Enquanto o Banco Central aponta spread médio
de 28% ao ano, os três maiores bancos privados
divulgaram nesta semana junto com seus balanços que,
segundo seus cálculos, seus spreads médios com
operações de crédito rodaram em torno de 13% ao ano no
primeiro trimestre.
O indicador calculado pelo BC e divulgado
mensalmente virou argumento central do governo contra
os bancos na recente cruzada para forçar para baixo o
alto spread - diferença entre o custo de captação dos
bancos e os juros dos empréstimo aos clientes -
praticado no país.
Na quarta-feira, o BC divulgou a nota de
crédito referente a março, que indicou spread médio de
18,4% ao ano nos empréstimos para empresas e de 35,1%
para pessoas físicas, além de ter cravado o spread
geral de 28%. O Itaú informou que seu spread de
janeiro a março foi de 13,5% ao ano, enquanto o
Santander apontou 12,4%. No balanço do Bradesco, o
dado não é explícito.
O tamanho da diferença intriga. E os bancos
começam a empreender um esforço para explicá-la, com o
objetivo de ganhar algum terreno na polêmica que se
instalou nas últimas três semanas em torno do custo do
crédito.
"Qual dos dois está certo? O fato é que o
spread do BC e o dos bancos mostram coisas
diferentes", pontua um banqueiro. "O spread do BC é
baseado em poucos produtos. Virou verdade porque tem o
selo do BC", diz um ex-presidente da Febraban, a
federação dos bancos.
Os bancos apontam que o spread do BC só pega
52,9% do crédito para pessoas físicas do sistema e
39,1% dos empréstimos para empresas; e essa seria a
principal falha da metodologia. Abrange basicamente
créditos concedidos a partir dos chamados recursos
livres, aqueles que não têm direcionamento obrigatório
(como rural e imobiliário) e não contam com subsídio,
como os financiamentos do BNDES. Justamente linhas
como as do BNDES e o crédito imobiliário têm boas
garantias e, portanto, risco mais baixo e spreads
menores. Os grandes bancos são grandes repassadores
dos recursos do BNDES e assumem o risco de crédito das
operações que fecham.
O argumento não é novo. No site da Febraban,
é possível encontrar estudos publicados desde outubro
de 2009 exatamente com o mesmo raciocínio. Os estudos
são atualizados mensalmente e elaborados pelo
economista-chefe da instituição, Rubens Sardenberg.
Segundo aponta Sardenberg, no spread para
pessoa física entram as linhas de cheque especial,
crédito pessoal, de compra de veículos e outros bens.
Ficam de fora cartão de crédito, imobiliário e
leasing, por exemplo. Já no spread das empresas,
entram desconto de duplicatas e notas promissórias,
capital de giro, conta garantida, aquisição de bens e
repasses externos e ACCs. BNDES, crédito rural e
leasing não integram a conta e respondem por quase 60%
dos empréstimos para empresas.
"Produtos com taxas mais altas e mais
sensíveis a flutuações de curto prazo estão super
representados na amostra utilizada pelo BC para
cálculo do spread bancário", afirma o estudo. Exemplo
citado: o crédito pessoal representa 27,1% do saldo
das operações para pessoas físicas e, segundo a
Febraban, tem peso de 54,4% no saldo das operações
incluídas no cálculo do spread. Outro: a conta
garantida é 8,9% do saldo de empréstimos para empresas
e tem peso de 13,5% no estoque considerado para o
spread; enquanto o ACC é 4,3% do estoque e 8,5% do
spread.
Sardenberg chega a recalcular o spread,
incluindo, entre outros, o imobiliário, que tem spread
de 6% ao ano. E, nas suas contas, o spread em
fevereiro deste ano para pessoas físicas não seria de
35,8% ao ano, como apontou o BC, mas de 28,4%. O
cálculo da Febraban baseia-se em 78,6% do estoque
(ante 52,9% do BC) e não chega a 100% porque deixa de
fora modalidades como empréstimos de cooperativas e
saldos não financiados no cartão de crédito, que não
têm taxas acompanhadas pelo BC.
Para empresas, o spread recalculado da
Febraban para fevereiro é de 13,5%, ante os 18,8% do
BC. De novo, ficam de fora da conta da entidade
modalidades não acompanhadas pela autoridade e entram
no cálculo 67,9% do estoque (em comparação a 39,1% do
BC).
Banqueiros apontam outro "defeito" do spread
do BC. "O spread é calculado sobre o fluxo de
empréstimos e os prazos desses empréstimos não são
ponderados. Com isso, os créditos de 30 dias, mais
caros, têm o mesmo peso no cálculo do que os
financiamentos de longo prazo", diz um deles.
Três executivos de instituições distintas
ouvidos pelo Valor contam a mesma história para
explicar a origem do cálculo feito pelo BC: ele foi
idealizado na gestão de Armínio Fraga à frente do BC,
em 1999, com o objetivo de acompanhar a tendência da
taxa no tempo e não para ser a reprodução exata
daquilo que é praticado. A um interlocutor,
recentemente, Armínio Fraga não teria endossado a
história e teria dito que o cálculo deveria refletir a
realidade.
O curioso é que o autor do estudo inicial
mencionado pelos banqueiros sobre spread no BC, sob a
gestão de Fraga, foi justamente Alexandre Tombini, o
atual presidente do Banco Central e que, à época,
chefiava o departamento de estudos e pesquisas da
autarquia. Isso situa Tombini no coração do debate
atual. A pressão sobre os bancos tem sido puxada pelo
ministro da Fazenda, Guido Mantega, e pela presidente
Dilma Rousseff, enquanto o BC, que fiscaliza e regula
os bancos, tem se mantido silente. Mas o tema é
próximo de Tombini. Ele conduziu o estudo logo depois
da implementação do regime de metas de inflação no
país, que criou o ambiente de estabilidade econômica
que pavimentou o caminho para a expansão do crédito
desde então.
Algumas das sugestões de medidas para baixar
o spread feitas por Tombini há 13 anos constam também
da lista entregue ao governo pela Febraban há duas
semanas. Outras foram implementadas, como a ampliação
da base de cobertura da central de risco do BC, que
abrangia empréstimos de R$ 50 mil para cima em 1999 e
agora chega a R$ 1.000. Vale a pena revisitar o texto.
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sexta-feira, 27 de abril de 2012
O spread do Banco Central versus o spread dos bancos
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