sábado, 25 de outubro de 2014

Eleições 2014: O Momento Brizola de Dilma Rousseff


André Kaysel  Via Carta Maior
  

O ano era 1982. Leonel Brizola, veterano trabalhista, após 18 anos de exílio e proscrição lançava-se ao governo do Rio de Janeiro, terceiro colégio eleitoral do país. Seu adversário mais importante, Miro Teixeira, então candidato da máquina chaguista, a qual representava o MDB acomodado com a ditadura. Miro era favorito, mas a campanha de Brizola ganhou força e, em um dado momento ficou claro que o velho líder gaúcho poderia levar. Então, a Rede Globo, que engordara à sombra do regime militar, preparou em conluio com a Pró-Consulte – firma contratada para realizar uma apuração eletrônica – uma fraude para tirar a vitória das mãos de Brizola. Só se esqueceram da pergunta de Mané Garrincha: “o Sr. se  lembrou de combinar com os russos?”.

Brizola, percebendo a trama, foi à televisão e denunciou o esquema da Globo. Destruída a farsa, os verdadeiros resultados foram proclamados e o trabalhista sagrou-se governador. Para desespero da direita, claro.

2014: a dois dias das eleições, com a candidata oficial a um passo da vitória, a revista Veja, que Brizola um dia qualificou como “agentes da CIA”, lança uma capa sensacionalista, afirmando que a presidenta, juntamente com o ex-presidente Lula, teriam pleno conhecimento dos casos de corrupção na Petrobrás. Mais uma vez, esqueceram-se da sabedoria do “anjo das pernas tortas”. Dilma foi ao ar e acusou a ação criminosa da publicação do Sr. Civita. Mais do que isso, declarou que irá a justiça contra o semanário por sua calúnia. Mais uma vez, vivemos um “momento Brizola”.

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Talvez não por acaso Dilma seja uma petista relativamente neófita, oriunda das hostes do PDT, agremiação fundada por Brizola após seu retorno do exílio. Mesmo em seus momentos mais radicais, o PT nunca enfrentou os monopólios midiáticos da mesma maneira que fazia o líder gaúcho. O custo disso pode ser plenamente avaliado nas eleições de 1989, nas quais Lula e o PT tiveram sua vitória frustrada pelas artimanhas da Globo.

Agora, 25 anos mais tarde, quando termina uma eleição cuja polarização e acirramento só se comparam aos do pleito daquele ano, Dilma encarnou a herança brizolista. Como bem declarou essa semana o jornalista Rodrigo Vianna, Dilma traz ao PT uma “pitada de varguismo e de brizolismo”, revelando uma compreensão da questão nacional que o PT nunca teve plenamente. Agora, que a “gerente” se metamorfoseou em liderança política de primeiro calibre, podemos estar assistindo à síntese de duas vertentes da esquerda brasileira, até hoje divorciadas: a nacionalista popular, do trabalhismo, e a socialista democrática, representada pelo petismo.

É verdade que, ao longo dos mandatos de Lula e Dilma essa aproximação vinha se ensaiando, como alguns observadores – caso do cientista político André Singer – já notaram. Porém, fora do âmbito da política externa, essa convergência só se esboçou, não chegando a se configurar. Agora, às vésperas da votação, o discurso de Dilma dá mais um passo nessa direção. Não sei se essa síntese de fato ocorrerá em seu provável segundo mandato, mas o episódio de hoje demonstra que ela é possível e necessária, caso o PT não queira ser engolido pela direita golpista e reacionária. Há muito em jogo nessas eleições, dentro e fora do país, e uma coalizão de interesses internos e externos, abrigada na candidatura de Aécio Neves, tem demonstrado até a onde vai sua disposição de derrotar a candidatura popular. Nesse quadro, uma liderança firme e com claro discernimento do interesse nacional é algo crucial.

Nos últimos dias, tanto Lula, como Dilma, vinham subindo o tom contra a grande imprensa. O discurso de Dilma contra a Veja é a culminação disso. Brizola tinha a vocação da política. Lula, ainda que de modo muito distinto, também a tem e Dilma deixou claro possuí-la. O sociólogo Max Weber uma vez declarou que era comovente ver um homem, jovem ou maduro, apresentar-se e dizer: “eis-me aqui”. Esse teria a vocação da política. No caso do Brasil de hoje, tratou-se de uma mulher. Uma mulher que teve a coragem de enfrentar os verdugos da ditadura e, quatro décadas depois, enfrenta com o mesmo brio os interesses inconfessáveis dos Civitas.

O Brasil pode se orgulhar da líder que tem. Vargas, Jango e Brizola sorriem no túmulo. Já os vendilhões da pátria, acostumados a falar grosso e a ouvir sussurros como resposta, esses podem tremer. Viva a presidenta Dilma! Viva o povo brasileiro! Viva o Brasil!




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