*José Álvaro de Lima
Cardoso.
O movimento social e sindical brasileiro irá travar, nos próximos 60
dias, algumas das batalhas mais importantes da sua história. Um dos maiores
desafios será a luta para impedir a aprovação a contrarreforma da Previdência,
até o final do mês de abril. O governo Temer não está economizando esforços
para aprova-la, pois este é um dos compromissos assumidos no processo golpista.
Estão enquadrando a base parlamentar e mobilizando todos os poderes, apelando,
inclusive, para a repressão ao debate esclarecedor sobre o assunto.
Recentemente a base do governo solicitou ao executivo, que interpele na justiça,
ANFIP e DIEESE, pela divulgação de dados denunciando o massacre da reforma da
previdência, feito através do estudo Previdência:
reformar para excluir?.Por outro lado, os parlamentares da base do governo
que assinaram o pedido de abertura da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI)
da reforma da Previdência, encaminhado pelo senador Paulo Paim, vêm sofrendo
pressões para retirar suas assinaturas do requerimento.
É fundamental entender que a PEC 287/2016 é filha dileta do golpe
desferido contra a democracia brasileira. Todas as premissas nos quais a
proposta se baseia, são falsas e equivocadas. A proposta irá acabar com o
direito à proteção na velhice exatamente para os segmentos mais fragilizados da
população: idosos, agricultores pobres, crianças, mulheres, deficientes. Como
lembrou o economista Eduardo Fagnani, a PEC, na prática, revoga no Brasil, o artigo
25 da declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, que prevê que “todo
ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e à sua
família saúde, bem-estar, inclusive alimentação, vestuário e habitação,
cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis e direito à segurança em
caso de desemprego, doença invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda
dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle”.
O objetivo da PEC é aproveitar a crise para o desmonte total das
políticas públicas e dos instrumentos de ação do Estado. No caso da previdência
o objetivo é privatizar. Há uma premissa por parte dos mentores da proposta de
que os gastos sociais
“obrigatórios” seriam a causa do desajuste fiscal. Trata-se de diminuí-los ao
máximo. Ignora-se completamente que o problema fiscal tem natureza
essencialmente financeira, como consequência dos juros altos e das
inconsistências do regime fiscal e macroeconômico. Não se faz referência aos
gastos com juros sobre a dívida pública que, em 2015 (R$ 502 bilhões), foram
superiores aos gastos previdenciários (R$ 486 bilhões); às desonerações
tributárias que totalizaram R$ 280 bilhões em 2015 (o governo federal abre mão
de cerca de 20% das suas receitas); e ao fato de que anualmente o governo deixa
de arrecadar cerca de R$ 452 bilhões (2015), porque não há políticas eficazes
de combate à sonegação fiscal. Aliás, é de um sarcasmo absoluto que os mentores do projeto que quer fazer os brasileiros trabalharem
até os 75 anos ou 80 anos, tenham se aposentado jovens e com polpudos proventos:
Temer (55 anos) R$ 30.000; Eliseu Padilha (53): R$ 19.300; Meirelles (55): R$
250.000,00 (sic).
Se a contrarreforma
for aprovada pode quebrar a previdência no médio prazo, porque há grande risco de queda
brutal da arrecadação da previdência. Os contribuintes, ao não vislumbrarem que
poderão receber o benefício, irão desistir de contribuir ao longo do tempo. E
quem vai ganhar com isso são os bancos, que irão vender mais fundos de
previdência privada e outros produtos financeiros. Mas este não é um risco, é o
objetivo da contrarreforma. Com a privatização as
pessoas vão comprar planos privados de previdência, gerando um dos maiores
mercados cativos do mundo para o setor financeiro. Não tem negócio melhor para
os bancos. Com
a reforma o recado é: quem não buscar os fundos de
previdência complementar pode cair na pobreza. Somente no ano passado, com
o burburinho de que a previdência iria quebrar, os bancos tiveram um aumento, de janeiro a
outubro, de cerca de 21% na compra de fundos de previdência privada.
A batalha pela preservação da Previdência Social será uma das maiores da
história dos trabalhadores no Brasil. Se perdermos, as consequências serão as
mais dramáticas, para as atuais e futuras gerações. Mas os ataques vêm em
várias frentes. O presidente da Câmara de Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou
que irá colocar em votação, rapidamente, ainda no mês de março, o PL 4.302/98,
enviado ainda pelo governo FHC, que libera a terceirização ampla e precariza as
relações de trabalho. Segundo consta, o projeto regula a terceirização sem
limites, o que significaria o fim do mercado de trabalho, tal como conhecemos
hoje. Se aprovado pela Câmara Federal sem alterações, o texto irá direto à
sanção do Executivo.
Com a Emenda da Morte (95) já em vigor, com a eventual aprovação da PEC 287/16,
da reforma trabalhista, e da terceirização sem limites, presenciaremos a
destruição da malha de direitos trabalhistas atuais, conquistados à duríssimas
penas, ao longo de 70 anos ou mais. Nos próximos meses, talvez como nunca, a
dignidade e a coragem dos sindicatos e movimentos sociais terão que fazer a
diferença. Não há outra saída a não ser o combate incessante ao ataque aos
direitos.
*Economista.
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