Por J. Carlos de Assis, no Jornal GGN. Transcrito no blog do Miro.
Rio Grande do Norte saiu da fase da crise para entrar no caos. Outros Estados se seguirão. Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, entre os grandes, estão na mesma trilha de total desmantelamento de suas funções de governo. Mesmo São Paulo, o mais rico de todos, está cancelando ou adiando pagamentos de professores universitários por falta de orçamento. Breve toda a República sucumbirá, se ainda já não sucumbiu, à destruição de seus sistemas de saúde, de educação e de segurança pública, entre outros.
São muitos os culpados por essa situação, inclusive a depressão econômica.
No plano imediato, porém, há dois deles, verdadeiros açougueiros dos cidadãos brasileiros: Michel Temer, porque é basicamente um ignorante que não consegue avaliar a extensão dessa crise, e Henrique Meirelles, que faz questão de fomentar a crise a fim de facilitar os objetivos neoliberais de destruição do Estado, de privatização e de facilitação de transformação dos espaços públicos em espaços abertos à rapina do setor privado, como a água da Cedae.
O primeiro passo para o aniquilamento financeiro dos Estados e o progressivo estrangulamento da Federação, ainda no Governo FHC, foi a famigerada Lei de Responsabilidade Fiscal. Saudada pelos neoliberais como o caminho para forçar a probidade dos Estados, não passou de um meio de estrangulamento dos serviços públicos estaduais e de sua capacidade de endividamento. Enquanto isso uma legislação paralela, a Lei Kandir, reduzia as receitas estaduais com isenção de impostos sobre exportação de commodities.
Mas esse não foi o ponto máximo de aniquilamento das finanças estaduais. Em 1997, sob pressão do FMI, e determinado a fazer superávit primário a qualquer custo, o Governo federal obrigou os governos estaduais a privatizarem seus bancos comerciais para facilitar a unificação das contas públicas. Como a maioria desses bancos rolavam dívidas dos Estados junto a bancos privados, o Governo não pensou duas vezes: consolidou essas dívidas e pagou pelo valor de face os títulos que estavam sendo rolados, usando para isso títulos da dívida pública federal.
Um não especialista vê isso com naturalidade. Afinal, se o Estado rolava suas dívidas junto aos bancos comerciais privados nada mais natural do que contar com a bondade do Governo federal para pagar a conta à vista recebendo a prazo a contrapartida dos pagamentos dos Estados. Entretanto, há nisso algo de estranho do ponto de vista federativo. Os títulos públicos que a União usou para antecipar o pagamento da dívida aos bancos privados não representavam dinheiro do Governo federal, mas dos próprios Estados e municípios.
Note-se que a Constituição define a Federação como união indissolúvel dos Estados e Municípios. Não diz que a Federação é a União mais Estados mais Municípios. Significa que, quando a União emite dívida, ela o faz em nome de Estados e Municípios. Em conseqüência, ao pagar de uma vez a dívida consolida da dos Estados, o Governo federal efetivamente quitou essa dívida com passivo dos Estados (e municípios maiores), e não há nenhum sentido econômico ela cobrar a dívida novamente, criando um novo passivo, aos mesmos Estados.
Em face disso, temos uma situação na qual o Governo federal simplesmente está roubando recursos dos Estados para que eles paguem uma dívida que jamais teria existido. Em termos quantitativos, tomando como base valores reais do fim do ano passado, a dívida consolidada se levava a R$ 111 bilhões em 1997. Foram pagos pelos Estados até fins de 2016 nada menos que R$ 277 bilhões, por força de incidência de juros estratosféricos. E restam a pagar nada menos que R$ 493 bilhões. Isso, naturalmente, é impagável. É a própria destruição da Federação nos termos exigidos por Meirelles.
Foi se valendo dessa situação que o Ministro da Fazenda decidiu de forma oportunista forçar os Estados a promover um programa de privatização em larga escala em nível estadual. O caso mais paradigmático é o do Rio de Janeiro. Aproveitando-se de um governo estadual fraco e altamente endividado, inclusive por conta da dívida com a União, ele lhe impôs a venda da Cedae, sem qualquer consideração com as prioridades da sociedade fluminense e com a necessidade de defesa pública de uma área vital para o bem-estar da população.
O mais grave não é isso. A venda da Cedae cobre uma parte ínfima das necessidades financeiras do Estado. O acordo assinado prevê três anos de moratória relativa ao resto da infame dívida a pagar, porém sem garantia de que, ao fim desse tempo, as finanças do Estado estejam recuperadas. Isso acontecerá com todos os Estados. É um processo perverso de privatização que não tem qualquer perspectiva a não ser a queima de ativos. Contra isso, só existe um remédio: juntar os Estados mais atingidos e promover no Congresso uma sublevação contra a Federação. Sem isso, todo o país tende a virar um Rio Grande do Norte.
Rio Grande do Norte saiu da fase da crise para entrar no caos. Outros Estados se seguirão. Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, entre os grandes, estão na mesma trilha de total desmantelamento de suas funções de governo. Mesmo São Paulo, o mais rico de todos, está cancelando ou adiando pagamentos de professores universitários por falta de orçamento. Breve toda a República sucumbirá, se ainda já não sucumbiu, à destruição de seus sistemas de saúde, de educação e de segurança pública, entre outros.
São muitos os culpados por essa situação, inclusive a depressão econômica.
No plano imediato, porém, há dois deles, verdadeiros açougueiros dos cidadãos brasileiros: Michel Temer, porque é basicamente um ignorante que não consegue avaliar a extensão dessa crise, e Henrique Meirelles, que faz questão de fomentar a crise a fim de facilitar os objetivos neoliberais de destruição do Estado, de privatização e de facilitação de transformação dos espaços públicos em espaços abertos à rapina do setor privado, como a água da Cedae.
O primeiro passo para o aniquilamento financeiro dos Estados e o progressivo estrangulamento da Federação, ainda no Governo FHC, foi a famigerada Lei de Responsabilidade Fiscal. Saudada pelos neoliberais como o caminho para forçar a probidade dos Estados, não passou de um meio de estrangulamento dos serviços públicos estaduais e de sua capacidade de endividamento. Enquanto isso uma legislação paralela, a Lei Kandir, reduzia as receitas estaduais com isenção de impostos sobre exportação de commodities.
Mas esse não foi o ponto máximo de aniquilamento das finanças estaduais. Em 1997, sob pressão do FMI, e determinado a fazer superávit primário a qualquer custo, o Governo federal obrigou os governos estaduais a privatizarem seus bancos comerciais para facilitar a unificação das contas públicas. Como a maioria desses bancos rolavam dívidas dos Estados junto a bancos privados, o Governo não pensou duas vezes: consolidou essas dívidas e pagou pelo valor de face os títulos que estavam sendo rolados, usando para isso títulos da dívida pública federal.
Um não especialista vê isso com naturalidade. Afinal, se o Estado rolava suas dívidas junto aos bancos comerciais privados nada mais natural do que contar com a bondade do Governo federal para pagar a conta à vista recebendo a prazo a contrapartida dos pagamentos dos Estados. Entretanto, há nisso algo de estranho do ponto de vista federativo. Os títulos públicos que a União usou para antecipar o pagamento da dívida aos bancos privados não representavam dinheiro do Governo federal, mas dos próprios Estados e municípios.
Note-se que a Constituição define a Federação como união indissolúvel dos Estados e Municípios. Não diz que a Federação é a União mais Estados mais Municípios. Significa que, quando a União emite dívida, ela o faz em nome de Estados e Municípios. Em conseqüência, ao pagar de uma vez a dívida consolida da dos Estados, o Governo federal efetivamente quitou essa dívida com passivo dos Estados (e municípios maiores), e não há nenhum sentido econômico ela cobrar a dívida novamente, criando um novo passivo, aos mesmos Estados.
Em face disso, temos uma situação na qual o Governo federal simplesmente está roubando recursos dos Estados para que eles paguem uma dívida que jamais teria existido. Em termos quantitativos, tomando como base valores reais do fim do ano passado, a dívida consolidada se levava a R$ 111 bilhões em 1997. Foram pagos pelos Estados até fins de 2016 nada menos que R$ 277 bilhões, por força de incidência de juros estratosféricos. E restam a pagar nada menos que R$ 493 bilhões. Isso, naturalmente, é impagável. É a própria destruição da Federação nos termos exigidos por Meirelles.
Foi se valendo dessa situação que o Ministro da Fazenda decidiu de forma oportunista forçar os Estados a promover um programa de privatização em larga escala em nível estadual. O caso mais paradigmático é o do Rio de Janeiro. Aproveitando-se de um governo estadual fraco e altamente endividado, inclusive por conta da dívida com a União, ele lhe impôs a venda da Cedae, sem qualquer consideração com as prioridades da sociedade fluminense e com a necessidade de defesa pública de uma área vital para o bem-estar da população.
O mais grave não é isso. A venda da Cedae cobre uma parte ínfima das necessidades financeiras do Estado. O acordo assinado prevê três anos de moratória relativa ao resto da infame dívida a pagar, porém sem garantia de que, ao fim desse tempo, as finanças do Estado estejam recuperadas. Isso acontecerá com todos os Estados. É um processo perverso de privatização que não tem qualquer perspectiva a não ser a queima de ativos. Contra isso, só existe um remédio: juntar os Estados mais atingidos e promover no Congresso uma sublevação contra a Federação. Sem isso, todo o país tende a virar um Rio Grande do Norte.
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