quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Os juros mais altos do mundo e as lições do Prêmio Nobel



*José Álvaro de Lima Cardoso.
       
      Na última quarta-feira o Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) decidiu manter a taxa básica de juro (Selic) em 14,25% ao ano, a mais elevada do mundo. Curiosamente (mas sem surpresas) o Banco Central (BC) foi duramente criticado pela decisão tomada, pelos chamados analistas do mercado. As críticas decorreram do fato BC manter intocada a maior taxa de juros do planeta. Não faltou analista, inclusive, questionando uma eventual influência, na decisão do BC, por parte da Presidenta da República. Como se a decisão de política de juros, que influencia diretamente crescimento, emprego e renda, fosse exclusivamente técnica e não devesse sofrer a influência das decisões políticas. Este é o sonho, diga-se de passagem, dos banqueiros: um banco central “independente” que, independentemente do partido que se encontre no poder, se submeta aos interesses dos ricos e do grande capital.
        A decisão do BC ocorreu apenas um dia após o Fundo Monetário Internacional (FMI) divulgar projeção do aprofundamento da recessão no Brasil nos próximos dois anos. Pelas previsões do FMI o Brasil terá nova recessão em 2016 (3,5%) e crescimento zero em 2017. O Brasil tem, de longe, a maior taxa de juros reais (taxa nominal menos inflação), que é a que importa, do mundo. Num ranking de 40 países estabelecido pela Infinity Asset Manegement e o site MoneYou o Brasil ficou em primeiro lugar, com 6,78% de juros reais, muito distante do segundo lugar, Rússia, com 2,78%. Em seguida vem a China (2,61%), Indonésia (2,29%) e Filipinas (1,27%). Em último no ranking estão Dinamarca (-2,02%), Argentina (-8,87%) e Venezuela (-58,59%). A média geral da pesquisa resulta numa uma taxa negativa: -1,8%.
        Talvez os membros do Copom, e alguns analistas do chamado mercado, devessem ter prestado um pouco de atenção na entrevista que o economista estadunidense Joseph Stiglitz, concedeu à imprensa brasileira em Davos, onde participa do Fórum Econômico Mundial. O Prêmio Nobel de economia de 2001 resume assim o seu diagnóstico: 
● A política monetária brasileira (taxa de juros) estrangula a economia. Não tem como crescer praticando uma das mais altas taxas de juros do planeta;
● o modelo que pretende combater a inflação através da elevação dos juros (adotado pelo BC brasileiro) está desacreditado no mundo inteiro. Aumentar os juros serve no caso em que a inflação decorre de excesso de demanda. Caso contrário, a alta dos juros mata a economia;
● no Brasil dois problemas se destacam: o colapso do preço das exportações e o escândalo de corrupção. A política monetária deveria se contrapor a esses fatores, mas a política de juros estratosféricos os está agravando;
● no que se refere à economia mundial há falta de demanda agregada global. Mesmo antes da crise, o que sustentava a economia americana era uma bolha artificial. Se não fosse por ela, a economia teria sido fraca antes do estouro da bolha;
● por que a demanda global está fraca? Quatro razões básicas: 1) desigualdade de renda. Quanto mais cresce a desigualdade mais a demanda se enfraquece; 2) Transformações estruturais que estão acontecendo em quase todos os países. Nos EUA, a transição da indústria manufatureira para os serviços, na China, transição das exportações para a demanda interna; 3) bagunça na zona do euro, com políticas econômicas de austeridade, que ajudaram a derrubar o crescimento. E que pegam outros países, inclusive EUA; 4) queda brutal do preço do petróleo. Os países que exportam petróleo têm reduzido os gastos e os que importam - e, portanto, ganham com o menor preço - não necessariamente gastam os recursos poupados, por não saberem se o ganho se manterá no longo prazo.
        A verdade é dura. Enquanto o Brasil pratica as maiores taxas de juros do mundo e gasta R$ 500 bilhões com a dívida pública em um ano (quase 18 vezes os investimentos com o Bolsa Família) o economista sugere, como saída aumentar os gastos dos governos, investir em tecnologia, educação e infraestrutura. Propõe, além disso, tornar a estrutura tributária mais justa, cobrando mais impostos de quem pode pagar mais, uma urgência no Brasil. Tudo isso, para Stiglitz, estimularia a economia, apesar das dificuldades políticas, já que há grande polarização em todo o mundo. Destaque para uma aguda observação do eminente economista: o que fez Hitler ascender foi o desemprego e não a inflação. O desemprego é a verdadeira causa da instabilidade social. Portanto, os países têm que colocar a geração de emprego e renda como o centro da política econômica. E os bancos centrais têm também que trabalhar nessa direção.  

*Economista e supervisor técnico do Dieese em Santa Catarina.

Nenhum comentário:

Postar um comentário