*José Álvaro de Lima Cardoso.
Na última quarta-feira o Comitê de Política
Monetária do Banco Central (Copom) decidiu manter a taxa básica de juro (Selic)
em 14,25% ao ano, a mais elevada do mundo. Curiosamente (mas sem surpresas) o
Banco Central (BC) foi duramente criticado pela decisão tomada, pelos chamados
analistas do mercado. As críticas decorreram do fato BC manter intocada a maior
taxa de juros do planeta. Não faltou analista, inclusive, questionando uma
eventual influência, na decisão do BC, por parte da Presidenta da República.
Como se a decisão de política de juros, que influencia diretamente crescimento,
emprego e renda, fosse exclusivamente técnica e não devesse sofrer a influência
das decisões políticas. Este é o sonho, diga-se de passagem, dos banqueiros: um
banco central “independente” que, independentemente do partido que se encontre
no poder, se submeta aos interesses dos ricos e do grande capital.
A
decisão do BC ocorreu apenas um dia após o Fundo Monetário Internacional (FMI)
divulgar projeção do aprofundamento da recessão no Brasil nos próximos dois
anos. Pelas previsões do FMI o Brasil terá nova recessão em 2016 (3,5%) e
crescimento zero em 2017. O Brasil tem, de longe, a maior taxa de juros reais
(taxa nominal menos inflação), que é a que importa, do mundo. Num ranking de 40
países estabelecido pela Infinity Asset Manegement e o site MoneYou o Brasil
ficou em primeiro lugar, com 6,78% de juros reais, muito distante do segundo
lugar, Rússia, com 2,78%. Em seguida vem a China (2,61%), Indonésia (2,29%) e
Filipinas (1,27%). Em último no ranking estão Dinamarca (-2,02%), Argentina
(-8,87%) e Venezuela (-58,59%). A média geral da pesquisa resulta numa uma taxa
negativa: -1,8%.
Talvez os membros do Copom, e alguns analistas do chamado mercado,
devessem ter prestado um pouco de atenção na entrevista que o economista
estadunidense Joseph Stiglitz, concedeu à imprensa brasileira em Davos, onde
participa do Fórum Econômico Mundial. O Prêmio Nobel de economia de 2001 resume
assim o seu diagnóstico:
● A política monetária brasileira (taxa de juros)
estrangula a economia. Não tem como crescer praticando uma das mais altas taxas
de juros do planeta;
● o modelo que pretende combater a inflação através
da elevação dos juros (adotado pelo BC brasileiro) está desacreditado no mundo
inteiro. Aumentar os juros serve no caso em que a inflação decorre de excesso
de demanda. Caso contrário, a alta dos juros mata a economia;
● no Brasil dois problemas se destacam: o colapso
do preço das exportações e o escândalo de corrupção. A política monetária
deveria se contrapor a esses fatores, mas a política de juros estratosféricos os
está agravando;
● no que se refere à economia mundial há falta de
demanda agregada global. Mesmo antes da crise, o que sustentava a economia
americana era uma bolha artificial. Se não fosse por ela, a economia teria sido
fraca antes do estouro da bolha;
● por que a demanda global está fraca? Quatro
razões básicas: 1) desigualdade de renda. Quanto mais cresce a desigualdade
mais a demanda se enfraquece; 2) Transformações estruturais que estão
acontecendo em quase todos os países. Nos EUA, a transição da indústria
manufatureira para os serviços, na China, transição das exportações para a
demanda interna; 3) bagunça na zona do euro, com políticas econômicas de
austeridade, que ajudaram a derrubar o crescimento. E que pegam outros países,
inclusive EUA; 4) queda brutal do preço do petróleo. Os países que exportam petróleo
têm reduzido os gastos e os que importam - e, portanto, ganham com o menor
preço - não necessariamente gastam os recursos poupados, por não saberem se o
ganho se manterá no longo prazo.
A verdade é dura. Enquanto o Brasil pratica as
maiores taxas de juros do mundo e gasta R$ 500 bilhões com a dívida pública em
um ano (quase 18 vezes os investimentos com o Bolsa Família) o economista
sugere, como saída aumentar os gastos dos governos, investir em tecnologia,
educação e infraestrutura. Propõe, além disso, tornar a estrutura tributária
mais justa, cobrando mais impostos de quem pode pagar mais, uma urgência no
Brasil. Tudo isso, para Stiglitz, estimularia a economia, apesar das dificuldades
políticas, já que há grande polarização em todo o mundo. Destaque para uma
aguda observação do eminente economista: o que fez Hitler ascender foi o
desemprego e não a inflação. O desemprego é a verdadeira causa da instabilidade
social. Portanto, os países têm que colocar a geração de emprego e renda como o
centro da política econômica. E os bancos centrais têm também que trabalhar
nessa direção.
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