*José Álvaro Cardoso.
Entender,
pelo menos minimamente, o que se passa na Venezuela é fundamental para todos
nós latino-americanos. Qualquer que seja o desfecho da grave crise atual que
vive aquele país, ela necessariamente influenciará toda a política nos países
da América do Sul. Se o golpe triunfar na Venezuela, toda a américa latina será
impactada, com retrocesso na democracia e no campo dos direitos da cidadania. A
principal força do golpe que está sendo desferido contra a soberania da
Venezuela, é a mesma do golpe no Brasil: o imperialismo norte-americano. As
razoes do golpe, lá e aqui, também são muito semelhantes: petróleo (mas também
água e outros minerais) e interesses geopolíticos.
Independentemente da posição que se tenha em
relação ao governo Maduro, que é um direito de cada um, é preciso entender o
que é central no processo venezuelano. O que está em jogo no país vizinho, não são
os possíveis erros cometidos pelo governo Maduro, neste ou naquele setor, ou se
o governo é pior neste ou naquele aspecto. Essencialmente, o que está em jogo é
uma luta de vida ou morte, entre a direita fascista da Venezuela, apoiada pelo
Império, e outros países imperialistas, contra o governo Venezuelano, que tem o
apoio da maioria do povo pobre do país. O que está em jogo naquele país, são os
interesses dos EUA, e de seus aliados, no petróleo venezuelano. Por isso querem
derrubar um governo democraticamente eleito, e que, com imensas dificuldades,
colocou a renda petroleira a serviço dos interesses da maioria do povo venezuelano.
Esta é a questão fundamental.
A Venezuela sofre um sórdido cerco
internacional, liderado pelos Estados Unidos, mas que conta com a participação
de vários governos golpistas, como México, Colômbia, Brasil, Panamá, Espanha. Os
governos do Brasil e dos demais países do Mercosul, como vira latas obedientes
ao império, suspenderam, no dia 05.08, a Venezuela do bloco. Com o detalhe,
curioso, de que a Venezuela já estava suspensa desde dezembro de 2016. A decisão
mostra o grau de subserviência de governos dos países que compõem o Mercosul,
com destaque para o Brasil. É uma piada pronta, governos golpistas como o do
Brasil, suspenderem a Venezuela com a acusação de não respeitarem a democracia.
Se o Brasil não tivesse sido assaltado por golpistas, a serviço de interesses
estrangeiros, teria sido o primeiro a se manifestar contra as agressões do governo
americano, a um país soberano e com um governo eleito pela maioria da
população.
Há risco real de guerra civil na Venezuela,
como se pode concluir pelo nível de radicalização das manifestações de ruas. Recentemente,
a direita antichavista e pro-imperialista, tem queimado pessoas vivas, sob a
acusação de defenderem o governo bolivariano. Nos últimos meses as milícias de
oposição ao governo já provocaram mais de 100 mortes. Além de ataques à
pessoas, uma grande quantidade de prédios e equipamentos públicos têm sido depredados,
visando gerar um ambiente caótico, numa atitude conhecida de construção de um
ambiente favorável ao golpe de Estado.
A brutal crise política tem como base
material a crise econômica, e seus reflexos na vida cotidiana da população. Desde
a chegada de Hugo Chávez ao poder, em 1999, foi iniciado um processo de notáveis
melhorias na vida do povo Venezuelano, com base na chamada renda petroleira.
Até a chegada de Chávez ao poder central, os lucros do petróleo serviam ao
imperialismo e à uma elite antinacional e ligada aos interesses dos EUA. Milhões
de venezuelanos pobres passaram a usufruir de serviços de saúde e de educação,
como nunca haviam tido a oportunidade. O analfabetismo foi erradicado em 2005
no país, conquista reconhecida pela UNESCO, o que significou a alfabetização de
1,6 milhão de cidadãos. A rede de ensino público foi ampliada em larga escala.
Atualmente a Venezuela é país em todo o mundo com o maior número de estudantes
no ensino superior, na comparação com o seu número de habitantes.
Na área habitacional foram entregues até
agora mais de 1,7 milhão de moradias, um dos maiores programas habitacionais do
mundo em proporção à população, voltados para a população mais pobre, que paga
suas casas dentro das possibilidades, o que representa valores simbólicos.
Quando Chávez chegou ao poder em1999, 70% da população da Venezuela se
encontrava abaixo da linha de pobreza e nada menos que 40% vivia na situação de
pobreza extrema. Mesmo dispondo da maior reserva de petróleo do mundo. Com os
governos bolivarianos, a pobreza caiu de 70,8%, em 1996, para 21%, em 2010, e a
extrema pobreza, que era de 40% em 1996, recuou para 7,3%, em 2010.
Para alguns incautos é difícil de entender
o apoio da população mais pobre ao governo Maduro, apesar da crise de
abastecimento, e da inflação elevadíssima, em grande parte efeitos diretos da
sabotagem à economia patrocinada pela direita Venezuela, com apoio da CIA.
Porém, o que ocorre é que o Chavismo construiu uma estrutura estatal de
atendimento à população que, na prática, atende a cerca de 20 milhões de
pessoas. Isso num país que tem população total de 32 milhões de habitantes.
Atualmente 2,1 milhões de idosos recebem pensão ou aposentadoria, o que
representa, 66% da população da chamada terceira idade. Ademais, a mortalidade
infantil que em 1990 era de 25 por mil, em 2010 era 13 por 1000.
É isso que as elites nacionais da
Venezuela, e o imperialismo, não aceitam. Colocar os lucros do petróleo à
serviço do povo, não pode. As elites nacionais, subservientes aos interesses
norte-americanos, que perderam muito com o chavismo, há tempos perderam a
esperança de recuperar seus privilégios com um retorno através das urnas. Os
EUA por sua vez, tem interesse, primeiro na maior reserva de petróleo do
planeta, que historicamente, até a chegada de Chávez, sempre esteve à sua
disposição. Mas temos que entender que não é só isso. Não admitem também um
governo que prioriza o bem-estar de seu povo, e que vem concretamente
melhorando o perfil de distribuição de renda do país. Este é um péssimo
exemplo, para a Região e o mundo.
É este o contexto da guerra política e
econômica que travam contra a Venezuela. Temos o direito de ter a opinião que
quisermos sobre o governo Maduro. Mas não podemos ignorar o que era aquele antes
e depois da revolução bolivariana. Não podemos desconhecer que a criminosa atuação
dos EUA na tentativa de derrubar o governo daquele país nada tem a ver com
defesa da democracia, e sim de se apoderar do petróleo Venezuela. Essencialmente,
o que está acontecendo é um ataque criminoso e sem tréguas a um país soberano,
que vem melhorando a vida de seu povo. Por isso o seu governo tem que ser
eliminado, de qualquer forma.
*Economista.
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