Jornal GGN - "Em 1964 também diziam que não era
golpe, que era revolução. O destino é inviolável. A história é
implacável. A esses senadores que vão votar a favor do impeachment a
história reserva a cada um o destino que lhes é merecido", afirma João
Vicente, filho do ex-presidente João Goulart. Em entrevista à RBA, ele
contestou a suposição de que a história é escrita pelos vencedores.
"Quem vence são aqueles que permanecem como figuras do povo brasileiro",
diz, citando Jango. "Onde estão aqueles que traíram o povo?"
João Vicente lembra que seu pai (na foto, com ele e Denize) foi o único presidente brasileiro a morrer no exílio
Por Vitor Nuzzi
'No momento em que se debate o retrocesso, é muito importante rememorar Jango'
Na RBA
No próximo domingo (14), um grupo participará da chamada Caminhada
Cívica por Jango e pela Democracia, no elevado da região central de São
Paulo, que agora leva o nome do ex-presidente João Goulart. E o ato –
organizado, entre outros, pela Agência Sindical – ocorre em um momento
oportuno, conforme lembra João Vicente Goulart, filho do ex-presidente,
que ao lado de sua irmã, Denize, estará presente. "É muito importante,
neste momento em que se debate abertamente o retrocesso, rememorar
Jango", diz João Vicente.
A simples mudança de nome no elevado, o popular "Minhocão", significa
"um grande avanço na luta pelos direitos humanos, pelos sítios de
memória", diz ele, lembrando ainda, de mudança ocorrida em 2015 em
Brasília, onde a ponte que tinha o nome do general-presidente Arthur da
Costa e Silva passou a se chamar Honestino Guimarães, em homenagem ao
líder estudantil desaparecido durante a ditadura. Em São Paulo, a
alteração foi sancionada em julho pelo prefeito Fernando Haddad, após a
Câmara aprovar projeto de lei do vereador Eliseu Gabriel. Inaugurado em
1971, o elevado tinha até então também o nome de Costa e Silva.
João Vicente destaca outras iniciativas envolvendo o nome de Jango,
como projeto do deputado federal Pompeo de Mattos (PDT-RS), aprovado há
um mês na Comissão de Cultura da Câmara, pelo qual se inscreve João
Goulart no Livro dos Heróis da Pátria. Ele cita ainda a devolução das
honras de Estado e anulação da "tenebrosa sessão" de 2 de abril de 1964,
que decretou vaga a Presidência da República, mesmo com Jango em
território nacional. "Estão dando a ele o verdadeiro espaço que a
ditadura lhe cassou."
A iniciativa da caminhada demonstra ainda, segundo João Vicente, o
reconhecimento de centrais e sindicatos "à luta de Jango pelos
trabalhadores brasileiros". Ele lembra episódios como o aumento de 100%
dado ao salário mínimo em 1954, quando Goulart era ministro do Trabalho
de Getúlio Vargas e acabou perdendo o cargo. Foi o período do chamado
Manifesto dos Coronéis, que reclamavam, entre outras coisas, do reajuste
do mínimo. Destaca ainda a criação do 13º salário, em 1962, já no
governo Jango.
Nesse sentido, o filho do ex-presidente lembra das ameaças em curso,
com o governo interino. "Os trabalhadores não podem sofrer esse
retrocesso em seus direitos", afirma, comparando o Congresso atual e o
de 1964. Aquele, diz, "impediu as reformas de base". O de hoje,
acrescenta, "não é comprometido com a democracia, mas com interesses
pessoais e corporativos".
Para ele, Jango representa hoje "todos os democratas", e a caminhada
de domingo surge como evento "em homenagem à história nacional". João
Vicente lembra que seu pai foi o único presidente brasileiro a morrer no
exílio: a morte de Jango completará 40 anos em 6 de dezembro.
O filho de Goulart mostra inconformismo com decisão do governo do
Distrito Federal, há um ano, de não mais ceder um terreno para a
construção do Memorial da Democracia e da Liberdade, que levaria o nome
do ex-presidente. "Surpreendeu muito pela covardia do governador
(Rodrigo) Rollemberg, que de socialista não tem nada. Ele está
praticando um crime de memória. No momento em que o Brasil lhe devolve
(a Jango) as honras de chefe de Estado, que o Congresso faz uma
autocrítica (anulando a sessão de 2 de abril), em que os direitos
humanos avançam, em que o Mercosul declara Jango herói latino-americano,
tivemos uma surpresa e uma indignação profunda."
João Vicente também vê paralelo entre a situação vivida hoje pelo
Brasil e a de 52 anos atrás. "Em 1964 também diziam que não era golpe,
que era revolução. O destino é inviolável. A história é implacável. A
esses senadores que vão votar a favor do impeachment a história reserva a
cada um o destino que lhes é merecido", afirma, contestando em certa
medida a suposição de que a história é escrita pelos vencedores. "Quem
vence são aqueles que permanecem como figuras do povo brasileiro", diz,
citando Jango. "Onde estão aqueles que traíram o povo?"
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