* José Álvaro de Lima Cardoso.
Aprofundar
a discussão sobre a dívida pública brasileira é um imperativo para os
brasileiros e trabalhadores em geral. Isso por uma razão muito simples: o
mecanismo da dívida pública significa a transferência de bilhões de reais todo
ano, para o setor rentista, com cortes de recursos para a saúde, educação,
habitação e melhoria de vida do povo em geral. A dívida pública, do ponto de
vista técnico, é uma forma de complementar o financiamento do Estado. Se houver
necessidade para investimentos em setores estratégicos, por exemplo, não há
nada errado no fato de um país, estado ou município se endividar. Se a
arrecadação pública, em determinado momento, não foi suficiente para suprir
todas as obrigações do governo, este pode lançar mão do endividamento ´para
cobrir o conjunto de obrigações do Estado. A dívida, em si, pode e
deve ser usada quando for para atender ao interesse público.
O
problema é quando a dívida representa a drenagem sistemática e expressiva de
recursos públicos, constituindo o que se chama de sistema da dívida. Este sistema da dívida existe no Brasil, em
vários países da América Latina e, de resto, em vários países do mundo, como
está a demonstrar o drama vivido pela Grécia. O sistema da dívida é um
mecanismo de desvio de recursos públicos em benefícios dos chamados rentistas, que
aparece como sendo uma exigência técnica para o bom funcionamento da economia. É
como se aquela política fosse uma definição divina, que não pudesse ser sequer
questionada. O sistema de funcionamento da dívida, portanto, é financeiro, mas
também política, cultural e ideológico.
Um
exemplo nesse debate, é a política de superávit primário, que visa apenas fazer
poupança para pagar os credores da dívida pública. Retira da saúde e educação
para pagar os compromissos com os banqueiros, portanto, é prejudicial aos
interesses da população de uma forma geral. Especialmente a população mais
pobre que depende mais dos serviços públicos. No entanto, a ideia dominante na
sociedade é de que o país tem que ter superávit primário, senão enfrentará problemas
nas contas públicas. Ora, isso nada tem de base técnica, é apenas uma construção
político ideológica cultivada ao longo dos anos. Quando o governo reduz o
superávit primário há uma indignação geral da grande mídia, dos chamados formadores de opinião, etc. Mas, muitos
brasileiros morrem de doenças decorrentes da fome ainda (apesar dos notáveis
avanços nos últimos anos) e não se fala nada sobre o assunto. Se critica, por exemplo, o Programa Bolsa Família, que é programa extremamente
eficiente, que com 0,5% do PIB retira 55 milhões de pessoas do flagelo da fome.
A dívida pública transfere anualmente 6% ou mais do PIB para basicamente 20 mil
famílias e acha-se perfeitamente normal.
No Brasil as transferências de dinheiro
público para o pagamento da dívida provocam graves consequências sobre controle
da inflação, dos juros, salários (inclusive no setor público), renda, programas
sociais, etc. Exemplo: em 2015, os gastos com pessoal no governo
federal devem somar o equivalente a 4,1% do PIB. E o país deve gastar uns 7% do
PIB com serviços da dívida pública. Este debate, e tudo que o envolve, tem que
ser aprofundado e assimilado pelos brasileiros.
*Economista e supervisor
técnico do DIEESE em Santa Catarina.
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