segunda-feira, 29 de junho de 2015

Carta aberta às autoridades brasileiras

Boaventura de Sousa Santos, no Carta Maior


Senhora Presidente Dilma Rousseff,

Senhores Ministros,

Ao longo dos anos tenho acompanhado o modo como o Brasil tem vindo a visibilizar e potenciar outras formas de produzir e viver que constituem espaços de experimentação de sociabilidades alternativas e que estabelecem outra relação com a economia.

A economia solidária é uma das expressões destas outras economias e, no Brasil, vem se desenvolvendo e ganhando notoriedade graças à força política e social das iniciativas econômicas/solidárias e de seus movimentos sociais, mas também pelo avanço da política pública de economia solidária no Governo Federal.

A política pública de economia solidária no Brasil é uma das pioneiras no mundo e tem servido de referência não só para outros países do Sul - que prosperam com a experimentação de sociabilidades econômicas alternativas, mas também para países do Norte que se aproximam destas outras economias não só potencializando novas experiências, mas também visibilizando iniciativas históricas.

No entanto, sabe-se que esta política não reflete apenas uma concessão do Estado, mas sobretudo uma conquista do movimento. O nome de Paul Singer – a quem tenho muito apreço e admiração pessoais e respeito político e intelectual –, foi referendado pelo movimento para orientar a política de economia solidária a fim de conduzir uma política em constante diálogo com a sociedade e em atendimento as demandas dos movimentos sociais com quem se relaciona. Desta forma, uma possível adequação na direção política da Secretaria Nacional de Economia Solidária – com a saída de Paul Singer e equipe – comprometeria a estratégia política e relação Estado e sociedade que vem se construindo ao longo das últimas quatro gestões governamentais do Brasil.

Paul Singer é um político, um intelectual e um militante respeitado tanto no campo político como no campo acadêmico nacional e internacional. Trata-se de um homem que lutou pelas conquistas democráticas do Brasil e, espero profundamente, que ele possa continuar contribuindo, desde o Estado, para a legitimidade de outras economias possíveis.

Sendo assim, me junto ao apelo dos movimentos sociais e venho, por meio desta carta, requerer a manutenção e a ampliação desta política pública executada pela Secretaria Nacional de Economia Solidária, em parceira com o movimento popular de economia solidária e liderada por Paul Singer – nome que tem a confiança dos movimentos sociais.

Por fim, reafirmo meu compromisso político e acadêmico de visibilizar estas experiências alternativas de produzir e viver que historicamente são produzidas como invisíveis. O Projeto ALICE (www.alice.ces.uc.pt), sob minha coordenação, vem desenvolvendo diversas pesquisas sobre o tema das outras economias e o Brasil é um dos países que desperta nossa atenção tanto no que diz respeito as experiências práticas desenvolvidas pelos sujeitos coletivos (trabalhadores do campo e da cidade, indígenas, quilombolas, catadores de materiais recicláveis...), como no que diz respeito as políticas publicas realizadas pelo Estado brasileiro para este fim.

Os meus melhores cumprimentos,

Boaventura de Sousa Santos

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