Ignacio Ramonet no Carta Maior

postado em: 25/03/2015
Ave
simpática da fauna amazônica, o tucano é bem conhecido por seu
espetacular bico de cor vistosa. Mas também é o nome de um agressivo
“pássaro de aço” fabricado pela construtora brasileira Embraer, cuja
denominação militar é EMB 312, e cujos dois modelos mais vendidos são: o
T-27, em sua versão de treinamento, e o AT-27, armado para ataques em
terra. É uma das aeronaves de treinamento mais vendidas no mundo. A
aviação militar da Venezuela, por exemplo, possui cerca de trinta
Tucanos.
E
precisamente um desses tucanos militares, artilhado para atacar,
deveria bombardear o Palácio de Miraflores, em Caracas, no último dia 12
de fevereiro. E matar o presidente Nicolás Maduro. Tinha como missão,
da mesma forma, atacar o Ministério da Defesa e destruir o edifício que
abriga os estúdios do canal de televisão internacional Telesur, a fim de
semear o caos e a confusão.
Segundo
revelou o próprio presidente Maduro, a tentativa de golpe foi
desarticulada graças à habilidade dos organismos de inteligência
bolivarianos. Eles permitiram a prisão de um grupo de oficiais da
aviação e de civis uniformizados. “Trata-se – declarou o mandatário
venezuelano – de uma tentativa de utilizar um grupo de oficiais da
aviação para provocar um ataque e um atentado golpista à democracia e à
estabilidade da nossa pátria; é o último suspiro do chamado 'golpe azul'
de um ano atrás, em fevereiro-março de 2014”.
Nicolás
Maduro contou que um dos oficiais envolvidos estava “comprometido”
desde o ano passado com grupos de ultradireita venezuelana que
procuravam gerar novamente distúrbios violentos no país. O presidente
revelou que, depois de uma série de investigações, as autoridades
militares exigiram que esse oficial fosse banido das forças armadas.
“Mas há algumas semanas – explicou o mandatário –, vários opositores o
contactaram de novo, pagaram-lhe uma soma importante em dólares e
confiaram a ele várias missões. Ao mesmo tempo, a embaixada do Estados
Unidos lhe concedia um visto com data de 3 de fevereiro e lhe garantia
que, 'se isso falhar, já sabe, tem um visto para entrar nos Estados
Unidos por qualquer uma de nossas fronteiras'”.
A
partir daquele momento – continuou relatando Nicolás Maduro –, esse
oficial contatou mais quatro companheiros para executar as missões
“planejadas de Washington”. Uma delas consistia em gravar em vídeo
declarações do general de aviação Oswaldo Hernández Sánchez na prisão.
Ele foi detido por tentar dar um golpe de Estado em 2014.
“A
ordem era gravar um vídeo desse general, a quem apelidam de El Oso [O
Osso, em tradução literal], e em 12 de fevereiro, nos atos de
comemoração, pegar um avião Tucano e atacar o Palácio de Miraflores e
outros 'objetivos estratégicos', como o Ministério da Defesa, o Conselho
Nacional Eleitoral (CNE) e a sede da Telesur. A ordem de iniciar a ação
se dispararia no momento em que um jornal de oposição publicasse o que
eles chamavam de 'programa de governo de transição'”.
Por
sua vez, Diosdado Cabello, presidente da Assembleia Nacional
venezuelana, e Jorge Rodríguez, prefeito do município Libertador,
contribuíram em Caracas, no último dia 13 de fevereiro, com mais
detalhes da tentativa golpista. Ambos os dirigentes chavistas
confirmaram que os oficiais detidos haviam admitido que a publicação de
um “manifesto” na imprensa era uma das senhas para lançar a tentativa,
cujo código era Operação Jericó.
Ambos
revelaram que, segundo declarações dos presos, os golpistas tinham a
intenção de “liquidar” desde o primeiro instante, além do presidente
Nicolás Maduro, aos próprios Diosdado Cabello e Jorge Rodríguez, e a
duas personalidades bolivarianas: Tibisay Lucena, presidenta do CNE, e
Tareck e Aissami, o ex-ministro do Interior e atual governador do estado
de Aragua.
Por
outro lado, identificaram, além do general Oswaldo Hernández, El Oso,
outros supostos cabeças da conspiração. A saber: o capitão Héctor José
Noguera Figueroa, o coronel José José Suárez Rómulo, o primeiro tenente
Ricardo Antich Zapata (supostamente encarregado dos contatos com a
embaixada dos Estados Unidos) e o primeiro tenente Luis Hernándo Lugo
Calderón. Também mostraram parte do arsenal apreendido, em particular
armas de alto calibre, como fusis semiautomáticos AR-15, metralhadoras e
granadas. Da mesma forma, revelaram que descobriram mapas da cidade de
Carcas com vários “alvos estratégicos” marcados: o Palácio de
Miraflores, os ministérios da Defesa, do Interior e de Justiça e Paz; o
Conselho Nacional Eleitoral, a Direção de Contrainteligência Militar e o
canal Telesur.
Cabello
e Rodríguez designaram como “autores intelectuais” da tentativa
golpista e do projeto de magnicídio duas personalidades da oposição:
Antonio Ledezma, prefeito de Caracas (preso no último dia 19 de
fevereiro), e Julio Borges, deputado da oposição. Também afirmaram ter
provas da participação de pessoas da embaixada norte-americana: “Uma
funcionária da embaixada chamava as esposas dos generais venezuelanos e
lhes dizia que o nome de seu marido estava na lista de pessoas
sancionadas pelo Congresso dos Estados Unidos. E que o visto de toda a
sua família para ingressar em território americano havia sido
invalidado. Tentando criar confusão nas famílias dos oficiais”, explicou
Jorge Rodríguez.
O
presidente Maduro disse, por sua vez, ter em seu poder o “plano de
governo” redigido pelos golpistas, no qual se eliminam os poderes
públicos e se ameaça os cubanos das missões de serviço social (saúde,
educação, esporte). “Também falam – disse maduro – em privatizar a PDVSA
(Petróleos de Venezuela Sociedad Anónima), em dissolver todos os
poderes públicos, suspender as garantias democráticas, liberalizar o
sistema de câmbio e presentear a oligarquia com dólares mais uma vez”. O
presidente acrescentou que, nesse “plano de governo”, os golpistas
“lançam uma ameaça contra o que chamam de “coletivos” – que nós sabemos
que é o povo venezuelano –, anunciando que, quando chegarem ao poder,
atuarão contra eles com toda a força militar. E os cubanos das missões
na Venezuela teriam 24 horas para se apresentar nos escritórios do novo
governo de fato ou 'enfrentarão as consequências (…)'”.
Apesar
de todos esses detalhes e provas trazidos pelas máximas autoridades
venezuelanas, os meios de comunicação internacionais (inclusive na
América Latina) deram pouco crédito a esse anúncio de intenção de golpe
de Estado. Essa “incredulidade” faz parte – há 15 anos – da estratégia
dos grandes meios de comunicação dominantes em guerra contra a revolução
bolivariana, para desacreditar as autoridades bolivarianas. Indiferente
a essa atitude hostil, o presidente Nicolás Maduro continuou
explicando, com perseverança pedagógica e com todo o tipo de provas,
como, desde o falecimento de Hugo Chávez (há exatamente dois anos), e
desde sua eleição (14 de abril de 2014), um “golpe lento” está em marcha
para tentar derrotá-lo.
Desta
vez, o golpe seria executado em quatro fases. A primeira começou no
começo de janeiro de 2015, quando o presidente Maduro realizava uma
longa viagem ao exterior (China, Irã, Catar, Arabia Saudita, Argélia e
Rússia). Essa fase foi realizada com o apoio de setores do empresariado,
que impulsionaram campanhas de retenção de alimentos básicos e produtos
de primeira necessidade, com a finalidade de criar escassez e mal
estar, preparando as condições para que os cidadãos saíssem às ruas para
protestar e saquear supermercados. O que não aconteceu.
Na
segunda fase, os grandes meios de comunicação internacionais
intensificaram a difusão de reportagens, notícias e artigos que davam
uma imagem distorcida da realidade venezuelana. Fazendo crer que, no
país do “socialismo do século XXI”, estava-se produzindo uma autêntica
“crise humanitária”. O presidente Maduro denunciou, na ocasião, o
detestável papel desempenhado nessa fase da Operação Jericó por vários
jornais espanhóis (El País, ABC).
A
terceira etapa deveria ser protagonizada por um “traidor” que, na
televisão e nos grandes meios de comunicação, faria um chamamento solene
à rebelião. Ainda que o presidente não tenha deixado claro quem seria
esse “traidor”, alertou os cidadãos: “Não quero alarmar ninguém, mas sou
obrigado a dizer a verdade (…) Estão procurando um traidor e peço ao
povo que esteja alerta”.
A
quarta fase do golpe é a que se desvelou em 12 de fevereiro, com a
participação de um grupo de oficiais direitistas da aviação militar,
financiados pelo estrangeiro. Então, seria anunciado o “programa de
governo de transição”. E se enterraria a revolução de Chávez.
Mas inclusive em quatro fases, o golpe fracassou. E a revolução bolivariana continua viva.
Tradução de Daniella Cambaúva
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