,
os gastos públicos com juros foram superiores a R$ 300 bilhões.
Enquanto
os recursos públicos pagos pelos impostos descem pelo ralo do mercado
financeiro, o governo vai cortar direitos dos trabalhadores para economizar R$
10 bi com essas MPs. Além disso, ameaça vetar a mudança do Fator
Previdenciário, que beneficia os aposentados e é defendida pelas centrais
sindicais, como se as contas públicas fossem quebrar...
Só com
crescimento haverá equilíbrio fiscal e desenvolvimento
Mudar o
rumo da política econômica é colocar o crescimento como um aspecto central,
porque os números sinalizam uma desaceleração muito forte da economia. Os
investimentos do governo federal estão parando. O desemprego cresce mês após
mês. A renda do trabalhador também está em trajetória de queda. A arrecadação
do governo federal está caindo.
Só com o crescimento
econômico poderemos recuperar o equilíbrio das contas públicas. O resultado
fiscal é sempre o reflexo da saúde de uma economia. Uma economia estagnada gera
um orçamento desequilibrado. Durante o governo de FHC, sua equipe econômica
promoveu corte de gastos e contingenciamentos. Mesmo assim, o déficit nominal
foi de 5,53% do PIB em oito anos. A dívida pública como proporção do PIB
cresceu de 30,6%, em 1995, para 60,4%, em 2002.
Uma
economia forte e dinamizada produz aumento da arrecadação, e o resultado é o
equilíbrio fiscal. Durante o segundo governo do presidente Lula, a economia
cresceu em média 4,7% ao ano e a dívida pública caiu como proporção do PIB de
45,5%, em 2007, para 39,2%, em 2010. E como resultado do crescimento econômico
de 7,6%, em 2010, o déficit nominal foi reduzido para 2,5% do PIB.
É hora de
radicalizar o projeto de desenvolvimento, com o fortalecimento da produção,
investimentos na indústria nacional e na agricultura, desenvolvimento de
pesquisa, ciência e tecnologia e dinamização do mercado interno. Enquanto o
país se submeter aos interesses do capital financeiro e estiver dependente da
dinâmica imposta pelos países avançados, especialmente em relação a ciência e
tecnologia, nossa economia estará fragilizada.
O salto
que precisamos dar na economia implica uma nova estratégia política para
enfrentar a avalanche regressiva, que avança tanto na área do trabalho, com o
projeto de terceirização, como na esfera dos valores da sociedade, dando espaço
a uma onda conservadora que prega a redução da maioridade penal, a
flexibilização do Estatuto do Desarmamento, a aprovação do Estatuto da Família,
a PEC 215 e a eliminação da rotulagem dos alimentos transgênicos. No campo
político, avança a legalização do financiamento empresarial de campanhas
eleitorais, dentro de uma contrarreforma política que agravará os problemas no
nosso regime democrático.
A
fragilidade do governo no Congresso Nacional demonstra que é necessário, mais
do que nunca, construir uma nova governabilidade, com as forças progressistas,
como as centrais sindicais, movimentos populares, organizações de juventude,
cultura e mídia alternativa, para enfrentar a ofensiva neoliberal, que avança
ao lado de uma onda conservadora.
O ajuste
fiscal, nos termos em que está sendo proposto, coloca o governo contra as
forças progressistas, enfraquecendo a capacidade de um salto político. É
necessário reagir e colocar em andamento uma nova agenda política, ombro a
ombro com as forças democráticas e populares, os movimentos sociais organizados
e os partidos políticos - comprometidos com o desenvolvimento inclusivo do
país, a soberania nacional e a retomada do crescimento, com a garantia do
emprego - que atuam de forma autônoma parar ampliar o horizonte político.
A
proposta de ajuste fiscal apresentada pelo governo trava o país diante da
possibilidade de uma nova fase de desenvolvimento e da construção de uma nova
estratégia política. O Brasil progrediu nos últimos 12 anos, mas a continuidade
desse projeto depende de retificações. Essa proposta de ajuste fiscal não
combina com os novos desafios. Combina apenas com o passado. Portanto, quem
quer dizer SIM ao desenvolvimento com justiça social tem que dizer NÃO ao
arrocho fiscal, nos termos propostos pelo governo.
20 de
maio de 2015
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