
A cultura do segredo e a falta de transparência
cercam as questões relativas ao nuclear, e o que acontece no Japão,
acontece também em outras partes do mundo, inclusive no Brasil
15/08/2013
Heitor Scalambrini Costa
Nas
últimas semanas revelações surpreendentes sobre continuação da tragédia
no complexo de Fukushima Daiichi, no Japão, ocuparam novamente os meios
de comunicação de todo o mundo. Enormes quantidades de trítio, césio e
estrôncio estão sendo despejados, e envenenando o Oceano Pacifico.
Menciona-se a fabulosa quantidade de 300 toneladas de água radioativa
por dia despejada.
O governo japonês durante
muito tempo confiou na empresa operadora do complexo, Tokyo Electric
Power, também conhecida como Tepco. Esta por sua vez, omitiu a
existência deste vazamento de água altamente radioativa para o oceano.
Este é um pesadelo que não tem fim. O dano que está sendo feito é
absolutamente incalculável.
A cultura do segredo e
a falta de transparência cercam as questões relativas ao nuclear, e o
que acontece no Japão, acontece também em outras partes do mundo,
inclusive no Brasil.
O que era denunciado, mas
até então sem provas cabais, de que o governo ditatorial do Brasil,
tinha interesse em fazer sua bomba atômica, veio à tona agora com a
abertura de arquivos "secretos” do Estado-Maior das Forças Armadas
(EMFA). Em reportagem recente no Jornal Estado de São Paulo, o
jornalista Marcelo de Moraes relata que em 10 de junho de 1974, o
general Geisel expôs em uma reunião do Alto Comando Militar, a
preocupação do governo e dos militares, em relação ao fato de a Índia
ter detonado uma bomba atômica, e à possibilidade de os vizinhos
argentinos, também testassem um artefato nuclear. Defendeu então, a
construção da bomba atômica brasileira.
Em 1979
teve inicio o Programa Nuclear Paralelo, encabeçado pelo governo
militar. A existência do Projeto Paralelo, nunca admitido publicamente, e
cujas pesquisas na direção da fabricação da Bomba iam de vento em popa,
permaneceu secreto. Até que uma reportagem, em 1986, do jornal Folha de
São Paulo, revelou a existência de covas e cisternas e poços profundos
na Serra do Cachimbo, no Pará; e no Raso da Catarina, no semiárido
baiano. Tudo indicava que seriam para testes com artefatos nucleares.
Ministério
Público e o Congresso Nacional ao investigarem o caso descobriram
contas bancárias secretas, que dentro do Projeto Paralelo eram chamadas
de Delta. Isto poria um fim na ambição do governo militar de fabricar a
Bomba, apesar de que, no ano seguinte, o Brasil dominou por completo o
ciclo do enriquecimento de urânio. Em 1988 caiu a ditadura, e foi
promulgada a atual Constituição, que proíbe o uso da energia nuclear
para fins bélicos. Com tudo isso, o programa brasileiro passou a ser
"legítimo" e controlado pela estatal Eletronuclear.
Em
1990, outras revelações surgiram sobre o Projeto Paralelo. O fato é que
hoje no Brasil, ainda alguns sonham com a fabricação da Bomba
tupiniquim, como atestam posições públicas de políticos, acadêmicos,
ex-ministros de Estado e militares de alta patente.
A
retomada do Programa Nuclear Brasileiro, em junho de 2007 foi outro
exemplo de como atua na surdina, na "calada da noite” o lobby nuclear.
Sem nenhuma discussão com a população brasileira foi reativado este
Programa pelo Conselho Nacional de Política Energética, grupo de 10
pessoas que assessoram a presidência da Republica. Posteriormente em seu
Plano Nacional de Energia (PNE 2030), o Ministério de Minas de energia
anunciou a construção de mais 4 usinas nucleares no país, além da
construção de Angra 3.
Para espanto de todos,
duas destas novas usinas seriam construídas no Nordeste brasileiro. Como
não bastasse a tragédia do sertanejo frente à omissão governamental com
relação ao fenômeno das secas, imaginem agora que na beira do Rio São
Francisco será instalado uma usina nuclear. Um verdadeiro ato de
insanidade do poder público, que fecha os olhos aos riscos de uma
calamidade possível, como a que esta passando o povo japonês.
E
este descalabro agora é promovido pelo Clube de Engenharia de
Pernambuco, que em um Seminário conjunto com a Eletronuclear, enalteceu o
desenvolvimento e as vantagens que a construção de uma usina nuclear
trará para o semiárido Pernambuco. O povo pernambucano merece uma
explicação.
Heitor Scalambrini Costa é professor da Universidade Federal de Pernambuco.
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