*José Álvaro de Lima Cardoso
O conjunto de medidas anunciado em 3 de abril pelo governo federal, apesar de bastante robusto, não deve alterar significativamente o cenário da indústria para este ano, até porque a sua implementação e, principalmente, os seus efeitos, devem demorar. A indústria já vinha se recuperando, como era previsto, em função de ajustes de estoques e retomada de confiança dos empresários. Após um forte recuo em janeiro (de 1,5%) a produção industrial registrou crescimento em fevereiro, de 1,3% na série livre de influências sazonais. Esse é o resultado mais elevado desde os 2,2% registrado em fevereiro de 2011. Mesmo assim, na comparação com fevereiro de 2011, o total da indústria ainda é negativo em 3,9%. Se comparado ao mês de setembro de 2008, mês que antecede o agravamento da crise internacional, a produção industrial de fevereiro deste ano é 3,0% inferior, ou seja, após três anos da crise a indústria brasileira ainda não conseguiu retomar a sua produção em níveis iguais aos de pré-crise. Neste momento em que a indústria anda de lado, portanto, as medidas têm o mérito de estimular a confiança empresarial no futuro do setor, possibilitando maiores investimentos.
Apesar das medidas anunciadas estarem fortemente calcadas na desoneração de impostos, elas não devem causar grandes impactos nas contas públicas, nem comprometer a meta de superávit primário para 2012, de 3,1% do PIB. Isto porque é grande a margem que o governo dispõe para obter receitas extraordinárias e de deslocar despesas para o ano seguinte (por exemplo, em fevereiro deste ano o governo obteve R$ 5 bilhões de dividendos, garantindo superávit de R$ 5,4 bilhões no mês). No ano passado a arrecadação do governo federal com dividendos foi de R$ 20 bilhões e pode chegar a R$ 25,5 bilhões em 2012. De qualquer forma, a política fiscal será expansionista em 2012, pelo crescimento das despesas com a Previdência em função do aumento do mínimo, e pela aceleração do ritmo de investimentos da União.
Um problema importante: o robusto empréstimo que será feito pelo Tesouro ao BNDES (fundamental para viabilização do pacote anunciado) será operacionalizado através da emissão de títulos públicos, aumentando a dívida bruta, que já não é pequena. Ou seja, em última instância o subsídio à indústria será realizado via dívida pública, que paga os juros mais generosos do mundo. Outro problema diz respeito à desoneração da folha dos 15 setores industriais. O governo promete compensar as eventuais perdas do INSS, porém tal compensação deverá ser realizada com base em estimativas, e não com base na perda efetiva de receita, o que pode aumentar o suposto “déficit” da Previdência Social (como se sabe, a Seguridade Social, onde se insere a Previdência Social, é superavitária no Brasil). O Ministério da Fazenda estima que a substituição da contribuição patronal de 20% sobre a folha desses 15 setores por uma nova contribuição sobre a receita bruta implica uma renúncia fiscal de R$ 7,2 bilhões ao ano. Ou seja, a mudança reduzirá a receita da Previdência Social em R$ 7,2 bilhões por ano, que serão cobertos pela União.
As medidas para proteção da indústria, por sua vez, são importantes, mas não suficientes. Como a atual crise mundial será de longa duração e existe grande oferta industrial excedente, a disputa de mercados será cada vez mais difícil. O Brasil tem que enfrentar o problema da sobrevalorização do real com muita determinação. A questão dos juros permanece no centro do debate do problema industrial, pois o elevado rendimento atrai bilhões de dólares especulativos, valorizando o real. Além disso, em algum momento, o governo brasileiro terá que enfrentar o problema de controle de capitais. Se há um tsunami de dólares e de euros no mundo, vazando para os emergentes e valorizando o real, nada mais justo do que controlar estes capitais. Como faz, por exemplo, o Chile, desde 1991, com sucesso.
*Economista e supervisor técnico do DIEESE em Santa Catarina.
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