quinta-feira, 26 de abril de 2012

“Aquisições & fusões” elevam desnacionalização em 118%


26/04/2012

De janeiro a março, 74 empresas nacionais passaram para controle estrangeiro. No ano passado, foram 34

Escrito por: Carlos Lopes/Hora do Povo

A mais nova “Pesquisa de Fusões e Aquisições”, da consultoria KPMG, permite algumas conclusões sobre a situação periclitante – já perdemos um semestre este ano – da economia brasileira. Como veremos, a luta atual contra a desindustrialização da economia é, antes de tudo, e não somente em última instância, uma luta contra a sua desnacionalização. Ainda que isso ainda não tenha se explicitado completamente, ou será isso ou será, simplesmente, inútil.
O número de empresas brasileiras que foram desnacionalizadas no primeiro trimestre deste ano aumentou 117,65% em relação ao mesmo período do ano passado. Segundo a pesquisa, 74 empresas nacionais passaram para controle estrangeiro de janeiro a março. No ano passado, foram 34 empresas.
Resumindo: é mais um recorde de desnacionalização, pois, em 2011, o número de empresas desnacionalizadas já aumentara 18,86% em relação a 2010, batendo o recorde desse último ano, em que o número de empresas desnacionalizadas aumentou 92,30% frente à 2009.
Comparado a 2005, o número de empresas desnacionalizadas em 2011 aumentou 700%.
Os números de empresas desnacionalizadas nos últimos anos, segundo sucessivos relatórios da KPMG, são os seguintes:
- 2005 – 26 empresas;
- 2006 – 115 empresas;
- 2007 – 143 empresas;
- 2008 – 110 empresas;
- 2009 – 91 empresas;
- 2010 – 175 empresas;
- 2011 – 208 empresas;
Esses números não incluem todas as “fusões e aquisições” com participação de capital estrangeiro, mas exclusivamente os casos onde o capital majoritário, antes nacional, passou a ser estrangeiro (operações denominadas cb1 - “cross border 1”). Estão excluídas, portanto, as filiais de multinacionais que foram compradas por outra multinacional (operações cb4 - “cross border 4”), embora, muitas vezes, a filial tenha sido, antes, uma empresa nacional.
Antes de voltar à desindustrialização, observemos duas coisas: esse massacre desnacionalizante sucede à chacina do governo Fernando Henrique, quando 1.532 empresas foram desnacionalizadas.
Segundo: temos uma ideia bastante próxima da realidade sobre a origem do dinheiro que comprou essas empresas, quando examinamos a distribuição do capital no conjunto das operações “cross border” (isto é, todas as compras de empresas por empresas de outro país na economia brasileira):
Em 2005: 1º) EUA - 29,2%;
               2º) França – 7,6%;
Em 2006: 1º) EUA - 33,7%;
               2º) França – 8,5%;
Em 2007: 1º) EUA - 32,5%;
               2º) França – 6,6%;
Em 2008: 1º) EUA - 36,3%;
               2º) França – 8,1%;
Em 2009: 1º) EUA - 39,2%;
               2º) França – 8,5%;
Em 2010: 1º) EUA - 38,2%;
               2º) França – 5,9%;
Em 2011: 1º) EUA - 29,7%;
               2º) França – 7,9%.
O que podemos concluir?
Primeiro, que a desnacionalização está se acelerando cada vez mais. Segundo, que isso se dá pari passu com a desindustrialização.
Alguns jornais, quando da divulgação do PIB de 2011, publicaram que a participação de 14,6% da indústria de transformação no PIB era uma regressão ao patamar anterior ao governo Juscelino. Esses jornais são muito ignorantes: na verdade, ela é inferior à de 1950 (19,3%), isto é, mais baixa do que era no início do segundo governo Getúlio (cf. Marcio Pochmann e Marcio Wohlers, “Principais características da inovação na indústria de transformação no Brasil”, CP nº 5, IPEA, Brasília, maio/2008, pág. 2).
Essa participação, só de 2005 a 2011, caiu 19,33% (cf. Júlio Miragaya, “Desindustrialização e baixo crescimento econômico”, Correio Braziliense, 23/04/2012).
Terceira conclusão: o dinheiro norte-americano aumentou sua predominância depois da crise que eclodiu em 2008, turbinado pelas superemissões de dólares. Na verdade, “investimento direto estrangeiro” e domínio das multinacionais dos EUA sobre a nossa economia é quase a mesma coisa – para sermos mais exatos, qualitativamente é a mesma coisa.
Uma das ilusões mais grotescas em relação ao “investimento direto estrangeiro” (IDE) é a de que ele vai nos industrializar.
Para concluir como isso é falso, deveria bastar o fato de que estamos falando de “desindustrialização” num país em que, de 2005 a 2011, entraram US$ 254,65 bilhões em IDE – e seu estoque no país quadruplicou: de US$ 181,34 bilhões (2005) para US$ 669,67 bilhões (2011).
E isso depois da entrada de US$ 163,45 bilhões no governo anterior (1995-2002) – o equivalente a“cerca de três vezes o estoque investido pelas multinacionais no País até 1995” (cf. A. L. F.  Scherer, “Investimento direto estrangeiro, fusões e aquisições e desnacionalização da economia brasileira: um balanço da década do Plano Real”, Indic. Econ. FEE, v. 32, nº 2, Porto Alegre, ag. 2004, pág. 115).
Se, depois disso, há “desindustrialização”, algo está errado com o IDE que viria nos industrializar.
Sem dúvida: além de se dirigir sobretudo ao setor de serviços, no setor industrial ele não faz mais que comprar empresas nacionais para torná-las montadoras – com o valor aqui agregado, a partir de componentes importados pelas filiais de multinacionais, descendo quase ao fundo da fossa das Marianas.
Como consequência, explodiram, em nosso país, as importações de “bens intermediários”, que são sobretudo importações de componentes por parte das filiais de multinacionais.
Por isso, o mesmo câmbio que destrói as indústrias nacionais, beneficia as filiais das multinacionais – porque ele barateia as suas importações. E, se tiverem de importar o produto acabado, transformando as empresas ex-nacionais em balcões de importação, como muitas já fazem, para a maioria é até melhor.
Portanto, também não incomodam às filiais de multinacionais a causa da distorção no câmbio - os juros altíssimos que asfixiam as empresas brasileiras - mesmo porque há uma “relação cada vez mais estreita entre as empresas multinacionais e o processo de globalização financeira, o qual se expressa tanto na inserção ativa dessas empresas nos mercados financeiros internacionais (...) quanto na importância das regras de ‘governança corporativa’ na gestão dessas empresas” (loc. cit., pág. 109).
Em suma, os fatores que torturam e aniquilam a indústria nacional – isto é, que provocam a desindustrialização – são os mesmos que beneficiam as filiais de multinacionais.
Apenas mencionaremos aqui, sem mais comentários - porque não é, agora, o nosso assunto - o problema do aumento das remessas de lucros, que deixa na corda bamba as contas externas.

Um comentário:

  1. Você poderia disponibilizar o relatório da pesquisa da KPMG para primeiro trimestre de 2012?

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