domingo, 19 de outubro de 2014

O baixo crescimento do Brasil no contexto mundial




*José Álvaro de Lima Cardoso
     O baixo crescimento da economia brasileira observado nos últimos anos preocupa a todos que têm responsabilidade com o país. Afinal, crescimento é um pressuposto da continuidade do processo de melhoria da renda, em curso na última década. A chamada recessão técnica que o país enfrentou no primeiro semestre (aparentemente superada, a julgar pela divulgação dos dados mais recentes do nível de atividade), é um fenômeno bastante negativo. Pelas suas condições naturais e tecnológicas, não há dúvidas que o Brasil pode crescer a taxas muito superiores do que as verificadas no último triênio. Entre 1940 e 1980, quando o nível de escolaridade da população era muito inferior, nenhum outro país cresceu tanto quanto o Brasil, tendo atingido crescimento anual médio de 7%, o maior entre todos os países no período. O país precisa crescer a taxas mais elevadas para continuar aumentando a renda per capita e melhorar a vida da população, que deve ser o objetivo primeiro da política econômica de qualquer nação.
     Muitos analistas têm escrito sobre o baixo crescimento do Brasil, destacando que este está entre os mais baixos do mundo. As referidas análises comparam recorrentemente o crescimento brasileiro aos dos países emergentes, e ao de outros países sul-americanos. De fato, o Brasil tem crescido abaixo da média verificada nos países chamados emergentes. No entanto, quando retiramos a China da análise (cujo crescimento é “um ponto fora da curva”) verificamos que a economia brasileira vem crescendo de forma semelhante aos países emergentes.
    O G-20 é o um fórum informal que reúne os países desenvolvidos e emergentes, cujas economias representam nada menos que 90% do PIB mundial e 2/3 da população global. Na tabela abaixo, temos os países que compõem o G-20 e seus respectivos crescimentos em 2013. O Brasil está na 7ª posição em crescimento, no grupo. A Tabela contém também uma média de crescimento do PIB com e sem a presença da China que lidera o crescimento. O crescimento do Brasil está acima da média do G-20 sem a China, como revelam os dados.  


                                


                                Variação do PIB no G-20 em 2013
País
Variação do PIB (%) em 2013
China
7,7
Indonésia
5,8
Índia
5,0
Turquia
4,1
Arábia Saudita
4,0
Coréia do Sul
3,0
Argentina
2,9
Brasil
2,5
Austrália
2,3
EUA
2,2
Canadá
2,0
África do Sul
1,9
Reino Unido
1,7
Japão
1,5
Rússia
1,3
México
1,1
Alemanha
0,5
França
0,3
Itália
-1,9
Média do G20
3,4
Média sem China
2,2
Fonte: FMI
Elaboração: DIEESE



     O Brasil cresceu mais que 11 países do G-20, alguns deles apontados como modelos a serem seguidos. É o caso do México, cujo produto no ano passado, cresceu apenas 1,1%, abaixo até da média que vem mantendo nos últimos 12 anos (1,5%). O México atualmente é o preferido dos especuladores de todos os quadrantes do mundo. Há grande condescendência dos organismos internacionais e das organizações ligadas aos grandes grupos multinacionais com a política econômica do México. Mas não nos enganemos, isso não ocorre por acaso. O país lidera a Aliança para o Pacífico, apoiada diretamente pelos EUA e Espanha. O fato é que o México vem crescendo metade do que cresce o Brasil, e tem uma dívida pública do tamanho do PIB, enquanto a do Brasil equivale a 35%. Não obstante, é grande a condescendência do FMI e outras organizações multilaterais com o México, que destoa da dureza com que, em regra, o Brasil vem sendo tratado por estes mesmos organismos e imprensa mundial.
     Não devemos ser ingênuos. A razão disso está na forma como ambos os países se relacionam com os interesses dos países dominantes, especialmente os EUA. Só para citar exemplo recente: no final de 2013, o governo mexicano de Piena Neto aprovou a reforma de dois artigos da Constituição, que abre caminho para a privatização da Pemex, empresa de petróleo comandada pelo Estado Mexicano há 75 anos. É decisão extremamente estratégica, que mexe com interesses históricos e atende aos apelos das gigantes do petróleo. Também é muito perigosa, visto que quase um terço da receita do governo mexicano advém da Pemex.
     Enquanto isso no Brasil, em julho último o governo entregou à Petrobrás, quatro das seis áreas de cessão onerosa utilizadas como garantia no processo de capitalização da empresa. Essas áreas, que estão concentradas no campo de Franco (agora Búzios), tem entre 10 e 14 bilhões de barris de petróleo recuperáveis, praticamente tudo que o país possui de reservas comprovadas. Decisão acertada, para uma empresa que detém impressionantes resultados operacionais (os que realmente importam): extração de 1,95 milhão de barris/dia de petróleo, que garante ótimos resultados financeiros, e o ingresso em um círculo virtuoso (no qual produz mais, fatura mais e aumenta fortemente a sua capacidade de investir). Esse tipo de decisão estratégica, que colocará a Petrobrás, nos próximos anos, no seleto grupo das cinco maiores petroleiras mundiais em termos de produção e reservas confirmadas de petróleo, obviamente não agrada o lobby internacional do petróleo. As multinacionais estão de olho nas imensas reservas de Petróleo do país e uma empresa de ponta como a Petrobrás, que não conseguiram privatizar na década de 1990, é um tremendo obstáculo neste objetivo. Isso explica a frequência e a virulência dos ataques contra a empresa.
     O baixo crescimento do Brasil é problema que deve ser enfrentado com determinação. No entanto, o fenômeno deve ser visto no quadro da economia internacional, que ainda sente os efeitos da maior crise do capitalismo nos últimos 80 anos. A necessidade de acelerar o crescimento do Brasil está sendo, por si só, bastante árdua e complexa. Montar diagnósticos irrealistas como se os problemas brasileiros estivessem descolados da realidade mundial, não ajudam em nada a resolução do problema.
*Economista e supervisor técnico do DIEESE em Santa Catarina.

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