quarta-feira, 22 de maio de 2013

Um novo contexto para o setor financeiro?





Catia Uehara,
Regina Camargos e
Gustavo Cavarzan*

A partir de 2012 teve início de forma mais clara o desenho de um possível novo cenário para o setor financeiro no Brasil. Essa possibilidade se coloca a partir de indicativos de mudanças em três variáveis fundamentais na lógica de funcionamento dos bancos atuantes no país. Primeiramente, ressalta-se a ofensiva do governo federal contra os elevados spreads bancários, diagnosticados como um dos obstáculos à continuidade do processo de crescimento e desenvolvimento econômico, na medida em que o alto custo do dinheiro impede decisões de investimento das empresas e de consumo das famílias. A partir deste diagnóstico, os dois grandes bancos públicos federais foram acionados para iniciar um movimento de redução de suas taxas de juros, na expectativa de que os bancos privados os acompanhassem a fim de não perderem mercado.
Além dos spreads, as tarifas bancárias também foram reduzidas nos bancos públicos a partir de outubro de 2012, visto que a cobrança abusiva de tarifas consiste em uma das principais reclamações dos consumidores com relação ao setor financeiro. Finalmente, completando o cenário, temos a inflexão na política monetária do Banco Central que, a partir de agosto de 2011, iniciou um processo de redução da taxa básica de juros da economia (Selic) até chegar ao seu  menor patamar histórico em outubro de 2012 (7,25%), apesar da elevação na última reunião para 7,5%. Sabe-se que as instituições financeiras são as principais credoras da dívida pública federal, em parte corrigida pela taxa Selic, e, portanto são afetadas pela menor rentabilidade dos títulos públicos e dos depósitos compulsórios, que também são remunerados, em parte, por esta taxa.
De fato, nos últimos 12 meses o spread geral da economia brasileira caiu 3,6 pontos percentuais (p.p.), chegando ao patamar de 11,7 p.p. em março deste ano, valor ainda extremamente elevado para os níveis internacionais. Essa redução se deve, em grande parte, a baixa nos juros cobrados pelos bancos públicos. No cheque especial, por exemplo, a taxa mensal cobrada pela Caixa caiu 47% entre março de 2012 e janeiro de 2013. No Banco do Brasil a queda foi de 39%, enquanto nos bancos privados chegou ao máximo de a 5%. Este mesmo padrão é verificado para outras linhas de crédito, ou seja, observa-se redução dos juros nos principais bancos, ainda que com intensidade maior nas instituições públicas.
Os juros menores e a Selic em baixa já se refletiram nos resultados dos bancos, acostumados, historicamente, aos ganhos elevados, prazos curtos para o retorno das aplicações e risco baixo, três características só encontradas simultaneamente no mercado financeiro brasileiro. Esse esquema é um entrave ao desenvolvimento do país, pois dificulta mecanismos de financiamento de longo prazo para empreendimentos produtivos.
Os benefícios da queda nos juros e spreads para a economia brasileira, no entanto, não são imediatos, pois não se sabe ao certo como os bancos irão reagir a este novo cenário, ou seja, os reflexos objetivos da mudança de patamar das taxas de juros dependem da resposta que será dada pelas instituições financeiras diante da tentativa do governo de alterar a cultura rentista. Nesse momento, é possível traçar duas possibilidades de reação em curso.
A primeira parte da avaliação de que os bancos não necessariamente perdem rentabilidade com a queda nos juros, já que existe no Brasil uma grande margem para crescimento das operações de crédito, num contexto de aumento do emprego e da renda. Dessa forma, os bancos precisariam mudar a estratégia de negócios, passando a ganhar menos na rentabilização de cada operação e mais no volume de operações. A segunda reação possível, em linha com o tradicional conservadorismo dos bancos brasileiros, é o corte de custos operacionais, principalmente do número de trabalhadores.
Têm-se, então, dois padrões de atuação bastante distintos, que coloca em lados opostos bancos públicos e privados. Os públicos têm apostado no crescimento das operações de crédito. Em 2012, a Caixa e o Banco do Brasil aumentaram suas carteiras de crédito em 42% e 25%, respectivamente, mantendo a inadimplência baixa, a rentabilidade alta e o nível de emprego estável ou em crescimento, no caso da Caixa. Já os três maiores bancos privados (Bradesco, Itaú Unibanco e Santander) elevaram o crédito em apenas 8,5%, em média, no mesmo período, tiveram queda na rentabilidade e cortaram quase 10 mil postos de trabalho. Sem dúvida, a estratégia adotada pelas instituições públicas é a que interessa ao desenvolvimento do país, mas esse segmento não é capaz de alavancar sozinho uma retomada mais vigorosa da economia .Se os bancos privados não mudarem suas estratégias de negócios, corre-se o risco de perder a oportunidade histórica de superar o rentismo e de elevar os patamares da taxa de investimento da economia brasileira.  
*Técnicos do DIEESE.

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