Autor: *Francisco Alano
Tendo em vista o cenário
complicado do emprego industrial no país, o governo brasileiro acaba de
encaminhar ao Congresso a MP que institui o Programa de Proteção ao Emprego
(PPE). Mais uma vez, depois da redução do IPI, da mudança na desoneração da
folha de pagamentos, do regime Inovar Auto e de outras inúmeras ações de
Estado, as indústrias montadoras de veículos são as maiores beneficiadas pela
medida, que visa muito mais salvar as elevadas margens de lucro deste setor do
que, de fato, proteger empregos.
O programa consiste na permissão
para que empresas que comprovadamente estejam em má situação econômico-financeira,
possam reduzir temporariamente a jornada de trabalho de seus trabalhadores (limite
máximo de doze meses), com redução equivalente dos salários. Paralelamente, o
Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) complementa em 50% a remuneração dos
trabalhadores, fazendo com que a redução de jornada de 30% tenha como
contrapartida uma redução de salários entre 15 e 20%. Ou seja, uma medida que
garante estabilidade dos empregos, já que a empresa que adotar o programa não
pode demitir trabalhadores durante o tempo em que estiver no PPE, e, ao mesmo
tempo, reduz salários e se apropria dos recursos do FAT – dinheiro do
trabalhador – para novamente auxiliar setores que historicamente são
beneficiados no país.
A despeito do discurso de crise e
dos dados que demonstram uma forte queda nas vendas de veículos no Brasil, é
preciso analisar com mais atenção este setor. Em primeiro lugar, as indústrias
montadoras que afirmam estar em crise, todas filiais de matrizes europeias,
norte-americanas e, mais recentemente, asiáticas, remeteram, segundo o Banco
Central, em torno de US$ 16,3 bilhões ao exterior nos últimos 5 anos. Em moeda
nacional, este valor fica próximo dos R$ 30 bilhões. Ou seja, durante o período
de vigor excepcional na venda de veículos, as montadoras lançaram seus lucros
para o exterior com o mesmo ímpeto. O prejuízo, neste caso, é duplo. Em
primeiro lugar, contribuiu enormemente para a suposta má situação financeira
atual do setor, já que a enorme gordura acumulada durante os últimos anos se
destinou diretamente para as matrizes no exterior. Por outro lado, o prejuízo
se dá nas contas nacionais, contribuindo com um enorme déficit no balanço de
pagamentos.
Outro dado extremamente relevante
é o de que as montadoras no Brasil praticam historicamente um preço em torno de
duas vezes maior do que o praticado no exterior. Um carro que custa R$ 20 mil
no exterior, chega a custar mais de R$ 40 mil no Brasil. A explicação dada
pelas montadoras para isso beira a mais absoluta cara de pau: “cobram o que os
brasileiros estão dispostos a pagar”. Ou seja, traduzindo para a linguagem
real, o preço não tem relação alguma com o custo de produção, mas sim com a
estrutura de monopólio do mercado, que garante que 7 ou 8 grandes montadoras
tenham a liberdade de praticar o preço que lhes garantir a maior margem de
lucro possível, uma verdadeira extorsão ao consumidor.
Já para o setor comercial, o PPE
tende a ter pouco impacto imediato. Por um lado, as grandes empresas do setor
passíveis de entrar no programa, em função do seu número de funcionários–
supermercados e grandes redes de varejo –, estão com ótima situação econômico-financeira,
sendo que dificilmente se enquadrariam no PPE. Por outro lado, parte
considerável da remuneração de seus trabalhadores ocorre por meio de comissão,
sendo que uma redução das vendas, nocivamente, já corrói os salários através da
redução das comissões. O que é pior, no caso do comércio, reduz salários e mantém
a jornada de trabalho, uma das maiores entre todos os setores econômicos. O
impacto pode se dar neste sentido, no caso de que a generalização do PPE possa
reduzir expressivamente os salários, contraindo o mercado interno e trazendo
compressão das vendas.
Assim, mais uma vez, um dos
maiores setores capitalistas do país colhe as benesses da crise que eles
próprios criaram. Mostram o caráter parasitário de amplos setores da burguesia
brasileira, que preferem, deliberadamente, colocar a economia do país “na lona”
para saquear o Estado e os trabalhadores. Se a demanda por veículos está menor,
qual o motivo para não reduzir preço e, por sua vez, ampliar as vendas? O lucro
exorbitante e as remessas de lucros para o exterior ditam o modelo. Modelo que
não apenas engorda o bolso de quem pouco faz, mas também amplia a desigualdade
social, ligando o sinal de alerta para as conquistas dos trabalhadores dos
últimos anos.
Florianópolis – 10 de julho de
2015
*Presidente da FECESC – Federação dos Trabalhadores
no Comércio no Estado de Santa Catarina
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