José Álvaro de Lima Cardoso.
Neste
momento histórico, em que o país sofre os efeitos do golpe de Estado mais
sórdido da história, que vem liquidando com direitos, soberania e patrimônio do
Brasil, um dos traços marcantes é a sanha neoliberal de reduzir o Estado
brasileiro a pó. A destruição absoluta do Estado e a terceirização de cargos
públicos estão nesse contexto de destruição.
O debate sobre a terceirização é particularmente importante porque,
dentro de cerca de um mês e meio, entra em vigor a Legislação que destruiu os
direitos sociais e trabalhistas no Brasil. Essa lei é um verdadeiro crime de
lesa-pátria, como se sabe. Regressaremos ao século XIX em termos de direitos
sociais e trabalhistas. Significará também o maior roubo de renda que os
trabalhadores já sofreram na história do Brasil. Se os trabalhadores soubessem
o que essa lei significará nas suas vidas, haveria greve geral no país até que
a Lei 13.467/2017 fosse anulada.
A
terceirização tem sua validade nas atividades meio das empresas e instituições
públicas, especialmente nos serviços auxiliares, como aliás, vem sendo
praticado há décadas no Brasil. A focalização da empresa na sua
“missão” teria como objetivo elevar os níveis de produtividade e a qualidade da
produção ou serviço prestado. Porém, no
contexto histórico brasileiro, a experiência concreta de terceirização (que se
disseminou na década de 1990) vem associada com uma série de problemas, relativamente
bem pesquisados e documentados. Quais são eles:
a) Precarização
das condições de trabalho e insegurança no trabalho;
b) redução do
emprego; isto é, a empresa terceira não recontrata todos os trabalhadores
desligados pela empresa mãe por ocasião da terceirização;
c) diminuição de
salários. Quase sempre os trabalhadores terceirizados ganham menos que os
demais, ainda que exerçam a mesma função do trabalhador não terceirizado. O
objetivo é este mesmo;
d) menor formação
e treinamento. Na política de treinamento das empresas dificilmente o
trabalhador terceiro é incluído;
e) jornadas
superiores aos demais trabalhadores (em muitos casos).
A fúria privatista que tomou conta do
Brasil após o golpe, somada aos efeitos da crise fiscal, que tornou o cobertor
financeiro mais curto na administração pública, em função da queda na arrecadação,
aumentam o risco de terceirização de serviços públicos fundamentais. Quando se
terceirizam serviços essenciais no setor público, os aspectos listados acima
exercem um resultado negativo sobre as condições de vida dos trabalhadores e
sobre a qualidade dos serviços prestados, prejudicando especialmente os mais
pobres, que mais precisam dos serviços do Estado.
Não se adotou a realização de concurso público
para os serviços essenciais do Estado, por acaso. O trabalhador concursado
possui maior autonomia e qualificação, o que é fundamental para garantir um elevado
padrão de serviços por parte do funcionalismo púbico. Os trabalhadores
concursados, por exemplo, estão sujeitos à uma rotatividade do trabalho bem inferior
à verificada no setor privado, o que é fundamental para o desempenho dos
serviços que, boa parte deles, são complexos e exigem estudo e continuidade.
Quando as entidades sindicais do setor público
defendem a realização de concursos públicos, salários dignos e condições de
trabalho, eles estão defendendo ao mesmo tempo o direito de o povo ter acessos à
serviços de qualidade. A visão predominante nas empresas
e instituições públicas, é que a terceirização é um problema meramente
administrativo, que não diz respeito às direções sindicais. Esta é uma questão
bastante séria, porque a terceirização, além de representar redução de empregos,
leva também à fragmentação sindical, na medida em que trabalhador terceirizado
não se associa ao sindicato, não participa dos fóruns sindicais, ganha menos,
não tem benefícios, é desqualificado e tem mais medo de perder o emprego. Por
conseguinte, seu poder de barganha e negociação perante o patrão é praticamente
nulo.
As pesquisas do DIEESE, e de outras
instituições, revelam que a lógica da terceirização no Brasil é principalmente a
da redução de custos. Pela importância e complexidade dos serviços públicos os
governos não podem se guiar exclusivamente pelo barateamento dos serviços.
Especialmente num país onde os salários já são baixos. A lei da terceirização sem limites, aprovada neste ano e já em vigor, tem
como objetivo principal a redução de custos. Quando o empresário terceiriza no
setor privado, quer principalmente reduzir custos, e portanto, repassar o ônus
da crise para os trabalhadores, que passam a ser mais explorados.
Esta lógica não pode ser a do setor público.
Se quisermos atingir a condição de grande nação, teremos que eliminar todas as
formas de trabalho indigno e precarizado, e melhorar continuamente as condições
de trabalho de todos, incluindo os trabalhadores do setor público, que têm a
responsabilidade de prestar atendimento aos setores que mais precisam na
sociedade.
*Economista.
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