terça-feira, 19 de agosto de 2014

Fantasma do ajuste de início de governo

Luis Nassif 

No Repórter Sindical



Os tais ajustes prometidos para 2015 são fantasmas que assombram o sono dos empresários sem que se materializem em discussões objetivas sobre seu alcance.
No início de sua gestão, Lula promoveu um duro ajuste monetário e fiscal. Depois disso, o País cresceu. No início de sua gestão, Dilma promoveu um duro ajuste monetário e fiscal. E a economia desabou.
Essa diferença mostra que o mantra de que, fazendo a lição de casa no início de governo, se terá o céu depois, depende das circunstâncias de cada momento.

Reunidos no Rio de Janeiro, economistas de linha heterodoxa participaram de dois dias de debates no Seminário Brasil em Perspectiva e discutiram o tema.

Na avaliação geral, seja quem for o eleito, não haverá espaço para políticas radicais.
No caso de Lula, o ajuste se fazia necessário porque o quadro econômico, em 2002, era imensamente mais deteriorado do que o quadro atual. No início do governo Dilma, o quadro era outro. E, agora, é muito diverso, sem nenhum dos riscos criados em 2002.
No ajuste radical os efeitos negativos são evidentes - recessão, desemprego - mas os benefícios para frente, não.
Essa ideia de que basta ter previsibilidade para despertar o espírito animal do empresário é balela. O que desperta é previsibilidade e garantia de mercado. Se se retirar a perna do consumo interno, o que resta?
Como apontou a ex-presidente do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), Vanessa Petrelli, estão esgotados os fatores que garantiram a dinâmica da economia nos últimos anos.
Depois de 2008 houve a desaceleração do comércio mundial, deixando de ser alavanca de crescimento.
O aumento de preços de commodities arrefeceu.
A carga tributária não irá mais crescer no mesmo ritmo.
Com o mundo crescendo menos, todos crescendo relativamente menos.
Problemas de monta nas contas correntes, tanto na balança comercial como um crescimento expressivo na conta de serviços, com aumento na remessa de lucros, aluguéis de equipamentos e turismo.
O elemento de controle inflacionário pela apreciação do câmbio está esgotado.
Se derrubar o emprego e renda, a economia afunda.
Nesse dilema, não haverá como fugir de uma discussão ampla sobre o tal tripé econômico.
Vanessa considera essencial preservar espaço fiscal para garantir a política ativa de estímulos à economia e de garantia de emprego e renda.
Até hoje o governo não se valeu do espaço aberto por lei para retirar os investimentos do PAC do cálculo do superávit primário, diz ela. E o nível atual da dívida pública e do quadro fiscal é muito melhor do que na maioria absoluta de países.
Vanessa não considera plausível nem racional tratar a inflação brasileira como choque de demanda. No início do governo Dilma, um choque de custos externo foi tratado com restrições de crédito e aperto fiscal e afundou o crescimento.
Em 2011, o BC conduzia uma competente rota de redução de juros quando outro choque de custos - motivado pela especulação com preços internacionais de commodities - promoveu um recuo, nova elevação dos juros que significou um tiro no peito do processo incipiente de transição da poupança para o médio e longo prazo.
Sem uma revisão das políticas de tratamento da inflação, o País continuará patinando.

Luis Nassif éjornalista especializado em economia.
blog (jornalggn.com.br/luisnassif)

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