22/06/2012
Gasto do governo com salário cresceu em 2012 bem abaixo da inflação. Já são 34 categorias federais em greve
porCarlos Lopes
Durante a reunião
do G-20, foi anunciado que o governo brasileiro vai
entrar com US$ 10 bilhões a mais para o FMI – isto é,
para que sejam enfiados em bancos falidos,
irresponsáveis e parasitas. Enquanto isso, a greve dos
funcionários públicos federais se propaga como fogo na
palha seca – e a equipe econômica nega até mesmo um mero
reajuste. O pagamento de salários pelo governo no
primeiro quadrimestre deste ano aumentou apenas 2% em
relação ao mesmo período de 2011 – enquanto a inflação,
de janeiro de 2011 a abril de 2012, alcançava 8,38%.
Estamos de pleno acordo com a
presidente Dilma, que, há 10 dias, em Belo Horizonte,
declarou que “mais uma vez as autoridades da zona do
euro respondem a uma crise que se aprofunda e que se torna
uma crise quase crônica com 100 bilhões de euros para
financiamento aos bancos. A pergunta é, até quando? Vamos
lembrar bem que no fim do ano passado foram 1 trilhão de
euros também para os bancos”.
Talvez por
isso, nos pareceu estranho o anúncio, na reunião do G-20, em
Los Cabos, de que o governo brasileiro se comprometeu a
contribuir com US$ 10 bilhões a mais para o FMI. Nos pareceu
tão estranho que resolvemos conferir a nota de madame
Lagarde, diretora-gerente daquela instituição.
Infelizmente, madame, que fez
carreira como advogada de multinacionais norte-americanas
(portanto, não bate prego sem estopa), fornece uma lista
detalhada dos 12 países – o anúncio diz 37, mas os outros,
da “zona do euro”, já haviam se comprometido em abril - que
resolveram colocar mais dinheiro
no FMI para ser enfiado em bancos europeus, e, por tabela,
nos norte-americanos, que são a origem dos “derivativos” em
que aqueles se afundaram.
Os EUA não fazem parte dessa
lista de desprendidos contribuintes do FMI. Mas o Brasil
está lá, com US$ 10 bilhões. Na América Latina, além do
nosso governo, somente os do México e da Colômbia
subscreveram esse estipêndio (cf. IMF, Press Release Nº
12/231, June 19 2012).
Como o representante do Brasil
nas reuniões do FMI é o ministro Mantega (suplente:
Tombini), não sabemos ainda o que a presidente Dilma achou
dessa filantrópica iniciativa.
Pois, o objetivo desse dinheiro
extra para o FMI é tacitamente claro – até porque jamais se
ouviu falar que o FMI incentivasse a produção, o emprego
ou o crescimento. Madame Lagarde, aliás, esmerou-se em não
deixar dúvidas: trata-se de apoiar a “aplicação de
sólidas medidas de política econômica - em particular as
implementadas pelo Banco Central Europeu – e o
fortalecimento da gestão de governo na zona del euro,
assim como as reformas e o ajuste aplicado em países como
Itália, Espanha e Grécia” (sic).
Em suma, trata-se de saquear os
povos da Europa – e os nossos – em prol de bancos falidos (“sistemas
financeiros ainda frágeis”, na língua de madame) que
colocaram os países centrais no atoleiro atual. Lá pelas
tantas, madame Lagarde resolveu consertar um esquecimento.
Eis o que saiu: “o desemprego é igualmente preocupante”.
Portanto, diz a sensível
senhora, a situação de meia dúzia de banqueiros e a de
dezenas de milhões de trabalhadores sem emprego é
“igualmente” preocupante.
O que quer dizer - mas isso
todo mundo já sabia - que se depender dela, ou do FMI, os
desempregados que se danem. Logo em seguida vem uma
profissão de fé na pilhagem dos Estados, através dos juros:
“a política fiscal – isto é, os estabilizadores
automáticos - cumprirá uma função importante”.
Enquanto isso, no Brasil, nós
precisamos urgentemente, para voltar a crescer, de expandir
o mercado interno – o que significa aumento real de
salários. No entanto, há uma greve gigantesca de
funcionários públicos federais (ver página 5 do WWW.horadopovo.com.br),
e os negociadores do governo parolam sobre a “crise
internacional” para não dar nem reajuste, portanto, para
reduzir o salário real dos servidores públicos.
Como disse o professor
Theotonio dos Santos, como nós um apoiador do governo da
presidente Dilma, sobre o problema dos professores
universitários, “esta greve é séria. Parece que as
autoridades nacionais não estão entendendo o grau de
descontentamento salarial existente na universidade. Há
algo errado. Talvez seja a falta de diálogo, pois não há
reivindicações absurdas. Temos muitos inimigos comuns. Não
podemos abrir flancos para eles. Não há tempo para
hesitações”.
Porém, parece que a equipe
econômica prefere aplacar os inimigos com US$ 10 bilhões, ao
invés de contemplar as justas reivindicações do
funcionalismo – que são apenas uma forma modesta de investir
no atendimento público à população.
A auditora fiscal Maria Lúcia
Fatorelli demonstrou algo irretorquível - no primeiro
quadrimestre, segundo o Tesouro Nacional, o pagamento de
salários e encargos sociais do funcionalismo somou o
seguinte, neste ano e no ano passado:
- 2011: R$
58.338.901.000;
- 2012: R$
59.445.162.000.
A diferença entre um ano e
outro é de 2% (a rigor, 1,89%). No entanto, a inflação dos
15 meses que vão de janeiro de 2011 até abril de 2012 foi
8,38% (IPCA). Ou, se usarmos como índice o INPC, 7,81%.
Logo, isso significa que na
comparação entre o primeiro quadrimestre deste ano e o mesmo
período do ano passado, os servidores saíram perdendo, pelo
menos, 6%, se pudéssemos aplicar essa perda linearmente a
todos os salários. Como não podemos (há categorias sem
reajuste há três anos - entre elas os delegados da PF, os
funcionários do Itamaraty e os auditores da Receita) a perda
de muitos é maior. “O aumento de apenas 2% no gasto com
o conjunto de servidores corresponde apenas a progressões
automáticas de carreira e poucas contratações”, diz a
auditora, que comenta:
“No mesmo período
comparado, os gastos com juros e amortizações da dívida
pública federal subiram extraordinariamente em 40%, de R$
263,9 bilhões nos 4 primeiros meses de 2011 para R$ 369,2
bilhões no mesmo período de 2012. O montante de R$ 369,2
bilhões gastos de janeiro a abril/2012 representam nada
menos que 6 vezes mais que todos os gastos com pessoal,
ativos, aposentados e pensionistas, de todas as carreiras
de servidores federais, de todos os poderes”.
Além de tudo isso – US$ 10
bilhões para reforçar o caixa do FMI?
O montante gasto com salários
dos servidores cresceu mais que a inflação até 2010.
Aproveitando a ideia da auditora, comparemos o aumento desse
montante no primeiro quadrimestre, desde 2004 (em 2003, o
orçamento ainda foi elaborado pelo governo Fernando
Henrique), em relação ao ano anterior (entre parênteses, a
inflação, pelo INPC): 2004: +10,14%
(inflação: 6,13%); 2005: +10,32% (inflação:
5,05%); 2006: +13,60% (inflação: 2,81%);
2007: +13,66% (inflação: 5,16%); 2008:
+6,63% (inflação: 6,48%); 2009: +25,34%
(inflação: 4,11%); 2010: +6,50% (inflação:
6,47%).
O montante de pagamentos de
salários no primeiro quadrimestre superou a inflação desse
período. Embora, não houve uma completa recomposição nos
salários, pois o arrocho do governo Fernando Henrique foi
tão brutal que “para que os salários retornassem ao
mesmo poder de compra de 1º (primeiro) de janeiro de 1995,
o reajuste necessário sobre os salários de dezembro/2000
deveria ser de 75,48%” (Dieese, “A questão salarial
dos servidores públicos federais”, Brasília, julho de 2001).
No entanto, houve algum esforço
para minorar a situação dos servidores – isto é, para
melhorar o atendimento ao povo. Mas agora temos uma equipe
econômica com um credo de outras épocas: nenhum aumento para
os funcionários, US$ 10 bilhões para o FMI, dinheiro a rodo
para os bancos - e estagnação.
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